De médico, louco e economista, todo mundo tem um pouco
No mercado, não tem muito segredo nem maldade, só um pragmatismo que às vezes assusta mesmo: em linhas gerais, quem quer aplicar (poupar) empresta dinheiro a quem quer empreender

“Que legal, você é médico? Será que não podia dar uma olhadinha nessa pinta que apareceu aqui faz uns dias, ó?!”
- Aposente-se aos 40 (ou o quanto antes): Não depender de um salário no fim do mês é o seu grito de liberdade. Aqui está o seu plano para dar Adeus ao seu chefe.
Nunca vi essa cena acontecer, mas toda vez que falo que trabalho no mercado financeiro, não demora muito para alguém começar a me pedir dicas e sugestões. Até pouco tempo atrás, a campeã era: “Vou viajar nas férias, você acha que o dólar vai cair ou subir?”.
Educadamente (não muito, confesso), costumava responder: “É mais fácil te dizer se vai chover daqui a dois meses do que te falar o que vai ser do dólar amanhã”.
Eu não sei fazer previsões — minha bola de cristal veio quebrada de fábrica. Eu não acredito nem em horóscopo, que dirá em tarô, búzios ou projeções de economistas?!
Se você fechou uma viagem, compre agora todos os dólares de que vai precisar e fique tranquilo — tentar operar a grana da viagem é pedir para transformar suas férias em uma enorme dor de cabeça. A ideia é simples: se você tem grana para pagar tudo no câmbio atual, pague e se livre do problema; se você está torcendo para o dólar cair, é melhor trocar de destino.
Curiosamente, nos últimos meses, quando falo o que faço da vida, a pergunta mudou um pouco: “Esses fundos imobiliários vão continuar subindo?”.
Leia Também
A simplicidade é a maior das sofisticações na hora de investir
Marcas da independência: Vitreo agora é Empiricus Investimentos
Gosto mais dessa: me faz acreditar que as pessoas estão se preocupando mais com o futuro e estão saindo da poupança e dos imóveis físicos para colocar um pouco de dinheiro em outros tipos de ativos.
Por mais que o mercado financeiro ainda faça muita gente torcer o nariz por aí (os Faria Limers não ajudam muito a melhorar a imagem, convenhamos), a Bolsa nada mais é do que um mecanismo de transferência de recursos — me divirto com publicitários que falam mal da ganância dos banqueiros enquanto bolam campanhas para vender McLanche Feliz para criancinhas acima do peso.
No mercado, não tem muito segredo nem maldade, só um pragmatismo que às vezes assusta mesmo: em linhas gerais, quem quer aplicar (poupar) empresta dinheiro a quem quer empreender. Não caia no discurso fácil de que colocar dinheiro na Bolsa é viver de especulação (o que não seria nenhum problema): o comprador de ações financia fábricas, represas, estradas. Gera, mesmo que indiretamente, milhares de empregos e melhora a vida de muita gente por aí.
Um acionista, grande ou pequeno, faz muito mais pelo desenvolvimento do país do que o tuiteiro que vive de mesada e faz campanha pelo fim dos canudinho plásticos, mas não dispensa um bom ar-condicionado.
Pegue o exemplo de um fundo imobiliário — com a morte da poupança (alguém aí está a fim de investir em um produto que rende menos do que a inflação?), de onde virá o funding do setor imobiliário?
Muitas vezes, os fundos compram imóveis de desenvolvedores e incorporadores, o que permite uma nova rodada de investimentos. Há também aqueles que desenvolvem projetos e ajudam a criar um novo centro de distribuição ou a sede de uma empresa. No fim das contas, o cotista (poupador) é quem coloca dinheiro nas mãos do empreendedor (tomador).
Olha que bonito: quando te perguntarem se você investe em fundos imobiliários, você pode responder que não, que você financia prédios de escolas e hospitais, que está dando crédito para uma nova incorporação imobiliária ou que está financiando a construção do novo centro de distribuição da Lojas Renner, por exemplo.
Mesmo os famigerados bancões são indispensáveis para o desenvolvimento de projetos, sejam grandes ou pequenos — o Itaú pode financiar o carro do seu petshop ou a nova mina de minério da Vale em Carajás.
Só chegamos onde chegamos porque foram criados mecanismos de transferência de recursos que possibilitaram a execução de uma infinidade de avanços tecnológicos, que melhoram e salvam vidas cotidianamente.
Desde a década de 1950, cientistas teorizavam que seria possível gerar imagens do corpo humano através da manipulação de campos magnéticos. Foram anos de estudo, pesquisa e testes. Mas a máquina de ressonância magnética só saiu do papel depois que a GE entrou na brincadeira, na década de 1980.
A GE é uma empresa listada na Bolsa de Nova York e tem boa parte de seus projetos bancados via emissões no mercado de capitais — da próxima vez que fizer um exame, não se esqueça de agradecer ao “porco capitalista” que ajudou na detecção precoce de milhões de tumores, benignos ou malignos, ao redor do mundo.
Me perdoe se divago, imagino que, como as dezenas de pessoas que me perguntaram nos últimos dias, você queira saber se o Ifix (principal índice de fundos imobiliários da B3) vai subir ou cair em 2020.
Depois de subir quase 36% em 2019 e do rali especial de Natal (foram quase 11% em dezembro), muita gente começou a profetizar o fim da festa. De fato, depois de um movimento desses, é difícil imaginar que ainda há muito mais por vir.
Por outro lado, não vejo grandes motivos para uma queda acentuada — hoje, o rendimento médio anual dos fundos imobiliários está em torno de 6,4% e ainda é atrativo. Confesso que parece pouco quando olhamos para os 11,5% de 2015, mas as coisas não existem no vácuo. O valor dos ativos financeiros é, em certa medida, relativo. Em 2015, a Selic estava na casa dos 14% e, hoje, está em 4,5%. Comparativamente, os 6,4% de 2020 (140% da Selic) são muito maiores do que os 11,5% de 2015 (82% da Selic).
Obs.: como os aluguéis são corrigidos anualmente pela inflação, o rendimento dos fundos pode ser considerado real e, portanto, a comparação com a Selic não é a mais adequada, mas serve para ilustrar o meu ponto.
Mais do que isso, acredito que o momento do ciclo é particularmente positivo para os fundos. Em algumas regiões, sobretudo nas áreas mais procuradas da cidade de São Paulo, a vacância tem caído e o aluguel tem subido de forma considerável, o que indica um potencial de aumento nas receitas e distribuição de rendimento dos fundos expostos à região.
Como há poucos projetos para serem entregues nos próximos trimestres, o cenário deve permanecer favorável aos proprietários, e os locatários, coitados, vão ter que se virar para pagar o aluguel.
É claro que a situação não é a mesma em todo lugar. O Rio de Janeiro, por exemplo, ainda tem muito caminho pela frente até que a recuperação apareça, dada a profundidade da crise que se alojou por lá.
Mesmo com o ciclo favorável, concordo que seria surpreendente se tivéssemos uma alta muito intensa no curto prazo — o processo de ajuste dos aluguéis é lento, com revisionais espalhadas ao longo de três anos, e quando a vacância cai há sempre descontos e carências, de forma que o impacto sobre o balanço do fundo só apareça meses após a ocupação.
De fato, o que vimos até agora foi uma leve correção do Ifix em janeiro (o índice recua pouco mais do que 1,5% no ano), um fenômeno absolutamente natural depois do que vimos no ano passado (foram 24 altas seguidas entre 27 de novembro e 3 de janeiro).
Da mesma forma que sou incapaz de prever o câmbio e o clima, não sei estimar o valor do Ifix no fim do ano, tampouco no fim da semana. Mas posso te dizer, com razoável confiança, que o momento ainda é favorável para os fundos e para o mercado imobiliário de uma forma geral.
Por mais que haja medo do “oba-oba” que deixou muita gente machucada em 2012 e 2013, o volume de lançamentos e a velocidade de absorção de área bruta locável (ABL) permanecem saudáveis, o que reduz bastante o risco de bolha. Tem outra: quem tirar grana dos FIIs vai aplicar onde? A farra do CDI acabou, não há muito para onde correr, amigo.
Em termos relativos, ainda considero os fundos imobiliários uma classe interessante — boa parte dos fundos é lastreada em ativos reais (os imóveis da carteira), o carrego é bom (o rendimento pinga na sua conta todo mês) e o ciclo é favorável, por mais que não tenhamos mais as barganhas de 2016.
Se estiver com medo de entrar agora, procure as ofertas, que costumam sair com um belo desconto para o valor de tela. O VILG11, fundo de logística da Vinci (que é uma de minhas gestoras preferidas), acabou de anunciar uma oferta a pouco mais de R$ 117 por cota (o papel tinha fechado acima dos R$ 140 na última sexta-feira).
Se a notícia é ruim pra quem já tem as cotas, pode ser o empurrãozinho que faltava para quem está querendo entrar. Há, claro, riscos envolvidos — não existem garantias de que os novos ativos, adquiridos com os recursos da emissão, terão a mesma qualidade da carteira atual. É preciso fazer o dever de casa, olhar o prospecto no detalhe e, então, tomar a decisão.
Eu certamente vou dar uma olhadinha, não é todo dia que dá para comprar um fundo desses com cerca de 15% de desconto.
Olhando para o mercado agora, a coisa não está muito promissora: com a piora do cenário em Hong Kong e o medo de um vírus agressivo na China, os mercados asiáticos caem forte e os principais indicadores nos EUA também apontam para baixo na volta do fim de semana prolongado. Ao que parece, não teremos uma terça-feira muito divertida pela frente.
Rodolfo Amstalden: O elogio que nem minha mãe me fez
Em mercados descontados que ainda carregam grandes downside risks, ganha-se e perde-se muito no intraday, mas nada acontece no dia após dia
Degrau por degrau: Confira a estratégia de investimento dos grandes ganhadores de dinheiro da bolsa
Embora a ganância nos atraia para a possibilidade de ganhos rápidos e fáceis, a realidade é que quem ganha dinheiro com ações o fez degrau por degrau
Blood bath and beyond: Entenda o banho de sangue dos mercados financeiros — e as oportunidades para o Brasil
Michael Hartnett, do Bank of America Merrill Lynch, alerta para um possível otimismo exagerado e prematuro sobre o fim da subida da taxa básica de juro nos EUA; saiba mais
Você está disposto a assumir riscos para atingir seus sonhos e ter retornos acima da média?
Para Howard Marks, você não pode esperar retornos acima da média se você não fizer apostas ativas. Porém, se suas apostas ativas também estiverem erradas, seus retornos serão abaixo da média
Rodolfo Amstalden: Qual é o mundo que nos aguarda logo à frente?
O mercado inteiro fala de inflação, e com motivos; afinal, precisamos sobreviver aos problemas de curto prazo. Confira as lições e debates trazidos por John Keynes
Novas energias para seu portfólio: Conheça o setor que pode impedir a Europa de congelar — e salvar sua carteira
Para aqueles que querem apostar no segmento de energia nuclear, responsável por 10% da energia do mundo, é interessante diversificar uma pequena parcela do capital
Está na hora de você virar um investidor qualificado
No longo prazo, produtos de investimento qualificado podem ter uma rentabilidade média maior e permitem maior diversificação
É melhor investir em bolsa ou em renda fixa no atual momento dos mercados financeiros?
A resposta continuará sendo uma carteira devidamente diversificada, com proteções e sob a âncora de valuations suficientemente descontados
Rodolfo Amstalden: Foi tudo graças à peak inflation
Imagine dois financistas sentados em um bar. Um desses sujeitos é religioso, enquanto o outro é ateu. Eles discutem sobre a eventual existência de bull markets
Beta, e depois alpha: Saiba por que você precisa saber analisar a temporada de balanços antes de montar sua carteira
Depois de muito tempo de narrativas sobre juros, inflação e recessão, talvez estejamos entrando num momento em que os resultados individuais voltam a ser relevantes
Rodolfo Amstalden: Uma ideia de research jamais poderá salvar sua alma
Venho escrevendo relatórios de research há quase 15 anos, e ainda não aprendi uma lição: a de que não é possível alcançar consolo para os nossos lutos através da explicação
Más notícias virando boas notícias? Saiba como queda no PIB dos EUA pode beneficiar seus investimentos
Investidores enxergaram nesse dado ruim a possibilidade de o Fed reduzir o aperto monetário. Desde então, os índices americanos valorizaram mais de 10%. Mas será que é para ficar animado?
Felipe Miranda: Dez lições de um fracassado
Após escrever um best-seller sobre o sucesso, hoje resolvi falar sobre o fracasso. Confira uma dezena de coisas que muito possivelmente você não vai ouvir por aí
Por que uma certificação ainda vale muito para trabalhar no mercado financeiro
Longe de mim desmerecer o conhecimento empírico, mas ter um certificado que comprove a sua expertise ainda é fundamental no mundo dos investimentos
O que é preciso para alcançar os melhores resultados em investimentos
Os melhores resultados não costumam vir das nossas melhores intenções, mas das melhores leituras de cenário.
Rodolfo Amstalden: Como se não bastasse, a crise hídrica nas bolsas mundiais voltou
O Ibovespa rompeu a barreira dos 100 mil pontos 8 vezes desde junho, sem sair do lugar, e os investidores estão perdendo dinheiro com tantos pregões que não levam a lugar nenhum
Como lidar com o desconhecido? Saiba como analisar os cenários no mundo e encontrar oportunidades de investimento
Minha sugestão é a diversificação de seu portfólio de investimentos e a ampliação do seu horizonte temporal para se apropriar dos diversos prêmios de risco ao longo do tempo
Será possível retornar à era de ouro dos grandes fundos de ações?
O jogo está estruturalmente mais difícil, por conta da maior competição, das restrições impostas pelo tamanho e pela menor assimetria de informação
E o Oscar de melhor fundo no curto prazo vai para…
Nas crises, o investidor inteligente é aquele que sobrevive. Para isso, deve-se preferir a consistência de bons retornos à raridade de desempenhos excepcionais
Rodolfo Amstalden: Nasci 300 mil anos atrás, sou quase um bebê
Somos mais frágeis do que gostaríamos de admitir. Mas, se tomássemos em plena conta essa fragilidade, faltaria confiança para seguirmos adiante