Apesar da torcida do mercado e de indicadores positivos como risco-país e taxas de juros, ainda falta um bocado de consolidação fiscal e crescimento econômico para o país retomar o almejado grau de investimento.
Nesta quinta-feira, a agência de classificação de risco Fitch manteve a nota do Brasil em “BB-”, três degraus abaixo do “investment grade”. Além disso, a Fitch sinalizou que uma mudança de nota deve demorar mais um pouco, já que manteve a perspectiva estável para sua avaliação.
Esse "selo de bom pagador" é exigido por grandes investidores internacionais, como fundos de pensão, para alocar recursos em um determinado país. Mas mais do que essa chancela prática, o grau de investimento é o reconhecimento na comunidade financeira internacional de que o país é civilizado o suficiente em termos macroeconômicos para receber parcela da poupança mundial.
Em comunicado, a Fitch diz que a nota brasileira é restringida por um elevado e crescente endividamento do governo; uma rígida estrutura fiscal e baixo potencial de crescimento econômico. Além disso, o cenário político é “difícil”, incluindo um Congresso fragmentado e escândalos de corrupção que dificultam uma aprovação tempestiva das reformas fiscais e econômicas.
Nem tudo é crítica na avaliação, pois a Fitch reconhece a importância da aprovação da reforma da Previdência e também da venda de ativos e desinvestimentos feitos pela Petrobras e bancos públicos.
A agência também chama atenção para o pacote de reformas “Mais Brasil”, que tenta melhorar o gerenciamento da política fiscal, ampliar a flexibilidade orçamentária e redesenhar a relação fiscal entre União, Estados e municípios. Mas pondera as dificuldades de aprovação.
Sem superávit, sem grau de investimento
Em sua nota, a Fitch chama atenção para elevada dívida sobre o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, que está na linha de 79%, contra uma mediana de 46,7% dos demais países que estão no grupo de nota “BB”.
Mais importante que isso é que nas condições atuais, a Fitch avalia que esse endividamento continuará crescendo ao longo da próxima década. A conta é simples, gastando mais do que arrecada, o governo seguirá se endividando. Para a agência, bateremos nos 80% do PIB em 2020. A dívida não é ainda maior em função da devolução antecipada dos empréstimos feitos ao BNDES.
Para a Fitch, o superávit primário necessário para estabilizar (veja bem, estabilizar) a relação dívida/PIB seria de 3 pontos percentuais do Produto, hoje temos déficit ao redor de 1%.
Para dar uma melhor dimensão dessa trajetória do endividamento, quando o Brasil recebeu a classificação de “grau de investimento”, em 2008, o percentual estava ao redor dos 56%. Mas mais importante que o patamar era a trajetória de queda. Em 2013, a dívida estava em 51,5% do PIB. O que temos é que desde então, a dívida sobre o PIB aumentou quase 30 pontos do PIB (pergunta: qual foi o benefício disso para a sociedade?).
Considerando o gasto com juro (que está caindo junto com a Selic), o déficit nominal está na linha dos 7%, ainda elevado em comparação com os pares de nota “BB”, que apresentam um buraco fiscal de 3% do PIB. Para o período 2020/2021, a Fitch estima que esse déficit vai recuar marginalmente para 6% do PIB e pondera que o resultado pode ser melhor caso o governo obtenha mais receitas não recorrentes, “embora isso não represente melhor estrutural”.
A Fitch trabalha com crescimento do PIB de 0,8% em 2019 e 2% em 2020, que também está abaixo da média dos países “BB”, de 3% e 3,2%. Para a agência, o andamento da agenda de reformas será crucial para impulsionar uma recuperação ainda maior.