O governo quer abrir espaço no orçamento para turbinar um programa de renda mínima em pleno ano eleitoral. Para tal fim, considera necessário deixar de pagar dívidas já transitadas em julgado com pessoas físicas e empresas e liquidar de vez o teto de gastos.
Essa brincadeira com bolso alheio, porém, demanda autorização do Congresso. Eis que, por uma margem de apenas quatro votos, o governo conseguiu aprovar na madrugada de hoje, em primeiro turno, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) dos Precatórios na Câmara.
O texto abre espaço de R$ 91,6 bilhões no Orçamento de 2022 para o pagamento do Auxílio Brasil e outros gastos durante o ano eleitoral.
Segundo turno ocorrerá em 'momento oportuno'
A sessão para apreciação dos destaques (sugestões de mudanças ao texto principal) e votação em segundo turno da PEC será convocada "oportunamente", segundo o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). Não ficou claro se isso ocorrerá ainda nesta quinta ou na semana que vem.
Lira deu voto favorável e ajudou a aprovar a proposta. O parlamentar, que por ocupar a presidência da Casa não costuma votar, apertou o sim e contribuiu para garantir o placar vitorioso para o governo. Parte da oposição também foi crucial para que o presidente Jair Bolsonaro assegurasse seu plano para o ano eleitoral.
Foram dias de negociações, pressão sobre a oposição e promessas de emendas parlamentares para o governo obter 312 votos a favor da PEC dos Precatórios, contra 144. Por ser uma alteração constitucional, a proposta precisava de maioria qualificada, com 308 votos, ou três quintos dos parlamentares. Ainda será preciso aprovar o texto em um segundo turno de votação antes que ele siga para o Senado, onde também deve enfrentar resistências.
Plano B em modo de espera
A aprovação coloca em modo de espera o "plano B" que o governo tem engatilhado: uma consulta ao Tribunal de Contas da União (TCU) para prorrogar o auxílio emergencial com crédito extraordinário, fora do teto de gastos - a regra que limita o avanço das despesas à inflação.
Concessões à oposição
Ao longo do dia, Lira avisou que não tinha como garantir um resultado favorável, mas trabalhou intensamente pela vitória e por um texto mais palatável aos parlamentares, inclusive para a oposição.
O governo enfrentou grandes dificuldades em arregimentar o apoio necessário, tanto pelo conteúdo da PEC quanto pela retomada das votações presenciais, que se tornou um obstáculo ao alcance de quórum mais confortável. As bancadas do MDB e do PSDB, geralmente alinhadas ao governo, não engrossaram o apoio à proposta.
Lira, no entanto, angariou votos da oposição, que tinha como meta priorizar o pagamento dos precatórios que a União deve aos Estados em decorrência de ações judiciais envolvendo o Fundef, antigo fundo de educação básica.
Pelo acordo, em vez de entrar na fila das dívidas judiciais, eles serão pagos de forma parcelada: 40% no primeiro ano, 30% no segundo e 30% no terceiro. Com essa concessão, o texto ganhou o apoio de 15 parlamentares do PDT, partido de oposição ao governo.
O Podemos, que na semana que vem filia o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, que deixou o governo Bolsonaro após divergências com o presidente sobre a condução dos trabalhos da Polícia Federal, deu mais quatro votos para a aprovação da PEC.
*Com informações do Estadão Conteúdo