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Julia Wiltgen
Julia Wiltgen
Jornalista formada pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) com pós-graduação em Finanças Corporativas e Investment Banking pela Fundação Instituto de Administração (FIA). Trabalhou com produção de reportagem na TV Globo e foi editora de finanças pessoais de Exame.com, na Editora Abril.
Contas de pagamento

PicPay e 99Pay: retorno de mais de 200% do CDI para qualquer valor acabou, mas remuneração pode ter aumentado; entenda

Contas de pagamento, como PicPay e 99Pay, já chegaram a pagar percentuais bem elevados do CDI sobre o saldo em conta, que foram sendo reduzidos com a alta da Selic; mas, em alguns casos, remuneração absoluta aumentou

Julia Wiltgen
Julia Wiltgen
16 de abril de 2022
7:00 - atualizado às 17:32
PicPay: empresa pretende aceitar pagamentos em criptomoedas e bitcoin, mas expõe pouco dos planos
Com a escalada da Selic, certas contas de pagamento de fato reduziram a rentabilidade; outras, como o PicPay, cortaram o percentual do CDI oferecido, mas agora rendem mais. Imagem: Divulgação/PicPay

Um dos grandes chamarizes das contas de pagamento remuneradas, como PicPay, 99Pay, NuConta e PagBank, é o seu retorno bem superior ao da poupança sem que para isso o usuário precise sequer se dar ao trabalho de transferir seu dinheiro para alguma aplicação financeira.

Em geral, o saldo em conta é alocado automaticamente em títulos públicos federais, investimentos que são até mais seguros que a poupança, por contarem com garantia do governo; e, assim, geram uma rentabilidade, que atualmente gira em torno de 100% do CDI na maioria das contas de pagamento rendeiras do mercado.

Mas os percentuais do CDI pagos por algumas contas de pagamento já foram muito maiores. Quando a taxa Selic estava perto das mínimas históricas de 2% ao ano, algumas delas chegaram a pagar mais de 200% do CDI para qualquer valor.

Causaram grande frisson, na época, as remunerações de 210% do CDI do PicPay para quantias de até R$ 250 mil e de 220% do CDI do 99Pay para qualquer valor até R$ 5 mil. O banco Digio, do Bradesco, também chegou a fazer uma ação promocional para pagar 130% do CDI por um ano sobre os valores depositados em certas datas.

Mas, com a escalada da Selic no último ano, esses percentuais de encher os olhos deixaram de ser oferecidos. O PicPay foi aos poucos reduzindo o percentual do CDI pago e o limite para receber a remuneração mais alta, até chegar aos 105% do CDI atuais, para quantias de até R$ 100 mil, e 100% do CDI para o que exceder este valor.

O 99Pay, por sua vez, colocou um limite bem baixo para a sua rentabilidade de 220% do CDI: R$ 500. Tudo que ultrapassar esse valor, na carteira digital da 99, também é remunerado em apenas 100% do CDI, até o limite de R$ 5 mil. Já a promoção do Digio terminou, e agora a rentabilidade voltou a ser de 100% do CDI para qualquer quantia.

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Mas embora não haja mais o percentual elevado do CDI para dar força ao marketing dessas empresas e fazer os olhos do investidor brilharem, as contas de pagamento têm hoje um retorno absoluto muito superior ao dos tempos de Selic nas mínimas, pelo simples fato de que a taxa básica de juros disparou. E o CDI é uma taxa que caminha bem próxima da Selic.

É certo, porém, que em alguns casos as remunerações altas foram mantidas até bem pouco tempo atrás, o que fez com que as mudanças nas regras ocasionassem realmente uma queda abrupta no retorno do usuário. Vamos ver o que aconteceu em cada caso, e quanto, em termos nominais, cada conta de pagamento que baixou sua remuneração relativa está pagando atualmente.

No PicPay, percentual do CDI foi reduzindo aos poucos

Vejamos o que aconteceu com o PicPay, o caso mais notório. Inicialmente, a conta remunerava apenas 100% do CDI. Mas, a partir de novembro de 2020, com a Selic em 2% ao ano, a conta passou a pagar 210% do CDI para depósitos de até R$ 250 mil, e 100% do CDI para o que excedesse esse valor.

O percentual, no entanto, voltou a cair à medida que a Selic foi aumentando, assim como os limites para receber a remuneração mais elevada, até chegar à rentabilidade atual.

É importante frisar que os termos e condições do PicPay lhe permitem suspender ou encerrar a geração de rendimentos, de forma temporária ou definitiva, sem aviso ou justificação prévia. Também permitem à empresa alterar as condições da remuneração, especialmente no que diz respeito à taxa aplicável ao rendimento, mediante comunicação aos clientes. E, de fato, a cada alteração, os clientes eram notificados.

Apesar da queda gradativa da rentabilidade relativa, porém, o rendimento nominal do PicPay, isto é, seu retorno absoluto, foi ficando progressivamente mais alto, e se afastando cada vez mais da rentabilidade da poupança. Afinal, a Selic saiu de 2% ao ano para os atuais 11,75%, o que levou o CDI mais ou menos de 1,90% ao ano para 11,65%.

Assim, 210% do CDI, em novembro de 2020, correspondia mais ou menos a 3,99% ao ano. Após desconto de imposto de renda pela maior alíquota (22,5%), válida para as aplicações de até seis meses de prazo, o retorno líquido fica em 3,09% ao ano. Já 100% do CDI correspondiam a 1,90% ao ano, o equivalente a 1,47% ao ano após o desconto de IR. Na mesma época, a poupança rendia 1,40% ao ano, retorno que já é isento de impostos.

Hoje, com a Selic em 11,75%, 105% do CDI correspondem a cerca de 12,23% ao ano, ou 9,48% líquido, se descontada a maior alíquota de imposto de renda. Já 100% do CDI equivalem mais ou menos a 11,65% ao ano, ou 9,03%, após o IR. E a poupança anda pagando 6,17% ao ano mais Taxa Referencial (TR), o que corresponde a 7,41% ao ano, considerada a TR de março.

Veja na tabela abaixo o histórico de mudanças na remuneração do PicPay e como ficou a rentabilidade bruta (antes de IR e IOF) a cada alteração (considerando a Selic da época):

Selic (a.a.)100% do CDI (a.a.)Data da mudançaRetorno relativoRetorno absoluto (a.a.)Limite
2,00%1,90%11/2020210% do CDI3,99%R$ 250 mil
2,75%2,65%03/2021150% do CDI3,98%R$ 250 mil
4,25%4,15%06/2021130% do CDI5,39%R$ 250 mil
5,25%5,15%08/2021120% do CDI6,18%R$ 250 mil
9,25%9,15%01/2022110% do CDI10,06%R$ 110 mil
10,75%10,65%02/2022105% do CDI11,18%R$ 100 mil

Limitação do retorno na 99Pay foi mais traumática

A mesma lógica se aplica às demais contas de pagamento remuneradas que reduziram o percentual do CDI pago com a queda da Selic, mas no caso da 99Pay a mudança foi um pouco mais traumática e de fato reduziu a rentabilidade para os valores acima do limite estabelecido.

Na carteira do app de transportes 99, a rentabilidade não vem de uma aplicação financeira, mas se trata de uma bonificação da empresa para quem deixa dinheiro na conta. Assim, não há cobrança de IR ou IOF, mas em compensação há limitações, como a ausência de qualquer remuneração para valores que excedam R$ 5 mil na conta.

A alteração, no caso do 99Pay, não foi no percentual do CDI, mas sim a introdução de um limite de R$ 500 para a rentabilidade de 220% do CDI em janeiro deste ano, mantendo um retorno de 100% do CDI para o que ultrapassar esta quantia até o total de R$ 5 mil.

Com isso, a mudança no 99Pay foi um pouco mais brusca. Tudo bem, quando a Selic estava em 2% ao ano, 220% do CDI correspondiam a apenas 4,18% ao ano, bem menos do que 100% do CDI hoje.

Mas no fim do ano passado, 220% do CDI correspondiam a uma rentabilidade de fabulosos 20,35%, e isso isento de impostos e taxas! De fato, um retorno deste para uma quantia de até R$ 5 mil não era de se jogar fora.

Agora, porém, 220% do CDI equivalem a cerca de 25,63% ao ano, mas essa remuneração, no 99Pay, está limitada a parcos R$ 500. E acima deste valor, o retorno de 100% do CDI corresponde a cerca de 11,65% ao ano - bem menos do os 220% do CDI do fim do ano passado.

Promoção do Digio foi feita quando a Selic estava nas mínimas

No Digio, banco digital do Bradesco, a rentabilidade da conta sempre foi de 100% do CDI para qualquer valor, obtida pelo investimento automático dos recursos em títulos públicos, o que gera um desconto de IR e IOF na fonte quando o usuário usa o dinheiro, como normalmente ocorre nesse tipo de investimento.

Mas entre 15 de setembro e 14 de outubro de 2020, o Digio fez uma ação promocional pelo mês do consumidor, em que se comprometeu a pagar um retorno de 130% do CDI durante um ano pelos depósitos feitos naquele período. Na época, a Selic estava na mínima de 2% ao ano. Assim, 130% do CDI correspondiam a uma rentabilidade bruta de apenas 2,47% ao ano.

Ao longo dos 12 meses seguintes, porém, a Selic foi subindo, e o CDI também. Alguém que tivesse feito um depósito no dia 14 de outubro de 2020, último dia da ação promocional, teria recebido apenas 4,10% em um ano, ou 3,38% após descontado o IR de 17,50%, válido para aplicações de mais de 360 dias. No mesmo período, a poupança rendeu 2,13%.

CDB de 200% do CDI do PagBank deixou saudades

O PagBank é outra conta de pagamento remunerada que paga 100% do CDI para o saldo em carteira, mas apenas no aniversário, isto é, quando o dinheiro completa um mês na conta, da mesma forma que acontece com a poupança.

Contudo, o PagBank oferece CDBs rentáveis, inclusive um com liquidez diária que paga 110% do CDI para aplicações a partir de R$ 1, mais do que os CDBs de liquidez diária dos bancos digitais costumam remunerar.

Mas este produto também viu sua rentabilidade relativa cair com a alta da Selic. Até o início de dezembro do ano passado, o CDB com liquidez diária pagava 200% do CDI. Na época, a Selic estava em 7,75% ao ano, o que significa que 200% do CDI correspondiam a uma rentabilidade bruta de cerca de 15,30% ao ano. Hoje, 110% do CDI representam “apenas” 12,82%. Outro caso em que, de fato, houve uma queda no retorno.

Contas de pagamento remuneradas rendem mais que a poupança, mas são seguras? Eu escrevi sobre elas nesta outra matéria, onde explico como funcionam, quanto rendem, o que oferecem e ainda avalio qual é a melhor.

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