Vermute conquista nova geração com produções artesanais e casas especializadas; veja onde provar no Rio e em São Paulo
De coadjuvante a estrela, a bebida ressurge em casas especializadas no Rio e em São Paulo, ganhando produções artesanais com toque brasileiro

Ele tem origem ancestral, já foi usado em tratamentos medicinais e tem raízes na cultura mediterrânea. Estamos falando do vermute, que percorreu milênios até encontrar, em 2025, um novo status: o de estrela.
Antes restrito ao papel de ingrediente em drinks consagrados ou à memória afetiva de gerações passadas, a bebida ressurge com força no Brasil e no mundo, ganhando casas especializadas e um público curioso.
O impulso para a redescoberta de um clássico que parecia adormecido está na sua versatilidade e no trabalho de bartenders e produtores que apostam em seu potencial. Por trás do fenômeno, uma combinação de coquetelaria em alta, o desejo por bebidas de menor teor alcoólico e uma busca por sabores complexos e com história.

Guiados por especialistas, percorremos a trajetória do vermute e indicamos vermuterias em São Paulo e no Rio de Janeiro que dão novos ares à forma como se consome e se produz a bebida.
O que é o vermute, afinal?
Para entender o movimento, é preciso primeiro entender a bebida. “O vermute é, em sua essência, um vinho fortificado, ou seja, um vinho ao qual se adiciona álcool, como no vinho do Porto ou no Jerez. No entanto, ele se encaixa em uma categoria secundária: a do vinho fortificado e aromatizado com especiarias”, explica Ale Bussab, co-criador do Trinca Bar & Vermuteria, primeira casa dedicada ao vermute em São Paulo.
O ingrediente que o define e lhe dá o nome é a artemísia. “O nome da bebida, aliás, vem da palavra alemã para essa planta, wermut. Ou seja, para ser vermute, é preciso ser um vinho fortificado com uma infusão de especiarias, principalmente a artemísia”, completa Bussab.
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Apesar do nome de origem alemã, o vermute tem uma história milenar e muito mais complexa. “O vermute que conhecemos hoje evoluiu do vinho hipocrático da Grécia Antiga, usado para fins medicinais”, explica Bussab. “Sua trajetória também passa pelo oriente, onde surgiram as tinturas de ervas em álcool, muitas vezes com vinhos de arroz como base.”
Considerado um fruto do Mediterrâneo, com raízes na Grécia, Itália e França, foi na Espanha que encontrou seu mais recente polo de popularidade.
A primeira onda global
Sua primeira grande onda de fama global, porém, veio com a coquetelaria clássica, entre o final do século 19 e o início do século 20. “Bares de grandes hotéis e restaurantes na Europa e nos Estados Unidos começaram a utilizá-lo em coquetéis que se tornaram ícones, como o Dry Martini, o Manhattan e, especialmente, o Negroni”, detalha Bussab.
“Naquela época, a bebida era valorizada por sua capacidade de equilibrar drinks alcoólicos intensos com doçura, amargor e complexidade botânica. Era também uma forma de tornar os destilados mais palatáveis, já que muitos eram rústicos e pouco refinados”, completa Ricardo Takahashi, mixologista e bar manager do Song Qi.
A popularidade do vermute caiu nas décadas seguintes, especialmente a partir dos anos 1970. “Foi um período marcado por coquetéis coloridos, xaropes e sucos industrializados. O vermute passou a ser visto como algo antigo, que nossos avós bebiam. Não sabiam apreciar o old, but gold”, acredita Takahashi.

O boom espanhol e a influência na América Latina
Foi só nos anos 2000 que o vermute voltou a ganhar força, graças a um movimento de revalorização na Espanha. “A partir de 2009, ele foi redescoberto como aperitivo popular, servido puro com gelo e uma rodela de laranja, sempre acompanhado das tapas”, conta Bussab.
“Foi mais uma revalorização do que um resgate”, já que o hábito de consumir a bebida como aperitivo nunca desapareceu por completo, complementa Clarissa Paes, criadora da La Finca Vermuteria, em Paraty, no Rio de Janeiro.
Esse renascimento espanhol teve impacto direto na América Latina, especialmente na Argentina, país com forte herança europeia, onde o vermute sempre foi parte da cultura familiar. “Lá, o consumo como aperitivo é muito comum, algo que os avós ensinavam aos netos. O hábito se perdeu por um tempo, mas voltou com força. E agora vemos o mesmo acontecendo no Brasil”, afirma Paes.
O vermute no Brasil
O vermute desembarcou no Brasil entre as décadas de 1940 e 1950, trazido pela marca italiana Cinzano, e se popularizou com um ícone nacional: o Rabo de Galo. “A principal estratégia para popularizar a bebida no país foi a criação do coquetel, cujo nome é a tradução literal de cocktail. O drink, que se tornou um clássico nacional, levava originalmente cachaça e vermute”, diz Ale Bussab.
A coquetelaria brasileira, no entanto, só começou a ganhar força a partir dos anos 2010, com nomes como Derivan Ferreira, responsável por resgatar e internacionalizar o Rabo de Galo. A partir daí, o vermute voltou ao radar, mas com um novo olhar: menos industrial e mais artesanal.
“O que observamos agora é um olhar renovado sobre o vermute, principalmente no Brasil, onde esse interesse é mais recente”, afirma Clarissa Paes. “Os bartenders têm um papel fundamental, pois são eles que criam novas demandas e reintroduzem ingredientes clássicos no mercado. O sucesso recente do Negroni, por exemplo, aumentou muito a procura”, completa Bussab.
Ricardo Takahashi ainda acredita que a busca por bebidas de menor teor alcoólico e a curiosidade do consumidor também são fundamentais, assim como o papel das redes sociais. “A disseminação do consumo mundial, receitas, marcas e histórias sobre a bebida agora ficam de mais fácil acesso e aguçam ainda mais a curiosidade.”
A versatilidade é a grande virtude do vermute. Ele pode ser a base de um drink complexo ou brilhar sozinho, com gelo e uma rodela de laranja. “Ele é tão versátil que está ocupando ambos os papéis. Coadjuvante em alguns clássicos e a estrela em outros, sendo consumido puro com gelo ou até mesmo com tônica, ou água com gás”, pontua Takahashi.

Um movimento com sotaque brasileiro
Enquanto a Argentina vive um boom com mais de 70 marcas nacionais, o Brasil ainda “está engatinhando”, como define Ale Bussab, em um mercado dominado por importados. Os desafios são grandes, mas o potencial é ainda maior.
“Os principais desafios da produção e divulgação do vermute no Brasil estão ligados, em parte, ao fato de que o país ainda está se consolidando como produtor de vinhos”, analisa Clarissa Paes.
Ela relata a dificuldade inicial de educar o público. “Quando abrimos a La Finca, em 2021, percebemos claramente essa dificuldade. Muitas pessoas sequer sabiam o que era vermute.” A proposta, segundo ela, é construir o paladar do consumidor brasileiro para o vermute como aperitivo e fomentar um mercado ainda em formação.
Hoje, o Brasil começa a desenvolver sua própria linguagem em torno do vermute – tanto no consumo quanto na produção. Paes, que começou produzindo com vinho argentino e hoje utiliza uvas de Minas Gerais, é a prova viva dessa força.
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“O Brasil tem um potencial enorme: temos diferentes regiões vinícolas e uma diversidade de ervas, especiarias e frutas nativas que permitem infinitas combinações.” Um exemplo é seu vermute Mata Atlântica, que leva ingredientes como folha de pitanga e pacová, a noz-moscada brasileira.
“Acreditamos que o vermute tem tudo a ver com o clima do Brasil, com nossa cultura. Assim como o gin teve seu momento de grande destaque, acreditamos que o vermute está trilhando um caminho semelhante, mas com um caráter mais duradouro do que uma simples moda passageira”, completa.
Vermuterias em São Paulo e no Rio de Janeiro
Trinca Bar & Vermuteria
Inaugurado em 2022 pelo casal Ale Bussab e Tábata Magarão, o Trinca Bar & Vermuteria estabeleceu a primeira vermuteria artesanal de São Paulo. A aposta no potencial do vermute, antes mesmo de sua popularização recente, definiu a filosofia do negócio: ser uma casa de alta coquetelaria especializada na bebida, onde até a arquitetura é projetada para contar sua história.

A seleção é vasta: além dos cinco vermutes da casa, são 56 rótulos de todo o mundo disponíveis para degustação. Na carta de drinks, destacam-se criações autorais como o Negroni da casa, feito com um vermute tinto de Malbec e especiarias brasileiras. Sucesso desde a abertura é o Jerez Jerez Jerez, preparado com uma combinação de vermutes, cordial de cacau, cumaru e Angostura. Bussab também se orgulha do Super Hickory, com um blend inusitado de vermutes infusionado em pamonha.
Endereço: R. Costa Carvalho, 96 - Pinheiros, São Paulo
Agustín
Em um ambiente despojado no Itaim Bibi, o Agustín vem renovando o cenário da coquetelaria paulistana com uma proposta autoral e descontraída. Fruto da união criativa entre o chef Julián Rigo, o bartender Juglio Ortiz e a chef Nora Brass, o bar aposta em sabores inventivos e uma carta de drinks que celebra ingredientes frescos e preparações artesanais. O destaque da casa fica por conta da produção própria de vermutes – branco, rosso, dry e até um rosé elaborado com uvas Peverella e Moscato.

Além dos vermutes, o Agustín ainda fabrica outras bebidas, como bitter aromático, licores de café com leite clarificado, casca de limão, avelã e noz pecã, e ainda um aperitivo à base de alcachofra. Todos os xaropes também são feitos ali mesmo, refletindo o compromisso da casa com o artesanal.
Endereço: R. Carla, 53 - Itaim Bibi, São Paulo
Bar Tero Vermuteria
No coração de Botafogo, o Bar Tero se estabelece, desde 2023, como a primeira vermuteria do Rio de Janeiro. Por lá, os italianos Nicola Bara e Tobia Messa servem a bebida em uma das quatro versões artesanais da casa – branco, tinto, laranja e rosé. Além disso, há uma seleção especial, com rótulos brasileiros, italianos, franceses e argentinos.

Na carta de drinks, há criações autorais como Negroni in Farsetto, que mistura Campari, gin e goiaba ao vermute rosé da casa clarificado com iogurte de frutas vermelhas. Outra opção inesperada [e também a escolha do editor] é o El Bosque, preparado com um blend de vermutes de caju e caqui, gin, cogumelo, tomate cereja, aceto balsâmico e especiarias.
Endereço: R. Paulo Barreto 110 - Botafogo, Rio de Janeiro
La Finca Vermuteria
Fundada em 2022 em Paraty, a La Finca Vermuteria é pioneira na produção de vermute artesanal no país. O objetivo é claro: incentivar o consumo da bebida não só como ingrediente, mas também como um aperitivo. Por trás da ideia, estão Seba Despis e Clarissa Paes, que inserem o vermute e a gastronomia despojada das tapas ao clima praieiro da cidade histórica.

Entre os rótulos originais, estão o Vermut Rosso, o primeiro da marca, que equilibra a artemísia com notas de café, cacau, chocolate, canela, coentro e zimbro. Vale provar também o Mata Atlântica, criação mais recente do casal, que leva às características marcantes do vermute um blend de botânicos nativos da Mata Atlântica, como pitanga e pacova, conhecido como o cardamomo brasileiro.
Endereço: R. José Viêira Ramos, 36 - Patitiba, Paraty
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