Após uma longa pausa por causa do Carnaval, os mercados brasileiros finalmente voltaram a operar nesta quarta-feira (26), às 13h. E, conforme já era esperado, o tom é de enorme cautela: o Ibovespa já cai mais de 7%, renovando as mínimas do ano, enquanto o dólar à vista subiu para R$ 4,44.
Afinal, as negociações estiveram paralisadas por aqui na segunda (24) e na terça-feira (25), dias em que os mercados globais enfrentaram enorme turbulência e registraram perdas relevantes. Assim, os ativos domésticos agora se ajustam às oscilações externas dos últimos dias.
Por volta de 17h10, o Ibovespa despencava 7,30%, aos 105.384,00 pontos, em meio a um intenso movimento de correção. Nos Estados Unidos, o Dow Jones acumulou perdas de 6,6% nos dois primeiros pregões desta semana; o S&P 500 (-6,3%) e o Nasdaq (-6,4%) também desabaram no período.
E toda essa onda de pessimismo global se deve ao avanço do coronavírus para além das fronteiras da China. Desde o fim de semana, novos focos da doença surgiram no mundo, com destaque para um salto nos casos na Itália, na Coreia do Sul e no Irã.
Até a semana passada, o mercado trabalhava com um cenário em que o vírus possuía poucas manifestações fora da China. Mas, com um crescimento súbito nas mortes e infecções em outros países, aumentou fortemente o temor quanto aos impactos que o surto poderá causar à economia global.
Nesse panorama cheio de incertezas, os investidores externos optaram por assumir uma postura mais defensiva nos últimos dias, vendendo ações e correndo para a segurança do dólar — e, por aqui, esse efeito só é sentido hoje, já que a pausa do Carnaval impediu um ajuste "em tempo real" dos ativos domésticos.
No mercado de moedas, o dólar à vista terminou a sessão em alta de 1,11%, a R$ 4,4413 — um novo recorde nominal de encerramento. A pressão sobre o câmbio só não foi maior porque o Banco Central (BC) convocou um leilão extraordinário de swap no início da tarde, para injetar recursos novos no sistema. Há outra operação semelhante prevista para amanhã.
Entre as curvas de juros, o dia foi de estabilidade na ponta mais curta, em meio à percepção de que o BC terá de cortar a Selic para dar mais impulso à economia doméstica. Mas, nos vencimentos mais longos, o tom foi de alta firme, em linha com o comportamento do dólar.
Veja abaixo como ficaram os principais DIs hoje:
- Janeiro/2021: de 4,18% para 4,19%;
- Janeiro/2022: de 4,68% para 4,76%;
- Janeiro/2023: de 5,26% para 5,37%;
- Janeiro/2025: de 6,06% para 6,19%;
- Janeiro/2027: de 6,47% para 6,63%.
Fatores locais
Como se a correção dos últimos dias não fosse suficiente para trazer cautela às negociações por aqui, há fatores extra de pressão no front doméstico.
Em primeiro plano, aparece a confirmação do primeiro caso do coronavírus no país— trata-se de um homem de 61 anos que esteve na Itália a trabalho. O Brasil, assim, tornou-se a primeira nação da América Latina a constatar a nova doença.
Além disso, o cenário de tensão em Brasília contribui para trazer ainda mais prudência as operações. Conforme revelado pelo site BR Político, do jornal O Estado de S. Paulo, o presidente Jair Bolsonaro disparou de seu celular pessoal um vídeo em que ataca o Congresso e convoca a população a "sair as ruas" em 15 de março para defendê-lo.
Para especialistas, o comportamento de Bolsonaro pode ser enquadrado como crime de responsabilidade — ainda não há posicionamentos oficiais dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia, e do Senado, Davi Alcolumbre. Mas, desde a noite de ontem, o tema tem gerado enorme discussão nas redes sociais.
O mal estar gerado pela situação — assim como a falta de clareza quanto à reação da classe política ao vídeo — cria mais um ponto de estresse para as negociações nesta quarta-feira.
Exterior menos negativo
A situação só não é pior porque, lá fora, a sessão é relativamente amena. Nos Estados Unidos, o Dow Jones (-0,33%), o S&P 500 (-0,14%) e o Nasdaq (+0,24%) ficam perto do zero a zero, após as fortes baixas dos últimos dias; na Europa, as principais praças assumiram um tom misto.
No mercado de câmbio, o dia também foi mais calmo em relação às sessões anteriores. O dólar continuou se fortalecendo na comparação com as moedas emergentes, mas num ritmo bem inferior ao dos últimos dias.
Dia vermelho
Todas as ações da carteira do Ibovespa operam em queda nesta tarde, mas alguns papéis apresentam desempenhos particularmente ruins: empresas aéreas e companhias ligadas ao mercado externo têm as maiores baixas do índice.
Gol PN (GOLL4), com perda de 14,78%, e Azul PN (AZUL4), em baixa de 13,12%, lideram a ponta negativa do Ibovespa, em meio a uma enxurrada de fatores negativos para tais companhias. Além da óbvia preocupação quanto aos impactos do coronavírus ao setor de viagens, também há a pressão vinda da disparada do dólar.
Vale lembrar que boa parte da linha de custos de uma companhia aérea é dolarizada, já que as despesas com combustível de aviação são denominadas na moeda americana. Assim, nem mesmo a baixa do petróleo nos últimos dias é capaz de trazer alento a essas empresas.
No front das exportadoras, há uma enorme preocupação quanto ao estado do comércio e da economia mundial por causa do surto. Nesse contexto, as siderúrgicas CSN ON (CSNA3), Gerdau PN (GGBR4) e Usiminas PNA (USIM5) são as mais prejudicadas, com quedas de 11,42%, 11,26% e 10,14%, nesta ordem.
As ações da Petrobras também são fortemente impactadas, tanto as ONs (PETR3) quanto as PNs (PETR4), com perdas de 9,72% e 9,20%, respectivamente. Somente nesta semana, o petróleo Brent já acumula queda de 8,7%, enquanto o WTI cai 7,43%.
Por fim, Vale ON (VALE3) desvaloriza 9,81% nesta tarde — a China, epicentro do coronavírus, é a principal consumidora mundial de minério de ferro, e uma desaceleração na economia do gigante asiático afetaria diretamente a empresa brasileira.
Top 5
Veja abaixo as cinco maiores quedas do índice nesta quarta-feira:
- Gol PN (GOLL4): -14,78%
- Azul PN (AZUL4): -13,12%
- Metalúrgica Gerdau PN (GOAU4): -12,33%
- CSN ON (CSNA3): -11,42%
- Gerdau PN (GGBR4): -11,26%