A vingança dos touros
Estamos novamente vivendo um bull market. Mas a bolsa já subiu demais novamente? É hora de vender? Leia no texto do colunista Ivan Sant’Anna

Com o Ibovespa fechando na sexta-feira, 11 de dezembro, a 115.130 pontos, podemos afirmar, com absoluta convicção, que estamos em pleno bull market no mercado de ações, bull market esse que, em certos momentos deste ano ímpar de 2020, parecia algo impossível de acontecer.
A máxima do ano (pelo menos até agora), 119.527 pontos, ocorreu em 23 de janeiro. Naquela ocasião, começaram a surgir notícias a respeito de um surto epidêmico na cidade de Wuhan, província de Hubei, no interior da China.
Com os traders atemorizados, a Bolsa brasileira encerrou um ciclo de alta iniciado em dezembro de 2016, a 58 mil pontos, quando se percebeu que o presidente Michel Temer dava início a um programa de reformas liberalizantes na economia.
Do high de 2020, a B3 levou um tombaço. Em apenas três meses, o índice caiu impressionantes 47%, fazendo a mínima do ano a 63.569 pontos no dia 23 de março. Naquela ocasião, a pandemia, após se espalhar pela Ásia e Europa, tomara o rumo das Américas, Norte e Sul.
Iniciou-se, então, teoricamente contrariando todos os fundamentos, o formidável bull market, do qual falo no primeiro parágrafo desta crônica e que estamos vivendo agora.
Aqueles que compraram nas mínimas do ano estão ganhando em média (considerando o Ibovespa como régua) 79%.
Leia Também
Bull markets não necessariamente têm uma lógica. Quem aguentou o tranco até aquele 23 de março, topava qualquer parada. E parada foi o que o mercado fez, antes de tomar rumo norte.
Essas coisas, a gente só percebe depois que se materializam. E os que detectam a reversão logo no início lavam a égua.
Entre outros fundamentos, a alta da Bolsa se deveu aos cortes na taxa Selic até 2% ao ano, a menor de toda a série histórica do Copom.
Os fundos de renda fixa passaram a apresentar “rendimentos” reais negativos. A poupança, nem se fala.
A pergunta de um milhão de dólares é até onde o mercado poderá subir. Tocar na máxima de 119.527 e seguir adiante é a hipótese mais provável.
Nesse caso, 2020 será um ano com resultado positivo para a Bolsa, apesar de mais de um milhão e meio de mortes causadas pela pandemia, número esse equivalente a 500 onzes de setembro ou 625 Pearl Harbors ou 10 Hiroshimas.
A melhor maneira de entender o que se passa na cabeça dos investidores é raciocinar como a maioria deles.
Digamos que nesse desce-e-sobe um cara que, em determinado momento, chegou a perder 40% do valor de sua carteira recuperou seu prejuízo.
Será que ele vai dizer: "Pronto, me safei. Vou liquidar tudo e voltar para o meu Tesouro Direto"?
Acho difícil. Nessa volta do mercado, ele aprendeu a ganhar, mesmo que seja apenas aquilo que tinha perdido. E o Tesouro Direto, mal e porcamente, vai, na melhor das hipóteses, proporcionar um decepcionante zero a zero.
Há também aquele que comprou ações nesses últimos nove meses. O cara está lucrando, por exemplo, uns 25 por cento. Esse pode pular fora da Bolsa a qualquer momento.
Ele pode estar pensando: “Pô, ganhei um quarto do meu dinheiro. Agora vou pôr num fundo de renda fixa. Pode não render nada mas não vai tomar de volta minha grana.”
O mercado é a média de todas essas decisões e indecisões individuais.
A verdade é que os bull markets são imprevisíveis. O Ibovespa pode subir até 150 mil, 175 mil, 200 mil? Pode. Mas se vai acontecer é outra conversa. A notícia mais alvissareira das últimas semanas é que o dinheiro dos gringos está voltando para a Bolsa brasileira.
O mood do mercado de ações em todo o mundo, apesar da pandemia e do declínio econômico, é de alta por causa das taxas de juros baixíssimas e até mesmo negativas.
No Japão, se paga 0,15% para ter títulos de dois anos do governo. Na Suíça, os bancos cobram 0,58% ao ano para ficar com seu dinheiro por uma década. Na Holanda, 0,47%.
Não há como as Bolsas de Valores não subirem nesse quadro de taxas de juros.
Uma coisa que sempre costumo dizer é que o mercado não reflete aquilo que aconteceu, nem mesmo o que está acontecendo, muito menos aquilo que vai acontecer mas sim “o que não pode deixar de acontecer”.
E se há uma coisa que não poderá deixar de acontecer é o fim da pandemia, seja através da vacinação em massa, imunização de rebanho ou um medicamento salvador.
Quem sabe, até tudo isso ao mesmo tempo.
Já testemunhei ou estudei incontáveis bull markets.
O dos anos 1920, the Roaring Twenties, nos Estados Unidos, durou seis anos, de 1923, após o colapso imobiliário da Flórida, até o dia seguinte ao Labor Day (1ª segunda-feira de setembro) de 1929.
O crash para valer, onde a maioria dos papéis virou pó, aconteceu na Black Tuesday (o politicamente correto logo irá mudar esse nome), em 29 de outubro daquele ano.
Dali em diante, o mercado foi escorregando até que, no dia 8 de julho de 1932, em plena Grande Depressão, aconteceu o dia mais santo de compra na Bolsa de Valores de Nova York em todos os tempos.
Naquele data, que mal foi percebida pelos investidores, o Dow bateu 41,22.
Se considerarmos as quedas ocorridas desde aquele dia até hoje como correções, o atual bull market da NYSE já dura 88 anos e meio.
Nesse período, o Dow subiu 79.209,70%. Descontando a inflação americana no período, mesmo assim o ganho foi de 3.757,12%.
Isso é coisa de bisavô para bisneto.
Aqui no Brasil, assisti um bull market curioso, ocorrido no governo João Goulart (1961-1964).
Embora Jango lutasse pela estatização das empresas estrangeiras, reforma agrária abrangente e tentasse transformar o Brasil em uma república sindical, durante boa parte de seu mandato a Bolsa subiu. Isso por causa da reavaliação dos ativos das sociedades anônimas.
Naquela época, as ações eram negociadas por valores altos. A da Cia. Siderúrgica Belgo Mineira, por exemplo, valia mais do que um salário mínimo.
Com a reavaliação dos ativos, um papel que era cotado em Bolsa por Cr$ 21.000,00, dando uma bonificação de mil por uma, passou a custar Cr$ 21,00. Passar de 21 para 42 era sopa. Daí a alta considerável, apesar dos riscos de socialização do país.
Com a tomada do poder pelos militares, em 1964, a lógica indicava que as Bolsa iriam subir. Afinal de contas, o país se livrara de uma “cubanização”.. Mas não.
A dupla Roberto Campos/Otávio Gouveia de Bulhões pôs em marcha uma política monetária extremamente hawkish, com as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional rendendo correção monetária mais juros anuais de 6% a 8% ao ano, dependendo do prazo de vencimento.
Isso levou a Bolsa de Valores a um tombaço.
Debelada a inflação, que caiu de 92,1% a.a. (1964) para 19,2%, 19,3% (1969), teve início o que para mim foi o bull market mais fascinante que já aconteceu no Brasil. Isso porque envolveu quase toda a classe média e alta. Todo mundo queria aplicar na Bolsa.
Os pregões eram televisionados. Quem estava de fora do mercado de ações era considerado um alienado.
Nessa época, eu era operador de pregão na Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, a mais importante das inúmeras que havia no país.
Só que a quantidade de IPOs fajutos, sem a menor sustentabilidade, e o modo desonesto como os fundos de ações eram administrados, puseram fim à euforia, dando lugar a um bear market que durou quase uma década.
Mais tarde, já nos anos 1980, o desafio do mercado de ações era bater a inflação, que ameaçava virar hiper, como acabou acontecendo.
Um crescimento mensal de 20% do Ibovespa podia não significar absolutamente nada, com uma alta de preços no mesmo período de 25% ou 30%.
Um dos bull markets mais desconcertantes do mercado brasileiro de ações se iniciou nos últimos meses do segundo mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso.
O PT, com o candidato Lula, era franco favorito. Só que, desde sua fundação, o Partido dos Trabalhadores prometera que, tão logo assumisse o poder, decretaria moratórias externa e interna, estatizaria os bancos e faria uma reforma agrária de grandes proporções, distribuindo as terras dos latifúndios.
Quando se tornou óbvio que Lula venceria as eleições presidenciais de 2002, o dólar subiu a R$ 3,954, equivalentes hoje a R$ 15,31.
A Bolsa caiu e houve grande fuga de capitais do Brasil, inclusive de poupadores da classe média.
Lula escolhera o médico Antonio Palocci, prefeito da cidade de Ribeirão Preto, para chefiar seu gabinete de transição.
Em seus contatos com banqueiros e empresários paulistas, Palocci fez ver que o governo petista iria manter, e até reforçar em alguns pontos, a política econômica de Pedro Malan e de Arminio Fraga, respectivamente ministro da Fazenda e presidente do Banco Central na administração Fernando Henrique.
Palocci acabou assumindo o ministério da Fazenda de Lula. Uma de suas primeiras providências foi aumentar a meta de superávit (sim, nós já tivemos superávit nas contas públicas) primário.
Aliando o capitalismo travestido de socialismo da cleptocracia Lula a uma alta no preço das commodities, esse bull market durou de setembro de 2002 (em pleno governo FHC) até o auge da crise americana do subprime (maio de 2008).
Nesse período, o Ibovespa se valorizou nada mais nada menos do que 702%. Como, paralelamente, o dólar não fez outra coisa a não ser cair frente ao real, o ganho com ações, quando medido na moeda americana, foi absurdo.
Ou seja, bull markets de ações não podem ser dimensionados por regras simples do tipo x + y = z.
Cada uma dessas altas tem suas características específicas.
O atual ciclo do touro se ancora nas taxas de juros negativas e só deverá terminar quando elas voltarem a ser atraentes.
Nesse ínterim, ocorrerão algumas fortes quedas que deverão ser encaradas como pontos de compra e algumas altas exageradas que serão seguidas de correções, as “saudáveis realizações de lucros”, como os traders e analistas gostam de classificá-las.
No momento, com os números tenebrosos da Covid-19 já precificados nas cotações, não há nada no horizonte mostrando que chegou a hora de vender.
Mais conteúdos Premium:
- Os melhores fundos imobiliários para investir em dezembro segundo 7 corretoras
- Um fundo de ações para turbinar a sua previdência em tempos de juros baixos
- Para fechar 2020 com chave de ouro: as ações favoritas para o mês de dezembro, segundo 14 corretoras
- Vacina ou vírus? Ganhe nos dois cenários com este IPO na bolsa
JP Morgan rebaixa Natura (NTCO3) após tombo de 30% das ações; empresa lança programa de recompra
Para o banco, tendências operacionais mais fracas de curto prazo e níveis elevados de ruídos devem continuar a fazer preço sobre as ações NTCO3; saiba o que fazer com os papéis agora
O rugido do leão: Ibovespa se prepara para Super Semana dos bancos centrais e mais balanços
Além das decisões de juros, os investidores seguem repercutindo as medidas de estímulo ao consumo na China
Depois de sofrer um raro ‘apagão’ e cair 20% em 2024, o que esperar de uma das ações preferidas dos ‘tubarões’ da Faria Lima e do Leblon?
Ação da Equatorial (EQTL3) rendeu retorno de cerca de 570% na última década, bem mais que a alta de 195% do Ibovespa no período, mas atravessou um momento difícil no ano passado
Ibovespa tem melhor semana do ano e vai ao nível mais alto em 2025; Magazine Luiza (MGLU3) e Natura (NTCO3) destacam-se em extremos opostos
Boa parte da alta do Ibovespa na semana é atribuída à repercussão de medidas adotadas pela China para impulsionar o consumo interno
Bolsa em disparada: Ibovespa avança 2,64%, dólar cai a R$ 5,7433 e Wall Street se recupera — tudo graças à China
Governo chinês incentiva consumo e uso do cartão de crédito, elevando expectativas por novos estímulos e impulsionando o mercado por aqui
Eztec (EZTC3) sobe forte com balanço do 4T24 e previsões ainda mais fortes para 2025. É hora de comprar ações da construtora?
Analistas destacam os resultados positivos em meio a um cenário macroeconômico deteriorado. Saiba de é hora de investir em EZTC3
Prio (PRIO3) sobe mais de 7% após balanço do quarto trimestre e fica entre as maiores altas do dia — mas ainda há espaço para mais
Os resultados animaram os investidores: as ações PRIO3 despontaram entre as maiores altas do Ibovespa durante todo o dia. E não são apenas os acionistas que estão vendo os papéis brilharem na bolsa
Vem divórcio? Azzas 2154 (AZZA3) recua forte na B3 com rumores de separação de Birman e Jatahy após menos de um ano desde a fusão
Após apenas oito meses desde a fusão, os dois empresários à frente dos negócios já avaliam alternativas para uma cisão de negócios, segundo a imprensa local
Magazine Luiza (MGLU3) vai acelerar oferta de crédito em 2025 mesmo com juros em alta, diz Fred Trajano
O CEO do Magalu afirma que, diante de patamares controlados de inadimplência e níveis elevados de rentabilidade, “não há por que não acelerar mais o crédito”
Magazine Luiza (MGLU3) salta 17% e lidera ganhos do Ibovespa após balanço — mas nem todos os analistas estão animados com as ações
A varejista anunciou o quinto lucro trimestral consecutivo no 4T24, com aumento de rentabilidade e margem, mas frustrou do lado das receitas; entenda
Frenetic trading days: Com guerra comercial no radar, Ibovespa tenta manter bom momento em dia de vendas no varejo e resultado fiscal
Bolsa vem de alta de mais de 1% na esteira da recuperação da Petrobras, da Vale, da B3 e dos bancos
O que não mata, engorda o bolso: por que você deveria comprar ações de “empresas sobreviventes”
Em um país que conta com pelo menos uma crise a cada dez anos, uma companhia ter muitas décadas de vida significa que ela já passou por tantas dificuldades que não é uma recessãozinha ou uma Selic de 15% que vai matá-la
“A Selic vai aumentar em 2025 e o Magazine Luiza (MGLU3) vai se provar de novo”, diz executivo do Magalu, após 5º lucro consecutivo no 4T24
A varejista teve lucro líquido de R$ 294,8 milhões no quarto trimestre de 2024, um avanço de 38,9% no comparativo com o ano anterior
Nem Trump para o Ibovespa: índice descola de Nova York e sobe 1,43% com a ajuda de “quarteto fantástico”
Na Europa, a maioria da bolsas fechou em baixa depois que o presidente norte-americano disse que pode impor tarifas de 200% sobre bebidas alcoólicas da UE — as fabricantes de vinho e champagne da região recuaram forte nesta quinta-feira (13)
Ação da Casas Bahia (BHIA3) tomba 13% após prejuízo acima do esperado: hora de pular fora do papel?
Bancos e corretoras reconhecem melhorias nas linhas do balanço da varejista, mas enxergam problemas em alguns números e no futuro do segmento
CSN Mineração (CMIN3) chega a saltar mais de 10% com balanço forte do 4T24 — e CSN (CSNA3) acompanha alta. Vale a pena investir nas ações agora?
Ambas as empresas anunciaram resultados do quarto trimestre acima do projetado pelo mercado; veja o que dizem os analistas
B3 (B3SA3) não precisa de rali da bolsa para se tornar atraente: a hora de investir é agora, diz BTG Pactual
Para os analistas, a operadora da bolsa brasileira é mais do que apenas uma aposta em ações — e chegou o momento ideal para comprar os papéis B3SA3
Da explosão do e-commerce à recuperação extrajudicial: Casas Bahia (BHIA3) deixou o pior para trás? Prejuízo menor no 4T24 dá uma pista
As ações da varejista passam por um boom na bolsa, mas há quem diga que esse movimento não está ligado diretamente com a recuperação do setor; confira o desempenho da companhia entre outubro e dezembro deste ano
“As ações da nossa carteira têm capacidade para até triplicar de valor”, diz gestor de fundo que rende mais que o dobro do Ibovespa desde 2008
Cenário de juros em alta, risco fiscal e incerteza geopolítica parece pouco convidativo, mas representa oportunidade para o investidor paciente, diz Pedro Rudge, da Leblon Equities
As Sete Magníficas viraram as Sete Malévolas: Goldman Sachs corta projeções para a bolsa dos EUA
O banco reduziu as previsões para o S&P 500, o índice mais amplo da bolsa de Nova York, citando preocupações com o grupo formado por Amazon, Alphabet, Apple, Meta, Microsoft, Nvidia e Tesla