Eleições na Argentina: como funcionou a dolarização, proposta por Javier Milei, em outros países
Panamá, Equador e El Salvador também dolarizaram suas economias. Mas deu certo?

Desde que se candidatou à presidência na Argentina, o libertário Javier Milei propõe duas medidas para estabilizar a economia do país: a dolarização e o fim do Banco Central.
As propostas tornaram-se centrais no debate eleitoral do segundo turno entre o libertário e o peronista Sergio Massa, de centro-esquerda. Para Milei, as duas medidas são necessárias para conter a inflação, que deve chegar a 138% este ano, e valorizar a produção e os salários.
Na América Latina, três países (Panamá, Equador e El Salvador), além da própria Argentina, na época da paridade peso-dólar, adotaram as medidas nas últimas décadas.
O Panamá dolarizou sua economia no começo do século 20. Casos mais recentes - Equador e El Salvador - mostram que a substituição da moeda nacional pelo dólar tem impacto direto no controle inflacionário, como tem dito Milei. Entretanto, a medida também provoca outros efeitos na economia que precisam ser considerados.
Economistas se dividem no tema da dolarização, mas todos reconhecem que a medida não resolve os problemas econômicos de uma nação se não estiver atrelada a outras.
Uma análise do que ocorreu em El Salvador e no Equador mostra que a falta de autonomia monetária contribuiu para uma distorção no sistemas de preços domésticos, tornando produtos mais caros para os seus moradores, e dificultou a gestão de crises.
Leia Também
Para Susana Herrero Olarte, pós-doutora em economia aplicada e Coordenadora do Centro de Pesquisas Econômicas da Universidad de las Americas (UDLA), em Quito, a dolarização tem uma clara desvantagem, que é a perda da capacidade de fazer política monetária.
"Se o que está acontecendo com os EUA coincidir com o que está acontecendo com o seu país, a economia vai bem. Mas, se não coincidir, isso pode gerar outro problema adicionado à economia, ainda mais em um momento de vulnerabilidade como a crise internacional atual", afirmou.
Outros economistas lembram que, em determinadas situações, países têm de ter flexibilidade para valorizar ou desvalorizar sua moeda. "O Equador, por exemplo, sofreu muito na pandemia de coronavírus porque não podia injetar mais dinheiro para fazer as medidas necessárias", disse o economista Leonardo Trevisan, professor da ESPM.
ARGENTINA EM RUÍNAS: O QUE MILEI E MASSA PROPÕEM PARA SALVAR A ECONOMIA DO PAÍS?
Como funciona a dolarização?
A dolarização na Argentina trocaria o peso pelo dólar como moeda nacional depois de um período de transição de 16 meses, inspirado no modelo equatoriano, segundo a campanha de Milei.
Com isso, a inflação cairia devido a um choque de preços e confiança. Após esse período, o Banco Central Argentino seria extinto.
No entanto, analistas alertam que isso significaria o fim da autonomia da Argentina para controlar a própria política monetária. A taxa de juros e a quantidade de moeda em circulação não seriam mais decididas por autoridades do governo argentino.
"Decisões monetárias seriam tomadas com base na economia dos Estados Unidos e teriam de ser seguidas pela Argentina, que tem outra realidade econômica", explicou Trevisan.
A paridade peso-dólar na era Menem
A proposta de Milei não é inédita no país. Durante o governo de Carlos Menem, na década de 90, a Argentina adotou a paridade entre o peso e o dólar - uma espécie de dolarização informal -, em meio a uma hiperinflação de 3.000% ao ano (cerca de 15 vezes maior que a atual).
A medida estabilizou a moeda. Uma abertura econômica, acompanhada de privatização de empresas públicas e uma baixa taxa de juros na economia americana, trouxe investimentos.
Após alguns anos de estabilidade, uma sequência de choques externos em países emergentes, primeiro no México, depois na Ásia e na Rússia, no entanto, acompanhados de um aumento dos juros nos EUA, enfraqueceu o modelo, já que os capitais externos fugiram para países mais seguros. Além disso, desvalorização do real, em 1999, afetou duramente as exportações argentinas, que caíram sensivelmente.
O modelo, para funcionar, dependia de o país receber dólares. Sem os dólares, o governo não podia emitir a quantidade equivalente em pesos e gastar. Com a fuga de capital por causa das crises externas, faltaram dólares para sustentar a economia, e o sistema entrou em colapso.
A Argentina enfrentou recessão e desemprego, que chegou a 30%. Em 2001, após o fracasso do modelo, os argentinos mergulharam numa crise profunda, que levou à fuga do presidente Fernando De La Rúa, de helicóptero, da Casa Rosada.
A dolarização no Equador
O Equador tornou o dólar a moeda oficial em um momento de inflação alta, semelhante ao que a Argentina vive hoje. O país vivia a pior crise econômica da sua história, com a moeda nacional, o sucre, desvalorizando-se dia após dia. Em uma semana, o custo de US$ 1 passou de 7 mil sucres para 19 mil.
A dolarização aconteceu após um confisco na conta bancária de milhares de equatorianos em 1999. Em março daquele ano, o governo forçou uma espécie de "feriado bancário", freando o sistema financeiro por cinco dias - período que serviu para o congelamento das poupanças, com o objetivo de evitar saques em massa de recursos em moeda estrangeira, com o objetivo de conter a inflação, a exemplo do que foi feito no Brasil no governo Collor em 1990.
A medida não funcionou. Em 9 de janeiro de 2000, o então presidente Jamil Mahuad decidiu substituir o sucre pelo dólar. O processo foi realizado num período de cinco meses.
O processo de dolarização de Mahuad veio acompanhado de um caos econômico e institucional. O Equador deu calote na dívida externa, e o Fundo Monetário Internacional (FMI) barrou novos empréstimos. O Parlamento não aprovou um Orçamento para o ano seguinte, e a Justiça do país declarou inconstitucional o congelamento de depósitos.
A transição para a moeda americana, apesar disso, não foi interrompida. O então vice-presidente, Gustavo Noboa, assumiu o cargo e comprometeu-se a manter a mudança. A inflação passou de 96,1% naquele ano para 37,7% no ano seguinte, segundo o Banco Mundial.
"Nos governos do final do século 20 foram tomadas muitas decisões fiscais erradas, com péssimos investimentos, que prejudicaram bastante a população. Os políticos da época monetizavam o déficit para inflar o orçamento nacional, e em certo ponto a crise estourou", disse ao Estadão o economista equatoriano Alberto Acosta Burneo.;
"Quando parte do sistema bancário quebrou, o Estado buscou uma maneira de resgatá-lo e tomou-se a decisão de dolarizar a economia".
COMO VIVER DE RENDA COM INVESTIMENTOS: O MÉTODO QUE PODE GERAR PAGAMENTOS CONSISTENTES NA SUA CONTA
Crédito e estabilidade
A chegada da moeda americana ao bolso dos equatorianos acabou com os temores de desvalorização repentina e descontrole inflacionário e também atraiu o investimento estrangeiro, dada a credibilidade da moeda. E há mais de duas décadas a inflação anual fica abaixo dos dois dígitos. A taxa em 2022 foi de 3,7%. Houve também uma expansão no crédito devido à estabilidade econômica.
"Antes do ano 2000 quase não existiam oportunidades de crédito no Equador, devido à pouca confiança na moeda. As pessoas gastavam o pouco dinheiro que tinham rapidamente, porque existia o medo de que em um futuro próximo perdesse todo seu valor. Os valores do sucre variavam todos os dias, e os bancos, fragilizados, ofereciam créditos imobiliários com prazos de apenas 5 anos", disse o economista.
"Posteriormente passamos a ter na economia uma moeda sã (o dólar) que possibilitou pensar a longo prazo, poupar. E as pessoas conseguiram comprar seus imóveis com prazos bem maiores, de mais de 30 anos, por exemplo".
Entretanto, o país continuou tendo problemas. Na pandemia, por exemplo, a falta de soberania monetária e a baixa capacidade de manobra fiscal fizeram com que o país tivesse graves problemas para estabilizar a economia, registrando uma queda do PIB de 6,4%, de acordo com o Banco Central do Equador.
- Leia também: Dólar paralelo na Argentina volta a subir após governo “descongelar” cotações oficiais antes da eleição
Dólares e lavagem de dinheiro do tráfico
A chegada da crise da violência relacionada ao tráfico de drogas no Equador testou os limites da economia dolarizada.
Nos últimos cinco anos, grupos criminosos organizados e cartéis de narcotráfico estrangeiro tomaram conta do país, estabelecendo um estado do terror.
Dúzias de toneladas de droga passaram a ser exportadas para os EUA e a Europa desde portos equatorianos com quase total impunidade. E a lavagem de dinheiro disparou.
O livre fluxo de capital tem favorecido às organizações criminosas, que se fortalecem ao lavar dinheiro ilícito em negócios comuns de setores como o imobiliário ou de serviços - processo que não chama a atenção das autoridades devido à falta de controle de divisas.
Uma investigação recente do Observatório Equatoriano do Crime Organizado (OECO) concluiu que a lavagem de dinheiro é o segundo crime mais comum depois do tráfico de drogas em pelo menos seis estados do país: Guayas, El Oro, Manabí, Carchi, Santa Elena e Sucumbíos.
O Centro Estratégico de Geopolítica (CELAG) estima que, no Equador, anualmente é lavado dinheiro equivalente a entre 2% e 5% do PIB.
- VEJA TAMBÉM: conflito no Oriente Médio pode fazer essa petroleira disparar até 70% na Bolsa (não é Petrobras); saiba como investir
Dolarização em El Salvador
Ao contrário do Equador, El Salvador possuía uma economia estável quando dolarizou a sua economia, em 2001. O país tinha uma relação econômica forte com os Estados Unidos, e a presença do dólar era alta entre os salvadorenhos. Àquela altura, somente El Salvador e Chile possuíam qualificações creditícias favoráveis na América Latina.
No entanto, o país optou por dolarizar a economia para conter o risco da desvalorização da moeda nacional, o cólon, reduzir taxas de juros, ampliar os termos de crédito e garantir o valor dos depósitos e da previdência social.
O maior lado negativo do processo foi o impacto da sua traumática transição. A falta de dólares gerou um arredondamento de preços. Com isso, produtos que custavam, por exemplo, $1,79, podiam ter seus valores arredondados para $2 em muitos casos. Em 2002, 55,1% dos salvadorenhos acreditavam que a dolarização era "o principal problema do país".
Poucos anos depois da dolarização a opinião pública sobre o assunto foi melhorando e o país se manteve estável, mas não é possível atribuir a estabilização ao dólar, já que El Salvador possuía outros mecanismos de controle inflacionário, disse o economista Claudio de Rosa, pesquisador do Observatório de Políticas Públicas da Universidade Francisco Gavidia (UFG).
"Ainda que El Salvador tenha dolarizado a economia, antes existia o regime cambial, que poderia ter tido o mesmo efeito se aplicado de forma eficiente", declarou.
Com os anos, tornou-se evidente que a dolarização não impulsionou a economia salvadorenha conforme as expectativas. A alta dívida pública e o limitado controle fiscal fizeram com que o país experimentasse um crescimento econômico modesto.
Entre os anos 2000 e 2022, a taxa de crescimento ultrapassou 3% apenas em três ocasiões, e nas últimas 3 décadas o crescimento do PIB só superou os 7% de 1992, antes da dolarização, e em 2021.
Além disso, o país é atualmente uma das nações menos atraentes para investimentos estrangeiros na América Latina. De acordo com o Banco Central de Reserva (BCR), de El Salvador, no ano anterior a nação teve uma variação negativa de 133% em investimentos quando comparado ao resultado de 2021.
A economia salvadorenha também se voltou para a importação de produtos, afetando a produção nacional. E o país foi duramente afetado pela crise financeira de 2008, com recessão de 2,1% em 2009, refletindo a vulnerabilidade de choques externos.
A dívida externa teve também um resultado negativo, cresceu no período, passando de 35,4% do PIB em 2021 para 65,5% em 2022, segundo os dados do Banco Mundial.
China reage à ameaça de tarifa de 100% de Trump: “Não queremos uma guerra tarifária, mas não temos medo de uma”
A troca de acusações ameaça atrapalhar um possível encontro entre Donald Trump e o líder chinês Xi Jinping e acabar com a trégua de uma guerra comercial
Lula tem encontro marcado com o papa Leão 14 nesta segunda-feira (13)
Esta será a quarta vez que Lula se encontra com um papa desde o início de sua trajetória política
Trump anuncia nova tarifa de 100% sobre importações da China, por postura ‘hostil’ e ‘sem precedentes do país asiático
Ameaças de tarifas e críticas à China feitas por Trump na tarde desta sexta já haviam azedado os mercados em Wall Street
Ministro brasileiro conversa com Marco Rubio e diz que delegação vai aos EUA negociar tarifaço
Presidente Lula afirma que a conversa entre os dois inicia uma nova fase da relação comercial do Brasil com o país norte-americano
Como era o avião da Embraer (EMBR3) que Putin admite ter abatido no Cazaquistão
Entenda o modelo de avião da Embraer (EMBR3) abatido pela Rússia no Cazaquistão, que deixou 38 mortos e gerou repercussão internacional
Enfim, o cessar-fogo: Hamas declara fim da guerra com Israel sob garantias internacionais
Em um discurso nesta quinta-feira (9), o chefe do Hamas afirmou que o grupo chegou a um acordo que visa a encerrar a guerra
EUA: Fed diz que riscos para emprego justificam corte de juros, mas cautela com inflação continua a afetar opinião dos diretores
Taxa de desemprego nos EUA atingiu o maior patamar em quase quatro anos, enquanto a inflação se afasta da meta de 2%
Quem são os brasileiros que chegaram mais perto do Prêmio Nobel até hoje
Brasil segue sem um Nobel oficial, mas já teve um filho de estrangeiros nascido no Rio, um físico injustiçado e a primeira vencedora do “Nobel da Agricultura”
Suprema Corte dos EUA mantém Lisa Cook no Fed até julgamento no início do ano que vem
Audiência só ocorrerá em janeiro de 2026; até lá, a diretora indicada por Biden permanece no cargo em meio à disputa com Donald Trump
Taylor Swift faz história com mais de 100 milhões de álbuns vendidos — e “The Life of a Showgirl” promete ampliar recorde
Primeira mulher a ultrapassar 100 milhões de álbuns certificados nos EUA, Taylor Swift lança nesta sexta “The Life of a Showgirl”, já recordista em pré-saves
Shutdown nos EUA: governo é paralisado pela 1ª vez desde 2019 e divulgação de dados é adiada; o que acontece agora?
Divulgação dos dados do payroll, previstas para a sexta, foi adiada para o fim do shutdown, quando o Congresso deverá entrar em acordo sobre o Orçamento
Apostador sortudo encontra bilhete esquecido e ganha quase R$ 100 milhões na loteria (e teria perdido tudo se fosse no Brasil)
Ele havia esquecido o bilhete premiado de loteria no fundo de um casaco e só o encontrou seis meses depois, por causa de uma onda de frio
Banheiro de US$ 1 milhão em Los Angeles provoca polêmica nos EUA
Moradores acusam a prefeitura de gastar demais em uma obra simples, enquanto a cidade corta orçamento de bombeiros e ainda depende de banheiros químicos em parques
O caminho ao Canadá: vistos, cidadania, desafios e estratégias para brasileiros
Especialistas detalham o caminho, os custos e as estratégias para brasileiros que planejam imigrar para o Canadá em meio a novas regras e um cenário mais competitivo
“Você está demitido”: Trump volta a colocar Powell sob a sua mira
Recentemente, uma decisão da Suprema Corte indicou que o presidente dos EUA não tem autoridade para destituir autoridades do Fed à vontade
Copa do Mundo 2026: anfitriões fogem do costume e anunciam três mascotes — mas não é a primeira vez que isso acontece
Copa do Mundo 2026 surpreende com três mascotes oficiais, representando Canadá, Estados Unidos e México. Mas, embora seja raro, essa não é a primeira vez que o torneio tem mais de um personagem símbolo
Argentina recua no desmonte do ‘cepo cambial’ e volta a impor restrição à compra de dólar
O controle argentino é um conjunto de controles às negociações do dólar que historicamente manteve a moeda americana em nível artificial
Trump assina ordem executiva que autoriza permanência do TikTok nos EUA
O republicano afirma que, entre os investidores envolvidos na operação, estão Michael Dell e Rupert Murdoch, com a Oracle tendo “grande envolvimento” no negócio.
Investidores sentem breve alívio com apoio dos EUA à Argentina, mas crise está longe do fim; quais os próximos passos de Milei?
Linha de swap cambial anunciada pelos EUA pode ajudar Milei e seus aliados, que correm contra o tempo para ocupar mais cadeiras no Congresso argentino
Ig Nobel 2025 premia pesquisas sobre vacas listradas, morcegos embriagados e um molho cacio e pepe elevado ao nível da perfeição
Na 35ª edição do Ig Nobel, a premiação mais inusitada da ciência mostra mais uma vez como perguntas estranhas podem render prestígio — e boas risadas