Tony Volpon: EUA, novo mercado emergente
Não tenham dúvidas: chegamos todos na beira do abismo neste mês de abril. Por pouco não caímos.

Abril de 2025, outubro de 1987, setembro de 2008, março de 2000 – meses que ficaram gravados na memória traumática dos mercados financeiros.
Parece uma eternidade, mas o mês começou com o tão esperado “Liberation Day”, quando o presidente Trump anunciou suas “tarifas recíprocas”. Diferentemente do que a equipe de Trump sinalizava, essas tarifas não foram determinadas por aquilo que os países de fato impõem como tarifas aos EUA, mas pelo (errôneo) uso de uma fórmula em um pouco conhecido trabalho acadêmico que calcula o nível tarifário teórico para zerar o déficit comercial entre dois países.
- VEJA MAIS: Ação brasileira da qual ‘os gringos gostam’ tem potencial para subir mais de 20% em breve; saiba o porquê
Que farsa. Eu até acredito que há um argumento plausível a ser feito pela reindustrialização da economia em função da concorrência geopolítica com a China, e que a política tarifária pode ser um instrumento para atingir este fim. Mas a ideia de zerar déficits comerciais bilaterais é simplesmente bizarra, algo que entendemos desde pelo menos o século 19 quando o economista inglês David Ricardo explicou o conceito de vantagens comparativas entre países.
A bizarrice tem explicação. A equipe de Trump estava de fato estudando a questão das tarifas recíprocas entre os EUA e outros países, mas esses cálculos não são nada triviais de fazer (especialmente quando se quer também levar em conta restrições não tarifárias). Mas Trump decidiu querer anunciar sua grande jogada no dia 2 de abril, e então alguém provavelmente ligado ao Uber Hawk tarifário Peter Navarro sugeriu a tal fórmula como um atalho.
Bom, não demorou nem alguns minutos para o mercado perceber que a soma das tarifas já anunciadas e as supostas tarifas recíprocas levavam a tarifa média acima de 20% – quando ela estava ao redor de 2% antes de Trump – níveis que remetiam ao que foi praticado durante os anos 30 do último século e na Grande Depressão.
- LEIA TAMBÉM: Tony Volpon: Buy the dip
Trump put
Com as bolsas despencando, a pergunta que muitos faziam foi: o Trump aguenta até quando? Qual o preço de exercício do “Trump put”?
Leia Também
A ideia de haver um “put” – uma opção de venda – é normalmente usada em relação ao Fed, e a crença que há um nível de queda das bolsas que aciona uma reação do Fed.
O interessante é que não foi a queda das bolsas no início do mês – que no seu pior ponto no S&P 500 chegou a cerca de 14% – que levou ao recuo de Trump. Ao que tudo indica, o que assustou Trump e sua equipe foram as reações nos mercados de Treasuries e no dólar.
Com as bolsas despencando e com crescentes temores de uma recessão, se esperaria que as taxas de juros do mercado deveriam cair. E, logo depois do anúncio das tarifas recíprocas, foi exatamente isso que aconteceu, com a taxa das Treasuries de dez anos chegando a ficar brevemente abaixo de 4%. Mas nos dias seguintes a taxa subiu fortemente para 4,5%, junto com forte queda do dólar – inclusive contra moedas emergentes – e forte alta no preço do ouro.
A ameaça de crise e o recuo
Tudo isso indicando uma forte perda de credibilidade dos EUA e o início de um processo de fuga de capitais dos seus mercados. Isto é, os investidores, especialmente os investidores fora dos EUA, começavam a tratar o país como uma economia emergente, especialmente quando Trump ameaçou tentar demitir Powell.
Esse inusitado acontecimento poderia abrir um horizonte de fim de governo para Trump.
Até aquele momento, ele parecia disposto a sacrificar a economia, passando até por uma recessão para atingir seu sonho de um novo regime tarifário. Mas há recessões e recessões na economia americana: recessões sem crise financeira (pensem 1991) são relativamente rápidas e rasas, resolvidas pelo Fed afrouxando a política monetária. Recessões com crise financeira (pensem 2008) são outra história: profundas, duradouras e devastadoras para o presidente de ocasião.
Não duvido que alguém como Scott Bessent, aquele que quebrou o Banco da Inglaterra junto com George Soros, entendeu exatamente o que estava acontecendo – alertou Trump sobre o risco existencial que ele estava correndo.
Felizmente para todos nós, parece que Trump escutou Bessent e recuou. Não duvido que, se de fato houvesse uma crise financeira nos EUA, isso acabaria tendo impacto devastador sobre todos os outros mercados e a economia global como um todo.
Será isso o fim da grande jogada tarifária de Trump? De cara não, até porque ainda vemos um jogo complicado de “quem vai piscar primeiro” com a China. Mas acho muito difícil Trump voltar à agressividade tarifária do dia 2 de abril.
E agora? Até adotando este relativamente otimista cenário, há várias pedras no caminho dos mercados. Primeiro, já que o recuo tarifário não foi total, ainda temos um cenário de alta da inflação e queda na atividade. Uma recessão “de leve” não pode ser descartada.
O Fed, depois de ter se queimado com a tese da inflação “transitória” na pandemia, parece agora querer correr o risco inverso, e não cortar a taxa de juros até ver uma virada negativa forte no mercado de trabalho. E, ao que tudo indica, e a despeito do recuo de Trump, investidores globais têm decidido diminuir sua exposição aos mercados americanos. Assim a pressão sobre o dólar e as Treasuries deve continuar.
Mas não tenham dúvidas: chegamos todos à beira do abismo neste mês de abril. Por pouco não caímos.
Mantendo a tradição: Ibovespa tenta recuperar os 140 mil pontos em dia de produção industrial e dados sobre o mercado de trabalho nos EUA
Investidores também monitoram decisão do governo de recorrer ao STF para manter aumento do IOF
Os fantasmas de Nelson Rodrigues: Ibovespa começa o semestre tentando sustentar posto de melhor investimento do ano
Melhor investimento do primeiro semestre, Ibovespa reage a trégua na guerra comercial, trade eleitoral e treta do IOF
Rumo a 2026 com a máquina enguiçada e o cofre furado
Com a aproximação do calendário eleitoral, cresce a percepção de que o pêndulo político está prestes a mudar de direção — e, com ele, toda a correlação de forças no país — o problema é o intervalo até lá
Tony Volpon: Mercado sobrevive a mais um susto… e as bolsas americanas batem nas máximas do ano
O “sangue frio” coletivo também é uma evidência de força dos mercados acionários em geral, que depois do cessar-fogo, atingiram novas máximas no ano e novas máximas históricas
Tudo sob controle: Ibovespa precisa de uma leve alta para fechar junho no azul, mas não depende só de si
Ibovespa vem de três altas mensais consecutivas, mas as turbulências de junho colocam a sequência em risco
Ser CLT virou ofensa? O que há por trás do medo da geração Z pela carteira assinada
De símbolo de estabilidade a motivo de piada nas redes sociais: o que esse movimento diz sobre o mundo do trabalho — e sobre a forma como estamos lidando com ele?
Atenção aos sinais: Bolsas internacionais sobem com notícia de acordo EUA-China; Ibovespa acompanha desemprego e PCE
Ibovespa tenta manter o bom momento enquanto governo busca meio de contornar derrubada do aumento do IOF
Siga na bolsa mesmo com a Selic em 15%: os sinais dizem que chegou a hora de comprar ações
A elevação do juro no Brasil não significa que chegou a hora de abandonar a renda variável de vez e mergulhar na super renda fixa brasileira — e eu te explico os motivos
Trocando as lentes: Ibovespa repercute derrubada de ajuste do IOF pelo Congresso, IPCA-15 de junho e PIB final dos EUA
Os investidores também monitoram entrevista coletiva de Galípolo após divulgação de Relatório de Política Monetária
Rodolfo Amstalden: Não existem níveis seguros para a oferta de segurança
Em tese, o forward guidance é tanto mais necessário quanto menos crível for a atitude da autoridade monetária. Se o seu cônjuge precisa prometer que vai voltar cedo toda vez que sai sozinho de casa, provavelmente há um ou mais motivos para isso.
É melhor ter um plano: Ibovespa busca manter tom positivo em dia de agenda fraca e Powell no Senado dos EUA
Bolsas internacionais seguem no azul, ainda repercutindo a trégua na guerra entre Israel e o Irã
Um longo caminho: Ibovespa monitora cessar-fogo enquanto investidores repercutem ata do Copom e testemunho de Powell
Trégua anunciada por Donald Trump impulsiona ativos de risco nos mercados internacionais e pode ajudar o Ibovespa
Um frágil cessar-fogo antes do tiro no pé que o Irã não vai querer dar
Cessar-fogo em guerra contra o Irã traz alívio, mas não resolve impasse estrutural. Trégua será duradoura ou apenas mais uma pausa antes do próximo ato?
Felipe Miranda: Precisamos (re)conversar sobre Méliuz (CASH3)
Depois de ter queimado a largada quase literalmente, Méliuz pode vir a ser uma opção, sobretudo àqueles interessados em uma alternativa para se expor a criptomoedas
Nem todo mundo em pânico: Ibovespa busca recuperação em meio a reação morna dos investidores a ataque dos EUA ao Irã
Por ordem de Trump, EUA bombardearam instalações nucleares do Irã na passagem do sábado para o domingo
É tempo de festa junina para os FIIs
Alguns elementos clássicos das festas juninas se encaixam perfeitamente na dinâmica dos FIIs, com paralelos divertidos (e úteis) entre as brincadeiras e a realidade do mercado
Tambores da guerra: Ibovespa volta do feriado repercutindo alta dos juros e temores de que Trump ordene ataques ao Irã
Enquanto Trump avalia a possibilidade de envolver diretamente os EUA na guerra, investidores reagem à alta da taxa de juros a 15% ao ano no Brasil
Conflito entre Israel e Irã abre oportunidade para mais dividendos da Petrobras (PETR4) — e ainda dá tempo de pegar carona nos ganhos
É claro que a alta do petróleo é positiva para a Petrobras, afinal isso implica em aumento das receitas. Mas há um outro detalhe ainda mais importante nesse movimento recente.
Não foi por falta de aviso: Copom encontra um sótão para subir os juros, mas repercussão no Ibovespa fica para amanhã
Investidores terão um dia inteiro para digerir as decisões de juros da Super Quarta devido a feriados que mantêm as bolsas fechadas no Brasil e nos Estados Unidos
Rodolfo Amstalden: São tudo pequenas coisas de 25 bps, e tudo deve passar
Vimos um build up da Selic terminal para 15,00%, de modo que a aposta em manutenção na reunião de hoje virou zebra (!). E aí, qual é a Selic de equilíbrio para o contexto atual? E qual deveria ser?