As coisas mudam incrivelmente rápido no mercado financeiro. Há poucas semanas, as bolsas globais batiam recordes atrás de recordes na expectativa do avanço da vacinação contra o coronavírus e novos estímulos. Era difícil imaginar que esses mesmos fatores motivariam a atual aversão ao risco (pelo menos no Brasil).
O motivo é que embora a vacina de fato tenha chegado ao país, o que temos disponível ainda é insuficiente para uma imunização em larga escala. Além disso, problemas com a importação de insumos e novas doses atrasam ainda mais o (inexistente) cronograma de vacinação do Ministério da Saúde.
Na semana passada o Ibovespa acumulou uma queda de 2,47%, e ficou abaixo dos 120 mil pontos, após os investidores “farejarem” uma piora do cenário fiscal brasileiro. O dólar também foi pressionado e subiu 3,30% nos últimos dias, indo a R$ 5,4790.
A falta de um plano de vacinação detalhado e as dificuldades que se acumulam não poderiam ter um timing pior. A situação da pandemia do coronavírus no país piora a cada dia, provando que a segunda onda tem força para ser ainda pior que a primeira. Manaus segue sendo o ponto mais crítico, mas a situação obriga diversas outras cidades e estados a fecharem as suas portas em uma tentativa de evitar um agravamento da situação.
O estado de São Paulo voltou hoje a operar no cenário mais rígido de distanciamento social aos finais de semana, feriados e das 20h às 6h em dias úteis. Nestes momentos, somente padarias, mercados e farmácias estão autorizados a funcionar. Na grande São Paulo, hospitais de campanha foram reativados e novas restrições não estão descartadas.
Não é só no Brasil que a situação do coronavírus preocupa. Estados Unidos, Europa e China também estão tocando suas campanhas de imunização enquanto batem novos recordes de contágio e mortes. O Ano Novo Chinês, um dos feriados mais tradicionais do continente asiático e que acontece em fevereiro, foi cancelado em diversas regiões.
Como em um efeito dominó, essa situação nos leva a esbarrar em outra preocupação frequente desde que a pandemia começou: o cumprimento do teto de gastos e o compromisso do governo com o equilíbrio fiscal. A leitura dos agentes do mercado é que nesse ritmo, a União deverá voltar a fornecer estímulos e rediscutir a existência do auxílio emergencial para socorrer a população.
O cenário não deve ser diferente nos próximos dias. A semana é mais curta em razão do feriado em São Paulo, mas no dia em que a B3 ficou fechada o noticiário corporativo não parou.
Tivemos o anúncio da saída de Wilson Ferreira Junior da Eletrobras, que derrubou os recibos de ações da estatal negociados em Nova York. O executivo vai assumir o comando da BR Distribuidora, curiosamente uma ex-estatal privatizada em 2019.
As ações brasileiras no geral tiveram um dia ruim em Nova York, com a queda do EWZ, o principal fundo de índice com papéis nacionais, que indica uma reabertura no vermelho para o Ibovespa no pregão de terça-feira.
Antes do início dos negócios, os investidores vão se debruçar sobre a ata do Copom em busca de pistas para o futuro da política monetária do país. O IPCA-15, uma prévia do índice oficial, também será divulgado na terça-feira pela manhã.
Nos Estados Unidos, a semana deve ser marcada pela leitura preliminar do Produto Interno Bruto (PIB) do 4º trimestre e a decisão de política monetária do Federal Reserve. A safra de balanços corporativos lá fora chega ao auge com a divulgação dos resultados de várias gigantes de tecnologia.
Corrida presidencial
As eleições para a presidência da Câmara e do Senado, que acontecem no dia 1º, ganham cada vez mais importância aos olhos do mercado. Os eleitos para as cadeiras serão os responsáveis por pautar questões importantes para a política fiscal do país, como as reformas. E, ao que parece, a maior parte dos candidatos estudam colocar o auxílio emergencial novamente em pauta.
Pelo menos foi isso que sinalizaram os candidatos à presidência da Câmara Arthur Lira (apontado pelo governo) e Baleia Rossi (principal candidato da oposição). Rodrigo Pacheco, que concorre à presidência do Senado, causou estresse no mercado ao dizer que o teto de gastos não deveria ser intocado em momentos de necessidade.
Ata em destaque
Após o Comitê de Política Monetária decidir manter a taxa básica de juros em 2% ao ano e retirar o forward guidance, que indicava a manutenção da taxa Selic na mínima histórica por um longo período, o mercado aguarda mais detalhes sobre a visão do Banco Central sobre a economia brasileira.
O mercado espera mais detalhes sobre a retirada da prescrição futura e o impacto da inflação no curto prazo e nas decisões do BC.
Outro destaque da agenda doméstica fica com a divulgação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), também na terça-feira, uma prévia da inflação oficial.
Cenário caótico
Na reta final do pregão de sexta-feira (22) duas notícias positivas que podem ajudar a amenizar a preocupação com o ritmo de vacinação no país.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou o segundo lote da CoronaVac, já envasado pelo Instituto Butantan, que totaliza 4,8 milhões de doses. Também chegou ao Brasil um carregamento de 2 milhões de doses da vacina desenvolvida pela Universidade de Oxford/ AstraZeneca, importada da Índia, e que já começaram a ser distribuídas aos estados.Assim, o Brasil eleva para 12,8 milhões o total de doses disponíveis.
Ainda assim, o número de doses disponíveis ainda é insuficiente e o mercado também pode ficar sensível às denúncias que chegam de diversas regiões do país de pessoas furando a fila de prioridade. Em Manaus, a vacinação chegou a ser paralisada para que se apurassem as denúncias. Qualquer fator que atrase o ritmo de vacinação deve ser mal recebido.
Agora, a expectativa é pela liberação da importação dos insumos chineses que permitirão ao Instituto Butantan e a Fiocruz retomarem a produção de novas doses. O país estaria retaliando o Brasil após declarações contrárias ao país tanto pelos filhos do presidente como ministros de Estado. Na semana passada, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o governador de São Paulo, João Doria, alegaram estar trabalhando para resolver a situação
Estados Unidos em foco
O destaque da agenda da semana fica com os Estados Unidos. Na quarta-feira (27) as atenções se voltam para a decisão de política monetária do Federal Reserve. A expectativa do mercado é de que a taxa se mantenha em 0,25% ao ano. É ao comunicado e à coletiva do presidente do Fed, Jerome Powell, que o mercado estará atento.
Recentemente, Powell afirmou que o momento de aumentar juros não está "nem um pouco próximo" e que o Fed não deve apertar a política monetária devido a "ameaças teóricas". Segundo o dirigente, a economia americana ainda está longe de atingir o máximo emprego, uma das metas utilizadas na hora de traçar os planos de política monetária e que o aumento só deve ocorrer se houver uma pressão inflacionária.
Além de insights sobre o ritmo de recuperação da economia americana, o comunicado também deve trazer informações sobre a manutenção das compras de títulos e outras ferramentas de estímulos utilizadas pelo BC americano.
Outra divulgação importante nesta semana é a leitura preliminar do Produto Interno Bruto (PIB) dos Estados Unidos do 4º trimestre de 2020, na quinta-feira. A expectativa é que a maior economia do mundo registre um crescimento de 4,6% ante o trimestre anterior.
O mercado também deve ficar atento aos primeiros passos do governo Biden. O novo presidente tem pressa para aprovar novos estímulos e acelerar o processo de vacinação no país.
Outra pauta que deve ser destaque na semana e pode até mesmo atrapalhar os planos de Biden é o impeachment de Donald Trump, que deve começar a ser julgado no Senado americano nesta terça-feira (26). Em processo já aprovado na Câmara dos Representantes, Trump é acusado de “incitação à rebelião”. Essa é a primeira vez na história que um julgamento de impeachment será feito após o presidente deixar o poder.
Balanços corporativos
A temporada de balanços no Brasil tem uma largada tímida, com apenas a Cielo, na terça-feira. Mas lá fora, ela já está a todo vapor. Confira as principais divulgações internacionais da semana:
Terça-feira (26): General Electric, UBS, Johnson & Johnson, Citigroup e Microsoft
Quarta-feira (27): Boeing, AT&T, Apple, Facebook e Whirpool
Quinta-feira (28): American Airlines, McDonald's, Mastercard, Visa e Samsung
Sexta-feira (29): Chevron e Caterpillar
Quem sobe e quem desce
Em um cenário de dificuldade no controle da pandemia, empresas da chamada “nova economia” e companhias que já se mostraram resilientes durante a crise possuem uma tendência a serem destaques positivos. Por isso, fique de olho nas empresas ligadas ao setor de commodities (que podem acompanhar o crescimento da economia chinesa, a única entre as grandes economias a ter desempenho positivo em 2020) e companhias com boa exposição ao e-commerce.
Na ponta contrária, empresas ligadas a shoppings, varejo físico e turismo tendem a ser prejudicadas pelas novas medidas de isolamento social. Vale ficar de olho também nas ações da Eletrobras. Após comentários de Pacheco, os analistas passaram a ficar menos otimistas com a possibilidade de privatização da companhia neste governo.
Agenda da semana
Segunda-feira (25)
- Brasil: mercado fechado por conta de feriado municipal em São Paulo; Relatório Focus do Banco Central (8h25); Balança comercial semanal (15h)
- EUA: Índice de atividade nacional - Dez (10h30)
- Europa: Fórum Econômico Mundial Virtual com a participação de líderes mundiais.
Terça-feira (26)
- Brasil: Confiança do Consumidor FGV (8h); IPCA-15 (9h); ata do Copom (8h)
- EUA: Confiança do Consumidor (12h)
- China: Lucro industrial (22h30)
Quarta-feira (27)
- EUA: Decisão de política monetária do Federal Reserve (16h); coletiva do presidente do Fed, Jerome Powell (16h30)
Quinta-feira (28):
- Brasil: IGP-M (8h)
- EUA: PIB do 4º trimestre (10h30); Balança comercial de bens (10h30)
Sexta-feira (29):
- Brasil: Balanço orçamentário (9h30)
- EUA: PMI de Chicago (11h45)