Cuidado, o payroll vem aí! Por que os investidores estão torcendo por mais desemprego nos EUA — e você também deveria
O principal relatório do mercado de trabalho norte-americano será divulgado em um momento de disparada dos juros dos Treasurys e quando o Fed sinaliza que a taxa básica ficará elevada por mais tempo; saiba como tudo isso mexe com o seu dia a dia
A italiana Monica Poli ficou famosa mundialmente por fazer vídeos nas ruas de Veneza avisando turistas sobre roubos com a célebre frase: “attenzione, pickpocket”. Se a vereadora estivesse circulando pelo mercado financeiro agora, ela também faria o mesmo alerta aos investidores — só que, neste caso, o batedor de carteira é outro: o dado de emprego dos EUA.
O chamado payroll referente ao mês de setembro será divulgado na manhã desta sexta-feira (6) e o mercado global está em estado de alerta — ainda mais depois que a disparada dos juros projetados pelos Treasurys de dez anos deixou todo mundo um pouco mais pobre.
Na terça-feira (3), os investidores globais ficaram de cabelo em pé com o aumento súbito dos yields (rendimentos) dos títulos de dívida do governo norte-americano com vencimento em dez anos, que atingiram o maior nível em 16 anos.
Na ocasião, os juros projetados por esses papéis atingiram 4,804% — o patamar mais elevado desde agosto de 2007, quando a crise do subprime, como ficou conhecido o colapso do setor imobiliário dos EUA, já dava as caras. Explicamos tudo sobre essa disparada em uma matéria especial.
E é aí que mora o perigo: os Treasurys de dez anos são considerados uma referência para o mercado global. Os yields desses papéis definem basicamente todas as taxas cobradas no mundo — de financiamento de imóveis a empréstimos bancários e até mesmo o quanto o investidor brasileiro vai receber ao comprar um título de dívida por aqui.
Isso quer dizer que se os juros dos Treasurys disparam, a casa, o carro e outros bens que qualquer pessoa possua — e isso inclui você, leitor do Seu Dinheiro — vai valer menos.
“A disparada dos yields está aumentando os custos dos empréstimos em toda a economia, com o ritmo de alta reavivando rumores de que um potencial estresse financeiro surgirá em algum momento”, disse James Knightley, economista-chefe internacional do ING.
No episódio especial do podcast Touros e Ursos de comemoração de cinco anos do Seu Dinheiro, Felipe Miranda, CEO da Empiricus, explica a dinâmica do mercado de dívida norte-americano neste momento.
Mas o que o payroll tem a ver com isso?
Tudo. Se o payroll mostrar que o mercado de trabalho continua aquecido, o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) poderá realizar aumentos adicionais da taxa básica para aliviar a pressão ascendente sobre a inflação.
E essa não é apenas uma hipótese. Recentemente, dirigentes do Fed sugeriram que os juros devem permanecer mais altos por mais tempo do que o esperado e que a chance de um novo aperto monetário ainda este ano se mantém sobre a mesa.
O Fed vem elevando os juros de curto prazo há um ano e meio. Esses aumentos visam combater a inflação ao desacelerar a economia — e acabam impulsionando os yields dos títulos de dívida de longo prazo.
Em outras palavras, os investidores estão torcendo por mais desemprego na maior economia do planeta. E não é por “maldade”. A torcida do mercado é pelo chamado “soft landing”, ou seja, uma desaceleração lenta da atividade que permita ao Fed moderar a dose dos juros.
O que esperar dos EUA hoje
Não é à toa que os investidores em todo o mundo esperam que o relatório de empregos nos EUA de sexta-feira traga mais clareza sobre os próximos passos da política monetária norte-americana.
Na quinta-feira (5), a divulgação dos pedidos de seguro-desemprego no país deram uma apimentada nas expectativas. Os pedidos iniciais de subsídio ao desemprego totalizaram 207 mil na semana encerrada em 30 de setembro, apenas 2 mil acima do período anterior e abaixo da estimativa da Dow Jones de 210 mil.
No dia anterior, o relatório de emprego da ADP mostrou um quadro diferente dos dados de pedidos de auxílio-desemprego divulgados hoje. A empresa disse que o crescimento do emprego no setor privado norte-americano desacelerou significativamente em setembro, com apenas 89 mil vagas criadas, abaixo das 180 mil em agosto e muito aquém das estimativas.
Para esta sexta-feira, economistas consultados pela Dow Jones projetam que a economia dos EUA gerou 170 mil empregos em setembro — uma ligeira queda em relação à abertura de 187 mil postos de trabalho em agosto no país.
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