Lembrança da bolha tech ou necessidade do combo “stay at home”?
Por que as ações decidiram ignorar aquilo que, em essência, lhes é o mais importante, ou seja, os resultados corporativos e os lucros das empresas?
“Vivemos, de modo incorrigível, distraídos das coisas mais importantes.” Com sua incorrigível precisão, esse é Guimarães Rosa. La Rochefoucauld tem a sua própria versão para ideia semelhante: “Nem o Sol nem a morte podem ser olhados fixamente”. E Keynes tinha sua própria mania de ligar questões cotidianas e filosóficas aos investimentos. Segundo ele, ao se deparar com uma eventual perda de dinheiro, o empresário a afasta da mente, “assim como um homem são põe de lado a expectativa de morte”. Meu Deus, será que isso faz de mim um keynesiano? A esta altura, era só o que me faltava…
Blindar o ambiente psíquico do pensamento sobre a morte é sinônimo de saúde mental. Numa hierarquização curiosa de prioridades e sob um grande paradoxo, vivemos sobre o mais profundo escapismo, fugindo da ideia mais elementar e irrefutável da vida, que é a morte.
Como resume Eduardo Giannetti, “a lembrança da morte — não como conceito intelectual, mas como um sentimento agudo de nossa inexorável extinção pessoal — não é uma experiência aprazível para quem se apega e dá valor à vida entre os vivos”. Ele mesmo completa: “A consciência antecipada da finitude e a convivência com a morte dos que nos são queridos sempre trouxeram sofrimento e ansiedade ao ser humano. O que distingue a nossa época, entretanto, é a quase metódica e sistemática recusa em encarar e atribuir a devida atenção a essa realidade e lidar com suas implicações. (…) O fato espantoso é que, apesar de toda a pretensa valorização da razão fria e de uma postura de completa objetividade diante das coisas, o ideal moderno é viver sob o mais metódico e fantasioso escapismo. É viver como se a morte não nos dissesse respeito”.
Por que ignoramos coisas importantes? Talvez, neste caso, “A Coisa” mais importante?
Relatório desta semana do Bank of America Merrill Lynch trouxe análise bastante interessante. Até o momento de sua publicação, 37% das empresas do índice S&P 500 haviam divulgado seus resultados trimestrais. No geral, os números seguiram surpreendendo positivamente, com uma superação das estimativas de consenso para os lucros da ordem de 18%, sob a liderança do setor financeiro. Até aqui, 69% das companhias bateram as estimativas para receita e lucro líquido, representando a maior proporção de surpresas positivas desde o terceiro trimestre de 2011. Olhando somente para o lucro líquido, a superação das projeções monta a 80%; para a receita líquida, o percentual é de 81%.
O curioso dessa história é que esse desempenho não tem se refletido no comportamento das ações. Numa dinâmica bastante contraintuitiva, as superações das estimativas de consenso não têm sido acompanhadas por reações positivas das respectivas ações, enquanto os desapontamentos frente ao projetado também não têm sido rebatidos com penalização aos papéis.
Leia Também
Até o momento da confecção do relatório, as companhias cujos resultados superaram as expectativas de consenso para receita e lucro líquido viram suas ações apresentarem uma performance, na média, inferior ao S&P 500 em 5 pontos-base no pregão subsequente à divulgação dos números (é a pior reação da história, segundo o banco). Enquanto isso, aqueles que frustraram as projeções encontraram uma reação favorável em termos relativos, superando o S&P em 60 pontos-base (a maior diferença da história).
Esse tipo de dinâmica também começa a chamar a atenção no Brasil. O pregão de ontem foi emblemático. Por semanas, convivemos com relatórios e notícias de que o Santander soltaria um bom resultado trimestral, acima das expectativas prévias. Com efeito, o banco publicou um belo resultado, além das estimativas de consenso. Curiosamente, a reação de suas ações foi bastante negativa. Todo o setor bancário foi arrastado pelo vermelho. Claro que depois vieram as explicações — todas elas muito bem construídas a posteriori, num exemplo de livro-texto para a falácia da narrativa, para dar orgulho em Nassim Taleb. Apontaram preocupação com futuras elevações de provisão, com o comportamento da inadimplência e com a margem financeira. A velha tendência em procurar por causas a efeitos meramente aleatórios ou para uma dinâmica técnica do mercado.
Há dias, algo semelhante ocorrera com WEG, cujo resultado arrombou qualquer projeção, mas foi insuficiente para animar as ações, que abriram o pregão seguinte em forte alta e terminaram em desvalorização significativa. Poderíamos também argumentar com o exemplo de Hypera, cujos papéis mereciam reação mais favorável ao balanço trimestral frente ao observado na prática.
Por que as ações decidiram ignorar aquilo que, em essência, lhes é o mais importante, ou seja, os resultados corporativos e os lucros das empresas?
Difícil encontrar as razões, mas, de acordo com a Merrill Lynch, esse é um mau sinal. Esse tipo de reação a resultados só foi encontrado durante a bolha de tecnologia em 2000, a única temporada de balanços, segundo o banco, com reflexos contraintuitivos sobre as ações. Na sequência daquele comportamento, os mercados enfrentaram um período bastante ruim.
Estaríamos, portanto, diante de uma bifurcação importante: i) levamos com efetiva preocupação os paralelos com a bolha de tecnologia, ou ii) levamos com efetiva preocupação a segunda onda de Covid-19 na Europa e nos EUA, cujo corolário seria a necessidade de nos posicionar no combo “stay at home”, representado classicamente pelas grandes ações de tecnologia?
A resposta não é trivial. Contudo, os paralelos com a bolha pontocom não me parecem tão pertinentes no momento. Agora, há reais vantagens competitivas, uma trajetória secular de crescimento, barreiras à entrada claras e valuations que, claro, não são propriamente barganhas (nem poderiam ser, dados a qualidade das companhias, o volume de liquidez no mundo e juros zerados), mas também não são proibitivos (com algumas exceções que comprovam a regra; Tesla é tipicamente apontada entre elas).
No final do dia, os resultados corporativos são como a morte. Você pode até ignorá-los, mas eles vão continuar lá como um fato inexorável da vida. Cedo ou tarde, temos nosso encontro marcado. Cedendo à tentação keynesiana, no longo prazo todos estaremos mortos, e teremos de encontrar os lucros corporativos. Se um negócio vai bem, as ações acabam seguindo.
E para encerrar de vez o texto mais paradoxal e contraintuitivo do ano, qual o país que não tem assistido a uma escalada importante dos casos de Covid (ao menos até agora) e mostra relativo controle da pandemia? Seria muito esperar por uma boa performance relativa dos ativos brasileiros?
Caça ao Tesouro amaldiçoado? Saiba se Tesouro IPCA+ com taxa de 8% vale a pena e o que mais mexe com seu bolso hoje
Entenda os riscos de investir no título público cuja remuneração está nas máximas históricas e saiba quando rendem R$ 10 mil aplicados nesses papéis e levados ao vencimento
Crônica de uma tragédia anunciada: a recuperação judicial da Ambipar, a briga dos bancos pelo seu dinheiro e o que mexe com o mercado hoje
Empresa de gestão ambiental finalmente entra com pedido de reestruturação. Na reportagem especial de hoje, a estratégia dos bancões para atrair os clientes de alta renda
Entre o populismo e o colapso fiscal: Brasília segue improvisando com o dinheiro que não tem
O governo avança na implementação de programas com apelo eleitoral, reforçando a percepção de que o foco da política econômica começa a se deslocar para o calendário de 2026
Felipe Miranda: Um portfólio para qualquer clima ideológico
Em tempos de guerra, os generais não apenas são os últimos a morrer, mas saem condecorados e com mais estrelas estampadas no peito. A boa notícia é que a correção de outubro nos permite comprar alguns deles a preços bastante convidativos.
A temporada de balanços já começa quente: confira o calendário completo e tudo que mexe com os mercados hoje
Liberamos o cronograma completo dos balanços do terceiro trimestre, que começam a ser divulgados nesta semana
CNH sem autoescola, CDBs do Banco Master e loteria +Milionária: confira as mais lidas do Seu Dinheiro na semana
Matérias sobre o fechamento de capital da Gol e a opinião do ex-BC Arminio Fraga sobre os investimentos isentos de IR também integram a lista das mais lidas
Como nasceu a ideia de R$ 60 milhões que mudou a história do Seu Dinheiro — e quais as próximas apostas
Em 2016, quando o Seu Dinheiro ainda nem existia, vi um gráfico em uma palestra que mudou minha carreira e a história do SD
A Eletrobras se livrou de uma… os benefícios da venda da Eletronuclear, os temores de crise de crédito nos EUA e mais
O colunista Ruy Hungria está otimista com Eletrobras; mercados internacionais operam no vermelho após fraudes reveladas por bancos regionais dos EUA. Veja o que mexe com seu bolso hoje
Venda da Eletronuclear é motivo de alegria — e mais dividendos — para os acionistas da Eletrobras (ELET6)
Em um único movimento a companhia liberou bilhões para investir em outros segmentos que têm se mostrado bem mais rentáveis e menos problemáticos, além de melhorar o potencial de pagamento de dividendos neste e nos próximos anos
Projeto aprovado na Câmara permite divórcio após a morte de um dos cônjuges, com mudança na divisão da herança
Processos iniciados antes do falecimento poderão ter prosseguimento a pedido dos herdeiros, deixando cônjuge sobrevivente de fora da herança
A solidez de um tiozão de Olympikus: a estratégia vencedora da Vulcabras (VULC3) e o que mexe com os mercados hoje
Conversamos com o CFO da Vulcabras, dona das marcas Olympikus e Mizuno, que se tornou uma queridinha entre analistas e gestores e paga dividendos mensais
Rodolfo Amstalden: O que o Nobel nos ensina sobre decisões de capex?
Bebendo do alicerce teórico de Mokyr, Philippe Aghion e Peter Howitt se destacaram por estudar o papel das inovações tecnológicas nas economias modernas
A fome de aquisições de um FII que superou a crise da Americanas e tudo que mexe com o seu bolso nesta quarta (15)
A história e a estratégia de expansão do GGRC11, prestes a se tornar um dos cinco maiores FIIs da bolsa, são os destaques do dia; nos mercados, atenção para a guerra comercial, o Livro Bege e balanços nos EUA
Um atalho para a bolsa: os riscos dos IPOs reversos, da imprevisibilidade de Trump e do que mexe com o seu bolso hoje
Reportagem especial explora o caminho encontrado por algumas empresas para chegarem à bolsa com a janela de IPOs fechada; colunista Matheus Spiess explora o que está em jogo com a nova tarifa à China anunciada por Trump
100% de tarifa, 0% de previsibilidade: Trump reacende risco global com novo round da guerra comercial com a China
O republicano voltou a impor tarifas de 100% aos produtos chineses. A decisão foi uma resposta direta ao endurecimento da postura de Pequim
Felipe Miranda: Perdidos no espaço-tempo
Toda a Ordem Mundial dos últimos anos dá lugar a uma nova orientação, ao menos, por enquanto, marcada pela Desordem
Abuse, use e invista: C&A queridinha dos analistas e Trump de volta ao morde-assopra com a China; o que mexe com o mercado hoje?
Reportagem especial do Seu Dinheiro aborda disparada da varejista na bolsa. Confira ainda a agenda da semana e a mais nova guerra tarifária do presidente norte-americano
ThIAgo e eu: uma conversa sobre IA, autenticidade e o futuro do trabalho
Uma colab entre mim e a inteligência artificial para refletir sobre três temas quentes de carreira — coffee badging, micro-shifting e as demissões por falta de produtividade no home office
A pequena notável que nos conecta, e o que mexe com os mercados nesta sexta-feira (10)
No Brasil, investidores avaliam embate após a queda da MP 1.303 e anúncio de novos recursos para a construção civil; nos EUA, todos de olho nos índices de inflação
Esta ação subiu mais de 50% em menos de um mês – e tem espaço para ir bem mais longe
Por que a aquisição da Desktop (DESK3) pela Claro faz sentido para a compradora e até onde pode ir a Microcap