Nesta semana a Câmara dos Deputados aprovou a urgência para a tramitação do projeto de lei 2630/2020, que ficou conhecido como PL das Fake News. A análise do mérito da proposta deve acontecer na próxima terça-feira (02).
O texto prevê a criação da Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. Ou seja, pretende regular as redes sociais, mecanismos de busca (como Google) e serviços de mensagens instantâneas (como WhatsApp e Telegram) e redes sociais no geral(como Facebook, TikTok e Instagram).
O projeto já havia sido aprovado em 2020 no Senado, mas desde então passou por uma série de mudanças e deve voltar para análise dos senadores após a votação desta semana.
O tema ganhou força nos últimos tempos com a invasão da Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro, e os ataques letais nas escolas.
Como o combate à desinformação foi um ponto importante da campanha de Lula em 2022, o presidente acompanha de perto a tramitação desse projeto e o governo fez sugestões para o texto.
A questão aqui é: há quem acuse o projeto de ser uma forma de censurar a população. Será que é este o caso? Discuto isso nos próximos parágrafos.
Os principais pontos do PL das Fake News
A proposta conta com alguns pontos importantes:
- O projeto veda o uso de contas automatizadas (robôs). Fica a cargo das plataformas fazer o controle disso e remover contas falsas;
- As empresas teriam que publicar relatórios trimestrais de transparência sobre a moderação dos conteúdos;
- Responsabilização das plataformas por qualquer conteúdo impulsionado;
- Mensagens disparadas em massa devem ser guardadas por três meses;
- Monetização de portais jornalísticos;
- Transparência em relação ao algoritmo utilizado para recomendar conteúdos aos usuários
- A PL das fake news também estabelece punição para os que promoverem divulgação em massa de fake news, podendo levar a até três anos de prisão mais multa.
PL das fake News é o PL da Censura?
A proposta tem provocado fortes discussões. Há, inclusive, quem diga que se trata de um caminho para cerceamento das liberdades individuais.
Um dos pontos que provocavam essa acusação era a criação de um órgão regulador que garantiria o cumprimento da lei por parte das redes sociais. Por ter sido um dos principais focos de resistência dos parlamentares, essa parte foi derrubada.
Mas ainda existem outras interrogações no projeto que poderiam abrir espaço para um ambiente restritivo nas redes sociais.
Um deles é a própria monetização dos veículos jornalísticos. Afinal, como evitar que o algoritmo coloque dinheiro em veículos de desinformação?
Mais um fator a ser discutido é qual seria o tamanho da responsabilidade das próprias empresas em relação ao que é publicado em cada rede. Responsabilizar as big techs pelo que é compartilhado não seria uma forma de criar uma censura privada?
Até porque, correndo o risco de ter que pagar multas, as empresas podem acabar virando ortodoxas demais na moderação de conteúdo, o que pode prejudicar a liberdade de expressão lá dentro — com a remoção de posts polêmicos, porém legítimos, por exemplo.
Essa foi uma das críticas feitas à legislação alemã nesse sentido, de acordo com um artigo do professor de Filosofia do Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Marco Antônio Sousa Alves. O Network Enforcement Act (Net-zDG) entrou em vigor em janeiro de 2018.
A lei de regulamentação das plataformas, bem parecida com o que está sendo proposta no Brasil, impôs uma série de regras a serem cumpridas pelas redes sociais. Entre elas, a obrigatoriedade de exclusão em até 24 horas de um conteúdo que infrinja as normas.
No caso de descumprimento, as plataformas podem ser sujeitas a multas no valor de até 50 milhões de euros.
Apesar de ser considerado um marco no enfrentamento da desinformação, a lei alemã cria um problema:
“As ameaças de criminalização, multas altas e prazos curtos também pressionariam as plataformas a remover conteúdos potencialmente legítimos, levando a uma interferência inadequada na liberdade de expressão”, disse o Relator Especial das Nações Unidas para a Proteção da Liberdade de Expressão, David Kaye.
Outro caso simbólico é o da regulação das redes na Malásia. O país criminaliza a publicação de fake news no país, sob pena de uma multa que ultrapassa os 120 mil dólares.
Acontece que a proibição começou pouco tempo antes das eleições para o governo federal em 2018. Nesse momento, várias organizações acusaram o ex-primeiro-ministro do país, Najib Razak, de usar a lei para impedir a divulgação de casos de corrupção e lavagem de dinheiro que o prejudicariam.
Isso significa que é sim importante pensar na questão da liberdade de expressão nas plataformas diante da possível aprovação da nova lei.
O outro lado…
Existem ainda, os argumentos válidos como contraponto. Para falar sobre eles, uso uma citação da socióloga Hannah Arendt, pensadora que acompanhou de perto a transformação da esfera pública com o avanço dos meios de comunicação em massa.
“O resultado da substituição coerente e total da verdade pela mentira não é que as mentiras passam a ser aceitas como verdades, nem simplesmente que a verdade passa a ser difamada como mentira, mas a destruição do próprio sentido que usamos para nos orientar no mundo.”
Desde a década de 60, Arendt sugere que a mentira organizada faz uso dos meios de comunicação para se espalhar e destrói tudo o que decidiu negar.
E, levando em consideração a nova horda de políticos que fazem uso da mentira sistemática para ganhos eleitorais, é de se pensar que uma legislação como essa seja necessária.
“É por isso que o poder de propagar ideias ou, especificamente, promover o que chamamos de desinformação deve ser relacionado à propriedade dos meios de comunicação e ao uso de sua capacidade de projetar sentidos para a sociedade, especialmente em contextos como o do Brasil, onde a concentração é alarmante”, argumenta Helena Martins na apresentação do livro “Desinformação: crise política e saídas democráticas para fake news”.
Além disso, as redes sociais colocaram foco sob uma tendência humana preocupante: a de repassar informações falsas. Um estudo do MIT (Massachusetts Institute of Technology) revela que as chances de uma notícia falsa ser repassada é 70% maior do que a de notícias verdadeiras.
Isso tem a ver, entre outras coisas, com o viés de confirmação, falo mais sobre isso aqui.
Mas acontece que os algoritmos das redes sociais seguem apenas uma religião: a do engajamento. Eles não estão nem aí se uma informação é verdadeira ou falsa, o que importa é que aquele conteúdo retenha o usuário na plataforma — e nisso as informações falsas são mestras.
As consequências disso podem ser notadas em situações desastrosas que se deram na nossa história recente — como a invasão à Praça dos Três Poderes, em 8 de janeiro.
Diante do potencial destrutivo que a desinformação pode causar tanto para os indivíduos, quanto para a República em si, também é válido argumentar que é preciso algum tipo de regulamentação nesses ambientes digitais.
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