Minha utopia brasileira
A caravana da corte portuguesa, falida, dependente do erário e dos favores do príncipe regente, tinha o tamanho da máquina burocrática americana.
“O Dom João que chegou ao Brasil em 1808 usaria para governar outro atributo fortíssimo da Monarquia: o da imagem do rei benigno, que tudo provê e de todos cuida e protege. Dom João passaria à história como um monarca bonachão, sossegado e paternal, que recebia pacientemente seus súditos no Palácio de São Cristóvão para o ritual de beija-mão. (..) A corte e o poder real fascinavam-se como uma verdadeira atração messiânica, era a esperança do socorro de um pai que vem curar as feridas dos filhos.”
Leia também:
- Confira os benefícios de ser um leitor Premium no Seu Dinheiro
- Livro de fundador da Empiricus defende o valor da estratégia para o investidor de sucesso
- 2021 será o “ano da fênix” da economia? Felipe Miranda dá 10 ideias para aproveitar a oportunidade de fazer dinheiro na bolsa
Esse é um trecho do livro “1808”, de Laurentino Gomes, que narra a chegada da família real portuguesa ao Brasil, como forma de escapar das guerras napoleônicas em meio ao bloqueio continental. Entre 10 mil e 15 mil portugueses atravessaram o Atlântico com Dom João — é aproximadamente o mesmo número de pessoas transferidas para Washington, a nova capital, pelo presidente americano John Adams. A caravana da corte portuguesa, falida, dependente do erário e dos favores do príncipe regente, tinha o tamanho da máquina burocrática americana.
Como resumiu o historiador John Armitage, “um enxame de aventureiros, necessitados e sem princípios acompanhou a família real. (…) os novos hóspedes pouco se interessavam pela prosperidade do país: consideravam temporária sua ausência de Portugal e propunham-se mais a enriquecer à custa do Estado do que a administrar justiça ou a beneficiar o público”.
Segundo o historiador Luiz Felipe Alencastro, naquele tempo, além da família real, 276 fidalgos e dignatários régios recebiam verba anual de custeio e representação, paga em moedas de ouro e prata retiradas do Tesouro Real do Rio de Janeiro. Havia cerca de 2.000 funcionários reais e indivíduos exercendo funções relacionadas à Coroa, 700 padres, 500 advogados, 200 praticantes de medicina e entre 4.000 e 5.000 militares. O cônsul inglês James Henderson resumiu bem a questão: “poucas cortes europeias têm tantas pessoas ligadas a ela quanto a brasileira, incluindo fidalgos, eclesiásticos e oficiais”.
A chegada da corte portuguesa marca, basicamente, o início de um processo de transformação que culminaria na superação do Brasil-colônia para sua independência em 1822. Foi um período de muita mudança e modernização. A forma, porém, da apropriação de elementos da cultura europeia e a maneira da constituição da nossa elite mostram a dependência do Estado, as relações de dependência dos “amigos do rei”. Em bom “brasileiro”, as famosas mamadas nas tetas do Estado.
Leia Também
Novo nome da Eletrobras em nada lembra mercado de energia; shutdown nos EUA e balanço da Petrobras também movem os mercados hoje
Eletrobras agora é Axia: nome questionável, dividendos indiscutíveis
A elite brasileira nasceu e cresceu sem erudição, profundidade intelectual e capacidade empreendedora, escorando-se nos favores da realeza para se sustentar e expandir. Era uma situação bem diferente daquela observada nos EUA, onde floresceu uma classe alfabetizada, habituada a decisões comunitárias e informada sobre as fronteiras do conhecimento e as invenções do mundo, disposta à atividade empreendedora e acostumada com a assunção de riscos.
Até aí, sejamos sinceros, nenhuma novidade. Mais papo de historiador do que de economista. Mas encontrar raízes históricas ajuda a entender o presente e, quem sabe, projetar o futuro.
Na natureza da sociedade brasileira, não se encontra a disposição ao risco, ao novo, ao desconhecido, ao empreendedorismo. Estamos, desde o começo, deitados em berço esplêndido, no colo do pai português bonachão e benevolente ou nos braços do Estado.
Talvez isso até poderia ser uma explicação antropológica para nossas taxas de juro historicamente tão altas. Para toparmos o financiamento público, precisamos ser remunerados agressivamente. Claro que não é a única justificativa. O passado de muita inflação e as dúvidas sobre a capacidade de o Estado honrar seus compromissos financeiros futuros diante da nossa trajetória fiscal estão entre as principais. Mas, pensando bem, não seria a mesma coisa? O Estado gasta muito e gera dúvidas sobre sua capacidade de financiamento; ao mesmo tempo, com seus gastos perdulários, alimenta uma sociedade muito dependente dos favores do Estado, num círculo vicioso aparentemente inquebrável.
Eis que agora, porém, os juros estão baixos. E por mais que devam subir em 2021, continuarão baixos na comparação com os níveis históricos. As pessoas, para não terem seu patrimônio corroído em termos reais e poderem preservar poder de compra, precisarão, cada vez mais, investir em ativos fora da renda fixa convencional. Por bem ou por mal, precisarão lidar com o risco. E não há melhor forma de aprender e conviver com algo a partir da própria convivência com esse algo. Como se aprende a andar de bicicleta? Como se aprende a cozinhar?
Os otimistas acreditam que o juro baixo vai revolucionar o mercado de capitais brasileiro, fazendo com que as pessoas passem a aumentar o duration de suas aplicações em renda fixa, a ter uma poupança de longo prazo grande em ações e a diversificar geograficamente e entre moedas seus investimentos.
Eu concordo com isso, mas tenho uma perspectiva ainda mais ambiciosa: o “financial deepening” como instrumento de transformação de toda a sociedade brasileira, em que passamos a entender que a vida não é de não se correr risco, de termos de nos escorar na segurança, mas, sim, de saber ponderar entre risco e retorno. Isso seria ainda mais transformacional, de entendermos que podemos mudar de emprego, mudar de cidade, mudar de opinião… conhecer o novo, empreender, romper relações destrutivas, abraçar um teste sem necessariamente saber seu resultado, calibrando a perda potencial.
Talvez seja uma utopia. A verdade, porém, é que, enquanto não tivermos a propriedade de conviver com o risco e a romper com o paternalismo, jamais conseguiremos caminhar efetivamente com as nossas próprias pernas. O Brasil do financial deepening pode ser de uma sociedade finalmente independente, mais confiante em si e na capacidade de conviver com a incerteza e o risco. Será somente um sonho?
O segredo do Copom, o reinado do Itaú e o que mais movimenta o seu bolso hoje
O mercado acredita que o Banco Central irá manter a taxa Selic em 15% ao ano, mas estará atento à comunicação do banco sobre o início do ciclo de cortes; o Itaú irá divulgar seus resultados depois do fechamento e é uma das ações campeãs para o mês de novembro
Política monetária não cede, e fiscal não ajuda: o que resta ao Copom é a comunicação
Mesmo com a inflação em desaceleração, o mercado segue conservador em relação aos juros. Essa preferência traz um recado claro: o problema deriva da falta de credibilidade fiscal
Tony Volpon: Inteligência artificial — Party like it’s 1998
Estamos vivendo uma bolha tecnológica. Muitos investimentos serão mais direcionados, mas isso acontece em qualquer revolução tecnológica.
Manter o carro na pista: a lição do rebalanceamento de carteira, mesmo para os fundos imobiliários
Assim como um carro precisa de alinhamento, sua carteira também precisa de ajustes para seguir firme na estrada dos investimentos
Petrobras (PETR4) pode surpreender com até R$ 10 bilhões em dividendos, Vale divulgou resultados, e o que mais mexe com seu bolso hoje
A petroleira divulgou bons números de produção do 3° trimestre, e há espaço para dividendos bilionários; a Vale também divulgou lucro acima do projetado, e mercado ainda digere encontro de Trump e Xi
Dividendos na casa de R$ 10 bilhões? Mesmo depois de uma ótima prévia, a Petrobras (PETR4) pode surpreender o mercado
A visão positiva não vem apenas da prévia do terceiro trimestre — na verdade, o mercado pode estar subestimando o potencial de produção da companhia nos próximos anos, e olha que eu nem estou considerando a Margem Equatorial
Vale puxa ferro, Trump se reúne com Xi, e bolsa bateu recordes: veja o que esperar do mercado hoje
A mineradora divulga seus resultados hoje depois do fechamento do mercado; analistas também digerem encontro entre os presidentes dos EUA e da China, fala do presidente do Fed sobre juros e recordes na bolsa brasileira
Rodolfo Amstalden: O silêncio entre as notas
Vácuos acumulados funcionaram de maneira exemplar para apaziguar o ambiente doméstico, reforçando o contexto para um ciclo confiável de queda de juros a partir de 2026
A corrida para investir em ouro, o resultado surpreendente do Santander, e o que mais mexe com os mercados hoje
Especialistas avaliam os investimentos em ouro depois do apetite dos bancos centrais por aumentar suas reservas no metal, e resultado do Santander Brasil veio acima das expectativas; veja o que mais vai afetar a bolsa hoje
O que a motosserra de Milei significa para a América Latina, e o que mais mexe com seu bolso hoje
A Argentina surpreendeu nesta semana ao dar vitória ao partido do presidente Milei nas eleições legislativas; resultado pode ser sinal de uma mudança política em rumo na América Latina, mais liberal e pró-mercado
A maré liberal avança: Milei consolida poder e reacende o espírito pró-mercado na América do Sul
Mais do que um evento isolado, o avanço de Milei se insere em um movimento mais amplo de realinhamento político na região
Os balanços dos bancos vêm aí, e mercado quer saber se BB pode cair mais; veja o que mais mexe com a bolsa hoje
Santander e Bradesco divulgam resultados nesta semana, e mercado aguarda números do BB para saber se há um alçapão no fundo do poço
Só um susto: as ações desta small cap foram do céu ao inferno e voltaram em 3 dias, mas este analista vê motivos para otimismo
Entenda o que aconteceu com os papéis da Desktop (DESK3) e por que eles ainda podem subir mais; veja ainda o que mexe com os mercados hoje
Por que o tombo de Desktop (DESK3) foi exagerado — e ainda vejo boas chances de o negócio com a Claro sair do papel
Nesta semana os acionistas tomaram um baita susto: as ações DESK3 desabaram 26% após a divulgação de um estudo da Anatel, sugerindo que a compra da Desktop pela Claro levaria a concentração de mercado para níveis “moderadamente elevados”. Eu discordo dessa interpretação, e mostro o motivo.
Títulos de Ambipar, Braskem e Raízen “foram de Americanas”? Como crises abalam mercado de crédito, e o que mais movimenta a bolsa hoje
Com crises das companhias, investir em títulos de dívidas de empresas ficou mais complexo; veja o que pode acontecer com quem mantém o título até o vencimento
Rodolfo Amstalden: As ações da Ambipar (AMBP3) e as ambivalências de uma participação cruzada
A ambição não funciona bem quando o assunto é ação, e o caso da Ambipar ensina muito sobre o momento de comprar e o de vender um ativo na bolsa
Caça ao Tesouro amaldiçoado? Saiba se Tesouro IPCA+ com taxa de 8% vale a pena e o que mais mexe com seu bolso hoje
Entenda os riscos de investir no título público cuja remuneração está nas máximas históricas e saiba quando rendem R$ 10 mil aplicados nesses papéis e levados ao vencimento
Crônica de uma tragédia anunciada: a recuperação judicial da Ambipar, a briga dos bancos pelo seu dinheiro e o que mexe com o mercado hoje
Empresa de gestão ambiental finalmente entra com pedido de reestruturação. Na reportagem especial de hoje, a estratégia dos bancões para atrair os clientes de alta renda
Entre o populismo e o colapso fiscal: Brasília segue improvisando com o dinheiro que não tem
O governo avança na implementação de programas com apelo eleitoral, reforçando a percepção de que o foco da política econômica começa a se deslocar para o calendário de 2026
Felipe Miranda: Um portfólio para qualquer clima ideológico
Em tempos de guerra, os generais não apenas são os últimos a morrer, mas saem condecorados e com mais estrelas estampadas no peito. A boa notícia é que a correção de outubro nos permite comprar alguns deles a preços bastante convidativos.