Guerra na Ucrânia fecha a janela para os IPOs na bolsa brasileira. Será um ano perdido para o mercado?
Tensões no leste europeu elevam projeções de inflação e juros, tornando o ambiente impróprio para aberturas de capital na bolsa (IPOs).
As ofertas iniciais de ações na bolsa (IPO, na sigla em inglês) vivem das chamadas janelas de oportunidade. Devido à alta de juros e à disparada da inflação no radar, já havia uma expectativa mais tímida para esse mercado neste ano. Mas se ainda havia uma fresta nessa janela, ela agora deve se fechar por completo com a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Com menos interessados em ações, muitas empresas desistiram de se listar na B3. De janeiro para cá, simplesmente nenhuma companhia abriu capital e outras 15 abandonaram os planos.
As tensões estão tão elevadas, que o que se esperava que fosse o principal gerador de incerteza no Brasil em 2022 — as eleições presidenciais — foi para o final da fila de preocupações. Então será que teremos um ano perdido para o mercado de capitais brasileiro?
A fim de tentar entender como fica o cenário para IPOs no Brasil neste ano, conversei com fontes tanto da ponta vendedora quanto da ponta compradora do mercado de ações. Um sinal de que o mar não está para o peixe dos IPOs é que nenhum dos bancos de investimento procurados quis participar da reportagem.
Mas antes de irmos para o cenário atual e contar as perspectivas para os IPOs, quero repassar o que vinha acontecendo na nossa economia e o que fez a janela se fechar.
Um olhar no retrovisor
A taxa básica de juros, a Selic, estava em trajetória de queda desde outubro de 2016, quando o Banco Central fez um corte de 0,25 ponto porcentual, para 14% ao ano. Até então, o BC afirmava que o cenário para a inflação se mostrava mais favorável do que o esperado (saudades).
Leia Também
A Selic manteve a tendência de queda até maio de 2018, quando estacionou em 6,5%. Assim, os juros só voltaram a cair em setembro de 2019 e atingiram o menor patamar da história, de 2%, em 2020. Os juros tão baixos tinham a intenção de aquecer a economia enquanto o Brasil sofria as primeiras consequências da pandemia.
Mas o que tem a ver a Selic com IPO? Bem, com os juros em patamares tão reduzidos, os investidores passaram a buscar alternativas na bolsa para fazer o dinheiro render. Prova disso é que a B3 terminou 2021 com a marca histórica de 4,2 milhões de pessoas investindo na bolsa, sendo que 41% desse total entrou apenas no ano passado.
Nesse meio tempo, com o mercado de capitais pujante, empresas que precisavam captar recursos olharam para a bolsa com bons olhos: só no ano passado, 46 companhias estrearam na B3. O número ficou atrás apenas de 2007, quando 64 empresas realizaram seu IPO na bolsa brasileira.
Faltou ar
No entanto, uma desaceleração dos IPOs no segundo semestre de 2021 sinalizou que algo estava mudando no ambiente macroeconômico. E isso começou em março passado, quando o BC subiu os juros para 2,75%, dizendo que era um “processo de normalização parcial”.
Um ano depois, chegamos a esta Super Quarta com uma inflação disseminada de 10,54% em 12 meses (no caso do IPCA) ao mesmo tempo que o mercado estima a Selic a 12,75% no final de 2022.
Assim, com a renda fixa pagando dois dígitos, a relação risco-retorno tende a desfavorecer os investimentos em bolsa e a troca de um pelo outro já é observada nos fundos de investimento.
De acordo com dados da Anbima, os fundos multimercados e de ações — principais compradores dos papéis das novatas que estrearam na B3 nos últimos anos — completaram seis meses de resgates líquidos em fevereiro.
Ao mesmo tempo, os fundos de renda fixa, que não investem em ações, estão com captação positiva. Nos primeiros dois meses de 2022, essa classe de fundos soma R$ 64 bilhões em captação líquida, enquanto os de ações e multimercados observam retiradas de R$ 21 bilhões e R$ 38 bilhões, respectivamente.
E todo esse movimento aconteceu sem que soubéssemos que uma guerra — no sentido mais literal da palavra — estava por vir.
Guerra adicionou instabilidade
“O elemento guerra traz enorme instabilidade, ao passo que não se sabe até onde ela vai”, afirma Roberto Quiroga, sócio diretor do escritório de advocacia Mattos Filho, um dos principais escritórios que prestam assessoria a empresas em IPOs no Brasil.
“O que já se prevê é um aumento maior da inflação do que o antecipado, e, por consequência, maior aumento de juros. O reflexo para as empresas é a dificuldade de captação de recursos.”
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADECONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADERoberto Quiroga, sócio diretor do Mattos Filho
No entanto, Quiroga afirma que, no estágio atual da guerra, o impacto sobre a captação de recursos ainda não chegou. “Nesse momento, temos uma visão de estabilidade. Se a guerra tiver uma solução rápida, a situação melhora substancialmente. Se não tiver, o panorama vai piorar no decorrer do ano”, analisou.
Quem pode fazer IPO?
Para Alan Riddell, sócio da empresa de auditoria e consultoria KPMG, apesar de o cenário difícil, o mercado de capitais deve continuar aberto para companhias que tenham bons modelos de negócio.
Ele se refere especificamente às empresas ligadas a tecnologia, conectadas com o mundo ESG (sigla em inglês para boas práticas ambientais, sociais e de governança), bem como o setor de infraestrutura, que, por ter uma visão de prazo mais longo, consegue aguentar ciclos econômicos.
“O mercado está aguardando para entender os riscos para poder precificá-los e avançar. Tem muita empresa de valor que vai poder sim fazer IPO”, diz Riddell.
No final do ano passado, o Seu Dinheiro publicou uma entrevista com o global head do Itaú BBA, Roderick Greenlees, que previa um número de IPOs em torno de 10 a 20 transações em 2022. Mas essa previsão era de quando não havia uma guerra acontecendo.
Na ponta compradora, Luis Felipe Amaral, sócio-fundador da gestora de fundos Equitas Investimentos, avalia que o setor agro igualmente teria forças para seguir com possíveis ofertas públicas iniciais. “Ele está menos correlacionado a esse ciclo de taxa de juros local e se beneficia do aumento das commodities.”
Não estamos vendo, no entanto, empresas do agro na fila para IPO, como mostra a tabela abaixo, feita com base nos dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM):
IPOs EM ANÁLISE
| EMISSORA | ENTRADA |
| ALPHAVILLE S.A. | 14/08/2020 |
| INVEST TECH PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S.A. | 17/05/2021 |
| CSN CIMENTOS S.A. | 17/05/2021 |
| TROCAFONE S.A. | 02/06/2021 |
| VIX LOGÍSTICA S.A. | 27/07/2021 |
| ALTHAIA S.A. INDÚSTRIA FARMACÊUTICA | 30/07/2021 |
| BMRV PARTICIPAÇÕES S.A. | 01/09/2021 |
| JFL HOLDING S.A. | 02/09/2021 |
| DATORA PARTICIPAÇÕES E SERVIÇOS S/A | 03/09/2021 |
| CAPTALYS COMPANHIA DE CRÉDITO | 10/09/2021 |
| INTERPLAYERS SOLUÇÕES INTEGRADAS SA | 17/09/2021 |
| SBPAR PARTICIPAÇÕES S.A. | 18/10/2021 |
| CIA RIOGRANDENSE DE SANEAMENTO | 09/12/2021 |
| TECIDOS E ARMARINHOS MIGUEL BARTOLOMEU S.A. | 10/12/2021 |
| SELF IT ACADEMIAS HOLDING S.A. | 13/12/2021 |
| SENIOR SISTEMAS S.A. | 01/02/2022 |
| QESTRA TECNOLOGIA ADMINISTRAÇÃO E PARTICIPAÇÕES | 02/03/2022 |
Poder não é querer
Ainda que os entrevistados julguem que algumas empresas podem sim se capitalizar por meio da bolsa, isso não significa que elas o farão. Por isso, quem puder adiar o IPO, vai adiar, segundo Quiroga. “Não vão se arriscar a entrar num mercado muito tumultuado”, disse.
Amaral, da Equitas, avalia que enquanto não tivermos um ambiente de queda de inflação, será difícil ver novamente a exuberância das aberturas de capital da primeira metade de 2021. No ano passado, a Equitas colocou na carteira algumas das empresas que fizeram IPOs, como Matter Dei, 3Tentos e Eletromídia.
Neste ano, até meados de março, nenhuma empresa abriu capital na B3 e, ao mesmo tempo, 15 que estavam na fila desistiram, como a rede de restaurantes Madero e as academias Blue Fit. Confira a lista de desistentes até o momento:
IPOs INDEFERIDOS/DESISTÊNCIAS
FEVEREIRO/2022
| EMPRESA | DATA | MOTIVO |
| CERRADINHO BIOENERGIA S.A. | 03/02 | Desistência |
JANEIRO/2022
| EMPRESA | DATA | MOTIVO |
| MONTE RODOVIAS S.A. | 06/01 | Desistência |
| AMMO VAREJO S.A. | 06/01 | Desistência |
| BLUEFIT ACAD DE GINÁSTICA E PART S.A. | 27/01 | Indeferida |
| MADERO INDÚSTRIA E COMÉRCIO S.A. | 24/01 | Desistência |
| DORI ALIMENTOS S.A. | 06/01 | Desistência |
| ENVIRONMENTAL ESG PART S.A. | 06/01 | Desistência |
| VERO S.A. | 10/01 | Desistência |
| ISH TECH S.A. | 24/01 | Desistência |
| COTY BRASIL COMÉRCIO S.A. | 17/01 | Desistência |
| CLARANET TECHNOLOGY S.A. | 13/01 | Desistência |
| FULWOOD S.A. | 18/01 | Desistência |
| CENCOSUD BRASIL COMERCIAL S.A. | 14/01 | Desistência |
| HOLDING VERZANI & SANDRINI S.A. | 28/01 | Desistência |
| CANTU STORE S.A. | 18/01 | Desistência |
Janela de oportunidade para IPOs
Diante de tanta incerteza e um cenário macro nada favorável, a janela de oportunidades para os IPOs pode eventualmente se abrir em 2022? Para os especialistas, a resposta é “sim”, e essa abertura pode acontecer em breve.
A principal janela de oportunidade para os IPOs em 2022 pode ser agora no segundo trimestre do ano, segundo o sócio da KPMG. Mas a partir de julho, dois fatores devem dificultar as ofertas de ações: o verão no hemisfério norte, que reduz consideravelmente o volume de negócios nas bolsas, e as eleições no Brasil.
“Pode ser que abra uma outra janela nos últimos dois meses do ano, quando tivermos os resultados das eleições”, disse Riddell. No entanto, ele ressalta que caso haja uma reviravolta rápida na Ucrânia, o mercado pode voltar com força. “Mas não é o cenário base que a gente trabalha hoje”, explicou.
De acordo com Riddell, a Eurasia Group, que faz análises políticas para a KPMG, vê como cenário futuro mais provável para o conflito na Ucrânia que a Rússia derrube o governo de Volodymyr Zelensky e assuma o poder. E, nesse sentido, desencadearia uma longa guerra civil no país.
“Talvez haja uma solução rápida, mas o cenário base é de uma solução longa e traumática”, disse Riddell.
E para o investidor?
O investimento em IPOs não costuma se revelar muito vantajoso para o investidor. A maioria das ações das novatas acaba registrando queda em relação ao preço da estreia, e não tem sido diferente com a safra mais recente da B3 nesse sentido.
Em outras palavras, investir na ação de uma empresa no IPO é mais arriscado do que em companhias que já estão listadas no mercado. Por outro lado, em um cenário em que o capital está mais caro e escasso, boas oportunidades podem surgir. Isso, claro, quando e se a janela para as ofertas voltar a se abrir.
Ouro cai mais de 5% com correção de preço e tem maior tombo em 12 anos — Citi zera posição no metal precioso
É a pior queda diária desde 2013, em um movimento influenciado pelo dólar mais forte e perspectiva de inflação menor nos EUA
Por que o mercado ficou tão feliz com a prévia da Vamos (VAMO3) — ação chegou a subir 10%
Após divulgar resultados operacionais fortes e reforçar o guidance para 2025, os papéis disparam na B3 com investidores embalados pelo ritmo de crescimento da locadora de caminhões e máquinas
Brava Energia (BRAV3) enxuga diretoria em meio a reestruturação interna e ações têm a maior queda do Ibovespa
Companhia simplifica estrutura, une áreas estratégicas e passa por mudanças no alto escalão enquanto lida com interdição da ANP
Inspirada pela corrida pelo ouro, B3 lança Índice Futuro de Ouro (IFGOLD B3), 12° novo indicador do ano
Novo indicador reflete a crescente demanda pelo ouro, com cálculos diários baseados no valor de fechamento do contrato futuro negociado na B3
FII RCRB11 zera vacância do portfólio — e cotistas vão sair ganhando com isso
O contrato foi feito no modelo plug-and-play, em que o imóvel é entregue pronto para uso imediato
Recorde de vendas e retorno ao Minha Casa Minha Vida: é hora de comprar Eztec (EZTC3)? Os destaques da prévia do 3T25
BTG destaca solidez nos números e vê potencial de valorização nas ações, negociadas a 0,7 vez o valor patrimonial, após a Eztec registrar o maior volume de vendas brutas da sua história e retomar lançamentos voltados ao Minha Casa Minha Vida
Usiminas (USIM5) lidera os ganhos do Ibovespa e GPA (PCAR3) é a ação com pior desempenho; veja as maiores altas e quedas da semana
Bolsa se recuperou e retornou aos 143 mil pontos com melhora da expectativa para negociações entre Brasil e EUA
Como o IFIX sobe 15% no ano e captações de fundos imobiliários continuam fortes mesmo com os juros altos
Captações totalizam R$ 31,5 bilhões até o fim de setembro, 71% do valor captado em 2024 e mais do que em 2023 inteiro; gestores usam estratégias para ampliar portfólio de fundos
De operário a milionário: Vencedor da Copa BTG Trader operava “virado”
Agora milionário, trader operava sem dormir, após chegar do turno da madrugada em seu trabalho em uma fábrica
Apesar de queda com alívio nas tensões entre EUA e China, ouro tem maior sequência de ganhos semanais desde 2008
O ouro, considerado um dos ativos mais seguros do mundo, acumulou valorização de 5,32% na semana, com maior sequência de ganhos semanais desde setembro de 2008.
Roberto Sallouti, CEO do BTG, gosta do fundamento, mas não ignora análise técnica: “o mercado te deixa humilde”
No evento Copa BTG Trader, o CEO do BTG Pactual relembrou o início da carreira como operador, defendeu a combinação entre fundamentos e análise técnica e alertou para um período prolongado de volatilidade nos mercados
Há razão para pânico com os bancos nos EUA? Saiba se o país está diante de uma crise de crédito e o que fazer com o seu dinheiro
Mesmo com alertas de bancos regionais dos EUA sobre o aumento do risco de inadimplência de suas carteiras de crédito, o risco não parece ser sistêmico, apontam especialistas
Citi vê mais instabilidade nos mercados com eleições de 2026 e tarifas e reduz risco em carteira de ações brasileiras
Futuro do Brasil está mais incerto e analistas do Citi decidiram reduzir o risco em sua carteira recomendada de ações MVP para o Brasil
Kafka em Wall Street: Por que você deveria se preocupar com uma potencial crise nos bancos dos EUA
O temor de uma infestação no setor financeiro e no mercado de crédito norte-americano faz pressão sobre as bolsas hoje
B3 se prepara para entrada de pequenas e médias empresas na Bolsa em 2026 — via ações ou renda fixa
Regime Fácil prevê simplificação de processos e diminuição de custos para que companhias de menor porte abram capital e melhorem governança
Carteira ESG: BTG passa a recomendar Copel (CPLE6) e Eletrobras (ELET3) por causa de alta no preço de energia; veja as outras escolhas do banco
Confira as dez escolhas do banco para outubro que atendem aos critérios ambientais, sociais e de governança corporativa
Bolsa em alta: oportunidade ou voo de galinha? O que você precisa saber sobre o Ibovespa e as ações brasileiras
André Lion, sócio e CIO da Ibiuna, fala sobre as perspectivas para a Bolsa, os riscos de 2026 e o impacto das eleições presidenciais no mercado
A estratégia deste novo fundo de previdência global é investir somente em ETFs — entenda como funciona o novo ativo da Investo
O produto combina gestão passiva, exposição internacional e benefícios tributários da previdência em uma carteira voltada para o longo prazo
De fundo imobiliário em crise a ‘Pacman dos FIIs’: CEO da Zagros revela estratégia do GGRC11 — e o que os investidores podem esperar daqui para frente
Prestes a se unir à lista de gigantes do mercado imobiliário, o GGRC11 aposta na compra de ativos com pagamento em cotas. Porém, o executivo alerta: a estratégia não é para qualquer um
Dólar fraco, ouro forte e bolsas em queda: combo China, EUA e Powell ditam o ritmo — Ibovespa cai junto com S&P 500 e Nasdaq
A expectativa por novos cortes de juros nos EUA e novos desdobramentos da tensão comercial entre as duas maiores economias do mundo mexeram com os negócios aqui e lá fora nesta terça-feira (14)
