Felipe Miranda: As notícias da minha morte foram um pouco prematuras
A morte já chegou para a renda fixa, o bitcoin e até o ouro… Agora, ela chega até para quem nunca esteve perto da morte: a Bolsa Brasileira.
A sentença já foi proferida: a Bolsa brasileira está condenada à morte. Vira e mexe é assim. O mercado, com suas narrativas ciclotímicas, conduz uma determinada classe de ativos à cadeira elétrica.
Lá em 2021, a renda fixa tinha morrido. Os juros ficariam zerados para sempre e todo mundo queria comprar IPO de non-profitable tech. Bom, deu no que deu.
O bitcoin, então, já morreu algumas dezenas de vezes – segue próximo à máxima histórica, enquanto a aprovação do ETF de ethereum pode conferir novo momentum de curto prazo às criptomoedas em geral.
Até o ouro, que supera o mais rigoroso dos desafios, ou seja, o impiedoso teste do tempo, teve lá suas condenações. Também está rondando o topo histórico, mesmo depois do assassinato de sua reputação a partir da subida das taxas de juro em âmbito global.
- Analista recomenda títulos que podem render bem mais do que o IPCA e do que CDI. Baixe o relatório gratuito aqui.
Agora, até quem nunca morreu está morrendo. Querem matar a Bolsa brasileira. Teríamos um ativo de risco que paga menos do que outros de maior segurança, de tal modo que carregá-lo em carteira seria uma decisão irracional. Bora vender tudo!
Quem são os assassinos?
Comprar ações no Brasil virou exercício de otimista desinformado, enganado por seu influenciador favorito. Uns vendem boas empresas a preços atraentes, outros leiloam terreno no céu, alguns fazem as duas coisas ao mesmo tempo.
Leia Também
O salvador da pátria para a Raízen, e o que esperar dos mercados hoje
Felipe Miranda: Um conto de duas cidades
O tio do zap exibe orgulhoso seu portfólio de imóveis e suas LIGs do Bradescão, enquanto caçoa do value investor, embora finja não ter preconceitos. “Eu não tenho nada contra investidor de Bolsa, até tenho amigos que são, comprimento normalmente, dou 'bom dia’…"
Fora da polarização dos investimentos (sim, ela está por toda a parte) e dos debates acalorados das redes sociais, talvez valha nos debruçarmos sobre o exato significado da ideia de que “as ações, na média, rendem estruturalmente menos do que a renda fixa no Brasil.”
Se isso for verdade, significa que o mercado brasileiro desafia uma das noções mais triviais da literatura do chamado “Financial Economics” (ou Teoria das Decisões Financeiras, numa tradução tipicamente adotada no Brasil): a de que um ativo de maior risco deve, na média e no longo prazo, pagar mais do que outro de menor risco, o que costuma ser representado pela chamada “Security Market Line”, uma linha ascendente que relaciona risco e retorno.
É bastante intuitivo: se você quer ter mais retorno potencial, vai precisar abrir mão da segurança. Caso contrário, se houvesse um ativo (ou um mercado) de maior risco e que paga menos, ninguém iria comprá-lo.
Seu preço, então, diminuiria e seu retorno potencial à frente seria muito maior, corrigindo a distorção.
Então, para o raciocínio mortífero contra as ações brasileiras ser verdadeiro, precisaríamos re-escrever todos livros de Finanças, com uma adição em itálico: as ações pagam menos do que a renda fixa, exceto no Brasil.
Ressalva importante: não se trata aqui do desconhecimento sobre o quão ruim tem sido o comportamento das ações brasileiras.
Desde que fundamos a Empiricus há 15 anos (e isso é longo prazo para qualquer métrica), o Ibovespa perde para a poupança, para o CDI e até para o IPCA.
Como empresários e analistas umbilicalmente ligados ao financial deepening, sofremos na pele as mazelas da renda variável local. É possível aprender com o sentimento do outro, mas é sempre mais fácil (embora mais dolorido) aprender com as próprias dores.
Portanto, alternando entre fins terríveis e terrores sem fim, somos conhecedores da tragédia acionária brasileira, sem que nos orgulhemos disso.
Também não estamos aqui para cravar que o Ibovespa é o time da virada.
- [Carteira recomendada] 10 ações brasileiras para investir agora e buscar lucros – baixe o relatório gratuito
Ciclos ruins de mercado podem durar bastante tempo – em particular, as últimas semanas foram especialmente complicadas, porque o Brasil parece carente de uma narrativa. Poucas coisas são tão ruins quanto isso.
Não é só que temos um problema fiscal, mas que não dispomos de um plano para resolvê-lo e, a isso, adicionamos agora um problema monetário! Ninguém sabe qual será o comportamento do BC em 2025, nem qual será a meta de inflação.
Bom, mas aí já temos assunto para um novo texto, quem sabe no Palavra do Estrategista da próxima quarta.
O ponto aqui é tomarmos consciência do que estamos falando ao matar a Bolsa.
A Bolsa não está morrendo...
Também havemos de pontuar a diferença entre retorno realizado e retorno projetado. Ao construir o raciocínio de que “as ações foram mal historicamente e, portanto, continuarão indo mal à frente”, estamos nos afastando do formalismo lógico-dedutivo.
Essa é uma argumentação por indução, um dos cernes da luta de Nassim Taleb, representada pela “falácia do peru de Natal” ou “falácia do granjeiro” de Bertrand Russell.
Vale para cisnes brancos, ausência de enchentes no Rio Grande do Sul por décadas e também para ativos financeiros: retornos (ou prejuízos!) passados não dizem muita coisa sobre retorno futuro. Esses costumam ser um mau guia.
Trouxe este tema para debate naquele histórico episódio do Market Makers com Luis Stuhlberger e Daniel Goldberg.
Entre outras coisas, eu gosto muito de conversar com o Daniel porque ele é muito diferente do restante do mercado financeiro. Não é só porque ele é mais inteligente e rico do que a maior parte das pessoas. Mas porque ele é uma exceção na forma de pensar. Daniel não é um gestor de fundo. Ele é um epistemólogo, um filósofo da ciência econômica ou um metodólogo (como quiser), que calhou de estar gerindo um fundo.
Para tentar ser justo, quando conversei com Luiz Guerra, CIO da Pragma, ele também me pareceu preocupado com questões de epistemologia de finanças, no que talvez seja herança dos tempos de Paulo Tenani na Pragma (mera desconfiança pessoal). Mas retomo, desculpe a digressão.
Em determinado momento, pergunto ao Daniel se ele concorda com o fato de o prêmio de risco de mercado (ações pagam menos do que a renda fixa na média) no Brasil ser negativo e quais seriam as razões disso. Daniel diz que, em termos de retorno realizado, não há dúvidas e aponta como possível explicação o fato de que o CDI não é um ativo livre de risco.
Acho que ele está certo.
Mas talvez a justificativa, embora correta, não consiga endereçar o problema em sua completude. Isso só aconteceria se comprar ações no Brasil fosse menos arriscado do que comprar títulos soberanos pós-fixados.
Ainda que tenha risco no CDI (concordo que tenha!), ainda me parece mais seguro do que comprar pedaços de empresas – há inclusive um profundo debate acadêmico se ratings corporativos podem ser superiores aos ratings soberanos de seus países de atuação.
O Prêmio de Risco de Mercado é, por definição, um conceito relativo. A Bolsa deveria pagar mais do que a renda fixa. Mesmo que a renda fixa tivesse algum risco, ele, ao menos a princípio, parece inferior ao das ações.
Até gostaria de oferecer uma resposta melhor sobre "os porquês”, mas confesso não a ter. Pode servir como ideia de dissertação para algum aventureiro. Neste momento, me concentro no “o quê”. Estamos mesmo condenados a uma performance estruturalmente ruim da Bolsa brasileira?
- LEIA TAMBÉM: Felipe Miranda: O real vai morrer aos 30?
É verdade que existem várias janelas ruins, mesmo de longo prazo, nas ações brasileiras. Mas também é verdade que elas dependem bastante do momento do ciclo em que são feitas as medições. Como a variância e a curtose da bolsa brasileira são enormes, medir o Prêmio de Risco de Mercado ao final de 2019, por exemplo, poderia levar a conclusões um tanto diferentes.
Se vivermos um ciclo de afrouxamento monetário mundo afora até o final de 2025 e depois elegermos um presidente pró-mercado por oito anos no Brasil, também poderíamos ter uma janela diametralmente oposta olhando em perspectiva.
As consequências da afirmação não estão devidamente dimensionadas. Além de caracterizar o Brasil como um mercado de capitais ineficientes, matar a Bolsa significa condenar IPOs, arrastando consigo também os private equities e os venture capitalists. Só haveria saída com investidores estratégicos. Limitam-se as possibilidades.
Sem IPOs, também o financiamento mesmo via dívida de longo prazo fica muito mais restrito para as empresas não-listadas. A abertura do capital é um acesso muito mais amplo a financiamento de maneira geral.
No fim, todo o empreendedorismo está em risco. Só cresceria quem já tem acesso ao capital. Formaríamos novos oligopólios e concentraríamos ainda mais a renda. Sem empreendedor, o sistema colapsa.
Os rentistas precisam tomar cuidado com o que desejam.
Rodolfo Amstalden: Só um momento, por favor
Qualquer aposta que fizermos na direção de um trade eleitoral deverá ser permeada e contida pela indefinição em relação ao futuro
Cada um tem seu momento: Ibovespa tenta manter o bom momento em dia de pacote de Lula contra o tarifaço
Expectativa de corte de juros nos Estados Unidos mantém aberto o apetite por risco nos mercados financeiros internacionais
De olho nos preços: Ibovespa aguarda dados de inflação nos Brasil e nos EUA com impasse comercial como pano de fundo
Projeções indicam que IPCA de julho deve acelerar em relação a junho e perder força no acumulado em 12 meses
As projeções para a inflação caem há 11 semanas; o que ainda segura o Banco Central de cortar juros?
Dados de inflação no Brasil e nos EUA podem redefinir apostas em cortes de juros, caso o impacto tarifário seja limitado e os preços continuem cedendo
Felipe Miranda: Parada súbita ou razões para uma Selic bem mais baixa à frente
Uma Selic abaixo de 12% ainda seria bastante alta, mas já muito diferente dos níveis atuais. Estamos amortecidos, anestesiados pelas doses homeopáticas de sofrimento e pelo barulho da polarização política, intensificada com o tarifaço
Ninguém segura: Ibovespa tenta manter bom momento em semana de balanços e dados de inflação, mas tarifaço segue no radar
Enquanto Brasil trabalha em plano de contingência para o tarifaço, trégua entre EUA e China se aproxima do fim
O que Donald Trump e o tarifaço nos ensinam sobre negociação com pessoas difíceis?
Somos todos negociadores. Você negocia com seu filho, com seu chefe, com o vendedor ambulante. A diferença é que alguns negociam sem preparo, enquanto outros usam estratégias.
Efeito Trumpoleta: Ibovespa repercute balanços em dia de agenda fraca; resultado da Petrobras (PETR4) é destaque
Investidores reagem a balanços enquanto monitoram possível reunião entre Donald Trump e Vladimir Putin
Ainda dá tempo de investir na Eletrobras (ELET3)? A resposta é sim — mas não demore muito
Pelo histórico mais curto (como empresa privada) e um dividendo até pouco tempo escasso, a Eletrobras ainda negocia com um múltiplo de cinco vezes, mas o potencial de crescimento é significativo
De olho no fluxo: Ibovespa reage a balanços em dia de alívio momentâneo com a guerra comercial e expectativa com Petrobras
Ibovespa vem de três altas seguidas; decisão brasileira de não retaliar os EUA desfaz parte da tensão no mercado
Rodolfo Amstalden: Como lucrar com o pegapacapá entre Hume e Descartes?
A ocasião faz o ladrão, e também faz o filósofo. Há momentos convidativos para adotarmos uma ou outra visão de mundo e de mercado.
Complicar para depois descomplicar: Ibovespa repercute balanços e início do tarifaço enquanto monitora Brasília
Ibovespa vem de duas leves altas consecutivas; balança comercial de julho é destaque entre indicadores
Anjos e demônios na bolsa: Ibovespa reage a balanços, ata do Copom e possível impacto de prisão de Bolsonaro sobre tarifaço de Trump
Investidores estão em compasso de espera quanto à reação da Trump à prisão domiciliar de Bolsonaro
O Brasil entre o impulso de confrontar e a necessidade de negociar com Trump
Guerra comercial com os EUA se mistura com cenário pré-eleitoral no Brasil e não deixa espaço para o tédio até a disputa pelo Planalto no ano que vem
Felipe Miranda: Em busca do heroísmo genuíno
O “Império da Lei” e do respeito à regra, tão caro aos EUA e tão atrelado a eles desde Tocqueville e sua “Democracia na América”, vai dando lugar à necessidade de laços pessoais e lealdade individual, no que, inclusive, aproxima-os de uma caracterização tipicamente brasileira
No pain, no gain: Ibovespa e outras bolsas buscam recompensa depois do sacrifício do último pregão
Ibovespa tenta acompanhar bolsas internacionais às vésperas da entra em vigor do tarifaço de Trump contra o Brasil
Gen Z stare e o silêncio que diz (muito) mais do que parece
Fomos treinados a reconhecer atenção por gestos claros: acenos, olho no olho, perguntas bem colocadas. Essa era a gramática da interação no trabalho. Mas e se os GenZs estiverem escrevendo com outra sintaxe?
Sem trégua: Tarifaço de Trump desata maré vermelha nos mercados internacionais; Ibovespa também repercute Vale
Donald Trump assinou na noite de ontem decreto com novas tarifas para mais de 90 países que fazem comércio com os EUA; sobretaxa de 50% ao Brasil ficou para a semana que vem
A ação que caiu com as tarifas de Trump mas, diferente de Embraer (EMBR3), ainda não voltou — e segue barata
Essas ações ainda estão bem abaixo dos níveis de 8 de julho, véspera do anúncio da taxação ao Brasil — o que para mim é uma oportunidade, já que negociam por apenas 4 vezes o Ebitda
O amarelo, o laranja e o café: Ibovespa reage a tarifaço aguado e à temporada de balanços enquanto aguarda Vale
Rescaldo da guerra comercial e da Super Quarta competem com repercussão de balanços no Brasil e nos EUA