Na carta de gestão de outubro, a gestora JGP, que tem entre os sócios André Jakurski, nos conta que segue com posição comprada em bolsa de valores diante de um cenário global com alguma diminuição no risco e uma expectativa de aceleração do crescimento no Brasil.
Segundo a gestora, o tom positivo dos mercados no mês passado ocorreu devido ao diálogo em torno de um acordo parcial na guerra comercial entre EUA e China. “O mercado entendeu que houve um forte aumento na probabilidade de que uma primeira fase do acordo seja assinada em meados de novembro e a expectativa é que os aumentos de tarifa programados para dezembro sejam adiados.”
Para a JGP, é justamente o desdobramento das negociações comerciais entre EUA e China, suas consequências práticas para as decisões de investimento, impacto na confiança, e os próximos dados econômicos que deverão ser monitorados com atenção para avaliar qual das duas narrativas sobre a possibilidade ou não de uma desaceleração mais acentuada da economia global predominará.
Guerra de Narrativas
Em sua carta macroeconômica, a JGP nos explica que na "guerra das narrativas", a tese de que a manufatura e o comércio global estão próximos ao fundo do poço e prestes a se recuperar, antes de ter impacto no setor de serviços, emprego e renda, está ganhando espaço e os ativos de risco globais estão novamente embarcando nesta narrativa.
No entanto, como a situação permanece fluida e a incerteza elevada, a narrativa de que a economia global ruma para uma desaceleração mais forte não pode ainda ser refutada.
Antes de apresentar essa ponderação, a JGP faz uma avaliação de outros "miniciclos" de queda na atividade industrial global.
No total, são três desde a crise de 2007/2008. O primeiro, em 2012, esteve associado à crise na zona do euro. O segundo, em 2015-2016, associado à desaceleração do crescimento na China e colapso do preço do petróleo no mercado global.
Este terceiro ciclo, iniciado em 2018, não é relacionado a nenhum fator específico, mas sim a uma combinação de efeitos pontuais. Entre eles, problemas que afetaram a indústria automotiva (fraudes nos softwares de controle de poluentes, atraso em cumprir as metas de emissões), ciclo de estoques, protestos na França, situação do Brexit, seca na Alemanha, interrupção de atividades do governo nos EUA (‘shutdown’), e, talvez o mais importante, aumento do protecionismo e acirramento da guerra comercial entre EUA e China.
Segundo a JGP, os principais bancos centrais reagiram à desaceleração da economia global neste terceiro "miniciclo". O BC da China vem atuando desde o ano passado, o Banco Central Europeu (BCE) voltou a comprar ativos (quantitative easing) e o Federal Reserve (Fed), banco central americano, já reduziu a taxa básica em 0,75 ponto percentual e ampliou a liquidez no mercado interbancário.
De acordo com a gestora, uma característica comum aos ‘miniciclos’ de 2012 e 2016 foi a resiliência do setor de serviços à desaceleração da manufatura e do comércio global.
No entanto, como o ciclo atual de desaceleração na manufatura global está sendo mais duradouro, apesar da resposta de política monetária (que talvez esteja perdendo a potência), cresceu a preocupação de que o ciclo de queda pudesse ser transmitido ao setor de serviços via queda de emprego, renda, e perda de confiança.
Com isso, explica a JGP em meados do ano, ganhou força a narrativa que a economia global estava rumando para uma desaceleração mais forte ou eventualmente uma recessão. Algo que preocupava o próprio Jakurski.
O contraponto
Os dados ainda resilientes de serviços (emprego e consumo), bem como alguns sinais de melhora nos PMIs, conversas sobre possível expansão fiscal, e, principalmente, a expectativa de um acordo comercial (fase 1) que possa estabelecer uma trégua no conflito entre EUA e China deram força a uma narrativa alternativa em que a economia global está prestes a se recuperar.
Assim, o "miniciclo" atual será uma repetição dos anteriores, quando as respostas de política foram suficientes para reverter o quadro de desaceleração da indústria e comércio global antes de gerar impactos mais fortes em emprego e renda de uma forma mais ampla.