Está marcada para amanhã a segunda Super Quarta de 2023 — e a data tem tudo para ser uma das mais agitadas dos últimos tempos. Com o agravamento da crise bancária internacional e as dificuldades financeiras de várias empresas por aqui, a pergunta que pauta o debate econômico hoje é: quando a taxa básica de juros (Selic) vai cair?
O Banco Central comandado por Roberto Campos Neto decide o futuro da Selic amanhã após o fechamento do mercado, algumas horas depois de os colegas do Federal Reserve anunciarem as taxas de juros nos Estados Unidos. Mas tudo indica que as decisões irão por caminhos bem diferentes..
Em questão de dias, os Estados Unidos saíram de um debate sobre a inflação persistente para o risco de uma nova crise bancária — com duas falências de bancos médios e outras instituições financeiras buscando socorro nos braços do Federal Reserve e de uma “vaquinha” de seus concorrentes para evitar que o problema se alastre. Na Suíça, nem mesmo o tradicional Credit Suisse saiu ileso — sendo adquirido pelo UBS como forma de socorro.
Apesar de dados da atividade econômica seguirem mostrando que há espaço para o Fed continuar o seu plano de aperto monetário, a situação delicada do sistema financeiro ressuscita os traumas deixados pela crise de 2008 — quando a quebra do Lehman Brothers jogou a economia global no fundo do poço.
Ou seja: para os investidores, uma eventual crise no horizonte obrigaria o Fed a mudar a direção — ao invés de subir os juros, a única saída seria voltar a cortar a taxa básica, em uma tentativa de estimular a economia e preservar a liquidez do sistema financeiro.
É fácil perceber a mudança do humor ao observar a curva do retorno dos títulos do Tesouro americano (Treasuries). Há duas semanas, a perspectiva era de um novo aumento de 0,25 ponto percentual ou superior, mas hoje, a curva precifica um corte nos juros e taxas significativamente mais baixas do que os observados antes do início da quebradeira dos bancos americanos.
Você pode acompanhar a evolução das apostas do mercado no gráfico abaixo.
Copom: seguindo uma trilha diferente
O natural é que, por tabela, a curva de juros brasileira também precifique o mesmo movimento visto nos Estados Unidos — mas não é isso que vemos acontecer no momento.
Os juros futuros até cederam um pouco nos últimos dias, aproveitando os ventos vindos de Nova York, mas quando comparamos com os primos americanos dos contratos de Depósito Interfinanceiro (DI), o movimento foi muito mais limitado.
E se nos EUA os investidores já enxergam um corte em breve, a curva brasileira segue vendo espaço para uma queda nos juros apenas no segundo semestre — na reunião de agosto, para algo na faixa de 13,50% ao ano, levando a Selic a fechar 2023 ainda na casa dos 13%.
As opções de Copom negociadas na B3 também tiveram pouca alteração, mesmo com a inversão da curva americana. As apostas de manutenção da Selic estavam em 95,5%, contra apenas 4,5% que veem espaço para o BC baixar os juros em 0,25 ponto percentual já nesta quarta-feira.
De modo geral, a curva de juros futuros aponta uma trajetória mais conservadora para a Selic do que as projeções coletadas e compiladas pelo Banco Central no boletim Focus, de divulgação semanal. A expectativa dos analistas no levantamento é a de que a taxa básica de juros chegue ao fim do ano em 12,75% a.a.
A conta mais conservadora dos investidores locais tem uma razão de ser — por aqui, o novo arcabouço fiscal ainda não foi apresentado, e os últimos dois meses foram de trocas de farpas intensas entre o governo federal e Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central, em uma ofensiva contra o patamar atual dos juros.
O Executivo acusa o BC de estrangular o crescimento do Brasil, enquanto a autarquia monetária defende a sua postura para combater a desancoragem das expectativas de inflação.
Com a escalada das tensões entre Lula e RCN, a taxa terminal para 2023 subiu nas projeções do mercado, mas é normal que o BC leve semanas até que a estimativa do mercado para a Selic no boletim reflita o cenário mostrado na curva de juros.
Isso porque os contratos de DI são um termômetro muito mais imediato do pensamento do mercado já que, ao contrário do que acontece com estimativas do Focus, estamos falando de investimentos que , naturalmente, envolvem dinheiro.
Os investidores, assim, acabam exigindo um prêmio de risco para acomodar uma eventual piora no cenário doméstico — com o arcabouço fiscal ainda incerto e apenas uma trégua parcial entre governo federal e BC.