Panela velha é que faz comida boa?
Não há aqui uma sabedoria popular formidável para o momento? Deveríamos comprar a “nova economia” ou nos voltarmos às commodities e bancos?
“Que saudade imensa do campo e do mato
Do manso regato que corta as campinas
Aos domingos ia passear de canoa
Das lindas lagoas de águas cristalinas
Que doce lembrança daquela festança
Onde tinha danças e lindas meninas
Eu vivo hoje em dia sem ter alegria
O mundo judia, mas também ensina
Estou contrariado, mas não derrotado
Eu sou bem guiado pelas mãos divinas.”
CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADECONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADEBelmonte
Estou com saudades de Senhora do Porto, interior de Minas Gerais. A turma na Faria Lima acha que interior é Ribeirão Preto, Campinas, São José do Rio Preto. Na Vila Madalena, o pessoal pensa que é Jalapão, Chapada dos Veadeiros, Bonito, e por aí vai. Nada contra esses lugares. Ao contrário, acho ótimos, mas não são aquilo a que me refiro quando falo de “interior”.
Chão batido, curral em que você entra tentando desviar, muitas vezes sem sucesso, das bostas de boi, porteira, fogão a lenha, porta cuja tranca se dá por meio de um pedaço de madeira grosso atravessado na perpendicular. Campo de futebol no meio do pasto — e também com bosta de boi; você escolhe em que posição vai jogar baseado na distribuição das fezes dos animais.
“Hoje eu vou na ponta esquerda.”
“Mas você é destro, Felipe. Nunca jogou na ponta esquerda.”
“Você que não está me acompanhando… sou bom em cortar pra dentro e entrar no
facão, estilo Messi, só que do outro lado.”
(rsrsrsrs)
Por conta da pandemia, fiquei sem essas coisas neste ano. Não sei se é muito bem verdade, mas as notícias que chegam — provavelmente com algum exagero, mas quem topa o risco? — apontam para uma situação meio ruim em Guanhães. “Lipe, mas nem podia ser diferente. Lá, ninguém usa máscara, não respeita isolamento social, fica se abraçando. Claro que ia dar nisso.”
Talvez até pudéssemos ir, com os devidos cuidados; de carro quem sabe… mas com a Maria tão pequena… Não sei se fizemos certo, mas preferimos ficar, sob os protestos típicos da família: “Você não liga mais pra gente…”.
Leia Também
A mensagem do Copom para a Selic, juros nos EUA, eleições no Brasil e o que mexe com seu bolso hoje
Os testes da família Bolsonaro, o sonho de consumo do Magalu (MGLU3), e o que move a bolsa hoje
Mal sabem eles o quanto me faz mal não ir visitá-los.
Sou formalmente paulistano, nascido e criado na Zona Oeste, entre Sumarezinho, Vila Madalena, Pinheiros e Cerqueira César, muito influenciado por isso. Ao mesmo tempo, ter passado boa parte das férias da infância e da adolescência em Senhora do Porto também fez parte da minha constituição. Essa ambivalência tão gritante entre um mundo cosmopolita, moderno, urbano, e outro rural, bucólico, pouco integrado à tecnologia de ponta, representa a coexistência interna de vários elementos simultâneos.
Até mesmo a formação musical oferecia mundos antagônicos, tipicamente percebidos como imiscíveis. Íamos de Cometa, saindo de São Paulo para Belo Horizonte, ouvindo Be Quick or Be Dead, para sermos recebidos na praça central, do lado do coreto e onde fica hoje o bar do meu tio Dacinho, perto da escola municipal, com “O Menino da Porteira”.
As minhas ambivalências também se verificam na formação intelectual. Sempre fui muito estudioso, debruçado sobre as teorias acadêmicas da fronteira do conhecimento. Ao mesmo tempo, sem nenhum demérito aos livros e aos journals, mantive comigo a crença de que muito conhecimento emanava da rua, da sabedoria popular, da vivência propriamente dita. Curiosamente, encontrei no Sidarta, de Hermann Hesse, um símbolo da educação clássica literária formal, uma lição importante. Nada pode substituir a experiência vivida.
Ontem à noite, assisti a um vídeo de família antigo. Um dos meus tios, completamente embriagado (nenhuma novidade), cantava: “Tô de namoro com uma moça solteirona; A bonitona quer ser a minha patroa; Os meus parentes já estão me criticando; Estão falando que ela é muito coroa; Ela é madura, já tem mais de trinta anos; Mas para mim o que importa é a pessoa; Não interessa se ela é coroa; Panela velha é que faz comida boa; Não interessa se ela é coroa; Panela velha é que faz comida boa”.
Não há aqui uma sabedoria popular formidável para o momento? Deveríamos nós comprar a “nova economia” ou nos voltarmos às commodities e aos bancos?
Nos primeiros dias de 2021, com a tal “onda azul” nos EUA, houve um movimento intenso em prol de migração em direção às “panelas velhas”, cuja comida seguiria muito boa, diante de valuations convidativos, de mais gastos fiscais que ensejassem matérias-primas mais caras, pressão para cima sobre as taxas de juro de mercado e dólar mais caro. O interesse na tecnologia e nos cases de crescimento teria diminuído, por conta do medo da regulação e de mais impostos do Partido Democrata e dos efeitos dos juros de mercado sobre as taxas de desconto, afetando dramaticamente casos de growth.
Na sexta-feira passada e ontem, porém, o movimento foi justamente o contrário. Sob o FOMO, o medo de ficar de fora, muitos abandonaram suas teses de investimento preferidas e foram comprar bancos e commodities. Muitos quebraram a cara, ao menos momentaneamente. Nada pior do que o overtrading, uma corrida atrás do rabo, em que você decide ir para um momentum trade e, então, descobre que o momento acabou, da forma mais dura, perdendo dinheiro.
O que fazer agora?
No já clássico How George Soros Knows What He Knows, a brasileira Flávia Cymbalista aponta que o megainvestidor somatiza o descontentamento com suas posições. Sente dor nas costas quando seu portfólio está desbalanceado e há nele algum erro. Não há nada de sobrenatural ali. É apenas a intuição, uma capacidade não estruturada de reconhecer padrões tacitamente, apontando algum desconforto.
Passo longe, bem longe mesmo, de ser George Soros. Não tenho dor nas costas, nem seus bilhões. Mas também somatizo bastante as coisas. Durmo especialmente mal quando estou preocupado e, em momentos mais agudos de estresse, tenho dor de garganta e febre.
Sempre que acordo, pego o celular e checo os mercados. Instintivamente, procuro o comportamento da variável que mais tem me preocupado naquele momento — fui perceber isso só recentemente. Nos últimos dias, minha primeira página tem sido o yield do Treasury de dez anos. É esse cara, para mim, que tem ditado o fluxo do capital em âmbito global.
Sob a expectativa de retomada da economia e pacotes fiscais gordos, com potenciais implicações para a inflação, ele tem subido neste ano, influenciando as taxas de juro de mercado pelo mundo e os valuations de nomes associados a crescimento, ao mesmo tempo em que desperta o interesse por bancos e commodities.
Há espaço para continuidade do movimento?
Em condições normais de temperatura e pressão, entendo que sim. Parece razoável supor a caminhada em direção a um yield de 1,25% para o Treasury de dez anos. Seria uma simples volta a uma mínima normalidade pós-pandemia, com um quadro fiscal mais deteriorado.
A partir daí, acho mais difíceis novas altas. Claro que pode haver algum overshooting de curto prazo, mas que tenderia a ser corrigido depois. A vitória democrata no Congresso americano é muito apertada, de modo que fica difícil a negociação de pacotes fiscais tão amplos. O problema mundial, há dez anos, é de baixo crescimento e baixa inflação — até há pouco tempo, discutíamos a “japonização do mundo”. Isso se deve a fatores seculares, como tecnologia e demografia, que não vão mudar; ao contrário, se intensificam a cada momento. Existe ainda um problema prático de que, sob o tamanho das dívidas soberanas e corporativas, uma subida rápida e intensa dos yields quebraria o mundo — uma coisa é dever 120% do PIB com juro zerado, outra coisa é ter a mesma dívida com juros de 4%. Seria razoável supor que os bancos centrais voltariam a atuar de forma mais pesada se os rendimentos dos títulos subissem de maneira vertiginosa.
Aponto ainda um fator de risco adicional. Talvez seja até mais uma elucubração. Possivelmente os três leitores tenham visto a China impondo lockdowns bastante restritivos a algumas províncias. E também os recordes dos preços da soja e do milho (o que pode ser bem ruim para frigoríficos); o minério de ferro e o aço sobem vertiginosamente. Então, me vem à cabeça que a China, de onde temos poucas informações confiáveis, pode estar estocando tudo que pode, de tudo, para se proteger de um eventual fechamento mais destacado de sua economia em meio à escalada de casos de coronavírus.
Em sendo o caso, poderíamos incorrer num susto súbito com preços de commodities, para uma posterior retomada.
Dito isso, parece razoável ter, sim, exposição a alguns nomes de commodities, mas eu focaria em nomes depreciados frente aos pares internacionais, menos alavancados e com menor custo marginal de produção — se você pensou em Vale, estamos na mesma página.
Ao mesmo tempo, manteria a confiança nas teses seculares de tecnologia, e-commerce, omnichannel, etc.
Se a tendência agora fosse em favor dos nomes da velha economia, ela seria a nova, e a nova seria a velha. A linha do tempo só caminha em uma direção.
A sabedoria popular prescreve: “Bezerro bom não berra”. Não há razão para reclamar depois que aconteceu.
É o fim da pirâmide corporativa? Como a IA muda a base do trabalho, ameaça os cargos de entrada e reescreve a carreira
As ofertas de emprego para posições de entrada tiveram fortes quedas desde 2024 em razão da adoção da IA. Como os novos trabalhadores vão aprender?
As dicas para quem quer receber dividendos de Natal, e por que Gerdau (GGBR4) e Direcional (DIRR3) são boas apostas
O que o investidor deve olhar antes de investir em uma empresa de olho dos proventos, segundo o colunista do Seu Dinheiro
Tsunami de dividendos extraordinários: como a taxação abre uma janela rara para os amantes de proventos
Ainda que a antecipação seja muito vantajosa em algumas circunstâncias, é preciso analisar caso a caso e não se animar com qualquer anúncio de dividendo extraordinário
Quais são os FIIs campeões de dezembro, divulgação do PIB e da balança comercial e o que mais o mercado espera para hoje
Sete FIIs disputam a liderança no mês de dezembro; veja o que mais você precisa saber hoje antes de investir
Copel (CPLE3) é a ação do mês, Ibovespa bate novo recorde, e o que mais movimenta os mercados hoje
Empresa de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, a Copel é a favorita para investir em dezembro. Veja o que mais você precisa saber sobre os mercados hoje
Mais empresas no nó do Master e Vorcaro, a escolha do Fed e o que move as bolsas hoje
Titan Capital surge como peça-chave no emaranhado de negócios de Daniel Vorcaro, envolvendo mais de 30 empresas; qual o risco da perda da independência do Fed, e o que mais o investidor precisa saber hoje
A sucessão no Fed: o risco silencioso por trás da queda dos juros
A simples possibilidade de mudança no comando do BC dos EUA já começou a mexer na curva de juros, refletindo a percepção de que o “jogo” da política monetária em 2026 será bem diferente do atual
Tony Volpon: Bolhas não acabam assim
Wall Street vivencia hoje uma bolha especulativa no mercado de ações? Entenda o que está acontecendo nas bolsas norte-americanas, e o que a inteligência artificial tem a ver com isso
As lições da Black Friday para o universo dos fundos imobiliários e uma indicação de FII que realmente vale a pena agora
Descontos na bolsa, retorno com dividendos elevados, movimentos de consolidação: que tipo de investimento realmente compensa na Black Friday dos FIIs?
Os futuros dividendos da Estapar (ALPK3), o plano da Petrobras (PETR3), as falas de Galípolo e o que mais move o mercado
Com mudanças contábeis, Estapar antecipa pagamentos de dividendos. Petrobras divulga seu plano estratégico, e presidente do BC se mantém duro em sua política de juros
Jogada de mestre: proposta da Estapar (ALPK3) reduz a espera por dividendos em até 8 anos, ações disparam e esse pode ser só o começo
A companhia possui um prejuízo acumulado bilionário e precisaria de mais 8 anos para conseguir zerar esse saldo para distribuir dividendos. Essa espera, porém, pode cair drasticamente se duas propostas forem aprovadas na AGE de dezembro.
A decisão de Natal do Fed, os títulos incentivados e o que mais move o mercado hoje
Veja qual o impacto da decisão de dezembro do banco central dos EUA para os mercados brasileiros e o que deve acontecer com as debêntures incentivadas, isentas de IR
Corte de juros em dezembro? O Fed diz talvez, o mercado jura que sim
Embora a maioria do mercado espere um corte de 25 pontos-base, as declarações do Fed revelam divisão interna: há quem considere a inflação o maior risco e há quem veja a fragilidade do mercado de trabalho como a principal preocupação
Rodolfo Amstalden: O mercado realmente subestima a Selic?
Dentro do arcabouço de metas de inflação, nosso Bacen dá mais cavalos de pau do que a média global. E o custo de se voltar atrás para um formulador de política monetária é quase que proibitivo. Logo, faz sentido para o mercado cobrar um seguro diante de viradas possíveis.
As projeções para a economia em 2026, inflação no Brasil e o que mais move os mercados hoje
Seu Dinheiro mostra as projeções do Itaú para os juros, inflação e dólar para 2026; veja o que você precisa saber sobre a bolsa hoje
Os planos e dividendos da Petrobras (PETR3), a guerra entre Rússia e Ucrânia, acordo entre Mercosul e UE e o que mais move o mercado
Seu Dinheiro conversou com analistas para entender o que esperar do novo plano de investimentos da Petrobras; a bolsa brasileira também reflete notícias do cenário econômico internacional
Felipe Miranda: O paradoxo do banqueiro central
Se você é explicitamente “o menino de ouro” do presidente da República e próximo ao ministério da Fazenda, é natural desconfiar de sua eventual subserviência ao poder Executivo
Hapvida decepciona mais uma vez, dados da Europa e dos EUA e o que mais move a bolsa hoje
Operadora de saúde enfrenta mais uma vez os mesmos problemas que a fizeram despencar na bolsa há mais dois anos; investidores aguardam discurso da presidente do Banco Central Europeu (BCE) e dados da economia dos EUA
CDBs do Master, Oncoclínicas (ONCO3), o ‘terror dos vendidos’ e mais: as matérias mais lidas do Seu Dinheiro na semana
Matéria sobre a exposição da Oncoclínicas aos CDBs do Banco Master foi a mais lida da semana; veja os destaques do SD
A debandada da bolsa, pessimismo global e tarifas de Trump: veja o que move os mercados hoje
Nos últimos anos, diversas empresas deixaram a B3; veja o que está por trás desse movimento e o que mais pode afetar o seu bolso