Felipe Miranda: Dilema do prisioneiro, versão brasileira
Como um dilema proposto em 1950 nos ajuda a entender o que está acontecendo no Brasil
“Dilema do prisioneiro” é aquele tipo de equilíbrio de Nash (sim, do filme “Uma Mente Brilhante”) em que a falta de coordenação entre os envolvidos leva a um resultado pior frente ao que seria o ótimo social.
Se você já conhece o problema, pode pular os próximos três parágrafos.
Originalmente, o dilema foi proposto em 1950 por Merrill Flood e Melvin Dresher, apresentado assim:
Dois suspeitos, A e B, são presos pela polícia. A polícia tem provas insuficientes para os condenar, mas, separando os prisioneiros, oferece a ambos o mesmo acordo: se um dos prisioneiros, confessando, testemunhar contra o outro e esse outro permanecer em silêncio, o que confessou sai livre enquanto o cúmplice silencioso cumpre 10 anos de sentença.
Se ambos ficarem em silêncio, a polícia só pode condená-los a 6 meses de cadeia cada um. Se ambos traírem o comparsa, cada um leva 5 anos de cadeia. Cada prisioneiro faz a sua decisão sem saber que decisão o outro vai tomar, e nenhum tem certeza da decisão do outro.
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A questão que o dilema propõe é: o que vai acontecer? Como o prisioneiro vai reagir?
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O melhor para os dois seria ambos negarem, claro. No entanto, movido pelo autointeresse e sem saber se o colega vai cooperar, um resultado típico costuma ser os dois delatarem, com medo de chegarem ao pior resultado para si.
“Delatar" é a chamada estratégia dominante para ambos os jogadores. Se "B" negar, a decisão de “A" deveria ser, pensando em si, mesmo, delatar (“A” sai livre, contra a alternativa de ser condenado a seis meses).
Já se “B” delatar, o melhor para “A" também seria delatar (“A" é condenado a cinco anos, contra a alternativa de pegar 10 anos). Vale o mesmo raciocínio para as decisões de “B”. Assim, chegamos ao resultado indesejável para os dois, mesmo com uma postura estritamente racional.
Como aplicamos esse dilema na economia do Brasil de hoje?
Há uma série de aplicações do Dilema do Prisioneiro e do tema mais geral de Teoria dos Jogos à Economia. A maior parte delas está centrada na Microeconomia e dinâmicas competitivas, mas não é só isso.
Paul Krugman, por exemplo, tem um artigo clássico sobre coordenação entre política fiscal e monetária na esfera macro. A melhor combinação possível entre as políticas seria um fiscal apertado, com um monetário frouxo.
Ocorre que, sem conseguir confiar na capacidade dos governos se manterem austeros diante do claro viés populista, costumamos morrer exatamente no oposto: uma política fiscal frouxa, que força um monetário apertado. Qualquer semelhança com o caso brasileiro não é mera coincidência.
É curioso como governos de esquerda costumam criticar os juros altos, mas acabam sendo seus principais causadores. O governo gasta mais e impõe uma trajetória não-convergente para a dívida pública. Investidores cobram mais juros para financiar o país.
As expectativas de inflação sobem com medo de o Banco Central perder a moeda. A política monetária se vê obrigada a reagir. Voltando à teoria dos jogos, é como se estivéssemos numa dinâmica de Stackelberg em que o Copom, embora seja quem define a Selic, apenas reage à escolha do líder.
Outra aplicação bem típica à Pindorama se verifica na reforma tributária. O melhor para todo mundo seria ninguém ter alíquota privilegiada.
Todos pagam o mesmo imposto, chegando a isonomia tributária, simplificação e eficiência produtiva. O capital não é alocado a partir de planejamentos tributários e não precisamos submeter o produto à Zona Franca de Manaus, enfrentando a logística do labirinto do Minotauro, para ter uma determinada isenção.
Mas sabemos que o setor X da economia, que é muito estratégico e tem efeitos sociais enormes, vai lá fazer seu lobby. Então, o setor Y também se motiva a fazer o mesmo. Em pouco tempo, todo o alfabeto, que gostaria de ter uma alíquota geral menor, está lá barganhando seu próprio benefício.
Assim se forma o país da meia-entrada. Uma porção enorme de setores fica com uma alíquota diferenciada. O resto da sociedade paga a conta. Morremos com a maior alíquota de IVA do mundo.
Do outro lado, na política...
Tudo isso é conhecido, sem grandes novidades. Agora, porém, entra uma nova dinâmica em cena. Na teoria dos jogos, a prática é outra. No equilíbrio entre Executivo e Legislativo, encontramos um desastre para os verdadeiros liberais.
O governo teoricamente progressista perde todas as pautas de costumes, seja a PEC das Drogas, os vetos da saidinha ou a manutenção da decisão de Bolsonaro para a Lei de Segurança Nacional. Não há progressismo algum na agenda de costumes.
Ao mesmo tempo, observamos um governo deliberadamente reacionário na economia, tentando recuperar pautas de 20 anos atrás.
O problema não é exatamente que as ideias sejam velhas, mas que sejam velhas e ruins. Não deu certo antes e não há nenhuma evidência de que possam dar certo agora. Dizem que repetir o mesmo procedimento esperando um resultado diferente é uma das definições de loucura.
Vivemos um ambiente de contrarreforma ou de restauracionismo, em que buscamos voltar a um passado anterior à Lei das Estatais, menor independência do Banco Central, leis de conteúdo nacional para o setor petróleo, insistência obsessiva por refinarias como Abreu e Lima, nova tentativa de revitalizar a fracassada indústria naval.
Poderíamos chegar a uma espécie de ótimo social em que Paulo Guedes conduziria a economia e Haddad tocaria a pauta dos costumes. Estamos com o risco de ter Galípolo definindo boa parte da política econômica e Silas Malafaia pregando os costumes.
Reclamamos da polarização entre Lula e Bolsonaro, mas precisamos tomar cuidado com o que desejamos. Do jeito que as coisas vão, o reacionarismo do governo na economia e do Congresso nos costumes pode nos levar a um resultado ainda pior.
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Com uma ala do PT cogitando outro candidato em 2026 e Bolsonaro impedido, podemos fugir da atual polarização para cair em outra, num grande embate entre primeiras damas.
Você já está preparado para Janja contra Michele? E para quem achar São Paulo mais avançada e “leading" para o restante do Brasil, conseguiremos conviver com o prefeito Pablo Marçal?
Bom, quem sabe assim possamos aprender a subitamente pilotar um helicóptero diante de uma pane no ar, nos preparar para um Ironman em cinco dias, lutar contra um rinoceronte. Estamos perdendo o senso do ridículo e, com ele, a esperança.
Este é um novo risco do Brasil: deixarmos até mesmo o título de país do futuro. Veja o que aconteceu com a Argentina quando a elite intelectual e empresarial desistiu de seu país.
Ainda há tempo de evitar o pior, com foco de curto prazo em encerrar a desancoragem das expectativas de inflação. Um primeiro passo importante seria Fazenda e BC voltarem a se falar diretamente.
Reclamar na imprensa que o outro só fala com o mercado não vai ajudar muito.
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