As duas velocidades do mercado na era pós-covid
Segunda onda: O quanto disso aqui é arte e o quanto é ciência? O que importa mais: teoria ou prática? Intuição ou formalismo?
A ideia da indução é tratada com desconfiança na epistemologia desde as contribuições de David Hume. O falseacionismo popperiano foi pela mesma linha e quase sepultou a possibilidade de inferir-se o geral a partir do particular.
A investigação talebiana clássica é, em grande medida, uma revitalização do problema da indução de Hume. De quantos cisnes brancos precisamos para concluir que todos os cisnes são brancos? As teorias não podem ser aceitas, elas apenas podem ser rejeitadas. Bastou um cisne negro na Austrália para derrubar muito tempo de estudo em ornitologia sugerindo que toda a espécie era branca.
Você nunca poderá dizer que o abominável homem das neves não existe. Não tê-lo nunca encontrado não exclui a possibilidade de esbarrar no cidadão (seria ele um cidadão?) em suas férias em Aspen. Ausência de evidência não é evidência de ausência.
Agora, sejamos francos aqui: dá pra ter uma boa dose de confiança de que o Sol vai nascer no Leste e se pôr no Oeste amanhã.
Boa parte do nosso conhecimento, principalmente aquele de cunho prático, é formado pela indução, não pela dedução. Se um fenômeno acontece de maneira recorrente e tem um determinado resultado, atribuímos boa probabilidade de que seja assim também no futuro.
Ainda que não seja necessariamente uma conclusão lógico-dedutiva, pode ter boa validade. Se eu demoro cerca de 1 hora para escrever isso todos os dias, imagino que amanhã levaria mais ou menos esse tempo também. Consigo me programar para isso, ainda que incorra em atrasos de vez em quando, fruto de distrações indesejadas e não deliberadas.
É tradicionalmente o conhecimento prático que permite o reconhecimento de padrões. A arte está em, ao identificar padrões e traçar analogias entre diversas situações ou cases de investimentos, perceber o que é, de fato, similar na analogia e quais são as diferenças, se sutis ou mais marcantes.
Gosto de tentar combinar a prática à teoria. Como Taleb, acredito que a ordem das coisas importa. O conhecimento deve emanar da prática para a academia, não o contrário. A realidade se impõe sobre a teoria. Não é a realidade que haverá de se adaptar ao teórico. Há uma simbiose com hereditariedade entre as coisas, sendo a paternidade pertencente à prática.
Se a prática nos permite o reconhecimento de padrões, a teoria oferece explicações gerais para circunstâncias particulares e desenvolve nossa capacidade de abstração. Criamos modelos matemáticos e mentais para aplicar nas mais variadas situações.
Rudi Dornbusch tem um modelo interessante. Originalmente, ele foi proposto para explicar o overshooting típico do mercado de câmbio. A ideia central é que, mesmo em mercados com expectativas racionais, as moedas tradicionalmente passam por movimentos exagerados.
Na sua exposição, ele aponta a existência de dois mercados na Economia: o de bens e o de capitais. Eles possuem velocidades diferentes de ajustamento. O primeiro é mais lento, demora a reagir. O segundo é mais ágil e responde de maneira instantânea a um choque.
Então, aparece um choque negativo súbito a determinado país. O mercado de capitais reage na hora. A moeda se desvaloriza. O mercado de bens continua parado.
Nesse primeiro momento, como só o mercado monetário reage, a resposta no câmbio é muito mais intensa, porque a absorção que viria da reação do mercado de bens ainda não aconteceu. Ou seja, no momento inicial, o câmbio vai além do que seria o equilíbrio final do processo.
Num segundo estágio, o mercado de bens vai superando sua rigidez e também se mexe, retirando a pressão excedente do lado monetário. O câmbio volta do overshooting.
O modelo de Dornbusch é, em si, bastante rico. Mas o mais interessante, pra mim, é que ele se aplica a qualquer situação em que há duas velocidades diferentes de ajustamento a choques. Você pode pensar em blue chips contra small caps — as primeiras tendem a reagir na frente; depois andam as menores.
E você pode pensar na recuperação pós-Covid. Os ajustamentos vieram primeiro na China e nos EUA, com excepcionalismos, cada um à sua maneira, no combate à doença. A China encontra mecanismos de controle social sem precedentes, além de ter observado enorme expansão monetária. Os EUA tiveram um programa de vacinação absolutamente surpreendente e acima de qualquer outro país. E teve também o Fed comprando até Marea Turbo e a administração Biden mudando bastante o regime fiscal.
Feito o ajustamento e com a vacinação bem avançada, com outros países a princípio mais rígidos superando as dificuldades iniciais, agora a Europa e o Japão encontram recuperação mais destacada. Os mercados emergentes também correm atrás do prejuízo.
O yield do Treasury de 10 anos veio abaixo de 1,50% nesta manhã, um nível importante, tipicamente ligado ao dividend yield médio do S&P 500. Isso ajuda a reforçar uma migração de recursos à periferia e aos casos de crescimento.
O overshooting deve chegar por aqui logo, logo. E isso é totalmente racional. Depois da primeira onda de recuperação nos EUA e na China, agora está na hora da segunda onda. Essa me interessa. Você está preparado?
Ataque do Irã poderia ter sido muito pior: não estamos diante da Terceira Guerra Mundial — mas saiba como você pode proteger seu dinheiro
Em outubro, após o ataque do Hamas, apontei para um “Kit Geopolítico” para auxiliar investidores a navegar por esse ambiente incerto
Felipe Miranda: Cinco coisas que deveriam acabar no mercado financeiro
O sócio-fundador da Empiricus lista práticas do universo dos investimentos que gostaria de ver eliminadas
O que Elon Musk, Javier Milei, Alexandre de Moraes, o halving do bitcoin e a China têm em comum?
Acredite: tudo isso movimentou o mercado financeiro esta semana; veja os destaques
Meu dependente paga pensão alimentícia; posso abatê-la no imposto de renda?
Titular da declaração de imposto de renda declara o pai como dependente, e ele paga pensão alimentícia à mãe dela. E agora?
Enquanto você se preocupa com a Oi (OIBR3), esta empresa da B3 virou a campeã de qualidade no serviço de internet – e ainda está barata na bolsa
Para se diferenciar, essa companhia construiu uma infraestrutura de qualidade, que tem proporcionado prêmios de internet fixa mais rápida do Estado de São Paulo, à frente das gigantes de telecom
Rodolfo Amstalden: Quintal da China, quintal do mundo
Se a economia chinesa sofre, nós necessariamente compartilhamos dessa desgraça?
Juro real de volta aos 6%: com bolsa na pior e dólar nas alturas, essa é uma nova oportunidade?
Uma regra prática comum para investimentos em renda fixa no Brasil sugere vender títulos quando os juros reais atingem 3% e comprá-los a 6%
Além do bitcoin (BTC): esta carteira já rendeu 447% acima da maior criptomoeda do mercado
Acredito que exista uma forma melhor de pensar sobre a ciclicidade do preço do bitcoin (BTC), que historicamente nos ajudou a gerar alfa neste mercado
Argentina entra na rota de ‘paraíso fiscal’, China encara mesma crise do Japão e inteligência artificial “sugando” o Ibovespa — veja tudo o que foi destaque na semana
A crise e os seus reflexos no país vizinho no Brasil despertaram o interesse dos leitores do Seu Dinheiro nos últimos dias
Pago escola e plano de saúde de um filho ilegítimo; posso abater esses gastos no imposto de renda?
Filho não assumido rende deduções no imposto de renda? A Dinheirista responde dúvidas de leitores sobre o IR 2024
Leia Também
Mais lidas
-
1
Klabin (KLBN11) e Gerdau (GGBR4) vão distribuir mais de R$ 5,5 bilhões em ações; veja como vai funcionar a bonificação
-
2
Juros em alta? Presidente do Fed fala pela primeira vez após dado de inflação e dá sinal claro do que vai acontecer nos EUA — bolsas sentem
-
3
Quem foi bem e quem foi mal entre as construtoras listadas na B3 nas prévias de resultados do 1T24