Tenho vários grupos de amigos que adoram sair para um bar ou uma balada no fim de semana. Já é praxe, quando eles combinam um novo encontro, um ou outro soltar a clássica frase: "vou beber como se não houvesse amanhã". O problema é sempre tem o amanhã, e normalmente ele traz na bagagem uma ressaca pouco agradável.
O que vem acontecendo com o mercado no começo dessa semana me faz lembrar muito esses amigos adeptos ao "tudo ou nada". A festa por lá já dura dois pregões com o Ibovespa rompendo os 85 mil pontos e o dólar abaixo dos R$ 3,90. E o combustível disso tudo é a overdose de pesquisas eleitorais (primeiro o Ibope de segunda e depois o Datafolha de terça) que trazem um cenário positivo para Jair Bolsonaro (PSL) e sua agenda econômica à la "posto Ipiranga".
Os investidores apostam alto e pouco pensam no fatídico dia de amanhã, que tem sim o risco de trazer notícias amargas. Uma declaração que o ex-diretor de Fiscalização do Banco Central Cláudio Mauch fez hoje em São Paulo contempla exatamente isso que estou falando. Ele disse que a volatilidade dos preços dos ativos de curto prazo deverá permanecer até que seja definida a equipe econômica do presidente que sairá eleito das urnas.
Mauch deu uma entrevista ao Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, durante o XIII Seminário Anual de Estabilidade Financeira e Economia Bancária e disse ser normal os preços dos ativos reagirem positivamente e as instituições financeiras revisarem suas projeções no momento em que as pesquisas confirmam os dois candidatos que vão disputar o segundo turno.
Mas fica um alerta para você, investidor: da mesma forma que o mercado reage muito bem a um Bolsonaro forte, qualquer mudança nesse cenário pode trazer uma guinada brusca de humor. E isso pode acontecer em questão de dias ou horas.
O mercado quer ele
O comportamento da bolsa e do câmbio é, segundo o ex-diretor do BC, prova da correlação existente entre as pesquisas de intenção de votos do Ibope e do Datafolha, que dão a Jair Bolsonaro vantagem sobre Haddad. Tão logo foram publicados os dados do Datafolha na terça-feira à noite, já havia instituições financeiras revisando ou indicando que poderiam revisar suas projeções para dólar e juros.
"Quando começa a chegar perto do momento de definir as eleições, o mercado fica olhando o que pensam os candidatos e o que eles já fizeram", diz Cláudio Mauch, ex-BC.
Num contexto geral, o ex-BC disse que o mercado parece estar dando o benefício da dúvida a Bolsonaro e que não dá para desmerecer a correlação entre as pesquisas e o movimento da bolsa e dólar.
Já que estamos falando de governo...
O ex-diretor aproveitou a deixa para defender a autonomia do BC. Segundo ele, se o BC já tivesse autonomia formal, com mandatos que transcendessem os mandatos políticos, com um compromisso de estabilidade da moeda claramente definido em lei e com o devido arcabouço para fazê-lo, claramente as transições políticas seriam mais tranquilas. "As transições políticas é o povo que decide, mas do ponto de vista da estabilidade da moeda e da situação financeira, o BC já teria dado antes."
*Com Estadão Conteúdo.