A nova política de Bolsonaro intriga Brasília e os mercados
Atritos do presidente com Rodrigo Maia sugerem uma ruptura no modelo de relação entre Executivo e Legislativo e isso vai trazer instabilidade à política e aos preços dos ativos

“O poder popular não precisa mais de intermediação. As novas tecnologias permitiram uma relação direta entre eleitor e seus representantes.”
A frase acima é do presidente Jair Bolsonaro e foi dita em sua diplomação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Lembrei desse ponto específico do discurso enquanto acompanhava a troca de farpas que se iniciou na sexta-feira entre o mandatário e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que reclama da articulação política do governo, externando não só a visão dele, mas sim ecoando uma insatisfação do Legislativo.
Esse mesmo discurso traz outra frase que ganha novo sentido sob a ótica de um conflito declarado entre os Poderes Executivo e Legislativo: “A construção de uma nação mais justa e desenvolvida requer uma ruptura com práticas que, historicamente, retardaram o nosso progresso.”
O fim do que se conhece como “Presidencialismo de Coalizão” sempre esteve na fala do presidente, mas parece que ninguém (ou pouca gente) no mercado e na academia levou isso à risca.
A crença (minha inclusive) era de que Bolsonaro poderia sim fazer a clássica negociação de cargos e espaço no governo em troca de apoio parlamentar, mas de uma forma hígida e sem os vícios que marcaram esse modelo político, que descambou para o “Presidencialismo de Cooptação”, via compra de apoio e corrupção expressa, que já levou dois ex-presidentes à cadeia.
Retroceder nunca, render-se jamais
Do Chile, Bolsonaro deixou claro que não vai ceder. Como militar imbuído de uma missão dada pelas urnas, ele vai para o combate contra a “velha política”, contra o “toma lá, dá cá”. “Nosso compromisso com a soberania do voto popular é inquebrantável”, disse o presidente, resgatando aqui mais uma passagem de sua fala no TSE.
Leia Também
A questão é que ainda não está claro o que vem a ser a “nova política” proposta pelo presidente, temos apenas algumas pistas e suposições e, também, não sabemos se isso vai funcionar.
Enquanto estivermos nesse vácuo sobre como o Executivo vai dialogar com o Legislativo para que tenha suas propostas aprovadas, o que está claro é que teremos atrito, ruídos e “crises” no mundo político, gerando instabilidade no preço dos ativos.
O pregão de sexta-feira foi prova disso e se não bastasse as agruras locais, a economia mundial parece estar adoecendo, em um momento em que as tradicionais ferramentas monetárias e fiscais parecem perder efeito num mundo que escapa aos livros-texto de economia.
O momento parece mais propício a estratégias de investimento que enfatizem a limitação de perdas em detrimento à plena obtenção de lucros. Estou adaptando aqui recomendação dada pelo lendário gestor da Oaktree Capital, Howard Marks, quando em setembro do ano passado anteviu problemas nos mercados americanos.
O mercado pune e o governo vai aprender isso cedo ou tarde. Todos os governos aprendem, embora alguns preferem ignorar a lição.
— Faria Lima Elevator (@FariaLimaElevat) March 23, 2019
A bola está com o Parlamento
Bolsonaro não explica literalmente o que ele entende por nova política. Para Maia, que falou em tom de provocação, seria não fazer nada e esperar aplausos nas redes sociais.
Depois, em tom mais duro, disse à "Folha de S.Paulo" que "não tem governo. É um governo vazio, que não tem ideia, proposta, articulação. Para dissimular, ele criou esse confronto do bem contra o mal, do bonito contra o feio, do quente contra o frio. Eles são o bem, os bonitos, os quentes. E nós, os políticos, somos os maus, os feios. É só para manter a base ultraconservadora na internet”.
Bolsonaro se defende jogando a pergunta de volta, questionado: “o que é articulação? O que é que está faltando eu fazer? O que foi feito no passado não deu certo e não seguirei o mesmo destino de ex-presidentes, pode ter certeza disso.”
Para o presidente, ele já fez a parte dele ao enviar o projeto de reforma da Previdência. Assim, a bola está com o Parlamento. “A responsabilidade no momento está com o Parlamento brasileiro. Eu confio na maioria dos parlamentares”, afirmou.
O que transparece na fala do presidente é que a reforma da Previdência, sendo um assunto de Estado e não de governo, deve ser aperfeiçoada e aprovada por parlamentares pensando no “bem do país”.
A crítica a essa postura é que o Executivo deveria dialogar e articular a base de votos no Congresso, onde todos sabemos que não existe (ou menos não existia?) essa ideia de “projeto de Nação”, “pensar no Brasil”.
Aqui é que se encaixa a frase que abre esse texto, do fim da intermediação com o poder popular. Parece que Bolsonaro vai para o embate contra as práticas da velha política contanto com sua base de apoio popular e sua força nas redes.
De fato, suas manifestações nas redes e lives no “Facebook” são feitas para manter uma militância inflamada e pronta para atacar a política, os políticos e as instituições. Algo que já acontece, pois tenho recebido e visto vídeos atacando Maia, por exemplo. Ponderei aqui que esse trabalho com as bases é necessário e válido, mas não precisa agredir aliados para fazer isso.
Uma leitura possível é que Bolsonaro vai jogar o povo contra o Congresso, dizendo que ele enviou a reforma para o bem do país, mas os congressistas são contra o Brasil, que não querem largar a velha política.
A ideia que ganha corpo é que o Congresso quer acabar com a Lava-Jato (como se fosse possível parar a operação ao desligar de um botão) e impedir o projeto contra corrupção de Sérgio Moro, em troca da reforma. Devaneios e teorias da conspiração são sempre mais deliciosos que a insossa realidade e seus infinitos tons entre os puros e os ímpios.
Os novos Cruzados
Outra indicação de que vamos para a ruptura vem de manifestações de gente próxima ao presidente. Em seu “Twitter”, o assessor internacional da Presidência da República, Filipe G. Martins, fala que há uma tentativa de isolar a ala anti-establishment, como forma de quebrar a mobilização popular.
Há e sempre houve um viés um pouco messiânico no próprio presidente e em boa parte de sua equipe, que se colocam como Cavaleiros Templários em uma cruzada contra o mal que tomou conta do Brasil nas esferas econômica, moral e ética.
Deixo aqui dois tuítes do Filipe Martins, mas para quem se interessar vale ler o “fio” todo.
8. O instinto mais primordial da política é o da sobrevivência. Afinal, quem se move por interesses compreende melhor do que ninguém que o primeiro interesse é o de manter-se no jogo e continuar em posição de buscar seus outros interesses; o de continuar vivo politicamente.
— Filipe G. Martins (@filgmartin) 22 de março de 2019
9. E a única forma de ativar a lógica da sobrevivência política é por meio da pressão popular, por meio da mesma força que converteu a campanha eleitoral do PR Bolsonaro em um movimento cívico e tornou possível sua vitória. É necessário, em suma, mostrar que o povo manda no país.
— Filipe G. Martins (@filgmartin) 22 de março de 2019
Um tuíte do secretário especial da Receita, Marcos Cintra, que também se espinhou com Maia, resume bem qual seria a ideia dessa “nova política”.
Já que os deputados acham que seus pedidos não estão sendo atendidos e não se mostram dispostos a apoiar a Nova Previdência, que a sociedade se articule para cobrar de seus representantes as razões que justificam eles sacrificarem o país e fazerem o povo pagar a conta.
— Marcos Cintra (@MarcosCintra) March 24, 2019
Para não ser taxado de “velha política”, “inimigo da Lava-Jato” ou “viúva do Lula”, deixo claro que não faço juízo de valor sobre o que está acontecendo. Tenho a impressão que estamos vendo um processo novo ainda com lentes antigas. Estamos em uma curva de aprendizado e sem conseguir enxergar direito em que ponto estamos e onde vamos parar.
Um novo Jânio Quadros?
Voltando a Howard Marks e sua célebre avaliação de que a história não se repete, mas rima (frase atribuída a Mark Twain), em conversa com amigos da academia e do mercado, a figura que surge é a do ex-presidente Jânio Quadros.
Simplificando ao máximo todo o contexto político da época, o quadro que se desenha agora “rimaria” com o de Jânio no sentido de termos um presidente que vai ao embate com o Congresso achando que voltaria nos braços do povo. O fim de Jânio e o resto da história é sabida por todos.
https://twitter.com/PedroCerize/status/1109588339148107777
Para descontrair um pouco, vale lembrar de um episódio envolvendo Jânio e Roberto Campos, que se preparava para virar político e foi pedir conselhos sobre como se portar.
Disse Jânio, que segundo Campos era proprietário de carisma e inquilino do exótico: “Faça coisas chocantes e inesperadas. Por exemplo: dê caneladas na imprensa bisbilhoteira, maltrate os funcionários públicos que tiranizam os contribuintes e passe pito nos bispos que se metem na política em vez de cuidar das almas. Na televisão, fale com voz escandida, como se fosse dono da verdade.”
Outras teorias
Como não se sabe direito o que está acontecendo, tudo cabe sobre os mais diversos prismas. Para uma ala, Bolsonaro nunca acreditou na reforma da Previdência e agora cria esse caso todo para jogar a “culpa” da não aprovação no Congresso. Ou que mesmo sabendo da necessidade da reforma, não quer o ônus político dela.
Há teorias de que Maia foi para o ataque por estar acuado, temendo que seja o próximo alvo do “Partido da Justiça”, já que seu nome aparece em delação premiada da construtora OAS.
Há quem espere que o Congresso, uma vez abandonado por Bolsonaro, vá reagir como “corpo”, tocando o terror com pautas bombas e inatividade.
Já para alguns, a alta popularidade do governo é algo que só ele enxerga, pois boa quantidade dos votos obtidos por Bolsonaro não foram exatamente votos para ele, mas sim para derrotar a engrenagem do PT e acabar com a recessão de Dilma e seus ortodoxos progressistas. Como o embate com o Congresso resultaria em paralisia e reflexos negativos na economia, esse apoio também se esvaziaria.
Encerro esse texto na noite de domingo, com muitos conhecidos do mercado temendo a abertura do pregão desta segunda-feira. "Hope for the best, prepare for the worst", ou torça pelo melhor, se prepare para o pior, parece ser uma boa frase para o momento. Ou de forma mais descontraída, "bunda na parede e boca fechada".
Desaprovação a Lula cai para 50,1%, mas é o suficiente para vencer Bolsonaro ou Tarcísio? Atlas Intel responde
Os dados de abril são os primeiros da série temporal que mostra uma reversão na tendência de alta na desaprovação e queda na aprovação que vinha sendo registrada desde abril de 2024
Planos pré-feriado: Ibovespa se prepara para semana mais curta, mas cheia de indicadores e balanços
Dados sobre o mercado de trabalho no Brasil e nos EUA, balanços e 100 dias de Trump são os destaques da semana
Vale (VALE3) sem dividendos extraordinários e de olho na China: o que pode acontecer com a mineradora agora; ações caem 2%
Executivos da companhia, incluindo o CEO Gustavo Pimenta, explicam o resultado financeiro do primeiro trimestre e alertam sobre os riscos da guerra comercial entre China e EUA nos negócios da empresa
Deixa a bolsa me levar: Ibovespa volta a flertar com máxima histórica em dia de IPCA-15 e repercussão de balanço da Vale
Apesar das incertezas da guerra comercial de Donald Trump, Ibovespa está a cerca de 2% de seu recorde nominal
Dona do Google vai pagar mais dividendos e recomprar US$ 70 bilhões em ações após superar projeção de receita e lucro no trimestre
A reação dos investidores aos números da Alphabet foi imediata: as ações chegaram a subir mais de 4% no after market em Nova York nesta quinta-feira (24)
Subir é o melhor remédio: ação da Hypera (HYPE3) dispara 12% e lidera o Ibovespa mesmo após prejuízo
Entenda a razão para o desempenho negativo da companhia entre janeiro e março não ter assustado os investidores e saiba se é o momento de colocar os papéis na carteira ou se desfazer deles
A culpa é da Gucci? Grupo Kering entrega queda de resultados após baixa de 25% na receita da principal marca
Crise generalizada do mercado de luxo afeta conglomerado francês; desaceleração já era esperada pelo CEO, François Pinault
Tudo tem um preço: Ibovespa tenta manter o bom momento, mas resposta da China aos EUA pode atrapalhar
China nega que esteja negociando tarifas com os Estados Unidos e mercados internacionais patinam
Ação da Neoenergia (NEOE3) sobe 5,5% após acordo com fundo canadense e chega ao maior valor em cinco anos. Comprar ou vender agora?
Bancos que avaliaram o negócio não tem uma posição unânime sobre o efeito da venda no caixa da empresa, mas são unânimes sobre a recomendação para o papel
Bolsa nas alturas: Ibovespa sobe 1,34% colado na disparada de Wall Street; dólar cai a R$ 5,7190 na mínima do dia
A boa notícia que apoiou a alta dos mercados tanto aqui como lá fora veio da Casa Branca e também ajudou as big techs nesta quarta-feira (23)
Agora 2025 começou: Ibovespa se prepara para seguir nos embalos da festa do estica e puxa de Trump — enquanto ele não muda de ideia
Bolsas internacionais amanheceram em alta nesta quarta-feira diante dos recuos de Trump em relação à guerra comercial e ao destino de Powell
Ibovespa pega carona nos fortes ganhos da bolsa de Nova York e sobe 0,63%; dólar cai a R$ 5,7284
Sinalização do governo Trump de que a guerra tarifária entre EUA e China pode estar perto de uma trégua ajudou na retomada do apetite por ativos mais arriscados
Orgulho e preconceito na bolsa: Ibovespa volta do feriado após sangria em Wall Street com pressão de Trump sobre Powell
Investidores temem que ações de Trump resultem e interferência no trabalho do Fed, o banco central norte-americano
Trump x Powell: uma briga muito além do corte de juros
O presidente norte-americano seguiu na campanha de pressão sobre Jerome Powell e o Federal Reserve e voltou a derrubar os mercados norte-americanos nesta segunda-feira (21)
É recorde: preço do ouro ultrapassa US$ 3.400 e já acumula alta de 30% no ano
Os contratos futuros do ouro chegaram a atingir US$ 3.433,10 a onça na manhã desta segunda-feira (21), um novo recorde, enquanto o dólar ia às mínimas em três anos
A última ameaça: dólar vai ao menor nível desde 2022 e a culpa é de Donald Trump
Na contramão, várias das moedas fortes sobem. O euro, por exemplo, se valoriza 1,3% em relação ao dólar na manhã desta segunda-feira (21)
Com ou sem feriado, Trump continua sendo o ‘maestro’ dos mercados: veja como ficaram o Ibovespa, o dólar e as bolsas de NY durante a semana
Possível negociação com a China pode trazer alívio para o mercado; recuperação das commodities, especialmente do petróleo, ajudaram a bolsa brasileira, mas VALE3 decepcionou
‘Indústria de entretenimento sempre foi resiliente’: Netflix não está preocupada com o impacto das tarifas de Trump; empresa reporta 1T25 forte
Plataforma de streaming quer apostar cada vez mais na publicidade para mitigar os efeitos do crescimento mais lento de assinantes
Lições da Páscoa: a ação que se valorizou mais de 100% e tem bons motivos para seguir subindo
O caso que diferencia a compra de uma ação baseada apenas em uma euforia de curto prazo das teses realmente fundamentadas em valuation e qualidade das empresas
Que telefone vai tocar primeiro: de Xi ou de Trump? Expectativa mexe com os mercados globais; veja o que esperar desta quinta
Depois do toma lá dá cá tarifário entre EUA e China, começam a crescer as expectativas de que Xi Jinping e Donald Trump possam iniciar negociações. Resta saber qual telefone irá tocar primeiro.