Felipe Miranda: Parada súbita ou razões para uma Selic bem mais baixa à frente
Uma Selic abaixo de 12% ainda seria bastante alta, mas já muito diferente dos níveis atuais. Estamos amortecidos, anestesiados pelas doses homeopáticas de sofrimento e pelo barulho da polarização política, intensificada com o tarifaço

Os estudos de Guillermo Calvo envolvendo os impactos de interrupções súbitas do fluxo de capital estrangeiro sobre os mercados emergentes são bastante conhecidos. Mesmo países cujo déficit em conta corrente é financiado pelo investimento direto podem passar por “sudden stops”, paradas repentinas de liquidez externa com efeitos sobre os mercados financeiros, as moedas e o balanço de pagamentos.
Embora o escopo original do trabalho esteja circunscrito ao fluxo de capitais, com maior foco nas sucessivas crises dos anos 90 em países emergentes (México em 95, Tigres Asiáticos em 97/98, Brasil em 99), tomo emprestadas essas ferramentas para oferecer uma analogia com a hipótese de uma parada súbita da atividade econômica local e as decisões de investimento neste momento.
Antecipando a conclusão de forma mais direta, o choque exógeno do tarifaço e seus desdobramentos podem gerar uma parada (ou desaceleração mais intensa) súbita da atividade econômica brasileira, com impactos pronunciados sobre empregos e inflação.
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O corolário seria uma possível antecipação do ciclo de cortes da Selic, num processo que penetraria o ano de 2026, quando a taxa básica seria reduzida em todas as reuniões do Copom.
O impacto macroeconômico direto e imediato do tarifaço tende a ser baixo. Com as isenções, falaríamos de algo em torno de 0,2 ponto percentual do PIB, a julgar pela exposição às vendas externas aos EUA. Mas isso desconsidera efeitos de segunda ordem, que podem ser até mais intensos do que os primeiros em ambientes de alta complexidade e interdependência.
Conforme alertou Marcos Lisboa no Estadão, as consequências podem ser maiores do que as pessoas imaginam porque desorganizam cadeias produtivas.
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Expectativas sobre o futuro
Há de se lembrar ainda como agentes econômicos obedecem a incentivos e pautam suas decisões na expectativa sobre o futuro.
E qual é esse futuro? Haverá novas isenções e a situação terminará mais construtiva do que o inicialmente contemplado? Ou será o contrário? Teremos novas retaliações ao Brasil a partir da prisão domiciliar do ex-presidente Bolsonaro?
E o que acontece quando terminar seu julgamento no STF? Temos já contratada uma nova crise entre os poderes brasileiros? Como fica a votação da pauta econômica no Congresso? Os demais ministros do STF acompanharão as decisões de Alexandre de Moraes sob o risco de sanções sobre si e sua família?
Os EUA romperão relações diplomáticas com o Brasil? Se Lula for reeleito, eles reconhecerão a legitimidade do pleito brasileiro? Um maior alinhamento ao Eixo das ditaduras vai machucar os valores ocidentais clássicos constitutivos da natureza brasileira?
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As pessoas se dividem em apenas dois grupos sobre as perguntas acima: aquelas que não sabem, e aquelas que acham que sabem. Há grande dispersão de resultados possíveis, inclusive com o risco de cauda mais negativo.
Quando isso acontece, todo mundo trava. O consumidor posterga compras de produtos não-essenciais, o empresário segura investimentos. E pela imposição direta do tarifaço, as exportações líquidas também são afetadas de maneira negativa.
A retração (ou, ao menos, desaceleração) de três dos quatro integrantes clássicos da demanda agregada (consumo, investimento, gastos do governo e exportações líquidas) acontece num momento em que a economia brasileira já dava sinais de algum resfriamento na margem.
O Caged cria menos postos de trabalho do que o apontado em ano anterior, com o último número vindo um pouco abaixo das projeções; os PMIs mais recentes indicam morosidade da atividade.
Em paralelo, com o mercado americano, em termos práticos, fechado para boa parte de nossa pauta de exportações a partir do tarifaço, aumenta a oferta interna. Carne, café, tilápia são apenas alguns dos exemplos mais midiáticos cujos preços já recuam nas gôndolas.
O IPCA de agosto deve ser negativo. Marcamos hoje a décima primeira redução semanal consecutiva das expectativas de inflação. Outra rodada de revisão para baixo nas projeções está contratada.
Os EUA e a Selic
Os ventos externos empurram na mesma direção. O dólar se enfraquece no mundo, seja por conta da “Bananification” dos EUA (termo de John Authors para se referir às medidas mais parecidas com aquelas adotadas em repúblicas de bananas), seja pelo prognóstico crescente de que o Fed poderia cortar sua taxa básica de juros em três vezes neste ano.
E se o juro vai para a casa de 3% por lá, fica difícil a defesa de uma Selic a 15% por tanto tempo. O diferencial de juros tende a atrair o capital estrangeiro interessado no carry (carrego).
Vender dólar e apostar na queda do pré curto parecem estratégias com boa assimetria. Em se confirmando, também abriria espaço para valuations melhores e aumento dos lucros corporativos.
Uma Selic abaixo de 12% ainda seria bastante alta, mas já muito diferente dos níveis atuais. Estamos amortecidos, anestesiados pelas doses homeopáticas de sofrimento e pelo barulho da polarização política, intensificada com o tarifaço.
Quando passar o período de excepcionalidade, o preço dos ativos será outro. A interrupção súbita da atividade brasileira é a antessala de uma Selic bem menor, ainda que Galípolo tente soar hawkish (duro) no curto prazo. O discurso em prol do aperto é a pré-condição para um afrouxamento à frente. Depois, tudo ficará óbvio…
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