O potencial de entrada de recursos para o mercado de ações brasileira é enorme. A afirmação é dos analistas do BTG Pactual, que avaliaram a alocação atual de fundos externos e locais ao mercado. O que vai ditar o ritmo e o volume de entrada são as medidas econômicas do novo governo.
Segundo o banco, conforme aumente a confiança dos investidores na capacidade de o governo lidar com a questão fiscal, as taxas de juros de longo prazo devem recuar ainda mais, tornando o mercado de ações mais atrativo.
“Com as taxas de juros de longo prazo prontas para cair, o fluxo para ações está pronto para disparar”, diz o relatório.
De fato, as taxas longas já recuaram recentemente, antecipando o comprometimento do governo com o problema fiscal. O banco lembra que a Nota do Tesouro Nacional (NTN-B) com vencimento de 2035 tem uma taxa de 5,2% em comparação com cerca de 5,6% cerca de dois meses atrás. “Esse ainda é um retorno suculento, mas que deve apontar para baixo à medida que as contas fiscais do Brasil melhorem”, diz a instituição.
Aos números
Usando os dados da consultoria EPFR Global, os analistas notaram que a exposição ao mercado de ações do Brasil de fundos globais e fundos emergentes (GEM, na sigla em inglês) está perto das mínimas históricas. A EPFR acompanha mais de 100 mil fundos ao redor do mundo, com cerca de US$ 34 trilhões em ativos.
Em setembro (último dado disponível), apenas 0,37% do dinheiro dos fundos globais estavam estacionados por aqui em comparação com 1,4% de outubro de 2014, pouco antes de confirmada a reeleição de Dilma Rousseff. Dos fundos emergentes, o percentual de setembro era de 6,4%, contra 11,1% em 2014.
Fazendo uma “conta de padaria” e considerando apenas o retorno dessas exposições ao patamar de 2014, o valor estimado que pode vir para o mercado de ações ficou em R$ 251 bilhões, ou US$ 68 bilhões.
Repetindo o mesmo exercício, mas considerando as exposições dos fundos locais, o potencial de entrada seria de outros R$ 200 bilhões.
Considerando dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), a alocação média dos fundos em ações está em 9,2%. Se esse percentual voltar para os 11,9% de 2014, cerca de R$ 100 bilhões podem ser direcionados ao mercado. Agora, se a alocação voltar à média de 14%, vista entre 2011 e 2013, estamos falando de algo em torno de R$ 200 bilhões.
Desfecho eleitoral deixa cenário mais construtivo
Segundo o BTG, o que assustou os investidores foi uma eleição complexa e difícil de se entender, mas com esse evento ficando para trás e com a redução do prêmio político dos ativos brasileiros, todas as atenções estão voltadas à política econômica do novo governo.
E não é só o BTG, que tem avaliação prospectiva positiva. Em carta aos cotistas, o chefe de investimento de renda variável da Franklin Templeton, Frederico Sampaio, afirma que as intenções declaradas até o momento pelo novo governo vão no caminho da recuperação da confiança e do crescimento econômico.
“Ainda não se sabe ao certo como será o governo Bolsonaro, mas o afastamento do risco de retrocesso da política econômica e da volta do populismo representado pela candidatura do PT foi celebrado pelos investidores”, diz o gesto na carta.
Sampaio, pondera, no entanto, que ainda resta muita desconfiança com relação à convicção de Jair Bolsonaro nessa agenda econômica liberal, mas que as “intenções declaradas” são favoráveis.
Para Sampaio, até a posse do novo governo, a tendência é que ocorra uma “lua de mel” em função das boas intenções, “mas a efetiva implementação ainda não é testada”. O especialista também chama atenção para a reforma da Previdência, que voltando a tramitar, pode alimentar ainda mais o otimismo.
Ainda de acordo com Sampaio, a bolsa está negociando por múltiplo preço/lucro projetado de 11,9 vezes, o que é visto como “muito atraente” considerando o cenário de recuperação econômica e de crescimento de lucros aliado ao nível historicamente baixo dos juros.
“A perspectiva de aprovação de reformas pode motivar revisões para cima do crescimento esperado para os anos por vir. Se o país conseguir realmente avançar na agenda econômica proposta, é possível vislumbrar longo período de valorização consistente do mercado”, diz Sampaio.
O especialista afirma que já mudou suas posições em mercado. A incerteza eleitoral e o choque na atividade proveniente da paralisação dos caminhoneiros, tinha levado a ajustes na estratégia do fundo Franklin Valor e Liquidez (FVL).
A carteira estava mais balanceada entre setores, com maior exposição a exportadoras e menor exposição a segmentos mais alavancados à recuperação econômica.
Agora, Sampaio afirma que a posição em exportadoras, como a Suzano, foi desfeita, bem como nas empresas de menor alavancagem.
“Voltamos a apostar em empresas estatais que têm perspectiva de melhora na gestão e/ou possibilidade de privatização. Nesse sentido, em adição à posição em Cemig, adquirimos ações da BR Distribuidora e da Petrobras”, diz Sampaio.
Renda fixa
Também em carta, o gestor de renda fixa da Franklin Templeton, Rodrigo Borges, afirma que a exposição a risco do fundo nos últimos meses foi mantida em patamares reduzidos quando comparada à média histórica.
Mesmo com dúvidas sobre a capacidade de Bolsonaro em angariar apoio político, Borges avalia que o fato de Paulo Guedes, que é o fiador do presidente eleito na área econômica, possuir uma orientação claramente liberal, fez com que os preços dos ativos brasileiros melhorassem bastante.
“Nos parece que a indicação de nomes técnicos para cargos importantes dentro do governo será a regra, o que tornará a política econômica mais robusta e eficiente e, portanto, capaz de impulsionar o crescimento”, escreve Borges.
Avaliando a última decisão do Comitê de Política Monetária (Copom), que manteve a Selic em 6,5%, Borges diz que como a assimetria entre os riscos de alta e baixa da inflação diminuiu, a taxa básica de juros pode permanecer inalterada por um período de tempo maior do que o anteriormente antecipado.