Um novo aumento no número de mortos e infectados pelo coronavírus mexe com os brios do mercado nesta quinta-feira (30). O avanço da doença provoca um salto na aversão ao risco, derrubando o Ibovespa e as demais bolsas do mundo — e desencadeando uma corrida ao dólar.
Por volta de 17h15, o principal índice acionário do Brasil recuava 0,87%, aos 114.379,75 pontos — no pior momento do dia, tocou os 112.825,49 (-2,22%), registrando uma nova mínima para 2020.
A melhora do Ibovespa ocorreu em linha com o exterior: nos Estados Unidos, o Dow Jones (-0,13%), o S&P 500 (-0,24%) e o Nasdaq (-0,24%) reduziram as perdas, reagindo a uma manifestação da Organização Mundial da Saúde (OMS) a respeito do coronavírus.
A instituição decretou emergência global de saúde pública, mas também elogiou os esforços do governo chinês para conter a disseminação da doença. A OMS também negou qualquer instrução para evitar viagens ao país asiático, uma postura que trouxe algum alívio às preocupações.
O mercado de câmbio, contudo, não teve muito tempo para reagir ao posicionamento. O dólar à vista fechou em alta de 0,90%, a R$ 4,2574 — a maior cotação de encerramento desde 27 de novembro (R$ 4,2586).
Até o começo da noite de ontem, o balanço do coronavírus dava conta de 133 mortos e cerca de seis mil pessoas infectadas. No entanto, o saldo aumentou bastante desde então — os números mais atualizados já mostram 170 mortes e quase oito mil contaminados no mundo.
"O mercado teme que a China não esteja contanto a verdade, teme que a realidade seja mais grave do que a revelada", diz um operador que prefere não ser identificado. "Há o receio de que o vírus poderá impactar a economia mundial".
A cautela em relação à doença também foi sentida no mercado de commodities. O petróleo Brent caiu 2,68% e o WTI terminou em baixa de 2,23% — as negociações de minério de ferro continuam paralisadas, em função do feriado do Ano Novo Lunar na China.
Turbulência na bolsa
O anúncio da OMS e a leitura de que a situação é menos grave do que o imaginado permitiu que alguns papéis que vinham sendo penalizados nesta quinta-feira ganhassem força — caso das empresas ligadas ao setor de commodities e que exportam para a China.
É o caso de Petrobras ON (PETR3), que virou e agora sobe 0,89%, apesar das perdas do petróleo. Vale ON (VALE3) e Gerdau PN (GGBR4) também passaram ao campo positivo, com ganhos de 0,61% e 1,34%, respectivamente.
Por outro lado, Petrobras PN (PETR4) segue em queda de 0,17% — CSN ON (CSNA3), com perda de 0,82%, e Usiminas PNA (USIM5), com desvalorização de 2,33%, também não conseguiram virar para alta.
No segmento de papel e celulose, Suzano ON (SUZB3) e as units da Klabin (KLBN11) recuam 1,71% e 1,18%, nesta ordem, trazendo pressão extra ao Ibovespa.
De olho na agenda
Além da tensão relacionada ao coronavírus, os mercados ainda repercutem uma agenda econômica carregada nesta quinta-feira. Em primeiro plano, aparece o avanço de 2,1% do PIB dos Estados Unidos na primeira prévia do quarto trimestre — um dado que veio em linha com as expectativas e não trouxe mais preocupação aos investidores.
Por aqui, são digeridos os dados do IGP-M, mostrando uma desaceleração para 0,48% em janeiro — em dezembro, o indicador subiu 2,09%. E, com o alívio na pressão inflacionária, o mercado volta a apostar num novo corte da Selic pelo Copom.
Mas, apesar da surpresa positiva com o IGP-M, as curvas de juros fecharam em alta — a pressão no dólar à vista e a tensão global com o coronavírus se sobrepuseram ao alívio inflacionário. Veja abaixo como ficaram os principais DIs nesta quinta-feira:
- Janeiro/2021: de 4,34% para 4,36%;
- Janeiro/2023: de 5,49% para 5,50%;
- Janeiro/2025: de 6,18% para 6,21%;
- Janeiro/2027: de 6,58% para 6,59%.
Até onde vai o dólar?
No mercado de câmbio, o dólar se valorizou em relação às moedas de países emergentes, como o peso mexicano, o rublo russo, o peso chileno, o rand sul-africano e o peso chileno, entre outras. Assim, o real acompanhou o contexto de cautela externa.
"Ninguém sabe até onde essa crise vai", diz Jefferson Luiz Rugik, diretor de câmbio da corretora Correparti. "O investidor é arredio ao risco: ele vê uma instabilidade dessas e corre para a segurança".
Esse é um movimento clássico dos mercados de câmbio: em momentos de turbulência, os agentes financeiros deixam suas posições em ativos mais arriscados — como as moedas de países emergentes — e correm para opções mais sólidas, como o dólar ou o iene.
Vale ressaltar, no entanto, que a divisa brasileira tem o pior desempenho do grupo, com o dólar já próximo as máximas nominais históricas. Rugik, no entanto, ainda não aposta numa atuação do Banco Central para conter o avanço da moeda americana.
"É um problema mundial, não é um problema específico do Brasil", diz ele. "Claro que, se o dólar subir demais, o Banco Central vai ter que intervir de alguma maneira. Mas, por enquanto, eu não vejo necessidade".
O diretor da Correparti ainda lembra que, no ano passado, quando o BC promoveu leilões de dólares no mercado à vista, havia um problema de liquidez no mercado doméstico — muitas empresas estavam enviando recursos ao exterior para o pagamento de proventos.
Assim, a conjuntura atual é diferente da do ano passado, já que, desta vez, não há uma questão estrutural relacionada ao país.
Dia vermelho
A maioria das ações do Ibovespa opera em queda nesta quinta-feira, com alguns poucos papéis conseguindo sustentar um desempenho positivo. Veja abaixo quais são as altas do índice:
- Cielo ON (CIEL3): +1,72%
- Gerdau PN (GGBR4): +1,64%
- Cosan ON (CSAN3): +0,88%
- Fleury ON (FLRY3): +0,87%
- Hypera ON (HYPE3): +0,81%
Confira também as cinco maiores quedas do Ibovespa:
- Braskem PNA (BRKM5): -4,20%
- Marfrig ON (MRFG3): -3,78%
- B2W ON (BTOW3): -3,63%
- Weg ON (WEGE3): -3,59%
- Cogna ON (COGN3): -3,42%