Um começo de agosto amargo: entendendo a engasgada do Ibovespa
Ibovespa acaba de emplacar a maior sequência de quedas desde 1984, mas tendência de valorização parece preservada
O mês de agosto tem se mostrado desafiador para os ativos brasileiros até o momento. Ontem, testemunhamos uma série de dez quedas consecutivas no Ibovespa.
Trata-se de um feito sem precedentes para o índice (a maior sequência negativa desde fevereiro de 1984).
Anteriormente, o recorde era de nove sessões consecutivas de queda, registrado em 12 de agosto de 1998, pouco antes da Crise da Rússia (houve outra sequência de nove quedas em 1995).
É interessante notar, no entanto, que nas ocasiões anteriores, as quedas foram consideravelmente mais profundas do que a desvalorização acumulada de cerca de 4% em agosto de 2023 (atingindo mais de 20% em cada período no passado).
Mas o Ibovespa não deveria ter disparado com o corte da Selic?
Curiosamente, essa virada para um cenário mais pessimista ocorreu logo após o início do ciclo de cortes da taxa Selic em agosto, com uma redução de 50 pontos-base.
Esse movimento era amplamente considerado por muitos como um possível impulsionador significativo para o desempenho positivo de nossa bolsa.
Leia Também
Felipe Miranda: Os últimos passos de um homem — ou, compre na fraqueza
Fica a dúvida: a tendência de alta teria se esgotado?
Já adianto que acredito não ser o caso.
Do ponto de vista estrutural, existe uma notável correlação entre o ciclo de redução da taxa Selic e o desempenho do Ibovespa.
Historicamente, as ações têm demonstrado uma tendência a valorizar-se durante os períodos de afrouxamento monetário.
Ao analisar os seis ciclos mais recentes de flexibilização da política monetária, é evidente que a média de aumento acumulado durante esses períodos foi de aproximadamente 35%.
Podemos observar esse padrão de comportamento a seguir, com uma atenção especial voltada para as fases de 12 e 24 meses após o início do ciclo de cortes.
Fonte: Santander, Helius e Bloomberg.
Desempenho do Ibovespa costuma piorar após o primeiro corte
Outro aspecto intrigante é que, de acordo com a tendência atualmente em curso, é comum observar que o mês em que o primeiro corte da taxa Selic acontece geralmente traz consigo uma diminuição no desempenho do Ibovespa.
É compreensível que diversos fatores disruptivos tenham se agregado nas últimas semanas, começando pela temporada de divulgação de resultados, que encerrou ontem (é importante lembrar que, a longo prazo, o valor das ações é fundamentado nas tendências operacionais e financeiras das empresas).
Embora a temporada de resultados tenha, em geral, apresentado resultados positivos, as reações variadas entre os investidores têm tendência a gerar instabilidade.
Além disso, o mês de agosto traz consigo a discussão orçamentária. Com a mudança de poder em direção ao Legislativo nos anos recentes, é evidente que há demandas crescentes por emendas parlamentares, em um momento de fragilidade das finanças públicas do Brasil, quando já está claro o desafio de alcançar as metas fiscais.
Incertezas sobre solução para déficit no orçamento
Ocorre, porém, que o buraco fiscal parece estar mais embaixo.
Existe uma considerável incerteza sobre como será resolvido o déficit no orçamento. Quando o próprio problema não pode ser claramente definido, torna-se significativamente mais complexo avaliar o risco e realizar estimativas precisas.
Se, por exemplo, a meta estabelecida não fosse atingida, mas houvesse um plano sólido e tangível para estabilizar a trajetória da relação de endividamento (dívida sobre PIB), não estaríamos enfrentando desafios substanciais.
Entretanto, essa não parece ser a situação atual.
Dessa maneira, apesar de termos controlado a inflação (como evidenciado pela qualidade dos detalhes do IPCA divulgados na última sexta-feira, embora o índice geral tenha excedido as expectativas), a atividade econômica tenha superado as previsões e as taxas de juros tenham declinado, o cenário não é dos mais favoráveis.
Isso ocorre porque o arcabouço fiscal, que afastou a ameaça de uma crise fiscal no Brasil desde o final de março, contribuindo para um aumento na disposição ao risco, parece estar enfrentando dificuldades na Câmara.
E dado que o governo optou por realizar um ajuste fiscal com base em receitas, isso tem gerado uma significativa incerteza econômica.
VEJA TAMBÉM — Pensão alimentícia: valor estabelecido é injusto! O que preciso para provar isso na justiça? Veja em A Dinheirista
Quem vai pagar a conta?
O Centrão mantém a postura de atrasar a votação do projeto na Câmara, aguardando a concretização de uma reforma ministerial que reforçaria o poder desse bloco dentro do cenário político.
O presidente Lula, até o momento, não apresentou indicações claras sobre como resolver essa questão complexa.
De maneira simultânea, a tramitação da Reforma Tributária, atualmente em discussão no Senado, também parece estar enfrentando obstáculos e pode impor desafios para certos setores, apesar das potenciais melhorias que traria ao sistema tributário brasileiro no longo prazo.
Além disso, para adicionar mais complexidade, o governo lançou um Novo Plano de Aceleração do Crescimento (Novo PAC) com abrangência de gastos que superam a marca de R$ 1 trilhão.
A conta parece não fechar.
Geralmente, em situações assim, os bancos são convocados para arcar com as consequências, o que justifica a recente queda do setor bancário, que tem um peso significativo no Ibovespa, além dos resultados financeiros abaixo do esperado.
Leia também
- O dragão virou lagartixa? Por que a frustração com o PIB da China preocupa o mercado
- Onde investir: Novo semestre começa com oportunidade sob medida para os ativos brasileiros
Cenário internacional não ajuda o Ibovespa
Outros dois fatores relevantes estão relacionados ao cenário internacional.
O primeiro deles diz respeito aos desafios enfrentados pelo setor de construção na China.
No fim de 2022, havia uma expectativa de que a China sairia da pandemia de Covid-19 em uma posição mais fortalecida em comparação a outras regiões do globo.
Entretanto, ao contrário dessa previsão, a economia chinesa encontrou dificuldades devido à contínua implementação de políticas rigorosas de "Covid-zero".
Mesmo após o relaxamento dessas medidas, a atividade econômica no país permaneceu consideravelmente abaixo das projeções durante esse período.
Atualmente, a recuperação econômica chinesa está enfrentando novos entraves, principalmente devido ao agravamento da crise no setor imobiliário.
Os dados mais recentes provavelmente indicarão apenas um leve indício de retomada do crescimento.
Além disso, a grande empresa imobiliária Country Garden anunciou a suspensão da negociação de quase uma dúzia de títulos no mercado local.
Apesar das tentativas de Pequim de atrair mais investimento estrangeiro por meio de incentivos fiscais, essa abordagem parece não ser suficiente para enfrentar os desafios persistentes.
Esse cenário tem um impacto negativo nas commodities, especialmente na Vale, empresa que possui uma participação significativa no Ibovespa, contribuindo para prejudicar o desempenho geral do índice.
O segundo ponto deriva da política de preços da Petrobras.
Após o aumento dos preços do petróleo, verifica-se que há uma defasagem considerável em relação aos valores internacionais nos polos Petrobras, chegando a 25% para a gasolina e 28% para o diesel, conforme apontado pela Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom).
Nos círculos do mercado financeiro, está surgindo uma expectativa crescente sobre a possibilidade de um iminente ajuste nos preços dos combustíveis pela empresa estatal. Isso é resultado do fato de que os preços dos derivados permanecem defasados devido à elevação do preço do petróleo.
É amplamente reconhecido que um reajuste é necessário, uma visão enfatizada pelo ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na semana passada, durante o lançamento do Novo PAC.
No entanto, a tarefa de comunicar essa notícia impopular está gerando um impasse, especialmente em relação ao presidente Lula.
O atual presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, parece inclinado a implementar o aumento nos preços, mas a decisão ainda não foi tomada.
Enquanto esperamos por esse desfecho, a pressão do risco de interferência política volta a se fazer sentir, exacerbando o ambiente em Brasília.
Principalmente após a correção, as ações brasileiras seguem consideradas baratas (agora, retornando aos 116 mil pontos), quando comparadas com as dos mercados desenvolvidos que, em sua maioria, estão avaliadas em patamares elevados.
Além disso, existem poucas opções viáveis entre outros mercados emergentes (com exceção do México). Por isso, a tendência de valorização parece estar preservada, mesmo que possa não ser um movimento linear e direto.
- Se a Bolsa ainda não começou a decolar, é sinal de que dá tempo de comprar ações enquanto elas estão custando muito abaixo de sua média histórica. Confira a seleção de 10 ativos que estão baratos e possuem gatilhos para valorizar bastante nos próximos meses, segundo a Empiricus Research. Relatório gratuito disponível aqui.
Quais são os FIIs campeões de dezembro, divulgação do PIB e da balança comercial e o que mais o mercado espera para hoje
Sete FIIs disputam a liderança no mês de dezembro; veja o que mais você precisa saber hoje antes de investir
Copel (CPLE3) é a ação do mês, Ibovespa bate novo recorde, e o que mais movimenta os mercados hoje
Empresa de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica, a Copel é a favorita para investir em dezembro. Veja o que mais você precisa saber sobre os mercados hoje
Mais empresas no nó do Master e Vorcaro, a escolha do Fed e o que move as bolsas hoje
Titan Capital surge como peça-chave no emaranhado de negócios de Daniel Vorcaro, envolvendo mais de 30 empresas; qual o risco da perda da independência do Fed, e o que mais o investidor precisa saber hoje
A sucessão no Fed: o risco silencioso por trás da queda dos juros
A simples possibilidade de mudança no comando do BC dos EUA já começou a mexer na curva de juros, refletindo a percepção de que o “jogo” da política monetária em 2026 será bem diferente do atual
Tony Volpon: Bolhas não acabam assim
Wall Street vivencia hoje uma bolha especulativa no mercado de ações? Entenda o que está acontecendo nas bolsas norte-americanas, e o que a inteligência artificial tem a ver com isso
As lições da Black Friday para o universo dos fundos imobiliários e uma indicação de FII que realmente vale a pena agora
Descontos na bolsa, retorno com dividendos elevados, movimentos de consolidação: que tipo de investimento realmente compensa na Black Friday dos FIIs?
Os futuros dividendos da Estapar (ALPK3), o plano da Petrobras (PETR3), as falas de Galípolo e o que mais move o mercado
Com mudanças contábeis, Estapar antecipa pagamentos de dividendos. Petrobras divulga seu plano estratégico, e presidente do BC se mantém duro em sua política de juros
Jogada de mestre: proposta da Estapar (ALPK3) reduz a espera por dividendos em até 8 anos, ações disparam e esse pode ser só o começo
A companhia possui um prejuízo acumulado bilionário e precisaria de mais 8 anos para conseguir zerar esse saldo para distribuir dividendos. Essa espera, porém, pode cair drasticamente se duas propostas forem aprovadas na AGE de dezembro.
A decisão de Natal do Fed, os títulos incentivados e o que mais move o mercado hoje
Veja qual o impacto da decisão de dezembro do banco central dos EUA para os mercados brasileiros e o que deve acontecer com as debêntures incentivadas, isentas de IR
Corte de juros em dezembro? O Fed diz talvez, o mercado jura que sim
Embora a maioria do mercado espere um corte de 25 pontos-base, as declarações do Fed revelam divisão interna: há quem considere a inflação o maior risco e há quem veja a fragilidade do mercado de trabalho como a principal preocupação
Rodolfo Amstalden: O mercado realmente subestima a Selic?
Dentro do arcabouço de metas de inflação, nosso Bacen dá mais cavalos de pau do que a média global. E o custo de se voltar atrás para um formulador de política monetária é quase que proibitivo. Logo, faz sentido para o mercado cobrar um seguro diante de viradas possíveis.
As projeções para a economia em 2026, inflação no Brasil e o que mais move os mercados hoje
Seu Dinheiro mostra as projeções do Itaú para os juros, inflação e dólar para 2026; veja o que você precisa saber sobre a bolsa hoje
Os planos e dividendos da Petrobras (PETR3), a guerra entre Rússia e Ucrânia, acordo entre Mercosul e UE e o que mais move o mercado
Seu Dinheiro conversou com analistas para entender o que esperar do novo plano de investimentos da Petrobras; a bolsa brasileira também reflete notícias do cenário econômico internacional
Felipe Miranda: O paradoxo do banqueiro central
Se você é explicitamente “o menino de ouro” do presidente da República e próximo ao ministério da Fazenda, é natural desconfiar de sua eventual subserviência ao poder Executivo
Hapvida decepciona mais uma vez, dados da Europa e dos EUA e o que mais move a bolsa hoje
Operadora de saúde enfrenta mais uma vez os mesmos problemas que a fizeram despencar na bolsa há mais dois anos; investidores aguardam discurso da presidente do Banco Central Europeu (BCE) e dados da economia dos EUA
CDBs do Master, Oncoclínicas (ONCO3), o ‘terror dos vendidos’ e mais: as matérias mais lidas do Seu Dinheiro na semana
Matéria sobre a exposição da Oncoclínicas aos CDBs do Banco Master foi a mais lida da semana; veja os destaques do SD
A debandada da bolsa, pessimismo global e tarifas de Trump: veja o que move os mercados hoje
Nos últimos anos, diversas empresas deixaram a B3; veja o que está por trás desse movimento e o que mais pode afetar o seu bolso
Planejamento, pé no chão e consciência de que a realidade pode ser dura são alguns dos requisitos mais importantes de quem quer ser dono da própria empresa
Milhões de brasileiros sonham em abrir um negócio, mas especialistas alertam que a realidade envolve insegurança financeira, mais trabalho e falta de planejamento
Rodolfo Amstalden: Será que o Fed já pode usar AI para cortar juros?
Chegamos à situação contemporânea nos EUA em que o mercado de trabalho começa a dar sinais em prol de cortes nos juros, enquanto a inflação (acima da meta) sugere insistência no aperto
A nova estratégia dos FIIs para crescer, a espera pelo balanço da Nvidia e o que mais mexe com seu bolso hoje
Para continuarem entregando bons retornos, os Fundos de Investimento Imobiliários adaptaram sua estratégia; veja se há riscos para o investidor comum. Balanço da Nvidia e dados de emprego dos EUA também movem os mercados hoje