Lula e o risco de cauda: O caminho da servidão
Entre os grandes problemas das últimas semanas está o fato de que o cenário de cauda, ainda que com probabilidade baixa, entrou na conta. Muitos que anteviam apenas mediocridade no governo agora temem o real desastre.

“Afirma-se que o homem é um ser racional, porém, a racionalidade é uma questão de opção — e as alternativas que a sua natureza oferece são estas: um ser racional ou um animal suicida. O homem tem que ser homem — por escolha, ele tem que ter sua vida como um valor; por escolha, tem que aprender a preservá-la; por escolha, tem que descobrir os valores que ela requer e praticar suas virtudes.”
O objetivismo de Ayn Rand, com toda sua defesa da racionalidade, parte de uma premissa aparentemente óbvia: a existência existe. Não há como se escapar das restrições e contingências objetivas. A realidade é real e, mais uma vez apelando a Rand, “você pode ignorar a realidade, mas não pode ignorar as consequências de ignorar a realidade.”
Lembrei-me da essência da filosofia de Rand ao me deparar com as palavras do presidente Lula em evento dos catadores: “a gente não cuida do pobre se ficar vendo estatística, se ficar olhando para a política fiscal do governo, sempre haverá uma prioridade acima dos pobres.”
A seguir por esse caminho, Lula ignora a realidade. Talvez o leitor mais crítico pudesse apontar que o presidente eleito fala para a plateia de ouvintes. Pode até ser, nunca saberemos o que está na cabeça dele. Mas, com notícias em tempo real e grupos de Zap altamente engajados, a plateia é sempre o mundo inteiro.
Lula e a lei das consequências indesejadas
É justamente o contrário. Só se cuida do pobre pensando em estatística. Aqueles que criticaram o uso da cloroquina no combate à covid-19 por falta de evidência empírica e apoio na comunidade científica agora querem fazer política econômica também desafiando a ciência.
Por mais bem intencionadas que possam ser as palavras, ”cuidar do pobre" sem espaço no orçamento aumenta o risco fiscal, o que se traduz em mais taxas de juro, e eleva as expectativas de inflação, porque o governo sempre poderá, num ato inflacionário, emitir mais moeda para cumprir seus compromissos financeiros.
Leia Também
Trump na sala de aula: Ibovespa reage a tarifas de 50% impostas pelos EUA ao Brasil
Rodolfo Amstalden: Nem cinco minutos guardados
Mais juros implicam menos investimentos, menos crescimento e mais desemprego. Mais inflação aleija justamente as classes mais pobres, desprovidas de alternativas para blindar seu patrimônio. Os rentistas estão lá protegidos no paraíso dos juros altos e nos altos juros reais da NTN-B. Uma opção pela maior concentração de renda, em tese o oposto do desejo original da esquerda. Lei das consequências indesejadas.
Um tiro no pé
Em entrevista que virou meme, Gabriel Galípolo descarta qualquer risco de a inflação subir no pós-pandemia, para ser desmentido pela imposição material da carestia poucos meses depois. Não deveria incomodar tanto o erro da previsão. “Predição é muito difícil, especialmente se for sobre o futuro.”
Tentar antecipar o impermeável futuro é comprar um jazigo no cemitério das reputações. Pra mim, o problema maior da entrevista é sua tentativa de refutar o típico paralelo entre economia doméstica e macroeconomia.
Era algo mais ou menos assim: “você não pode comparar uma família a um país, porque uma família nunca conseguirá dinheiro se estiver muito quebrada. Um país sempre poderá emitir moeda.” Sim, é verdade. O “pequeno" problema é a consequência da emissão de moeda. A senhoriagem, uma prerrogativa do Estado, resulta em inflação, uma espécie de imposto regressivo, cobrado com mais força das classes mais baixas.
A opção até aqui eleva os prêmios de risco, turva o horizonte para investimentos empresariais, estimula saída de capitais do país, faz o dólar subir, embute uma expectativa de alta dos juros em 2023. Com a Selic em 15% e o dólar a R$ 6, não haverá como cuidar do pobre. O governo Lula se inviabiliza em seus anseios mais centrais. É atirar no próprio pé. Fere de morte o princípio da própria racionalidade. "O homem tem que ser homem – por escolha, ele tem que ter sua vida como um valor”.
Começam a circular relatórios de bancos, corretoras e researches independentes com estratégias de investimento para 2023. Em quase todos eles há um consenso sobre o quanto a Bolsa brasileira está barata. O Ibovespa negocia próximo a 6,5x lucros, nível mais baixo desde 2005 e dois desvios-padrão distante da média histórica. O Equity Risk Premium (retorno esperado da Bolsa sobre a renda fixa) do índice também se encontra nas máximas históricas.
Sabemos que, no curto prazo, valuation é um driver menor; acaba sobrepujado pelo fluxo de notícias. O barato fica ainda mais barato se a informação marginal for negativa. O tamanho da atratividade dos preços, porém, chama atenção.
- ESTÁ GOSTANDO DESTE CONTEÚDO? Tenha acesso a ideias de investimento para sair do lugar comum, multiplicar e proteger o patrimônio
Por que estamos tão baratos?
Uma possível explicação está no artigo de Robert Barro, de título “Rare Events and the Equity Premium”, que, em grande medida, se trata de uma atualização mais bem fundamentada (e escrita por um autor mais famoso e respeitado na academia) de Rietz sobre o mesmo tema. A ideia é que os prêmios de risco se alargam quando enxergamos mais probabilidade de eventos raros, os cisnes pretos ou cinzas de Nassim Taleb.
Entre os grandes problemas das últimas semanas está o fato de que o cenário de cauda, ainda que com probabilidade baixa, entrou na conta. Muitos que anteviam apenas mediocridade no governo Lula agora temem o real desastre.
Se falta dinheiro, o governo emite moeda ou aumenta muito os impostos. A inflação dispara. A população vai para rua.
O governo quer atender aos desejos imediatistas. Emite mais moeda para conceder auxílios, pensões, bolsas e afins. A inflação fica mais intensa. Começam os papos de tabelamento, congelamento, confisco, expropriação, ferimento dos direitos de propriedade — esses dois últimos elementos representam a essência do capitalismo e, inclusive, do Parlamento, que nasceu na Inglaterra para proteger direitos econômicos (de propriedade) da burguesia emergente contra os abusos da nobreza.
É o caminho da servidão. Hayek já tinha desenhado a maior das responsabilidades sociais. Uma economia equilibrada. Direito à propriedade privada, respeito aos contratos, obediência às sinalizações do sistema de preços e um Estado que fomente, por meio de bom arcabouço institucional, os três elementos anteriores.
Estamos nos afastando de cada um desses pontos. A racionalidade precisa ser resgatada com urgência. Na direção atual, o governo parece um esquadrão suicida. Se houver alguma acomodação, a recuperação pode ser bem intensa. Por ora, é um grande “se".
Felipe Miranda: Troco um Van Gogh por uma small cap
Seria capaz de apostar que seu assessor de investimentos não ligou para oferecer uma carteira de small caps brasileiras neste momento. Há algo mais fora de moda do que elas agora? Olho para algumas dessas ações e tenho a impressão de estar diante de “Pomar com ciprestes”, em 1888.
Ontem, hoje, amanhã: Tensão com fim da trégua comercial dificulta busca por novos recordes no Ibovespa
Apetite por risco é desafiado pela aproximação do fim da trégua de Donald Trump em sua guerra comercial contra o mundo
Talvez fique repetitivo: Ibovespa mira novos recordes, mas feriado nos EUA drena liquidez dos mercados
O Ibovespa superou ontem, pela primeira vez na história, a marca dos 141 pontos; dólar está no nível mais baixo em pouco mais de um ano
A história não se repete, mas rima: a estratégia que deu certo no passado e tem grandes chances de trazer bons retornos — de novo
Mesmo com um endividamento controlado, a empresa em questão voltou a “passar o chapéu”, o que para nós é um sinal claro de que ela está de olho em novas aquisições. E a julgar pelo seu histórico, podemos dizer que isso tende a ser bastante positivo para os acionistas.
Ditados, superstições e preceitos da Rua
Aqueles que têm um modus operandi e se atêm a ele são vitoriosos. Por sua vez, os indecisos que ora obedecem a um critério, ora a outro, costumam ser alijados do mercado.
Feijão com arroz: Ibovespa busca recuperação em dia de payroll com Wall Street nas máximas
Wall Street fecha mais cedo hoje e nem abre amanhã, o que tende a drenar a liquidez nos mercados financeiros internacionais
Rodolfo Amstalden: Um estranho encontro com a verdade subterrânea
Em vez de entrar em disputas metodológicas na edição de hoje, proponho um outro tipo de exercício imaginativo, mais útil para fins didáticos
Mantendo a tradição: Ibovespa tenta recuperar os 140 mil pontos em dia de produção industrial e dados sobre o mercado de trabalho nos EUA
Investidores também monitoram decisão do governo de recorrer ao STF para manter aumento do IOF
Os fantasmas de Nelson Rodrigues: Ibovespa começa o semestre tentando sustentar posto de melhor investimento do ano
Melhor investimento do primeiro semestre, Ibovespa reage a trégua na guerra comercial, trade eleitoral e treta do IOF
Rumo a 2026 com a máquina enguiçada e o cofre furado
Com a aproximação do calendário eleitoral, cresce a percepção de que o pêndulo político está prestes a mudar de direção — e, com ele, toda a correlação de forças no país — o problema é o intervalo até lá
Tony Volpon: Mercado sobrevive a mais um susto… e as bolsas americanas batem nas máximas do ano
O “sangue frio” coletivo também é uma evidência de força dos mercados acionários em geral, que depois do cessar-fogo, atingiram novas máximas no ano e novas máximas históricas
Tudo sob controle: Ibovespa precisa de uma leve alta para fechar junho no azul, mas não depende só de si
Ibovespa vem de três altas mensais consecutivas, mas as turbulências de junho colocam a sequência em risco
Ser CLT virou ofensa? O que há por trás do medo da geração Z pela carteira assinada
De símbolo de estabilidade a motivo de piada nas redes sociais: o que esse movimento diz sobre o mundo do trabalho — e sobre a forma como estamos lidando com ele?
Atenção aos sinais: Bolsas internacionais sobem com notícia de acordo EUA-China; Ibovespa acompanha desemprego e PCE
Ibovespa tenta manter o bom momento enquanto governo busca meio de contornar derrubada do aumento do IOF
Siga na bolsa mesmo com a Selic em 15%: os sinais dizem que chegou a hora de comprar ações
A elevação do juro no Brasil não significa que chegou a hora de abandonar a renda variável de vez e mergulhar na super renda fixa brasileira — e eu te explico os motivos
Trocando as lentes: Ibovespa repercute derrubada de ajuste do IOF pelo Congresso, IPCA-15 de junho e PIB final dos EUA
Os investidores também monitoram entrevista coletiva de Galípolo após divulgação de Relatório de Política Monetária
Rodolfo Amstalden: Não existem níveis seguros para a oferta de segurança
Em tese, o forward guidance é tanto mais necessário quanto menos crível for a atitude da autoridade monetária. Se o seu cônjuge precisa prometer que vai voltar cedo toda vez que sai sozinho de casa, provavelmente há um ou mais motivos para isso.
É melhor ter um plano: Ibovespa busca manter tom positivo em dia de agenda fraca e Powell no Senado dos EUA
Bolsas internacionais seguem no azul, ainda repercutindo a trégua na guerra entre Israel e o Irã
Um longo caminho: Ibovespa monitora cessar-fogo enquanto investidores repercutem ata do Copom e testemunho de Powell
Trégua anunciada por Donald Trump impulsiona ativos de risco nos mercados internacionais e pode ajudar o Ibovespa
Um frágil cessar-fogo antes do tiro no pé que o Irã não vai querer dar
Cessar-fogo em guerra contra o Irã traz alívio, mas não resolve impasse estrutural. Trégua será duradoura ou apenas mais uma pausa antes do próximo ato?