Começa hoje a preparação para o que virá a ser a tão aguardada Super Quarta dos bancos centrais, que conta com a conclusão das reuniões de política monetária no Brasil e nos EUA.
Chegamos aqui de uma maneira muito diferente de como estávamos pensando que chegaríamos há algumas semanas, com uma mudança radical dos contextos local e internacional, o que provoca alterações relevantes na balança de riscos.
O mundo passa por um momento paradigmático, ainda digerindo a ressaca pós-pandemia (aquele inferno acabou, mas ainda sofremos as sequelas de todo o processo).
Passamos por um movimento de aperto monetário relevante em quase todos os países, o que tem como consequência uma provável recessão econômica nos próximos meses.
Não há como fugir, faz parte do livro-texto de economia (nem todos foram superados como algumas autoridades comentam equivocadamente).
Super Quarta sob estresse
No âmbito internacional, vivemos um estresse bancário como há muito tempo não se via.
Conforme comentamos na semana passada, a quebra de bancos regionais nos EUA provocou um sentimento muito financeiro nos mercados, com lembranças da crise de 2008.
Não vejo um cenário propício para caminharmos na mesma direção da Grande Crise Financeira, mas isso não significa que as coisas serão fáceis.
Pelo contrário. Teremos uma recessão nos países centrais, sem dúvida. Resta saber sua profundidade e duração.
Para isso, já devemos ter algum direcionamento do Federal Reserve sobre para onde ele quer levar a economia americana.
O Comitê Federal de Mercado Aberto (Fomc, na sigla em inglês) começa hoje e deverá apresentar amanhã, em sua conclusão, sua decisão de elevar os juros em 25 pontos-base (mais de 80% de chance implícita à negociação de futuros). Destaque para o comunicado.
As chances de uma alta de 50 pontos agora estão efetivamente fora de questão, depois de ser uma aposta favorita apenas algumas semanas atrás.

Um aperto monetário próximo do fim
Jerome Powell, o presidente do Fed, errou ao colocar na mesa a possibilidade de voltar a acelerar o aperto monetário.
Agora, as opiniões estão divididas sobre as táticas que o banco central deve adotar diante dos eventos recentes — a coletiva de imprensa de 30 minutos será amplamente comentada no mercado amanhã.
As opiniões estão divididas sobre as táticas que o banco central deve adotar diante dos eventos recentes, com parte do mercado esperando que o Fed mantenha inalterada a taxa.
Não tenho esse como meu cenário principal. Vejo como mais provável uma elevação marginal de 25 pontos mesmo.
Contudo, é bem possível que, depois da alta desta semana, o Fed avalie finalizar o processo de aperto monetário, mesmo que a inflação continue em patamares elevados, muito por conta dos eventos recentes com os bancos nos EUA e na Europa.
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Atenção com os bancos regionais dos EUA
Devo dizer, inclusive, que estou mais preocupado com os bancos regionais americanos, que representam cerca de 40% de todo o crédito nos EUA e ainda estão bastante estressados.
Atenção especial para o First Republic Bank, cuja ação caiu mais de 90% desde o começo de fevereiro.
Talvez o esforço coletivo dos grandes bancos não seja o suficiente para salvar a instituição, provocando mais uma quebra.
Se parar por aí, mesmo que negativo, ainda não é vetor sistêmico. Mas as coisas podem piorar rápido, por isso uma antecipação do fim do aperto monetário é provável.
Em outras palavras, devemos observar uma decisão hawkish e um tom mais dovish.
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Situação não é trivial no Brasil
Olhando para o Brasil, a situação também não é das mais triviais. O governo voltou a atrapalhar o próprio país.
Já era para termos em mãos o novo arcabouço fiscal antes do Comitê de Política Monetária (Copom) começar. Não foi o caso.
Aliás, ao que tudo indica, novos problemas nasceram entre a ala política e a econômica na reunião de sexta-feira no Palácio do Planalto, quando Haddad teria apresentado a nova regra fiscal ao Lula — há pressão para mais flexibilidade na regra, sugerindo mais gasto.
Isso é péssimo.
A Argentina é logo ali
Sabemos que o quadro fiscal é o calcanhar de Aquiles do país, não parecendo haver interesse de algumas alas estridentes do governo em resolver o problema. Querem mais gastos, sem compromisso, e menos juros.
Precisa explicar que não é assim que funciona e, caso optem por trilhar esse caminho, a Argentina é logo aí, perseguindo com obstinação os erros que acabaram com o governo Dilma.
Sem um arcabouço definido (ao menos formalmente divulgado), o BC tem menos argumentos para flexibilizar a política monetária, apertando ainda mais as condições financeiras brasileiras e piorando o cenário econômico local.
A indefinição de um substituto do teto deve pressionar a curva de juros para cima, sangrando ativos brasileiros. E vale destacar que a percepção tinha melhorado recentemente. A curva de juros hoje é pior que há seis meses, mas melhor que há 1 mês.

Lula erra ao caminhar pelo mesmo caminho de Dilma, ouvindo demais algumas personalidades do PT, como Gleisi Hoffmann, completamente desligada da realidade.
Todo cuidado é pouco
Haverá mais conversas hoje sobre o tema, principalmente depois que a Fazenda foi aos presidentes das casas legislativas pedindo apoio das lideranças contra os ataques do PT, enquanto aguardamos o encontro da Junta de Execução Orçamentária hoje — sim, a Fazenda, comandada por uma petista (o mais tucano dos petistas, mas ainda assim), quer se defender do próprio PT. Esquizofrenia coletiva severa.
Sim, a falta da formalização do novo arcabouço reduz a chance de uma sinalização de queda em breve, mas ainda acredito que, como o balanço de riscos mudou muito, com crise bancária no exterior e de crédito no Brasil, em especial depois do caso Americanas, o BC deverá manter amanhã, na Super Quarta, a taxa de juros inalterada, e sinalizar para uma possível queda em maio, dando início à flexibilização.
Seria o melhor cenário? Com certeza não, mas é o que temos para hoje.
Não pode martelar o juro para baixo já agora, uma vez que um dos pilares mais importantes, o fiscal, ainda está em aberto, mas não pode ser muito duro, porque compraria briga política grande e corre o risco de piorar muito as condições de crédito do país. É uma situação muito delicada e pouco trivial. Todo cuidado agora é pouco.