Encerramos o primeiro trimestre de 2022 com um patamar cambial bem diferente daquele que começamos o ano. Nos últimos três meses, o dólar desvalorizou-se mais de 17% frente ao real, fechando sua cotação à vista em seu patamar mais baixo em mais de 12 meses, aos R$ 4,60.
É como o ditado costuma dizer: quanto mais alto, maior a queda, uma vez que a moeda americana havia subido dois dígitos desde meados do ano passado.
Agora, por outro lado, pela ótica do real, a valorização foi expressiva neste início de ano, impulsionada pela forte entrada de capital estrangeiro no início do ano.
Resumidamente, tal movimento se deve principalmente a três fatores
- i) ativos baratos: o segundo semestre de 2021 foi penoso para os investidores locais, uma vez que os ruídos institucionais e fiscais pesaram sobre a percepção de risco doméstico, fato que deteriorou muito o valor dos ativos brasileiros — elevação em nível da curva de juros, precificação do cenário estagflacionário para 2022 e fuga de capital, fatores que jogaram o valuation das posições em Brasil no chão, o que é atrativo para o movimento de rotação setorial que temos visto ao redor do mundo, de teses caras para teses mais descontadas, devido à elevação dos juros em todo o globo;
- ii) diferencial de juros: o Brasil se antecipou à elevação dos juros se comparado a outras grandes economias, em um movimento que recriou o que se conhece no mercado como "carry trade", que se refere ao dinheiro especulativo que busca diferencial de juros entre países (pegar emprestado a juros reais negativos em mercados desenvolvidos e investir em juros reais positivos em mercados emergentes) e que havia abandonado os produtos de investimento brasileiros quando os juros foram para 2% ao ano — os EUA, em contraste, começaram a subir só agora os juros; e
- iii) Brasil como um país mais amigável frente aos demais emergentes: entre os seus pares, como os pertencentes ao acrônimo BRICS, o nosso país virou preferência entre os investidores globais, uma vez que, apesar de nossos problemas, ainda somos uma democracia ocidental pacífica — a Rússia se tornou "não-investível", a China tem seus problemas políticos e de desaceleração (devida atenção ao mercado imobiliário, que desde a Evergrande passa por dificuldades), a África do Sul se mostra completamente instável e, por fim, a Índia se provou cara e complexa socialmente.
Justifica-se dessa forma a atratividade dos ativos brasileiros ao longo dos três primeiros meses do ano, fato que explica a apreciação de nossa moeda frente ao dólar.
Note que, como já conversamos em coluna recente, tais vetores se relacionam com as variáveis que melhor conseguem explicar a variação do dólar, sendo elas a Taxa de Equilíbrio da Balança de Pagamentos, o risco-país, o diferencial de juros, a força das commodities e a força do dólar. Em outras palavras, não fugimos do tradicional.
A verdade mesmo é que ninguém consegue prever para onde o dólar vai.
Experimente fazer tal exercício: abra o primeiro Boletim Focus de anos anteriores e compare a projeção mediana do mercado nesta primeira coletânea com a cotação de fato registrada ao final de cada respectivo ano. As diferenças costumam ser brutais.
A quantidade de variáveis e a volatilidade inerente a cada uma delas impede que consigamos estabelecer projeções assertivas sobre a taxa cambial. Agora, isso não significa que seja impossível de se trabalhar.
Ausência de evidência não é evidência de ausência
Neste caso, considerando os cenários, podemos estabelecer bandas de confiança, nas quais o dólar deverá variar entre de acordo com o humor do investidor.
No cenário mais negativo, aquele em que estávamos no último trimestre de 2021, não acredito que seja inválido pensar em dólar entre R$ 5,25 e R$ 5,75 — dependeria mais do estresse local, relacionado com as eleições, e da velocidade de aperto monetário nos EUA, que reduziria na margem o diferencial de juros.
Já em uma ótica mais otimista, com a qual flertamos no primeiro trimestre de 2022, a faixa de atuação do dólar seria entre R$ 4,25 e R$ 4,75 — considerando que os três fatores positivos se mantenham firmes nos próximos meses, apesar das incertezas.
Neste contexto, o patamar atual e R$ 4,60 me parece atrativo para aqueles que ainda não começaram a investir no exterior o fazerem.
Lembre-se que há duas abordagens para os investimentos em dólar ou outras moedas:
i) a de casamento, que considera a posição estrutural de longo prazo; e
ii) a de romance de verão, que guarda consigo um cunho mais tático.
Pensando a longo prazo, entendemos que seja importante manter pelo menos algo como 15% a 30% de posições estruturais em moeda estrangeira nas carteiras. É benéfico ao investidor diversificar seu portfólio em outras divisas e geografias.
Para quem já tem esse percentual devidamente alocado lá fora, levando em conta que há espaço para aprofundamento dos três pontos favoráveis ao Brasil inicialmente apresentados, talvez seja a hora de esperar um pouco para novos movimentos lá fora.
Tudo isso, claro, feito sob o devido dimensionamento das posições, conforme seu perfil de risco, e a devida diversificação de carteira, com as respectivas proteções associadas.
Resumidamente, portanto, para quem ainda não fez seu pé de meia lá fora, ainda dá tempo. O patamar não é impeditivo, como eu disse, sendo que o cenário negativo acima ilustrado só deveria se realizar com os próximos passos da política monetária americana e com a proximidade das eleições.
As opções de investimento no exterior
Para quem topar, minhas formas favoritas de exposição são comprando ativos diretamente lá fora, por meio de uma corretora internacional.
Contudo, no ambiente doméstico, há também a opção para investir por meio de fundos de investimento, desde os dotados de gestão ativa em posições no exterior, até os passivos, em exposição cambial pura (exclusivamente para proteção da carteira, como o caso dos fundos de dólar nas corretoras locais).
Alternativamente, temos a opção de BDRs, que são aqueles recibos listados no Brasil de posições em Bolsas internacionais, e os ETFs (fundos índices/listados), como o IVVB11, que reproduzem o desempenho de uma carteira teórica e índices no exterior.
Todas as opções são válidas, com preferências às primeiras (fazer uma carteira diversificada lá fora é a melhor opção em meu entendimento). O importante é entender os benefícios de se diversificar sua carteira de investimentos em outras moedas.