Tony Volpon: Buy the dip
Já que o pessimismo virou o consenso, vou aqui argumentar por que de fato uma recessão é ainda improvável (com uma importante qualificação final)

Está fácil ser pessimista com os EUA e a bolsa americana. De várias maneiras, o governo Trump tem fugido do script esperado pelos mercados no período exuberante entre a eleição e a posse. A reversão do “Trump trade” tem sido quase que completa em vários mercados.
As ações da Tesla, que tinham tido uma das maiores valorizações com a eleição de Trump, caíram ao redor de 50% do seu pico em um período de algumas semanas. A correção do S&P 500 foi uma das mais rápidas correções de preços da história do mercado.
Sobre “por que?” de tudo isso, já discutimos no mês passado mostrando as “três surpresas de Trump”. Hoje quero discutir as prováveis consequências, e especificamente por quê, a meu ver, o mercado está exagerando na dose de pessimismo.
- VEJA MAIS: O que Trump planeja para o próximo dia 2 de abril? Veja como acompanhar em primeira mão
Os riscos e o pessimismo
Não há o que discutir que a economia americana está desacelerando, e que vários indicadores de sentimento, o tal “soft data”, têm caído para níveis associados a recessões, e essa possibilidade está sendo debatida intensamente: a economia americana cairá em recessão?
Essa pergunta é de extrema (e óbvia) importância: cálculos da Goldman Sachs mostram que depois de uma correção de 10% no S&P 500, se isso acontecer em um período não recessivo, na grande maioria das vezes o mercado tem uma relativamente rápida correção da queda e retomada da tendência de alta, isto é, deve-se “buy the dip”. Se for acompanhado por uma recessão, a queda pode se estender para algo acima de 25%.
Já que o pessimismo virou o consenso, vou aqui argumentar por que de fato uma recessão é ainda improvável (com uma importante qualificação final).
Leia Também
A combinação de aumento de tarifas, como a incerteza sobre as tarifas, sem dúvida representa um choque estagflacionário. Mas isso passa pelo mercado de bens/setor externo, quando 70% do PIB americano está concentrado no setor de serviços – a economia americana é uma gigante economia continental relativamente fechada, com a corrente de comércio não chegando a 25% do PIB.
Era esperado que a política tarifária de Trump elevaria o valor do dólar americano – como em 2018. Aqui o mercado também errou: o dólar apresenta queda de quase 4% no ano. Era também esperada uma alta nas taxas de juros, e no começo do ano a taxa das Treasuries de dez anos chegou a 4,80%, mas ela caiu para ao redor de 4,30%.
Ambos esses movimentos representam um afrouxamento expansivo das condições financeiras, neutralizando parte do aperto financeiro representado pela queda das bolsas. O índice de condições financeiras do Goldman Sachs, por exemplo, está hoje no mesmo nível do começo do ano.
Nenhuma recessão americana nos últimos 40 anos tem ocorrido sem algum choque exógeno negativo – como foi a pandemia – ou com uma crise financeira – como foi o estouro da bolha Nasdaq em 2000 ou a crise bancária de 2008. Até agora, pelo menos, não temos nem um nem o outro.
O “script” de recessão tem outro ingrediente importante: altas de juros básico promovida pelo Fed antes da recessão. Foi assim em 1991, 2000 e 2008 (altas de juros não causaram recessões em 1994 e 2022). Neste momento o Fed está cortando juros, e se houver uma virada negativa no “hard data”, podem apostar que Powell vai agir muito rapidamente para tentar salvar seu “soft landing”.
- LEIA TAMBÉM: Tony Volpon: As três surpresas de Donald Trump
O cenário global e a incerteza tarifária
As últimas recessões tiveram um caráter global, com o choque subjacente impactando negativamente vários países ao mesmo tempo.
Mas no caso atual a postura de Trump em relação tanto a seus aliados tradicionais como seu grande concorrente geopolítico, a China, tem feito esses países a anunciarem pacotes de estímulo fiscal.
No caso da Alemanha, maior economia da Europa, com um índice de endividamento de somente 63% do PIB, o pacote fiscal aprovado representará um gasto adicional de 20% do PIB.
Assim, diferente dos episódios recessivos recentes, não estamos vendo quedas sincronizadas de crescimento dos grandes blocos econômicos globais. O maior dispêndio fiscal europeu e chinês devem compensar, pelo menos em parte, qualquer queda de crescimento americano.
Corretamente muito da tese de recessão tem a ver com a alta da incerteza, e há estudos acadêmicos mostrando que alta de incerteza pode contribuir para a queda do crescimento econômico. E sem dúvida o vai-e-volta tarifário de Trump tem elevado o nível de incertezas.
Mas agora temos um horizonte, uma data, quando as incertezas tarifárias vão – pelo bem ou mal – diminuir (se não totalmente acabar): 2 de abril.
Nesta data o governo Trump vai divulgar suas tarifas recíprocas. Dada a expectativa de que haverá rodadas de negociações depois da divulgação, Trump tem como método de fixar posições “maximalistas” no início de qualquer negociação, em 2 de abril devemos saber, pelo menos, qual a extensão máxima do choque tarifário. Vamos saber o "ponto de partida máximo" do choque tarifário.
Agora há ainda o risco (este é o “porém” da minha tese otimista sobre o risco de recessão) de haver uma imposição tão alta de tarifas recíprocas que isso causaria uma recessão: isto é, um choque tarifário representaria um choque exógeno negativo forte o suficiente para causar uma recessão, como foi a pandemia.
Cálculos da Piper Sandler mostram que uma equalização completa de tarifas recíprocas elevariam a tarifa média americana para 15,5%, quando hoje está ao redor de 3%. Qualquer coisa perto de 15% causará, sem dúvida, uma recessão.
No início da semana os mercados subiram devido a uma matéria na Bloomberg citando fontes do governo que as tarifas recíprocas seriam mais “focadas” e seletivas. Apesar de essa notícia ser boa, a verdade é que a decisão será tomada somente por Trump, e provavelmente mais perto da data de 2 de abril.
Sabemos que há um grupo mais pragmático e um mais radical na questão tarifária dentro do governo – não ficaria surpreendido que o vazamento veio de uma fonte perto dos pragmatistas para mostrar a Trump os ganhos de uma postura tarifária mais comedida; afinal, sabemos que Trump gosta de ver as bolsas subindo.
Mas não devemos por isso já concluir que os pragmatistas vão ganhar o argumento. Até saber essa decisão final, não podemos bater o martelo na questão se haverá ou não uma recessão nos EUA.
Os cinco bilionários que mais perderam dinheiro neste ano em meio ao novo governo Trump – e o que mais aumentou sua fortuna
O ano não tem sido fácil nem para os ricaços; a oscilação do mercado tem sido fortemente influenciada pelas decisões do novo governo Trump, em especial o tarifaço global proposto por ele
Powell na mira de Trump: ameaça de demissão preocupa analistas, mas saída do presidente do Fed pode ser mais difícil do que o republicano imagina
As ameaças de Donald Trump contra Jerome Powell adicionam pressão ao mercado, mas a demissão do presidente do Fed pode levar a uma longa batalha judicial
Batalha naval: navios da China entram na mira das tarifas americanas — mas, dessa vez, não foi Trump que idealizou o novo imposto
As autoridades americanas chegaram à conclusão que a China foi agressiva para estabelecer dominância no setor de construção naval
Guerra comercial de Trump está prejudicando a economia do Brasil? Metade dos brasileiros acredita que sim, diz pesquisa
A pesquisa também identificou a percepção dos brasileiros sobre a atuação do governo dos Estados Unidos no geral, não apenas em relação às políticas comerciais
Com ou sem feriado, Trump continua sendo o ‘maestro’ dos mercados: veja como ficaram o Ibovespa, o dólar e as bolsas de NY durante a semana
Possível negociação com a China pode trazer alívio para o mercado; recuperação das commodities, especialmente do petróleo, ajudaram a bolsa brasileira, mas VALE3 decepcionou
‘Indústria de entretenimento sempre foi resiliente’: Netflix não está preocupada com o impacto das tarifas de Trump; empresa reporta 1T25 forte
Plataforma de streaming quer apostar cada vez mais na publicidade para mitigar os efeitos do crescimento mais lento de assinantes
Show de ofensas: a pressão total de Donald Trump sobre o Fed e Jerome Powell
“Terrível”, “devagar” e “muito político” foram algumas das críticas que o presidente norte-americano fez ao chefe do banco central, que ele mesmo escolheu, em defesa do corte de juros imediato
Mirou no que viu e acertou no que não viu: como as tarifas de Trump aceleram o plano do Putin de uma nova ordem mundial
A Rússia não está na lista de países que foram alvo das tarifas recíprocas de governo norte-americano e, embora não passe ilesa pela efeitos da guerra comercial, pode se dar bem com ela
Sobrevivendo a Trump: gestores estão mais otimistas com a Brasil e enxergam Ibovespa em 140 mil pontos no fim do ano
Em pesquisa realizada pelo BTG, gestores aparecem mais animados com o país, mesmo em cenário “perde-perde” com guerra comercial
Ações da Hertz dobram de valor em dois dias após bilionário Bill Ackman revelar que assumiu 20% de participação na locadora de carros
A gestora Pershing Square começou a montar posição na Hertz no fim de 2024, mas teve o aval da SEC para adiar o comunicado ao mercado enquanto quintuplicava a aposta
Mudou de lado? CEO da Nvidia (NVDC34), queridinha da IA, faz visita rara à China após restrições dos EUA a chips
A mensagem do executivo é simples: a China, maior potência asiática, é um mercado “muito importante” para a empresa, mesmo sob crescente pressão norte-americana
Dólar volta a recuar com guerra comercial entre Estados Unidos e China, mas ainda é possível buscar lucros com a moeda americana; veja como
Uma oportunidade ‘garimpada’ pela EQI Investimentos pode ser caminho para diversificar o patrimônio em meio ao cenário desafiador e buscar lucros de até dólar +10% ao ano
Van Gogh: 8 museus e destinos para conferir as obras do artista
Pintor holandês não teve notoriedade em vida; atualmente, é um dos artistas mais consagrados da história, com obras espalhadas por todo o mundo
Que telefone vai tocar primeiro: de Xi ou de Trump? Expectativa mexe com os mercados globais; veja o que esperar desta quinta
Depois do toma lá dá cá tarifário entre EUA e China, começam a crescer as expectativas de que Xi Jinping e Donald Trump possam iniciar negociações. Resta saber qual telefone irá tocar primeiro.
É hora de aproveitar a sangria dos mercados para investir na China? Guerra tarifária contra os EUA é um risco, mas torneira de estímulos de Xi pode ir longe
Parceria entre a B3 e bolsas da China pode estreitar o laço entre os investidores do dois países e permitir uma exposição direta às empresas chinesas que nem os EUA conseguem oferecer; veja quais são as opções para os investidores brasileiros investirem hoje no Gigante Asiático
Rodolfo Amstalden: Escute as feras
As arbitrariedades tarifárias de Peter “Sack of Bricks” Navarro jogaram a Bolsa americana em um dos drawdowns mais bizarros de sua longa e virtuosa história
Status: em um relacionamento tóxico com Donald Trump
Governador da Califórnia entra com ação contra as tarifas do republicano, mas essa disputa vai muito além do comércio
Taxa das blusinhas versão Trump: Shein e Temu vão subir preços ainda este mês para compensar tarifaço
Por enquanto, apenas os consumidores norte-americanos devem sentir no bolso os efeitos da guerra comercial com a China já na próxima semana — Shein e Temu batem recordes de vendas, impulsionadas mais pelo medo do aumento do que por otimismo
Por essa nem o Fed esperava: Powell diz pela primeira vez o que pode acontecer com os EUA após tarifas de Trump
O presidente do banco central norte-americano reconheceu que foi pego de surpresa com o tarifaço do republicano e admitiu que ninguém sabe lidar com uma guerra comercial desse calibre
O frio voltou? Coinbase acende alerta de ‘bear market’ no setor de criptomoedas
Com queda nos investimentos de risco, enfraquecimento dos indicadores e ativos abaixo da média de 200 dias, a Coinbase aponta sinais de queda no mercado