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Atritos no Centrão atrapalham reformas?

Existem outras motivações além da sucessão na Câmara para a saída de DEM e MDB do Centrão. Uma delas é a necessidade eleitoral de buscar uma maior independência em relação ao governo de Bolsonaro

3 de agosto de 2020
7:50
Brasília
Imagem: Shutterstock

Ao longo da última semana, uma das perguntas que mais recebi de investidores nacionais e internacionais referia-se à saída do MDB e do DEM do bloco partidário liderado pelo deputado Arthur Lira (PP-AL). Afinal, com o racha no Centrão, as reformas econômicas estão em perigo? Aumentam os riscos para a manutenção do teto de gastos?

O bloco comandado por Lira é amplo, composto de vários partidos. São eles: PL, PP, PSD, MDB, DEM, Solidariedade, PTB, PROS e Avante. Gerou muita preocupação no mercado que o rompimento pudesse significar uma sinalização contra as reformas do ministro Paulo Guedes. Não é bem assim.

Ainda que fizessem parte do bloco liderado por Lira, MDB e DEM se movimentavam de forma independente pelo Congresso Nacional. E o deputado pouco influenciava os votos de parlamentares dos dois partidos.

A formação do bloco é uma estratégia comum no Parlamento, tendo em vista o controle de comissões da Casa. Ademais, não há qualquer indicação do DEM ou do MDB de oposição à agenda de reformas em discussão na Câmara, embora haja resistência em questões pontuais, como a criação de um imposto sobre comércio eletrônico.

Ambos os partidos apoiaram, majoritariamente, a Reforma da Previdência, a MP da Liberdade Econômica, o Novo Marco do Saneamento e a Lei Geral de Telecomunicações (PLC nº 79), que são pautas reformistas.

No entanto, a sucessão à presidência da Câmara já está em curso e essa disputa, sim, afeta o ritmo de votação no Legislativo. É um dos motivos pelos quais não tenho sido tão otimista quanto à aprovação este ano da Reforma Tributária. Arthur Lira, pré-candidato à sucessão, iniciou um movimento de aproximação com o governo. Em troca de votos do bloco a projetos de interesse do governo, queria o apoio do presidente Jair Bolsonaro na sucessão de Rodrigo Maia (DEM-RJ). Como líder de um bloco com 221 deputados – reduzido para 158 após a saída do DEM e MDB –, a aliança foi bem recebida pelo Planalto.

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O governo, no entanto, parece ter tomado a decisão correta de se distanciar da disputa. Claro, há preferência e apoio por Lira, mas sem fechar as portas para outros candidatos. A lição da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), que explicitamente trabalhou contra a eleição do então deputado Eduardo Cunha (MDB), está viva na memória do governo.

Existem outras motivações além da sucessão na Câmara para a saída de DEM e MDB do Centrão. Uma delas é a necessidade eleitoral de buscar uma maior independência em relação ao governo de Bolsonaro. Nacionalmente conhecidos, e tendo como principal objetivo aumentar sua capilaridade política de Norte a Sul do país, MDB e DEM querem disputar as eleições municipais com maior independência.

Líderes de ambos os partidos afirmam nos bastidores que o tamanho e as diferenças regionais internas em ambas as siglas não permitem uma ligação, ainda que informal, ao governo. “Estamos no momento mais polarizado da política nacional. O partido precisa criar um ambiente de conforto para os que apoiam o presidente e também para os que criticam. Sair do bloco de Arthur Lira era necessário para solidificar essa percepção”, disse um importante membro do MDB.

Esse núcleo de centro moderado em torno de Rodrigo Maia não deve constituir um bloco partidário formal, mas as legendas devem atuar alinhadas. Além do DEM e do MDB, o grupo agrega o PSDB, o Cidadania, o Podemos e o PV, somando 116 deputados. Tais partidos devem manter apoio às reformas econômicas, fiscais e regulatórias, porém com uma linha mais crítica. Também criarão um bloco de resistência às pautas conservadoras.

Nos bastidores, comenta-se a possibilidade de criação de um novo bloco, mais alinhado ao Palácio do Planalto, composto por PSL, PSC, PTB e PROS. Essas siglas possuem um perfil mais conservador e devem apoiar não só a agenda econômica, como também a de costumes. A despeito da ala divergente do PSL, a grande maioria das pautas governistas deverá contar com o aval desse grupo, que soma 84 deputados.

Se confirmada essa união, o antigo blocão será reconfigurado e cairá para 135 deputados, distribuídos entre PP, PL, PSD, Solidariedade e Avante. Embora não integrem formalmente o bloco, Republicanos e Patriota atuam em consonância com o Centrão, o que eleva o número para 174 deputados. Esse conjunto deve se manter alinhado ao Planalto, porém com um nível de dissidência na faixa de 30%. Por se tratar de um grupo muito diverso e pragmático, em determinadas votações o nível de divergência poderá ser mais acentuado.

Obviamente, todas as composições deverão contar com dissidências. Além disso, qualquer uma poderá receber o reforço dos oito deputados do Partido Novo, a depender da pauta em discussão.

Na prática, a agenda de reformas econômicas do governo continua tendo boas chances de avançar. A saída do DEM e do MDB impacta mais a sucessão na Câmara e as estratégias eleitorais das siglas do que o andamento da agenda.

A falta de uma base política formal, coesa e organizada é o que impede o avanço consistente de inúmeras pautas. No entanto, ainda vejo o Congresso com viés reformista, embora não na intensidade e na velocidade que o mercado deseja.

A política de dentro para fora anda polarizada e binária. Tal comportamento não se reflete dentro do Parlamento. Em Brasília, no dia a dia, de fora para dentro, nada é binário. Tudo é negociado.

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