O Banco Central deve reduzir mais uma vez a taxa básica de juros (Selic) – hoje na mínima histórica de 4,25% – em mais uma medida para conter os impactos do coronavírus na economia. O Comitê de Política Monetária (Copom) anuncia a decisão nesta quarta-feira (18).
A expectativa de corte é consenso entre os agentes do mercado financeiro, que também esperam um BC mais atuante nos próximos meses. A divergência é apenas o tamanho da redução esperada.
O mercado intensificou as apostas em um corte na Selic após o Federal Reserve (Fed) reduzir os juros nos Estados Unidos no último domingo de maneira extraordinária, da faixa de 1% a 1,25% para a faixa de zero a 0,25% ao ano. A decisão do BC norte-americano foi uma reação aos efeitos do coronavírus na economia global.
A mesma preocupação deve guiar a autoridade monetária brasileira. Segundo o projeções Broadcast, do Grupo Estado, de 26 instituições, 16 estimam corte de 0,5 ponto porcentual na Selic, para 3,75% ao ano.
Para cinco casas, o corte será de 1 ponto porcentual e duas casas apostam em 0,75 pp. Três instituições projetam uma diminuição de apenas 0,25 pp e nenhuma casa espera manutenção da Selic nos atuais 4,25%.
O ciclo de cortes da Selic começou em julho de 2019 — até então a taxa estava em 6,5%. Nas reuniões seguintes, o Copom reduziu a taxa até chegar a 4,25% em fevereiro deste ano.
À época, o BC sinalizou que a sequência de diminuições havia chegado ao fim. Mas, no início deste mês, a autarquia voltou a indicar que uma nova redução era possível, após o Fed fazer o primeiro corte fora da agenda no ano.

Ao atualizar a projeção para uma Selic de 3,25% ao ano, como a maioria das instituições, o banco suíço UBS argumentou que a perspectiva econômica piorou desde a semana passada.
Países em todo mundo anunciaram medidas de distanciamento social e a China divulgou os primeiros números da economia já impactada pelo coronavírus.
O sócio-fundador da gestora Perservera, Guilherme Abbud, diz que a redução da Selic deveria ser ainda mais drástica. A projeção é de uma redução de 1,5 ponto percentual – ou seja, para o especialista a Selic deveria cair a 2,75% hoje.
“Não dá para se contentar com o que o mercado já precificou. O BC tem que tomar a dianteira do processo e pautar o mercado, não o contrário.” – Guilherme Abbud, Persevera Asset Management
Para o gestor, o mercado não deve ter uma reação imediata pessimista com um corte grande de juros, como aconteceu nos EUA. “No caso do Fed, a impressão que se passou foi de havia um problema maior no crédito do que o mercado enxerga hoje.”
Além dos juros
Abbud diz que o BC tem que comunicar que não existe pressão inflacionária e que as taxas vão ficar baixas por muito tempo. “Se disser que tem medo do hiato e da inflação, não vai adiantar nada. Tem que comunicar que a Selic baixa não é temporária.”
Para ele, o melhor sinal seria a redução drástica. “Não adianta ter Selic a 4% e curva a 8%”, afirmou, em referência às apostas do mercado refletidas nos juros futuros, que registraram forte alta nas últimas semanas.
Defesa das reformas
Ex-diretor do BC e chefe do Centro de Estudos Monetários do FGV IBRE, José Júlio Senna, diz que é preciso também uma atuação do governo federal na frente fiscal para evitar um avanço na curva mais longa de juros.
“Precisamos das reformas para o Brasil sair da mediocridade de crescimento, o que torna o país vulnerável em situações como a do coronavírus” – José Júlio Senna, ex-diretor do BC
Para Rafael Panonko, chefe de análises da Toro Investimentos, o governo parece estar esperando o desenrolar dos acontecimentos para ter uma atuação mais firme. “Tem que fazer algo para o mercado acalmar os ânimos. Vejo que falta muita comunicação.”
Desde o início do ano, o Ibovespa já derreteu 35% diante do pânico provocado pela pandemia do coronavírus.
Panonko diz que a Selic mais baixa em tese serve para tracionar a economia, mas ele afirma que percebe “muitos players” olhando com pessimismo para o cenário político e econômico, vendo que as reformas vão ser jogadas para o ano que vem. A Toro também prevê um corte de 0,5 ponto porcentual nesta quarta.
O sócio da Persevera concorda que mexer nos juros seria só um primeiro passo. Para ele, o BC tem que cada vez mais intervir no mercado cambial, irrigar o sistema financeiro e promover a queda de compulsório. O gestor avalia que as medidas anunciadas pelo BC na segunda-feira (16) estão na direção correta, como um primeiro passo.
Na segunda, a autoridade monetária comunicou que vai facilitar a renegociação de dívidas de empresas e pessoas físicas, além flexibilizar os requerimentos de capital dos bancos. As medidas devem dar margem para os bancos continuarem fornecendo crédito. Na terça-feira, o governo lançou um pacote de estímulos que pode chegar a R$ 147,3 bilhões.
Em meio aos primeiros sinais do governo para combater a crise do coronavírus, o mercado já espera que o crescimento econômico do Brasil em 2020 na casa de 1%, ou menos. Ontem, o Credit Suisse cortou a projeção do PIB para zero neste ano.