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Inchaço da máquina pública impede Brasil de prosperar sem fisiologismo

Ivan Sant’Anna vai contar para você de qual forma a esfera pública se relaciona com o desequilíbrio fiscal.

29 de agosto de 2020
11:30 - atualizado às 18:15
Brasília
Imagem: Shutterstock

Esta semana, o jornal Folha de São Paulo publicou uma matéria intitulada “Servidor público concentra seis das 10 ocupações mais bem pagas”, na qual mostra a discrepância, no Brasil, entre os salários públicos e os da iniciativa privada.

Ao longo dos anos, formou-se uma casta de intocáveis que, ao contrário de seus homônimos indianos (que eram os párias), aqui são funcionários públicos cujos salários, vantagens e benefícios se transformam em direitos adquiridos. Portanto, imexíveis.

Nas décadas de 1940 e 1950, quando a capital federal ainda era o Rio de Janeiro, os servidores eram conhecidos como barnabés, expressão pejorativa em função de seus baixos ordenados.

Juízes e parlamentares ainda tinham um diferencial. Seus proventos eram isentos de Imposto de Renda.

Só que não havia auxílio-moradia, muito menos apartamento funcional. Cada deputado ou senador que se virasse para alugar o imóvel onde morava. Ah, também não tinha esse negócio de passagens aéreas gratuitas.

As mordomias e vantagens extras começaram com a mudança para Brasília. Curiosamente, eram lançadas no orçamento com essa rubrica: “mordomia”.

A cada ano que passava, as vantagens dos servidores iam aumentando, tornando-se imediatamente direito adquirido. Ninguém pode mexer, por mais absurdo que seja o benefício.

Paradoxalmente, entre os direitos adquiridos estabelecidos na Constituição de 1988 estão educação e saúde gratuitas, lazer, segurança, proteção à maternidade, à infância e aos desamparados. Esses não pegaram direito, ou pegaram leve.

É só ir num hospital público e ver o que acontece lá dentro.

Quando, no final dos anos 1980 e início dos 1990, eu escrevia o Relatório FNJ, volta e meia tocava no assunto.

Num desses boletins, publicado em 29 de julho de 1988, afirmei:

“É preciso acabar com os direitos adquiridos, terminar com as distorções salariais, liquidar as isonomias, estabilidades e vitaliciedades. É preciso, enfim, desatar o nó que é o Brasil de hoje em termos de despesas públicas.”

Quase um ano mais tarde, em 28 de abril de 1989, voltei a bater na mesma tecla:

“Não tivemos e não temos o menor respeito com a moeda. Não tivemos e não temos a menor disciplina nos gastos públicos. Criamos monstros de direitos adquiridos. Uma professora se aposenta com 25 anos de trabalho. Um funcionário público não pode ser demitido. Noventa e dois por cento da receita estão comprometidos com custeio.”

Em 1960, durante a disputa eleitoral para a presidência da República, da qual saiu vencedor, Jânio Quadros comentou com Roberto Campos:

“A grande maioria dos brasileiros detesta funcionários públicos. É só criticá-los que vencerei estas eleições.”

Quase trinta anos mais tarde, em 1988, Fernando Collor de Mello, quase desconhecido governador de Alagoas, tornou-se celebridade nacional ao combater (ou fingir que combatia) os altos salários de alguns funcionários do poder judiciário de Alagoas.

Venceu as eleições, derrotando Lula no segundo turno.

Este ano, milhões de trabalhadores do setor privado foram severamente prejudicados pela Covid-19. Alguns perderam o emprego. Outros tiveram seus salários reduzidos.

Houve algum corte no funcionalismo?

Nenhum.

Seria a coisa mais lógica do mundo uma redução de uns 30% nos vencimentos daqueles servidores públicos que foram mandados para casa. Pelo menos os que ganham, digamos, mais do que dez mil reais por mês, observando-se o efeito cascata. Seria um baita reforço para os tesouros federal, estaduais e municipais.

Nada. Quem pagou o pato, só para citar um exemplo, foi a dona de uma pequena loja de bijuterias no shopping center ao lado de minha casa, que teve de fechar as portas e dispensar os funcionários. Ou a moça que vinha aqui em casa fazer as unhas de minha mulher.

Os intocáveis continuaram intocáveis.

Lembram-se daquele desembargador que desacatou guardas municipais da cidade de Santos, chamando-os de analfabetos e rasgando o talão de multa que preencheram?

Pois bem, nesse caso poderá haver punição. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, talvez “até” uma aposentadoria compulsória.

Outro dia, o Tribunal de Justiça de São Paulo anunciou o pagamento de um prêmio de R$ 100 mil para os desembargadores que julgassem processos durante a pandemia. Só que a decisão pegou tão mal que a medida foi desfeita no dia seguinte.

Enquanto prevalecerem os privilégios da casta dos intocáveis (ou seriam brâmanes?), o Brasil jamais enxugará sua máquina pública. Sempre que houver uma sobrinha de caixa, dela os eleitos se apropriarão.

Em meio a tudo isso, e considerando-se taxas de juros de renda fixa próximas de zero, o que resta ao investidor?

A resposta é meio óbvia. Partir para a renda variável, escolhendo papéis de empresas exportadoras, que acabam se beneficiando dessas distorções altistas para o dólar.

Ou então, se o dinheiro não for reserva de emergência, comprar criptomoedas. Estas independem de governos, são imunes a absurdos adquiridos e nada têm a ver com as mazelas tupiniquins.

A propósito dessas criptos, a Inversa tem publicações, áudios e vídeos arquitetados pela especialista Helena Margarido.

Ela não vai conseguir para o caro amigo leitor um carguinho no judiciário, ou cartório de registro civil, muito menos transformá-lo em um intocável. Mas suas indicações poderão multiplicar, quem sabe por dezenas de vezes, essa graninha que você cisma em manter na poupança ou no fundo recomendado pelo gerente do seu banco.

Aproveito para indicar a leitura do meu último livro lançado "30 Lições de Mercado". Você pode adquirir neste link o livro que vai mudar seu pensamento em relação aos investimentos.

Um forte abraço e um ótimo fim de semana.

Ivan Sant’Anna

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