Uma aposta de um bilhão de dólares ou apenas um hedge?
Arquetipicamente, toda história tem quatro personagens. A vítima, o herói, o sábio e o vilão. Se optar por não participar da matéria, o sujeito quase automaticamente se candidata a vilão

Jornalistas são seres curiosos. Uma pena que, em muitas vezes, essa curiosidade esteja voltada para si mesmo, para a autoimagem e narrativa, em vez de destinar-se propriamente a investigar a verdade e, de fato, ponderar os dois lados.
Ao ser convidada para participar de uma determinada reportagem, a fonte da matéria (o real protagonista da história) se vê obrigada a necessariamente escolher entre duas alternativas: i) declinar o convite e aceitar ex-ante que o texto sairá sem a sua versão dos fatos; e ii) abrir-se para o repórter e expor os seus argumentos. Nenhuma delas costuma ser boa.
Arquetipicamente, toda história tem quatro personagens. A vítima, o herói, o sábio e o vilão. Se optar por não participar da matéria, o sujeito quase automaticamente se candidata a vilão. Dos quatro personagens, esse é o único que caminha nas sombras, anda à margem da luz e se esconde das citações. Se ele não participou, então tem algo a esconder e é o bandido dessa narrativa hollywoodiana.
Já se o caminho for outro, ou seja, pelo aceite da entrevista, a fonte incorre num risco ainda mais problemático, de acabar provendo aspas que, no final do dia, servem apenas para validar uma narrativa que já estava previamente na cabeça do jornalista. É como se nosso protagonista viesse, tacitamente, a compactuar com as palavras ali escritas, uma vez que passa a dividir o palco com outros personagens, num roteiro escrito por alguém que, antecipadamente, já havia eleito heróis e vilões. Isso acontece porque, muitas vezes, o jornalista já tem em sua cabeça toda a história que deseja contar, consultando personagens apenas para capturar citações que vão transmitir a falsa ideia de que ele fez o seu trabalho e consultou os dois lados. Joga para si mesmo e para a torcida, fingindo ter feito um trabalho isento.
Mentira! Sedutoramente, o repórter finge fazer um trabalho de pesquisa, enquanto, na verdade, apenas busca elementos confirmatórios para sua própria versão dos fatos. As aspas do entrevistado servem só como argumento de defesa, não como real exposição da sua versão — não há equilíbrio de forças, pois quem precisa se defender, claro, tem culpa no cartório.
Conforme Rory Sutherland, com o brilhantismo costumeiro, afirmou em sua última newsletter “The Spectator”: “(...) o uma vez nobre e desejado objetivo de imparcialidade conduziu a algo ridículo, em que toda a autoridade é tratada como um mentiroso”. Ele constrói o argumento para dizer que os jornalistas, tão críticos à reemergência do populismo, podem estar, na verdade, sendo eles mesmos a força propulsora desse fenômeno. Trago o argumento para qualquer outro tipo de autoridade, inclusive para as finanças — se você é bem-sucedido ou se promove algo de impacto, necessariamente é um impostor.
Leia Também
Atenção!
Duas ressalvas importantes. A primeira é que nem sempre o processo se dá de maneira dolosa. Com efeito, na maior parte das vezes, inclusive, não é por dolo, muito embora tenhamos, sim, jornalistas pseudoespecializados de finanças e economia no Brasil com sua lista muito bem demarcada de heróis e vilões, sendo que os primeiros costumam carregar correlação positiva com o número de banners patrocinados no respectivo site “jornalístico”. Jornalistas, assim como todos nós, estão também suscetíveis aos vieses cognitivos, aos próprios preconceitos, à própria visão de mundo. Portanto, por mais imparcial que tentamos ser, acabamos incorrendo em predileções tácitas. Ah, sim, acontece com os analistas de investimento também. Todos nós nos achamos imparciais, frios e calculistas, o que obviamente é uma bobagem. Sua personalidade, o fato de ser caçula ou primogênito, os ganhos ou as perdas recentes e, até mesmo, quem sabe, uma má digestão do café da manhã influenciam na tomada de decisão — tudo de forma não perceptível, claro.
A segunda é que, embora a qualidade média dos jornalistas econômicos e financeiros no Brasil seja baixa (os jornalistas financeiros por aqui costumam odiar finanças e investimentos, nunca vi isso), há também excelentes profissionais na área, entre os quais faço questão de mencionar: Mara Luquet, Denyse Godoy, Lucas Amorim, Joana Cunha, Fernando Travaglini e Carlos Sambrana. Não quero dizer, com isso, que essa relação esgote a lista, mas a lista contém essa relação — coisas diferentes.
Os problemas do jornalismo financeiro não se restringem ao Brasil. Na sexta-feira, o Wall Street Journal reportou que Ray Dalio, o maior gestor do mundo, à frente da Bridgewater, mantinha uma aposta equivalente a US$ 1 bilhão na queda do S&P 500, por meio de puts (opções de venda) que expiravam em março de 2020. Foi um paranauê. Por que estaria esse grande gênio das finanças montando uma posição tão grande à espera de um colapso de Wall Street?
Poucas horas depois, Dalio foi ao LinkedIn para esclarecer: “Eu quero deixar claro que nós não temos esse tipo de aposta líquida no sentido de esperar uma queda do mercado acionário norte-americano”. Ao que acrescentou: “Eu acredito que estejamos vivendo num mundo em que manchetes sensacionalistas são o que muitos escritores querem acima de tudo, ainda que os fatos possam não se enquadrar nas manchetes”.
Essa não é a primeira vez que Ray Dalio encontra certos percalços com a imprensa. Em 28 de julho de 2016, ele já havia feito um post no LinkedIn sob o título: “The New York Times story is a distortion of reality” (A matéria do New York Times é uma distorção da realidade). O jornal havia descrito um quadro de medo e constante vigilância entre os funcionários da Bridgewater, apoiando-se em narrativas de ex-funcionários demitidos da gestora e fontes anônimas. Antes dessa matéria ser publicada, Dalio já percebera que seria algo ruim a seu respeito. Viu-se na sinuca de bico entre não participar (mantendo-se às sombras, sem poder passar a sua versão) ou ser entrevistado (correndo o risco de ter suas aspas usadas contra si mesmo, para pintá-lo como participante validador daquela narrativa grotesca). Optou pelo segundo caminho, arrependendo-se depois.
O que podemos inferir dessa história toda?
Bom, primeiro, o óbvio: cuidado com o que você lê por aí. Mas isso nem é o mais importante. Somos todos adultos e sabemos nos cuidar, passamos há tempos da ingenuidade de acreditarmos nas coisas que nos contam. O investidor Raul Seixas já sabia: não preciso ler jornais, mentir sozinho eu sou capaz.
Depois, a questão me lembrou a metáfora já contada aqui, proposta originalmente por um grande gestor brasileiro. Gestão de recursos é como um filme pornô. Você não pode fazer uma posição bem. Você tem que fazer todas bem. Ao ver uma determinada posição de um gestor, não dá para simplesmente concluir sobre a cabeça do sujeito e/ou replicar para si mesmo. Sozinha, a posição de Ray Dalio em puts de S&P parece uma aposta direcional. Ao ser combinada com todo o portfólio, ela passa a ser apenas hedge para as demais posições. Não há aposta líquida na queda. São coisas muito diferentes. A primeira postura representaria uma visão pessimista. A segunda poderia até significar um viés otimista, ponderado por hedge via puts.
A terceira é que Ray Dalio parece pertencer ao time daqueles que gostam de montar hedge — fazemos parte dessa vertente também. Há uma discussão antiga entre gestores, dividindo-se entre aqueles que, quando não estão muito convictos, montam posições menores e defendem-se no caixa; e outros que optam por construir posições contra as próprias convicções. Em termos práticos, ter 30% comprado em Bolsa, protegido com razoável posição em opções de venda de Bolsa não é a mesma coisa do que ter 10% comprado em Bolsa. Do nosso lado, tenderíamos a preferir o primeiro posicionamento, porque há convexidade nas coisas, as respostas não são lineares e as caudas (os eventos raros) costumam ser mal-precificados. O caixa também custa, em especial agora que passamos a ter juros civilizados.
Por fim, mesmo sendo apenas uma posição de hedge, um valor nocional de US$ 1 bilhão em puts de S&P 500 ainda é uma bitela. Não me parece força do acaso a escolha do mês de março para o vencimento das opções. Faz algum sentido que seja o momento em que a corrida eleitoral norte-americana comece a ocupar o centro do debate e traga volatilidade às cotações.
Ainda estamos igualmente construtivos com ativos de risco para 2020, mas não sem esperar volatilidade, muito menos sem ferir nossa filosofia de termos um portfólio diversificado e balanceado, sempre à caça de boas proteções. Continuamos com grande dificuldade de fazer previsões, em especial sobre o futuro.
A Bolsa brasileira é um pouco como a feira de Acari: deu no New York Times, é um sucesso, tem de tudo, é um mistério.
Tem offshore? Veja como declarar recursos e investimentos no exterior como pessoa jurídica no IR 2025
Regras de tributação de empresas constituídas para investir no exterior mudaram no fim de 2023 e novidades entram totalmente em vigor no IR 2025
A coruja do Duolingo na B3: aplicativo de idiomas terá BDRs na bolsa brasileira
O programa permitirá que investidores brasileiros possam investir em ações do grupo sem precisar de conta no exterior
Como declarar recursos e investimentos no exterior como pessoa física no imposto de renda 2025
Tem imóvel na Flórida? Investe por meio de uma corretora gringa? Bens e rendimentos no exterior também precisam ser informados na declaração de imposto de renda; veja como
Dólar fraco, desaceleração global e até recessão: cautela leva gestores de fundos brasileiros a rever estratégias — e Brasil entra nas carteiras
Para Absolute, Genoa e Kapitalo, expectativa é de que a tensão comercial entre China e EUA implique em menos comércio internacional, reforçando a ideia de um novo equilíbrio global ainda incerto
É hora de aproveitar a sangria dos mercados para investir na China? Guerra tarifária contra os EUA é um risco, mas torneira de estímulos de Xi pode ir longe
Parceria entre a B3 e bolsas da China pode estreitar o laço entre os investidores do dois países e permitir uma exposição direta às empresas chinesas que nem os EUA conseguem oferecer; veja quais são as opções para os investidores brasileiros investirem hoje no Gigante Asiático
Tarifaço de Trump pode não resultar em mais inflação, diz CIO da Empiricus Gestão; queda de preços e desaceleração global são mais prováveis
No episódio do podcast Touros e Ursos desta semana, João Piccioni, CIO da Empiricus Gestão, fala sobre política do caos de Trump e de como os mercados globais devem reagir à sua guerra tarifária
Dividendos da Petrobras (PETR4) podem cair junto com o preço do petróleo; é hora de trocar as ações pelos títulos de dívida da estatal?
Dívida da empresa emitida no exterior oferece juros na faixa dos 6%, em dólar, com opções que podem ser adquiridas em contas internacionais locais
Não foi só o Banco Master: entre os CDBs mais rentáveis de março, prefixado do Santander paga 15,72%, e banco chinês oferece 9,4% + IPCA
Levantamento da Quantum Finance traz as emissões com taxas acima da média do mercado; no mês passado, estoque de CDBs no país chegou a R$ 2,57 trilhões, alta de 14,3% na base anual
Renda fixa para abril chega a pagar acima de 9% + IPCA, sem IR; recomendações já incluem prefixados, de olho em juros mais comportados
O Seu Dinheiro compilou as carteiras do BB, Itaú BBA, BTG e XP, que recomendaram os melhores papéis para investir no mês
110% do CDI e liquidez imediata — Nubank lança nova Caixinha Turbo para todos os clientes, mas com algumas condições; veja quais
Nubank lança novo investimento acessível a todos os usuários e notificará clientes gradualmente sobre a novidade
Felipe Miranda: Dedo no gatilho
Não dá pra saber exatamente quando vai se dar o movimento. O que temos de informação neste momento é que há uma enorme demanda reprimida por Brasil. E essa talvez seja uma informação suficiente.
Felipe Miranda: Vale a pena investir em ações no Brasil?
Dado que a renda variável carrega, ao menos a princípio, mais risco do que a renda fixa, para se justificar o investimento em ações, elas precisariam pagar mais nessa comparação
XP rebate acusações de esquema de pirâmide, venda massiva de COEs e rentabilidade dos fundos
Após a repercussão no mercado, a própria XP decidiu tirar a limpo a história e esclarecer todas as dúvidas e temores dos investidores; veja o que disse a corretora
PGBL ou VGBL? Veja quanto dinheiro você ‘deixa na mesa’ ao escolher o tipo de plano de previdência errado
Investir em PGBL não é para todo mundo, mas para quem tem essa oportunidade, o aporte errado em VGBL pode custar caro; confira a simulação
De Minas para Buenos Aires: argentinos são a primeira frente da expansão do Inter (INBR32) na América Latina
O banco digital brasileiro anunciou um novo plano de expansão e, graças a uma parceria com uma instituição financeira argentina, a entrada no mercado do país deve acontecer em breve
XP Malls (XPML11) é desbancado por outro FII do setor de shopping como o favorito entre analistas para investir em março
O FII mais indicado para este mês está sendo negociado com desconto em relação ao preço justo estimado para as cotas e tem potencial de valorização de 15%
Mata-mata ou pontos corridos? Ibovespa busca nova alta em dia de PIB, medidas de Lula, payroll e Powell
Em meio às idas e vindas da guerra comercial de Donald Trump, PIB fechado de 2024 é o destaque entre os indicadores de hoje
Guerra comercial de Trump pode pôr fim à exuberância da bolsa dos EUA, diz gestora de Ray Dalio
Bridgewater envia uma mensagem clara: não se pode mais confiar nos EUA como um parceiro consistente — e lista quatro fatores que comprovam essa tese e podem mexer com os investimentos
Debêntures da Equatorial se destacam entre as recomendações de renda fixa para investir em março; veja a lista completa
BB e XP recomendaram ainda debêntures isentas de IR, CRAs, títulos públicos e CDBs para investir no mês
Vencimento de Tesouro Selic paga R$ 180 bilhões nesta semana; quanto rende essa bolada se for reinvestida?
Simulamos o retorno do reinvestimento em novos títulos Tesouro Selic e em outros papéis de renda fixa