Dizem que o ano novo começa para valer no Brasil a partir de hoje, passado o carnaval. E o mercado financeiro dá as boas-vindas a 2019 com uma dose de realidade que pressiona os ativos de risco. Aqui, é crescente a desconfiança em relação à reforma da Previdência, enquanto lá fora cresce o temor com a desaceleração da economia global.
Essa realidade se impõe aos preços dos ativos, elevando a postura defensiva dos investidores, que buscam menor exposição ao risco, diante das frustrações recentes. Afinal, o mercado financeiro vinha apostando que a guerra comercial não impactaria a atividade nem a demanda mundial e que as novas regras para aposentadoria seriam aprovadas logo.
A percepção é de que o dólar só deve aproximar-se da faixa de R$ 3,70 e o Ibovespa, da marca dos 100 mil pontos, quando surgirem sinais de melhora na articulação política no Congresso. Ao menos não se pode negar que o presidente Jair Bolsonaro entrou de vez na batalha da comunicação pela aprovação da nova Previdência - sem muita “desidratação”.
Assim, os investidores ficarão atentos nesta semana à instalação da primeira comissão na Câmara que irá avaliar a proposta da reforma, a de Constituição e Justiça. A expectativa é de que a CCJ seja formada na quarta-feira, mas os deputados estão fazendo “jogo duro” e dizem que só irão compor a comissão quando a reforma dos militares chegar ao Congresso.
A indicação dos partidos para os integrantes do colegiado começa. Mas a criação da CCJ pode se arrastar por mais uma semana, já que a expectativa é de que a equipe econômica envie a proposta de mudanças de regras dos não civis até o dia 20. Mesmo que a CCJ seja instalada, a reforma não deve andar sem o texto dos militares - que só deve ser votado após o envio da Previdência ao Senado.
Pé no freio
Até lá, os negócios locais devem seguir reféns do exterior, onde a perda de tração da atividade global tem se intensificado pelas principais economias centrais. Os dados fracos sobre o emprego nos Estados Unidos (payroll) em fevereiro levantaram dúvidas quanto a um contágio.
Esse cenário é compatível com a manutenção da política monetária pelo Federal Reserve e com a nova rodada de estímulos por parte do Banco Central Europeu (BCE). O problema é que os rendimentos do trabalhador nos EUA seguiram em alta, o que desenha um quadro inflacionário no país à frente e pode colocar o Fed em uma encruzilhada.
Afinal, a maior economia do mundo estaria perdendo dinamismo, o que sugere juros estáveis, ou será preciso combater um processo de alta nos preços, com mais aperto monetário. Os investidores tentam, então, mensurar se a pior geração de vagas no EUA em 17 meses foi um ponto fora da curva ou se seria o começo de uma tendência preocupante.
Nessa equação, não se pode esquecer do impacto da guerra tarifária no custo dos produtos às empresas e ao consumidor final. Por ora, porém, os investidores seguem otimistas de que EUA e China vão alcançar um acordo comercial, apesar dos sinais recente mais desfavoráveis.
Com isso, os índices futuros das bolsas de Nova York amanheceram em alta, tentando interromper a sequência de cinco quedas seguidas na semana passada. O desempenho negativo na última sexta-feira pesou ainda na Ásia, onde a maioria das bolsas recuou, à espera de novos desdobramentos sobre as negociações comerciais sino-americanas.
Já as principais praças europeias apontam para uma abertura positiva. Nos demais mercados, o rendimento (yield) do bônus dos EUA de 10 anos (T-note) segue perto do menor nível em dois meses, após o presidente do Fed, Jerome Powell, reiterar “paciência”, ao passo que o dólar também tenta se recuperar da queda ao final da semana passada.
Entre as moedas, destaque para a libra esterlina, que perde terreno antes de uma votação-chave no Parlamento britânico, amanhã, em relação à saída do Reino Unido da União Europeia (UE). Os membros do gabinete tentam convencer os conservadores a apoiar o acordo da primeira-ministro, Theresa May. Nas commodities, o petróleo sobe.
Atividade e inflação movimentam semana
A votação no Parlamento é apenas um dos destaques da carregada agenda econômica desta semana. Os destaques ficam com indicadores de inflação e atividade pelo mundo. Nos EUA, sai hoje resultado do varejo em janeiro (9h30). Amanhã, é a vez do índice de preços ao consumidor (CPI) e, no dia seguinte, do preços ao produtor (PPI), ambos referentes ao mês de fevereiro. Depois, na sexta-feira, sai a produção industrial.
É válido lembrar que os EUA entraram no horário de verão ontem, o que deixa a costa leste norte-americana mais próxima de Brasília. Com isso, os principais indicadores econômicos passam a ser conhecidos durante a manhã, sendo que o pregão em Nova York passa a funcionar das 10h30 às 17h - mesmo horário de fechamento do Ibovespa, que abre às 10h.
Na zona do euro, os dados da produção industrial saem na quarta-feira. Na sexta-feira, é a vez do CPI na região da moeda única. Na China, a semana começa com dados de inflação ao produtor e ao consumidor, à noite, e traz também o desempenho da indústria e do varejo, na quarta-feira. No Japão, tem decisão de juros, na quinta-feira.
Já no Brasil, a semana anterior encurtada pelo carnaval concentrou para os próximos dias uma série de indicadores econômicos relevantes. De amanhã até sexta-feira, por exemplo, o IBGE divulga seus principais dados. Na terça-feira, saem os números oficiais da inflação ao consumidor (IPCA), juntamente com os da safra agrícola.
No mesmo dia, tem a primeira prévia deste mês do IGP-M. Depois, começam a ser conhecidos os dados de atividade. Na quarta-feira, sai o desempenho da indústria em janeiro. Depois, na quinta-feira, é a vez do resultado do varejo no início deste ano e, no dia seguinte, na sexta-feira, será divulgada pesquisa do setor de serviços.
Também neste dia, sai o primeira IGP fechado de março, o IGP-10. Já no calendário de balanços, destaque para os resultados trimestrais das concessionárias de rodovias, CCR e Ecorodovias, além de Braskem e Embraer, que serão conhecidos entre quarta e quinta-feira. Hoje, sai o relatório de mercado Focus do Banco Central (8h25).