O que uma teleconferência da Gerdau ensina sobre empresas que tomam dívida para turbinar o resultado
Muitos analistas questionaram se não seria o momento de a Gerdau realizar mais empréstimos para aumentar a rentabilidade. Será mesmo?
Como analista de ações, eu tento defender os meus colegas de profissão sempre que possível.
No entanto, algumas vezes essa tarefa se torna pra lá de difícil.
Nos últimos dias, eu confesso que perdi a paciência ouvindo a teleconferência de resultados do segundo trimestre de 2021 da Gerdau (GGBR4). A companhia mostrou números muito fortes, com volumes e margens elevadas e uma geração de Ebitda de R$ 15 bilhões no acumulado dos últimos 12 meses.
Ajudada por esse elevado Ebitda, a alavancagem financeira, medida pelo indicador dívida líquida/Ebitda, atingiu um nível baixíssimo de 0,65 vezes.
Só que, ao invés de ter gerado satisfação, esse baixo nível de endividamento deixou alguns analistas desconfortáveis na teleconferência de resultados.
Acostumados a achar que a realidade do mundo dos negócios respeita perfeitamente a teoria encontrada nos livros, esses analistas insistiram em perguntar ao CEO e CFO se não estaria na hora de a Gerdau captar mais dívidas, dado que isso tenderia a aumentar a rentabilidade.
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Isso até faz sentido na teoria, mas sabemos que o mundo real guarda muito mais complexidades.
Turbinando a rentabilidade
Você já deve ter ouvido falar que a melhor forma de investir é utilizando dinheiro de terceiros.
Isso porque utilizar empréstimos é uma maneira de aumentar a rentabilidade de qualquer investimento.
Quer ver?
Vamos supor que você decida montar um negócio que precise de um investimento inicial de R$ 500 mil. Você tem esse dinheiro guardado e decide utilizá-lo para colocar a empresa de pé.
Considerando que no ano a empresa conseguiu um lucro operacional (Ebit) de R$ 100 mil, o retorno do seu investimento foi de 13,2%:
| Resultado do exercício – sem alavancagem | |
| Lucro antes do pagamento de juros (Ebit) | R$ 100.000 |
| Juros pagos ao banco | - R$ 0 |
| Lucro antes do imposto | (=) R$ 100.000 |
| Imposto pago (alíquota de 34%) | - R$ 34.000 |
| Lucro líquido | (=) R$ 66.000 |
| Patrimônio líquido (dinheiro próprio investido) | R$ 500.000 |
| ROE (Lucro líquido ÷ Patrimônio líquido) | 13,2% |
Agora, vamos supor que, em vez de ter investido R$ 500 mil do próprio bolso, você tivesse colocado apenas R$ 100 mil e o restante fosse emprestado do banco, a uma taxa de 10% ao ano. Considerando que o negócio gerasse o mesmo Ebit de R$ 100 mil, qual seria o seu retorno neste caso?
| Resultado do exercício – com alavancagem | |
| Lucro antes do pagamento de juros (Ebit) | R$ 100.000 |
| Juros pagos ao banco (10% sobre R$ 400 mil) | -R$ 40.000 |
| Lucro antes do imposto | (=) R$ 60.000 |
| Imposto pago (alíquota de 34%) | - R$ 20.400 |
| Lucro líquido | (=) R$ 39.600 |
| Patrimônio líquido | R$ 100.000 |
| ROE (Lucro líquido ÷ Patrimônio líquido) | 39,6% |
Repare que, apesar de o lucro ser menor por causa do pagamento de juros, o retorno para o acionista (ROE) acaba sendo muito maior quando há utilização de capital de terceiros. E quanto mais aumentarmos a parcela de dinheiro de terceiros, maior será o ROE (assumindo que a taxa de juros cobrada pelos bancos continuasse igual).
É claro que existe um limite para o endividamento. Segundo os livros de teoria de finanças, a relação ótima estaria entre cerca de 1,5 e 3,5 vezes dívida líquida/Ebitda (sigla para lucro antes de juros, impostos depreciação e amortização). Menos do que isso, o retorno é afetado; mais do que isso, a dívida pode ficar grande demais e levar a companhia à falência.
Teoria vs mundo real
Depois de a Gerdau mostrar um baixo nível de dívidas com relação aos seus resultados operacionais, muitos analistas questionaram o CEO e o CFO se não seria o momento de realizar mais empréstimos para turbinar a rentabilidade dos acionistas.
Como acabamos de ver, a pergunta faz sentido e está de acordo com a teoria de finanças. Mas, infelizmente, não conversa com o que estamos habituados a ver no mundo dos negócios, especialmente em setores muito cíclicos, como o que a Gerdau atua.
Aliás, foi justamente essa a resposta que a administração da empresa deu aos analistas na teleconferência ao descartar elevar o nível de endividamento.
Hoje o preço do aço e a demanda por ele estão elevadas, o resultado operacional está muito forte e proporcionando uma alavancagem de apenas 0,65 vezes a dívida líquida/Ebitda.
| Alavancagem financeira atual | |
| Dívida líquida | R$ 10,2 bilhões |
| Ebitda – últimos 12 meses | R$ 15,6 bilhões |
| Dívida líquida/Ebitda | 0,65 vezes |
Esse é um nível baixo e que acaba impactando negativamente o ROE no curto prazo, e é por isso que vimos analistas perguntando se não estava na hora de tomar mais dívidas.
O problema é que nada garante que as condições permanecerão tão favoráveis assim.
Da mesma forma que os preços do aço estão lá em cima e a demanda está aquecida neste momento, pode ser que daqui a doze meses estejamos numa crise tremenda, com preços e venda de aço em níveis deprimidos.
Nessa situação, o Ebitda cairia bastante, assim como aconteceu em meados da década passada.
Apenas como exemplo hipotético, em um cenário nem tão drástico no qual o Ebitda da Gerdau caísse para R$ 3 bilhões (o que ainda está bem acima dos piores níveis vistos em 2016) o mesmo endividamento que hoje é considerado baixo passaria a ser de 3,4 vezes o Ebitda – níveis próximos de alarmantes para qualquer companhia.
| Alavancagem financeira em um cenário de crise | |
| Dívida líquida | R$ 10,2 bilhões |
| Ebitda de 12 meses | R$ 3 bilhões |
| Dívida líquida/Ebitda | 3,4 vezes |
Agora, em um cenário ainda mais dramático, a companhia poderia ceder aos desejos e aumentar a sua dívida líquida para R$ 25 bilhões, a fim de deixar a alavancagem atual em 1,6 vezes o Ebitda e turbinar a rentabilidade dos acionistas.
No entanto, se o mercado piora logo em seguida e o Ebitda cai para aqueles mesmos R$ 3 bilhões do exemplo anterior, a alavancagem subiria para mais de 8 vezes.
| Alavancagem financeira em um cenário de crise e aumento da dívida | |
| Dívida líquida | R$ 25 bilhões |
| Ebitda de 12 meses | R$ 3 bilhões |
| Dívida líquida/Ebitda | 8,3 vezes |
Neste cenário, ela chegaria em um nível praticamente impagável de dívidas e teria de recorrer à renegociações, aumento de capital ou até mesmo um pedido de recuperação judicial.
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O longo prazo nem sempre é a soma de curtos prazos
Alavancar o negócio e aumentar a rentabilidade às custas do risco de quebrar lá na frente ou manter níveis confortáveis de dívida e ter a certeza de que o negócio vai resistir a qualquer dificuldade que venha a surgir?
O management da Gerdau adotou o caminho mais conservador, que pode desagradar analistas que acham que os negócios podem ser tocados totalmente de acordo com a teoria. Mas agindo assim, eles garantem a perenidade de um negócio que está sujeito a muito mais complexidades do que a teoria consegue prever.
Pode não parecer, mas é nesses pequenos sinais que os gestores de algumas companhias nos mostram que eles estão mais preocupados com a continuidade e saúde financeira da empresa do que em retornos turbinados de curto prazo que podem colocar em risco o dinheiro dos acionistas lá na frente.
Não é só pelos ótimos resultados e boas perspectivas que gostamos de Gerdau. É também por causa dessa disciplina que o management tem demonstrado mesmo nos tempos de bonança.
Por esses motivos, a companhia merece um lugar entre as Melhores Ações da Bolsa, que ainda conta com várias outras que compartilham das mesmas qualidades de resultados e de gestão e que está de olho na nova onda de IPOs que estão chegando por aí. Se quiser conferir a série, deixo aqui o convite.
Um grande abraço e até a próxima!
Ruy
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