Os rumos das moedas: quais devem ser os próximos passos do dólar, do euro e do real
Normalmente são os mercados emergentes que arcam com o peso de um dólar forte, mas não é o que ocorre dessa vez
Da mínima recente, o euro já sobe mais de 2,5%. O fortalecimento da moeda europeia chama a atenção, principalmente por acontecer pouco depois da desvalorização da divisa para abaixo da faixa de US$ 1.
Quem acompanhou mais de perto sabe que os europeus tiveram uma desvalorização cambial considerável ao longo dos últimos meses, muito por conta da saída de recursos do continente.
Os investidores estão preocupados com as sucessivas crises sobre o bloco econômico e não perdem tempo em retirar os recursos. Como podemos ver abaixo, os europeus passaram pelo pior episódio de saída de recursos desde 2016.
A consequência foi a perda de valor do euro, que alcançou seu patamar mais baixo em 20 anos — moedas fiduciárias reagem à percepção de vigor da economia subjacente. Não há escapatória com guerra, inflação e possibilidade de recessão.
Os investidores que procuram um bom retorno sobre a dívida do governo sempre buscam o juro real mais elevado. Quando o Federal Reserve aumenta as taxas de juros, os investidores transferem os recursos para os EUA, impulsionando o dólar.
E o que explica o fôlego recente do euro?
Bem, à medida que a situação energética na Europa ficou mais complicada, os membros do Banco Central Europeu (BCE) elevaram o tom de sua postura monetária agressiva, apresentando um aumento de 75 pontos-base na última quinta-feira.
O maior aumento dos juros nos 24 anos de história da instituição se deu em resposta à alta do custo da energia, que constitui o principal fator para que a taxa de inflação da zona do euro chegasse a 9,1% em agosto.
Em outras palavras, o banco central está tentando fazer com que a inflação não fique fora de controle. Dessa forma, a autoridade monetária europeia deverá aumentar ainda mais as taxas de juros, porque a inflação continua muito alta.
Tanto é verdade que a própria presidente do BCE, Christine Lagarde, indicou pelo menos mais duas reuniões com elevações dos juros, embora tenha sinalizado também que provavelmente serão menos de cinco.
Ou seja, se antes o euro estava fraco por conta da situação de crise da Zona do Euro, enquanto outras potências centrais, como os EUA, já subiam os juros e atraíam capital, agora o jogo começa a mudar.
Ainda que o aumento dos custos de empréstimos eleve o risco de que a zona do euro entre em recessão, fazendo com que o banco central reduza drasticamente as projeções de crescimento para o próximo ano, o sacrifício se faz necessário.
Com juros mais elevados, seria natural esperar uma resiliência maior do euro, que mesmo com a recuperação recente ainda cai mais de 10% em 2022. Entendo ser válido esperar a marginal apreciação da moeda europeia, mesmo que pouca coisa.
Argumento pelo fato de ser marginal porque o Federal também está apresentando uma postura bastante agressiva. A próxima reunião do Fed sobre taxas de juros será no dia 21 de setembro, quando devemos ter mais uma alta de 75 pontos-base.
Caso confirmada, será a terceira vez seguida que a autoridade monetária americana eleva em 0,75 p.p. o juro básico da economia dos EUA. O movimento se dá à luz dos direcionamentos recentes dos membros do Fed.
Há preocupações de que, se o Fed for muito agressivo, isso possa levar a uma recessão. Ao mesmo tempo, a força do mercado de trabalho dá certa margem para uma postura contracionista, normalizando a política monetária.
Quem arca com o peso do dólar forte?
Neste caso, o dólar americano ainda deveria permanecer forte no mundo (iene e franco suíço). É curioso. Normalmente são os mercados emergentes que arcam com o peso de um dólar forte. Não é o caso dessa vez.
Tradicionalmente, um dólar forte machuca os países menos favorecidos que devem cumprir suas obrigações de dívida em dólares e dependem dos EUA para a importação de alimentos. Mas algo diferente tem acontecido em 2022.
Atualmente, o dólar está se valorizando mais em relação às moedas das economias ricas do que às dos mercados emergentes, como o real. Isso acontece porque os bancos centrais dos países emergentes também estão se restringindo monetariamente.
Como os países desenvolvidos mantêm taxas de juros relativamente baixas mesmo com o aperto, o diferencial de juro real se mantém interessante para emergentes, não permitindo que haja muita fuga de capital. O real, por exemplo, se valoriza em 2022.
As autoridades do Fed disseram que provavelmente continuarão com os aumentos das taxas em 2023, então há pouco alívio chegando. Contra moedas desenvolvidas, o dólar pode subir ainda mais, ainda que marginalmente.
Contra o euro, boa parte da desvalorização já aconteceu, permitindo que a política mais restritiva do BCE consiga impedir novas quedas da moeda europeia. Contra o real, contudo, a história é diferente.
Nos últimos cinco anos, nossa moeda se desvalorizou em mais de 60% contra o dólar. Foi só agora que voltamos a ganhar um pouco de tração. Considerando que a inflação será um "não-evento" (representa mais ruído do que sinal), o real pode se manter forte.
Não entendo que seja o caso de uma grande valorização da moeda brasileira, mas pelo menos há espaço para que ela continue entre R$ 5,00 e R$ 5,50 contra o dólar de maneira mais estrutural do que pensamos.
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