Ainda que por aqui o cenário caótico da pandemia tenha pressionado o dólar e o juros desde o começo desta quarta-feira, hoje foi um daqueles dias em que as bolsas americanas e o Ibovespa pareciam caminhar para um dia de ganhos moderados e sem grandes crises. Mas as coisas azedaram na reta final - tanto lá quanto cá.
A disparada do petróleo, aliada a uma visão otimista em Wall Street com relação aos estímulos fiscais e monetários e uma queda do rendimento dos títulos públicos americanos sustentaram uma alta moderada ao longo do dia, com o Ibovespa chegando a avançar 1,38% na máxima.
Ainda que o mercado de juros tenha dado um dia de folga para o Nasdaq, as ações do setor de tecnologia não conseguiram sustentar o ímpeto e acabaram puxando para baixo também o Dow Jones e o S&P 500.
No Brasil, quase que simultaneamente, a preocupação com o fiscal voltou ao primeiro plano, após a notícia de que 16 estados estariam pressionando o Congresso por um auxílio emergencial maior do que a proposta aprovada, antes mesmo de o benefício começar a ser pago.
Com o fantasma que andava meio apagado desde a aprovação da PEC Emergencial de volta ao plano principal, as coisas azedaram. Em minutos a bolsa reverteu os ganhos, fechando o dia nas mínimas ao recuar 1,06%, aos 112.064 pontos. O dólar à vista, que se manteve pressionado ao longo de toda a sessão, acelerou a alta e fechou muito próximo das máximas, com um avanço de 2,25%, a R$ 5,6396.
Perto do fechamento, os contratos dos juros futuros também aceleraram para as máximas - tanto na ponta mais curta quanto na mais longa. Confira as taxas de fechamento do dia:
- Janeiro/2022: de 4,65% para 4,73%
- Janeiro/2023: de 6,37% para 6,62%
- Janeiro/2025: de 7,83% para 8,15%
- Janeiro/2027: de 8,34% para 8,70%
Trem sem freio
Embora em um primeiro momento a bolsa tenha seguido o cenário positivo internacional, a pandemia nunca deixou de sair da cabeça do mercado. A pressão exercida no dólar e no mercado de juros ao longo do dia prova isso.
Com mais de três mil mortos diários e uma forte pressão da sociedade e entidades para que o governo articule uma saída para a crise, os olhos dos investidores estiveram voltados para Brasília, onde o governo Bolsonaro ensaia uma mudança de postura - ainda que sem muito sucesso.
O pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro em rede nacional, realizado na noite de ontem, coincidiu com um recorde triste: 3.158 mortos nas últimas 24 horas. A situação crítica, que obriga estados e municípios a adotarem medidas cada vez mais rígidas de isolamento social, deve pesar sobre os indicadores de atividade nos próximos meses, piorando ainda mais as projeções de recuperação.
Em pouco mais de quatro minutos de fala, Bolsonaro distorceu informações sobre a atuação do seu governo contra o coronavírus e afirmou que fará de 2021 “o ano da vacinação”. Hoje pela manhã, o presidente se reuniu com lideranças e governadores, em uma tentativa de coordenar uma atuação nacional.
Na saída do encontro, o presidente Bolsonaro e as lideranças do Congresso reafirmaram o compromisso, prometendo avançar o processo de vacinação, mas sem a apresentação de medidas concretas. Alexandre Almeida, economista da CM Capital, destaca que, além da falta de planos concretos, o encontro também pecou por não contar com a presença de governadores importantes para essa articulação nacional, como João Doria, de São Paulo, e Wellington Dias, o governador do Piauí e presidente do Consórcio Nordeste.
Além disso, o presidente Jair Bolsonaro encontra certa dificuldade em se adequar ao novo posicionamento de seu governo. Ainda comentando os resultados da reunião, Bolsonaro voltou a criticar os lockdowns aplicados em todo o país e falou sobre “tratamento preventivo”, que não possui nenhuma validação científica.
Alexandre Jung, Head de Renda Variável da Vero Investimentos, também destaca a informação que o governo indiano deve atrasar a entrega de novas doses da vacina da AstraZeneca como um gatilho negativo para o mercado. "Com esse anúncio, as projeções de retomada e estabilidade acabam ficando mais comprometidas, pois não sabemos a extensão dessa paralisação".
Essa situação complexa, por si só, já era o suficiente para deteriorar o quadro fiscal no país, mas a notícia de que 16 governadores pressionam o Congresso para o retorno do auxílio emergencial de R$ 600 foi a gota d’água. No texto aprovado, a nova rodada do benefício seria de R$ 150, podendo chegar até R$ 350 em alguns casos. A notícia coincide com o início da discussão do parecer final da Comissão Mista de Orçamento (CMO), e, como lembrou o economista da CM Capital, já está atrasado.
Ancorando expectativas
Não é só o Brasil que é pressionado pela nova escalada no número de casos. Na Europa, o temor de uma terceira onda de contágio também leva os países a retomarem medidas mais restritivas de circulação, pesando sobre os ativos e commodities. Diante deste quadro, as bolsas asiáticas fecharam em queda, mas os principais índices do Velho Continente conseguiram se recuperar de olho em Nova York.
Nos Estados Unidos, as bolsas americanas operaram em alta durante boa parte do dia, com os olhos no Congresso, onde Jerome Powell e Janet Yellen voltaram a dar esclarecimentos.
Ontem, a fala de Yellen sobre o possível aumento da carga tributária das grandes empresas causou ruídos e azedou o humor dos investidores, mas hoje a reação foi positiva, com Powell e Yellen reafirmando o compromisso de apoiarem a economia americana enquanto a crise persistir.
Mesmo com um recuo dos títulos mais longos do Tesouro, as empresas de tecnologia, que vêm sofrendo de forma mais constante nas últimas semanas, não conseguiram manter o ritmo, o que acabou contagiando o restante dos índices.
Ao fim do dia, o Nasdaq recuou 2,01%, o S&P 500 teve queda de 0,55% e o Dow Jones ficou próximo da estabilidade, com leve recuo de 0,01%.
Encalhado
Depois de uma queda expressiva nas últimas semanas, o petróleo teve um dia com performance de gala - tanto o Brent quanto o barril WTI subiram cerca de 6%.
O temor dos últimos dias era de que os novos lockdowns na Europa prejudicassem a demanda global da commodity, mas, pela manhã, dados mais fortes do que o esperado das economias europeias afastaram um pouco essa leitura.
O empurrãozinho extra veio de um acontecimento, no mínimo, inusitado. Um navio porta-contêiner do tamanho do Empire State Building fez uma manobra errada e acabou bloqueando o Canal de Suez, uma das principais rotas comerciais e de abastecimento do mundo. O temor é que a paralisação da circulação por ali leve a atrasos na oferta do petróleo.
Durante a tarde, quando o otimismo ainda imperava na bolsa brasileira, as ações da Petrobras e da PetroRio chegaram a subir forte, refletindo a disparada da commodity, mas as companhias reverteram quase todos os ganhos.
Sobe e desce
A compra do Grupo Big pelo Carrefour (CRFB3) impulsionou as ações da companhia nesta quarta-feira (24), com os papéis liderando os ganhos do dia. Já a CCR (CCRO3), manteve uma alta significativa após firmar novos acordos com o governo de São Paulo. A Vale (VALE3) se destaca por ter ido na contramão da cotação do minério de ferro. Confira as maiores altas do dia:
CÓDIGO | NOME | VALOR | VARIAÇÃO |
CRFB3 | Carrefour Brasil ON | R$ 21,75 | 12,87% |
GOLL4 | Gol PN | R$ 20,78 | 2,36% |
SUZB3 | Suzano ON | R$ 73,36 | 2,22% |
VALE3 | Vale ON | R$ 92,96 | 2,09% |
CCRO3 | CCR ON | R$ 12,18 | 1,08% |
Após o avanço significativo na sessão de ontem, hoje as ações da resseguradora IRB passam por um movimento de realização de lucros recentes. Com a deterioração do cenário da pandemia e a tensão relacionada ao auxílio emergencial, as empresas do setor de consumo tiveram um dia negativo. Confira:
CÓDIGO | NOME | VALOR | VARIAÇÃO |
IRBR3 | IRB ON | R$ 6,05 | -6,20% |
MGLU3 | Magazine Luiza ON | R$ 20,29 | -5,67% |
VVAR3 | Via Varejo ON | R$ 11,47 | -5,28% |
ENGI11 | Engie units | R$ 41,63 | -5,08% |
CYRE3 | Cyrela ON | R$ 23,49 | -4,67% |