Os yields devem estar loucos: entenda os impactos da alta dos juros nos EUA
2022 promete ser um ano no qual enfrentaremos o desconhecido. Não só pelos impactos da pandemia, mas também pela normalização monetária
Muitas vezes não entendemos sinalizações que deveriam nos ser bastante claras. Consequentemente, sem compreender por inteiro os desdobramentos das variáveis que nos cercam, nos sentimos perdidos.
É como a tribo africana, no clássico de 1980 "Os Deuses Devem Estar Loucos", ao receber dos céus um presente dos Deuses: uma garrafa de Coca-Cola. Cada um interpreta o desconhecido à sua maneira.
De maneira similar, 2022 promete ser um ano no qual enfrentaremos o desconhecido. Isso não só pelo fato de ainda vivermos em um mundo afetado pela pandemia, mas também por estarmos em um contexto de normalização monetária, que implica em mudanças nos mercados financeiros.
Por isso, entendo a inflação e as movimentações dos Bancos Centrais ao redor do mundo como o ponto central de atenção no ano.
Em especial nos EUA, que serve de balizador para a taxa de juros dos demais países por uma questão de arbitragem de retornos.
Estresse na curva de juros já provoca ajuste nos ativos de risco
Tanto é verdade que o estresse recente na curva de juros vem provocando um movimento de ajuste nos preços dos ativos de risco em nível global, com particular sensibilidade adicional em investimentos emergentes que seguem o ritmo americano, como no caso brasileiro.
Leia Também
Um pouco antes do Natal, entre os dias 19 e 20 de dezembro, o rendimento dos títulos do tesouro americano com vencimento em 10 anos, considerado a taxa livre de risco global, repousava tranquilamente abaixo de 1,40%.
Em poucas semanas, porém, esta taxa avançou para a proximidade de 1,80%. São 40 pontos-base, uma quantia não ignorável para alguns pregões, o que provocou algumas coisas no mundo.
Juros ainda estão baixos no mundo desenvolvido
Em primeiro lugar, um ajuste marginal de renda variável para renda fixa acontece. Naturalmente, os juros ainda estão muito baixos no mundo desenvolvido, o que ainda enseja certa atratividade aos ativos de risco.
Contudo, como a taxa de juros nos EUA serve de base para outros países, que precisam pagar um prêmio adicional para atrair capital, a migração para renda fixa pode ser mais notável, como acontece no Brasil.
Ou seja, a preocupação com a subida das taxas de juros em âmbito global machucou os ativos.
Brasil acrescenta elementos domésticos ao risco externo
No Brasil, se a isso somarmos fatores técnicos de mercado e elementos domésticos ligados a temores com a situação fiscal dentro de um ano eleitoral, encontramos as justificativas para a correção recente. O Ibovespa caiu 2%, enquanto o SMAL11 perdeu 10%, indicando um comportamento mais adverso entre as smallcaps.
Como poucos setores pesam muito no índice, a média ponderada é distorcida por poucos nomes, escondendo o que realmente representaria um comportamento médio das ações brasileiras.
Se você tirar bancos e commodities da semana passada, por exemplo, o que aconteceu foi um verdadeiro movimento de sell-off generalizado, em especial nas teses cíclicas domésticas e nas de crescimento.
Rotação setorial
Em segundo lugar, entre os ativos de risco, como ações, nota-se o que se chama de "rotação setorial", em que os recursos passam de ativos ligados a crescimento para investimentos focados em valor (desconto).
Isso acontece porque teses de crescimento possuem seus fluxos de caixa muito no futuro; neste caso, se a taxa de juros sobe, tais fluxos são trazidos a valor presente por uma taxa maior e, portanto, valem menos.
É o que tem acontecido desde o início de 2022, de maneira similar com o início de 2021: uma rotação extrema de crescimento para valor.
Na verdade, nos EUA, a rotação tem sido tão intensa que o atual spread de desempenho de janeiro entre os quintis mais baratos e mais caros das ações é de 12%, o que se classifica no 98º percentil dos spreads mensais dos últimos 44 anos (só ocorreram em oito meses no período).
Juros em alta prejudicam ativos com duration longa
Em outras palavras, juros subindo no mundo é negativo para ativos com duration longa. Isto é, os fluxos de caixa lá na frente representam muito menos hoje se trazidos a valor presente por uma taxa de desconto mais alta.
Por anos e anos, havia liquidez farta para alimentarmos as promessas de, lá na frente, haver geração de caixa. O custo agora, entretanto, está cada vez mais elevado.
À medida que os mercados precificam a decolagem das taxas de juros nos EUA, os rendimentos buscam patamares cada vez mais altos.
O rendimento do Tesouro de 10 anos subiu mais 30 bps para 1,80% desde 1º de janeiro. Os rendimentos reais, ajustados pela inflação, também subiram em um ritmo nunca visto desde o auge da pandemia, em março de 2020.
Tais acontecimentos se dão pelo fato de termos uma inflação acentuada correndo solta no mundo hoje. Curiosamente, hoje (terça-feira) teremos a atualização dos preços ao consumidor no Brasil e, amanhã (quarta-feira), nos EUA.
As pressões pós-pandêmicas ainda são sentidas no poder de compra, que foi corroído nos últimos meses. Em resposta, como já poderíamos esperar, foi iniciada a normalização monetária.
No Brasil, este processo já começou há alguns meses e deverá caminhar até levar a Selic à faixa entre 11,75% e 12,50%.
Os caminhos do Fed
Nos EUA, por sua vez, protagonistas do texto de hoje, o processo se dará por três avenidas:
- tapering, ou redução do nível de compras extraordinárias, que se deram por conta da crise;
- elevação dos juros; e
- redução do balanço da autoridade monetária.
A postura cada vez mais agressiva do Federal Reserve continua a surpreender os mercados, mais recentemente após as atas do banco central de sua reunião de dezembro, divulgadas na semana passada, sinalizando preocupação com o nível da inflação, não mais carinhosamente apelidada de transitória, e satisfeito com a recuperação no mercado de trabalho americano.
Consequentemente, os itens acima elencados acontecerão mais rapidamente do que o antecipado anteriormente pelo mercado. Como se não bastasse, depois do relatório de emprego da última sexta-feira, alguns bancos começaram a agressivar paralelamente suas projeções para a autoridade monetária dos EUA, atingindo particularmente as ações de tecnologia.
Pelo menos três altas de juros são esperadas para 2022 nos EUA
O gráfico de pontos mais recente do Federal Reserve, que sinaliza as perspectivas do banco central para a trajetória das taxas de juros, atualmente mostra uma previsão mediana de três altas em 2022, embora vários participantes do mercado esperem mais.
As previsões mudaram bastante após a divulgação da ata na semana passada, que estabeleceu uma jogada tripla para o aperto da política, indicada acima.
O Goldman Sachs, por exemplo, agora vê quatro aumentos nas taxas em 2022, adicionando um aumento em dezembro à sua previsão anterior de aumentos em março, junho e setembro (o novo aperto se daria em julho ou até antes), isso porque, segundo a instituição, as atas recentes transmitem um maior senso de urgência, com a inflação provavelmente ainda muito acima da meta naquele momento.
Naturalmente, a política monetária cada vez mais rígida do Fed pode preocupar os investidores, principalmente aqueles que carregam consigo ações de alto crescimento e de países emergentes.
Há espaço para calmaria
Há, porém, espaço para calmaria nos mercados, depois de um início de ano bastante estressado, principalmente se o aumento dos rendimentos dos títulos desacelerar nas próximas semanas.
A temporada de resultados lá fora, que começa entre a quinta e a sexta-feira, pode ter algo a nos dizer sobre isso, principalmente se os ganhos atenderem às expectativas de Wall Street.
Isso possibilitaria uma transição mais gradual para um mundo sem estímulos. O grande problema das últimas semanas foi a brutalidade com que os movimentos se deram. Se eles ocorressem mais gradualmente, os ruídos seriam mitigados.
No Brasil, se conseguirmos essa transição para um mundo de mais gradualismo nos yields estrangeiros, podemos ter espaço para voltarmos a focarmos em nós mesmos.
A hora das small caps?
Em ano eleitoral, no aniversário de 200 anos da independência e de 100 anos da Semana de Arte Moderna, estamos vendo ativos brasileiros muito baratos, havendo espaço para comprar small caps muito castigadas, abaixo de 10 vezes lucros.
Ainda assim, como não necessariamente essa transição para o gradualismo vai acontecer, possibilitando continuidade da rotação setorial testemunhada até aqui, vejo espaço para um combo de banco com commodity (velha economia/setores tradicionais descontados) e small caps baratas e que já geram resultado.
Tudo isso, claro, feito sob o devido dimensionamento das posições, conforme seu perfil de risco, e a devida diversificação de carteira, com as respectivas proteções associadas.
Veja também - Bitcoin é anti-inflação? Maior criptomoeda do mercado pode proteger seu patrimônio da alta nos preços; entenda
Ibovespa atinge marca inédita ao fechar acima dos 150 mil pontos; dólar cai a R$ 5,3574
Na expectativa pela decisão do Copom, o principal índice de ações da B3 segue avançando, com potencial de chegar aos 170 mil pontos, segundo a XP
A última dança de Warren Buffett: ‘Oráculo de Omaha’ vai deixar a Berkshire Hathaway com caixa em nível recorde
Lucro operacional da Berkshire Hathaway saltou 34% em relação ao ano anterior; Warren Buffett se absteve de recomprar ações do conglomerado.
Ibovespa alcança o 5º recorde seguido, fecha na marca histórica de 149 mil pontos e acumula ganho de 2,26% no mês; dólar cai a R$ 5,3803
O combo de juros menores nos EUA e bons desempenhos trimestrais das empresas pavimenta o caminho para o principal índice da bolsa brasileira superar os 150 mil pontos até o final do ano, como apontam as previsões
Maior queda do Ibovespa: o que explica as ações da Marcopolo (POMO4) terem desabado após o balanço do terceiro trimestre?
As ações POMO4 terminaram o dia com a maior queda do Ibovespa depois de um balanço que mostrou linhas abaixo do que os analistas esperavam; veja os destaques
A ‘brecha’ que pode gerar uma onda de dividendos extras aos acionistas destas 20 empresas, segundo o BTG
Com a iminência da aprovação do projeto de lei que taxa os dividendos, o BTG listou 20 empresas que podem antecipar pagamentos extraordinários para ‘fugir’ da nova regra
Faltou brilho? Bradesco (BBDC4) lucra mais no 3T25, mas ações tombam: por que o mercado não se animou com o balanço
Mesmo com alta no lucro e na rentabilidade, o Bradesco viu as ações caírem no exterior após o 3T25. Analistas explicam o que pesou sobre o resultado e o que esperar daqui pra frente.
Montanha-russa da bolsa: a frase de Powell que derrubou Wall Street, freou o Ibovespa após marca histórica e fortaleceu o dólar
O banco central norte-americano cortou os juros pela segunda vez neste ano mesmo diante da ausência de dados econômicos — o problema foi o que Powell disse depois da decisão
Ouro ainda pode voltar para as máximas: como levar parte desse ganho no bolso
Um dos investimentos que mais renderam neste ano é também um dos mais antigos. Mas as formas de investir nele são modernas e vão de contratos futuros a ETFs
Ibovespa aos 155 mil pontos? JP Morgan vê três motores para uma nova arrancada da bolsa brasileira em 2025
De 10 de outubro até agora, o índice já acumula alta de 5%. No ano, o Ibovespa tem valorização de quase 24%
Santander Brasil (SANB11) bate expectativa de lucro e rentabilidade, mas analistas ainda tecem críticas ao balanço do 3T25. O que desagradou o mercado?
Resultado surpreendeu, mas mercado ainda vê preocupações no horizonte. É hora de comprar as ações SANB11?
Ouro tomba depois de máxima, mas ainda não é hora de vender tudo: preço pode voltar a subir
Bancos centrais globais devem continuar comprando ouro para se descolar do dólar, diz estudo; analistas comentam as melhores formas de investir no metal
IA nas bolsas: S&P 500 cruza a marca de 6.900 pontos pela 1ª vez e leva o Ibovespa ao recorde; dólar cai a R$ 5,3597
Os ganhos em Nova York foram liderados pela Nvidia, que subiu 4,98% e atingiu uma nova máxima. Por aqui, MBRF e Vale ajudaram o Ibovespa a sustentar a alta.
‘Pacman dos FIIs’ ataca novamente: GGRC11 abocanha novo imóvel e encerra a maior emissão de cotas da história do fundo
Com a aquisição, o fundo imobiliário ultrapassa R$ 2 bilhões em patrimônio líquido e consolida-se entre os maiores fundos logísticos do país, com mais de 200 mil cotistas
Itaú (ITUB4), BTG (BPAC11) e Nubank (ROXO34) são os bancos brasileiros favoritos dos investidores europeus, que veem vida ‘para além da eleição’
Risco eleitoral não pesa tanto para os gringos quanto para os investidores locais; estrangeiros mantêm ‘otimismo cauteloso’ em relação a ativos da América Latina
Gestor rebate alerta de bolha em IA: “valuation inflado é termo para quem quer ganhar discussão, não dinheiro”
Durante o Summit 2025 da Bloomberg Linea, Sylvio Castro, head de Global Solutions no Itaú, contou por que ele não acredita que haja uma bolha se formando no mercado de Inteligência Artificial
Vamos (VAMO3) lidera os ganhos do Ibovespa, enquanto Fleury (FLRY3) fica na lanterna; veja as maiores altas e quedas da semana
Com a ajuda dos dados de inflação, o principal índice da B3 encerrou a segunda semana seguida no azul, acumulando alta de 1,93%
Ibovespa na China: Itaú Asset e gestora chinesa obtêm aprovação para negociar o ETF BOVV11 na bolsa de Xangai
Parceria faz parte do programa ETF Connect, que prevê cooperação entre a B3 e as bolsas chinesas, com apoio do Ministério da Fazenda e da CVM
Envelhecimento da população da América Latina gera oportunidades na bolsa — Santander aponta empresas vencedoras e quem perde nessa
Nova demografia tem potencial de impulsionar empresas de saúde, varejo e imóveis, mas pressiona contas públicas e produtividade
Ainda vale a pena investir nos FoFs? BB-BI avalia as teses de seis Fundos de Fundos no IFIX e responde
Em meio ao esquecimento do segmento, o analista do BB-BI avalia as teses de seis Fundos de Fundos que possuem uma perspectiva positiva
Bolsas renovam recordes em Nova York, Ibovespa vai aos 147 mil pontos e dólar perde força — o motivo é a inflação aqui e lá fora. Mas e os juros?
O IPCA-15 de outubro no Brasil e o CPI de setembro nos EUA deram confiança aos investidores de que a taxa de juros deve cair — mais rápido lá fora do que aqui