O presidente do Banco Central (BC), Ilan Goldfajn, está em Bali, Indonésia, onde acontece encontro do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do G20. Em discurso, reforçou que o Brasil está bem posicionado para enfrentar choques externos e que quanto pior o quadro internacional, mas importante são reformas. Sobre o rumo da Selic, no entanto, não deu novas pistas.
A fala de Ilan, que diferencia o Brasil de outros emergentes, acontece em momento oportuno, já que os mercados internacionais enfrentaram o segundo dia de perdas acentuadas nas bolsas de valores e outros ativos em função das preocupações com a elevação dos juros na economia americana.
Ilan abriu sua apresentação, disponibilizada no site do BC, falando que o cenário internacional está mais desafiador, resultando em menor apetite por risco com relação a economias emergentes.
Os principais riscos externos continuam associados à normalização das taxas de juros em economias avançadas e às incertezas envolvendo o comércio internacional.
Segundo Ilan, o ajuste da taxa básica de juros americana traz desafios aos emergentes. A realocação de portfólios enfraquece as moedas e eleva os prêmios de risco. Além disso, os mercados financeiros estão mais voláteis, refletindo uma piora na percepção de risco dos agentes.
No entanto, ponderou Ilan, choques globais afetam cada economia de acordo com seus fundamentos.
“Fatores como necessidade de financiamento externo, inflação, autonomia 'de fato' do Banco Central e a sensibilidade a tensões comerciais ajudam a explicar as reações do mercado”, disse.
Segundo Ilan, a defesa dos emergentes começa no front doméstico, com políticas consistentes e câmbio flutuante para absorver esses choques.
Brasil bem preparado para resistir a choques
Segundo Ilan, essa capacidade brasileira de absorver eventual revés externo decorre de uma robusta posição no balanço de pagamentos, um regime de câmbio flutuante, adequado patamar de reservas internacionais, inflação baixa e expectativas ancoradas.
O presidente voltou a citar o baixo déficit em conta corrente, de 0,8% do PIB nos 12 meses encerrados em agosto, e disse que esse déficit é tranquilamente financiado pelo Investimento Direto no País, de 3,6% do PIB. Além disso, há um superávit comercial de US$ 52,5 bilhões, também medido em 12 meses.
Na lista de amortecedores ou colchões, também aparecem os US$ 380 bilhões em reservas internacionais, que equivalem a 20% do PIB.
Ilan citou, ainda, a baixa participação de estrangeiros no financiamento da dívida interna. O não residente representa cerca de 12% do total, abaixo da média dos demais emergentes, de 22,7%, segundo dados do FMI.
Segundo Ilan, o ambiente de baixa inflação e expectativas ancoradas também permite a “acomodação” de choques externos. E o sistema financeiro brasileiro é resiliente e seu funding é baseado em fontes domésticas de capital.
O que podemos entender por "acomodação" é que o BC brasileiro não precisa sair em dispara para aumentar a taxa básica de juros quando a coisa fica feia no mercado externo, seja para conter fuga de capitais ou tentar controlar uma alta da inflação proveniente de fortes movimentos de desvalorização cambial.
Principais riscos e desafios domésticos
Encerrada a parte dedicada ao quadro externo e listagem de fatores que diferenciam o Brasil de países como Turquia (BC não independente) e Argentina (sem reservas e elevado endividamento externo), Ilan passou a tratar do quadro local.
Segundo o presidente, apesar dos avanços dos últimos dois anos o passo decisivo, representado pela reforma da Previdência, ainda precisa ser dado.
“O cenário financeiro global mais adverso reforça a necessidade de continuidade das reformas e ajustes a fim de garantir confiança na sustentabilidade fiscal e gerar maior crescimento”, disse, complementando que “parece haver um maior consenso que as reformas e ajustes precisam continuar”.
Segundo Ilan, as reformas e ajustes , notadamente os de natureza fiscal, são “cruciais” para uma recuperação sustentada da atividade, inflação baixa e estável no médio e longo prazos e menores taxas neutras de juros na economia (taxa que promove o máximo crescimento com inflação na meta).
Política Monetária
Na parte dedicada à condução da política monetária, Ilan reafirmou as mensagens já dadas nas últimas semanas. O BC manteve a Selic em 6,5% ao ano na sua última reunião, mas alertou que pode começar a subir o juro (retirar estímulo) se o cenário futuro da inflação e seu balanço de risco piorarem.
Essa avaliação sobre a inflação prospectiva e balanço de risco passa por dois pontos. A percepção do mercado com relação à continuidade das reformas e o comportamento da taxa de câmbio. Dois fatores que passam pela eleição.
O BC não fala nessa linguagem, mas sim que: “a percepção de continuidade das reformas afeta as expectativas e projeções econômicas atuais” e que “a aprovação e implementação de reformas e ajustes é de importância crucial”.
O balanço de riscos para a inflação segue assimétrico, com um fator que pode levar a inflação a ficar abaixo do projetado e dois que podem desviar os preços para cima.
De um lado, há elevada ociosidade da economia. Do outro, há o risco de frustração com a continuidade das reformas. Algo que pode elevar os prêmios de risco. Tal risco se intensifica se o quadro global para emergentes se deteriorar.
Atividade e inflação
Ilan voltou a falar que a recuperação da atividade acontece de forma gradual. O crescimento esperado para 2018 é de 1,4% subindo para 2,4% em 2019, de acordo com as projeções do próprio BC.
No segundo trimestre, o PIB cresceu 0,8% sobre o trimestre anterior, e Ilan destacou que essa é a sexta variação positiva consecutiva, algo que não acontecia desde 2011. Disse ainda que o mercado de crédito se desenvolve de forma favorável.
No lado dos preços, “a inflação continua bem-comportada”, com variação de 4,5% em 12 meses depois dos choques recentes. A meta também é de 4,5% para 2018.
Sobre os núcleos de inflação, que captam a tendência dos preços, Ilan voltou a dizer que os dados estão em patamar apropriado, ou seja, compatíveis com as metas de inflação.
No lado das expectativas, as projeções estão próximas das metas de 4,25% para 2019, 4% para 2020 e 3,75% para 2021.