O Ibovespa caiu num buraco na semana passada. Em meio às incertezas vistas no cenário político-econômico global, o principal índice da bolsa brasileira perdeu o nível dos 100 mil pontos no último dia 15 — e, desde então, tentava voltar à marca dos três dígitos, mas sem sucesso.
Mas, nesta quarta-feira (21), o mercado parecia determinado a deixar esse fosso. Desde o início do dia, as operações assumiram um tom positivo, auxiliadas pelo clima mais ameno visto nas principais bolsas globais. Como resultado, o Ibovespa conseguiu subir o primeiro degrau, sustentando-se acima da marca centenária durante a manhã.
Só que um segundo fator de influência deu força extra à bolsa brasileira: o noticiário doméstico, que andava meio esquecido desde a aprovação da reforma da Previdência pelo plenário da Câmara. E, com sinalizações por parte do governo que foram bem recebidas pelo mercado, o Ibovespa conseguiu subir mais um degrau.
Como resultado, o principal índice acionário do país não só conseguiu recuperar o nível dos três dígitos — ele foi além. Ao fim do dia, o Ibovespa teve ganho de 2,00%, aos 101.201,90 pontos, encerrando muito perto da máxima intradiária, aos 101.240,13 pontos (+2,03%).
O dólar à vista também teve uma sessão de alívio: a moeda americana manteve-se em terreno negativo ao longo de toda a quarta-feira, fechando em baixa de 0,52%, aos R$ 4,0301 — na mínima, bateu os R$ 4,0151 (-0,89%).
Escalada local
Desde o início do dia, analistas e operadores citavam que novidades no front doméstico poderiam contribuir para melhorar o humor dos mercados locais. Em destaque, aparecia o plano de inclusão de outras 17 estatais numa lista de ativos a serem privatizados pelo governo.
Embora o anúncio oficial não tenha sido feito antes do encerramento da sessão — um evento formal está previsto para ocorrer no fim desta tarde —, a sinalização dada pelo governo na noite passada serviu para injetar ânimo nas operações.
Mais cedo, o site Poder360 divulgou uma relação com as 17 companhias que estariam nesse plano, com destaque para a Eletrobras. Como consequência, as ações ON da estatal (ELET3) dispararam 12,39% e as PNBs (ELET6) tiveram alta de 11,80%, liderando os ganhos do Ibovespa.
Mas não foi só isso. No meio da tarde, o jornal Valor Econômico publicou uma matéria afirmando, via fontes, que a equipe econômica pretende privatizar a Petrobras até o fim da gestão Bolsonaro, mesmo que a companhia não esteja na lista a ser divulgada hoje.
Essa segunda notícia fez as ações da Petrobras, que apresentavam ganhos modestos nesta quarta-feira, passarem a subir forte: os papéis PN (PETR4) terminaram a sessão em alta de 5,95%, enquanto os ONs (PETR3) tiveram ganho de 5,32%. E, dado o peso relevante da Petrobras na composição do Ibovespa, o índice como um todo ganhou força.
Por fim, também chamou a atenção o bom desempenho das ações do setor de construção civil, com MRV ON (MRVE3) e Cyrela ON (CYRE3) subindo 6,01% e 8,15%, respectivamente. Os ativos desse segmento reagem positivamente ao anúncio de uma nova modalidade de financiamento imobiliário pela Caixa.
Escada rolante
Mas o noticiário local só teve espaço para repercutir positivamente porque o clima lá fora está menos turbulento nesta quarta-feira. Embora as preocupações dos agentes financeiros em relação ao cenário político-econômico global permaneçam elevadas, o mercado encontrou espaço para se recuperar após as perdas recentes.
E, com o humor menos pesado, também aumentou a confiança de que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) irá cortar juros na próxima reunião de política monetária, em setembro, de modo a blindar a economia do país de eventuais impactos negativos da guerra comercial com a China.
Por mais que a ata da última reunião do Fed, divulgada nesta tarde, não tenha dado sinais evidentes de que um novo corte está a caminho — o documento voltou a bater na tecla de que não há um caminho predeterminado para a política monetária —, os mercados apostam que, na próxima sexta-feira (23), o presidente da instituição tende a assumir uma postura mais favorável ao alívio.
Jerome Powell fará um aguardado discurso no simpósio de Jackson Hole, uma espécie de encontro anual dos principais bancos centrais do mundo. E, considerando o acirramento nas tensões entre Washington e Pequim e as pressões cada vez maiores do presidente americano, Donald Trump — fatores que não estavam tao em evidência na última reunião, no fim de julho —, é esperada alguma atualização na postura do Fed.
"O clima lá fora está mais ameno, o mercado espera que comecem a surgir sinais de que o Fed ira mesmo cortar juros [em setembro]", diz Ari Santos, gerente da mesa de operações da H. Commcor. Ele lembra, contudo, que o Ibovespa segue com desempenho negativo no mês: mesmo com a alta de hoje, o índice ainda cai cerca de 0,6% em agosto.
Dólar despressurizado
Esse clima mais ameno visto no Ibovespa foi sentido no câmbio. E, assim como no caso do principal índice da bolsa brasileira, dois fatores atuaram em conjunto para trazer alívio à moeda americana
Por um lado, o dólar perdeu força em escala global, especialmente em relação às divisas de países emergentes, que foram castigadas nos últimos dias por causa da maior aversão ao risco. Assim, o peso mexicano, o rublo russo, o peso colombiano, o rand sul-africano e o peso chileno — além do real — ganharam força em conjunto nesta quarta-feira.
E, em termos locais, também exerceu influência sobre o mercado de câmbio o início dos leilões de dólar promovidos pelo Banco Central (BC) no mercado à vista — a autoridade aceitou propostas por US$ 200 milhões, de um lote total que poderia ir até US$ 550 milhões. Os leilões ocorrerão até o dia 29.
Juros em baixa
Em meio à expectativa em relação ao Fed e à tranquilidade no dólar à vista, as curvas de juros fecharam em baixa nesta quarta-feira, tanto na ponta curta quanto na longa.
Os DIs com vencimento em janeiro de 2021 recuaram de 5,43% para 5,36%, e os para janeiro de 2023 caíram de 6,44% para 6,34%. No vértice longo, as curvas com vencimento em janeiro de 2025 foram de 6,95% para 6,85%.