A chance de uma trapalhada: por que o mercado está tão cético com o arcabouço fiscal
Em meio a ruídos políticos, governo precisa tirar o arcabouço fiscal da frente para avançar com a reforma tributária

O Brasil vive uma semana importante, às vésperas da Super Quarta de 3 de maio, quando teremos definição de política monetária no Brasil e nos Estados Unidos.
Acontece que a decisão por aqui está lastreada não só na inflação corrente, mas, sim, nas expectativas de inflação, as quais estão sem ancoragem há algum tempo.
Em outras palavras, ainda que o IPCA-15 de abril, a prévia da inflação oficial, venha na quarta-feira (26) abaixo do esperado, como aconteceu no IPCA de março no início do mês, ainda teríamos que enfrentar o problema das expectativas dos investidores, que estão bem céticos quanto às intenções do atual governo para com a inflação.
O principal vetor de preocupação?
O arcabouço fiscal: a regra que substituirá o teto de gastos e que foi apresentada formalmente ao mercado e ao Congresso nos últimos dias — desde o final de março sabíamos a ideia geral, mas foi só recentemente que conhecemos o texto finalizado, com todas as suas exceções.
Não apenas o detalhamento frustrou um pouco o humor dos investidores, mas a dependência exacerbada em aumento de arrecadação para sustentar a nova âncora gera preocupação, aumentando as incertezas sobre a intenção de zerar o déficit público em 2024.
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Conforme podemos observar no gráfico abaixo, criado com excelência pelo time de altíssimo nível da Wealth High Governance (WHG), a carga tributária no Brasil já é extremamente elevada para um país de renda média. Em outras palavras, um ajuste fiscal baseado em mais receita parece carecer do principal foco de atenção: o gasto.
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Note como as receitas do governo brasileiro (em % PIB) se aproximam mais da média dos países desenvolvidos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) do que da média da América Latina. Infelizmente, porém, rever o destino dessas receitas não parece ser um trabalho para os próximos quatro anos.

Governo precisa aprovar arcabouço fiscal para andar com reforma tributária
Com o ceticismo em relação à conquista de receita, o cronograma fica cada vez mais apertado. O governo precisa aprovar o quanto antes a regra para entrar no segundo tema de peso do ano: a reforma tributária.
Conhecemos a caricatura brasileira, com a grande quantidade de horas gastas por uma empresa em um ano para honrar tributos, considerando o preparo, a declaração e o pagamento (estima-se mais de 1.500 horas por ano).
Uma proposta para reformar minimamente o sistema tributário, portanto, seria muito bem-vinda. Para ilustrar, recorro novamente aos amigos da WHG, que comentaram recentemente sobre a nota técnica preparada para o Centro de Cidadania Fiscal.
O estudo "Impactos macroeconômicos estimados da proposta de reforma tributária consubstanciada na PEC 45/2019", do economista Bráulio Borges, mostra os benefícios da reforma tributária, impactando o PIB potencial de diferentes formas:
- i) melhora no ambiente de negócios (menos tempo gasto com impostos);
- ii) redução de ruído da guerra fiscal entre os estados;
- iii) diminuição das renúncias fiscais (um dos focos do time do Haddad); e
- iv) menor oneração dos investimentos (geram riqueza a longo prazo).

Por que o mercado está tão cético
Uma coisa chama a atenção, porém. Não há nada para o curto prazo. Aliás, a diferença entre os frutos colhidos com 5 e 10 anos de reforma é impressionante.
Dito de outra maneira, os impactos da reforma demoram algum tempo até serem sentidos de maneira mais intensa (transição entre os regimes de tributos).
Ou seja, precisamos de receita e resultado hoje, quando a reforma tributária, ainda que seja um caminho, não deverá trazer bons frutos tão cedo. Por isso vemos o mercado tão cético.
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Ruído político não ajuda
Para piorar, tivemos o caso do ministro chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), Gonçalves Dias, que pediu exoneração do cargo depois da divulgação de imagens que mostram sua suposta conivência com as manifestações no dia 8 de janeiro.
O movimento gerou um receio de que a instalação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investigará os atos possa atrapalhar a tramitação do arcabouço, gerando mal-estar adicional sobre os ativos de risco locais — corremos contra o tempo, tendo este trimestre para aprovar o arcabouço e o próximo semestre para a reforma tributária.
Se perdermos 2023, a janela não se abrirá tão cedo (2024 é ano eleitoral).
Francamente? Acredito que a notícia seja mais ruído do que sinal. O próximo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, tranquilizou a todos dizendo que o cronograma não deveria ser alterado.
Quanto antes resolvermos isso, melhor. A proposta do arcabouço parece ter agradado a boa parte do Congresso, que pretende colocar um enforcement mais rigoroso na lei.
Sim, é possível tecer muitas críticas ao arcabouço. A própria Fitch Ratings avaliou que a regra não deve estabilizar a dívida pública, muito por conta da necessidade de aumento de receitas — a estabilização da dívida requer um superávit primário de 2,0% a 2,5%. Parece difícil.
Mesmo assim, em um ambiente tão complexo para a tomada de decisão de política econômica, uma regra que simplesmente não explode o país já me parece o suficiente, ao menos até 2026.
Para onde olhar
Enquanto o texto tramita, lidamos com a audiência com Roberto Campos Neto, presidente do BC, na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Desde que não haja surpresas da fala da autoridade, o mercado deve reagir bem.
Espero que a situação evite novas críticas do governo. Em sendo o caso, eu não vejo razão para temer. Mais importante, no meu entendimento, será o IPCA-15 de quarta-feira, como falei anteriormente.
A mediana das estimativas aponta para uma desaceleração da inflação, de 5,36% para 4,30% na comparação anual. Caso o dado venha abaixo do esperado, podemos ter espaço para um novo rali dos ativos, como no início do mês.
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