O presidente Jair Bolsonaro chega hoje aos cem primeiros dias de mandato e a data é marcada por uma forte agenda de indicadores e eventos econômicos, capazes de agitar o mercado financeiro hoje. Ainda assim, o foco dos investidores segue na capacidade do novo governo de romper com a “velha política” e avançar com a agenda de reformas.
O primeiro passo nessa direção foi dado ontem. Sem grandes novidades, o parecer da reforma da Previdência foi lido na primeira comissão da Câmara dos Deputados, que analisa se a proposta fere algum princípio constitucional. A votação do texto, que preservou na íntegra o projeto original do governo, está marcada para a semana que vem.
O cenário ideal para o mercado doméstico é de que o projeto seja aprovado sem alterações, deixando as eventuais mudanças para a próxima etapa, durante discussão na comissão especial. E é aí que mora o perigo. Os principais riscos estão relacionados ao tempo de negociação até a aprovação e o quanto do conteúdo será diluído durante esse período.
Para o investidor, quanto mais próximo for a proposta final aprovada no Congresso do texto original apresentado pela equipe econômica, chegando perto de uma economia fiscal de R$ 1 trilhão em dez anos, melhor. Ou seja, a expectativa já embutida nos preços dos ativos locais é de que o Legislativo irá aprovar uma reforma robusta, com a potência fiscal esperada pelo ministro Paulo Guedes (Economia).
Tudo vai depender, porém, do desempenho do Executivo nas negociações com o parlamentares, sem a prática costumeira do “toma-lá-dá-cá”. Por ora, percebe-se que a base de apoio é bem mais fraca do que se imaginava e a articulação política pode esbarrar na popularidade de Bolsonaro, que é a menor após três meses de governo desde 1985.
Novas ameaças
Já no exterior, as polêmicas envolvendo o presidente norte-americano, Donald Trump, que ameaçou impor novas tarifas contra a Europa, elevam o temor dos mercados internacionais em relação à desaceleração econômica global. Afinal, a possibilidade de sobretaxar produtos europeus pode provocar um revés nas negociações comerciais com a China.
Um dos principais receios dos chineses é justamente em relação à imprevisibilidade de Trump. Pequim alega riscos quanto ao descumprimento do acordo à revelia do temperamento do comandante da Casa Branca, ao mesmo tempo em que o presidente chinês, Xi Jinping, mostra-se resiliente.
Por mais que tais ameaças do governo Trump possam ser uma estratégia de Washington em busca de vantagens comerciais, não se trata de uma postura positiva para a economia global, que já vive um momento de fraqueza. A revisão para baixo nas estimativas do Fundo Monetário Internacional (FMI) ontem para o crescimento mundial já reflete esse movimento.
Diante disso, as principais bolsas da Ásia encerraram a sessão de forma mista, em meio ao aumento da tensão entre Estados Unidos e União Europeia (UE) e à redução do FMI para a economia global ao nível mais baixo desde a crise financeira de 2008. As perdas foram lideradas por Tóquio (-0,5%), ao passo que Hong Kong teve leve baixa e Xangai, leve alta.
Em Wall Street, os índices futuros das bolsas de Nova York ensaiam ganhos, tentando recuperar-se das perdas ontem, o que tenta embalar a abertura do pregão europeu. Nos demais mercados, o petróleo segue em alta, beneficiado pelas interrupções na oferta da commodity e também pela fraqueza do dólar, que mede forças em relação às moedas rivais.
Agora, os investidores aguardam pela forte agenda econômica desta quarta-feira, em busca de mais pistas sobre a saúde da economia global. Os eventos e indicadores previstos para o dia podem aumentar a ansiedade nos mercados com risco ou trazer calma aos negócios, em meio ao ambiente econômico-financeiro bastante complicado.
Inflação, BCE e Brexit em destaque
O calendário do dia está carregado no Brasil e no exterior. Entre os indicadores econômicos, o destaque fica com a inflação de março ao consumidor brasileiro (9h) e norte-americano (9h30). A estimativa para o IPCA é de aceleração, a 0,6% em relação a fevereiro, confirmando a recente pressão de alta nos preços no varejo.
Com isso, a taxa acumulada em 12 meses deve se afastar da meta perseguida pelo Banco Central (4,25%), indo a 4,4%. Tal comportamento tem reduzido o ímpeto das apostas quanto a novos cortes na taxa de juros (Selic) em breve. Já o CPI dos EUA deve manter o ritmo lento, com a ausência de pressão inflacionário mantendo o Federal Reserve paciente.
Também no calendário doméstico, antes do IPCA, sai a primeira prévia deste mês do IGP-M (8h) e, depois, é a vez dos números preliminares de abril sobre a entrada e saída de dólares no país (12h30). Já nos EUA, além do CPI, merece atenção a ata da reunião de março do Fed (15h), quando abandonou a previsão de aumento nos juros do país neste ano.
Entre os indicadores econômicos norte-americana, serão conhecidos também os estoques no atacado em fevereiro (11h), os estoques semanais de petróleo bruto e derivados (11h30) e o orçamento do Tesouro em fevereiro (15h). No fim do dia, a China divulga os índices de preços ao consumidor e ao produtor em março.
Na Europa, serão conhecidos vários indicadores de atividade no Reino Unido, mas o destaque fica com a reunião de emergência de líderes europeus sobre a saída dos britânicos da União Europeia. O encontro pode decidir se o Brexit acontecerá nesta sexta-feira ou se será adiado - para maio, junho ou, quiçá, em até um ano.
Já no bloco comum, o Banco Central Europeu (BCE) anuncia a decisão sobre a taxa de juros na zona do euro, às 8h45. Não se espera novidades em termos de política monetária, após novas medidas de estímulo anunciadas em março. Ainda assim, merece atenção a entrevista coletiva do presidente do BCE, Mario Draghi, às 9h30.