Quando Ronaldo Fenômeno surpreendeu o mundo do futebol ao anunciar a compra do Cruzeiro, clube que o revelou para o esporte, os valores do negócio saltaram aos olhos.
Houve quem achasse pouco o pagamento de R$ 400 milhões pela aquisição de 90% das ações de um clube da estatura do Cruzeiro.
Na prática, afinal, o montante proposto por Ronaldo e aceito pela direção do Cruzeiro presume a precificação em pouco mais de R$ 444 milhões de um clube duas vezes campeão da Copa Libertadores, quatro vezes campeão brasileiro e com seis títulos de Copa do Brasil - isto sem contar outros títulos relevantes em sua galeria.
Mesa Diretora do Cruzeiro x Ronaldo Fenômeno
Esclarecimentos iniciais deram a entender que a Sociedade Anônima de Futebol (SAF) estabelecida para viabilizar o negócio assumiria a bilionária vida do Cruzeiro, o que, em princípio, proporcionaria valores consideravelmente maiores à transação.
Mas e se os tais R$ 400 milhões não fossem realmente R$ 400 milhões? E se a SAF não assumisse as dívidas do clube?
Foi o que alegou a Mesa Diretora do Conselho Deliberativo do Cruzeiro. Ela emitiu nota questionando o contrato da venda do futebol do clube para seu ex-atleta.
De acordo com a Mesa, Ronaldo Fenômeno não assumiria nenhuma dívida e aportaria no clube R$ 50 milhões, apenas 12,5% do originalmente prometido.
Na carta, a Mesa Diretora afirma que o contrato assinado entre Ronaldo e o presidente do Cruzeiro, Sérgio Santos Rodrigues, prevê que os R$ 350 milhões restantes adviriam de receitas geradas pela gestão da SAF.
Ela ainda qualifica o contrato como lesivo ao clube e critica a proposta de que a propriedade dos centros de treinamento do clube seja transferida para a SAF.
XP contesta alegações da Mesa Diretora
A primeira reação às alegações não partiu de Ronaldo Fenômeno, mas da XP Investimentos. Isto porque a corretora foi a responsável pela intermediação do negócio.
A XP assegura que o valor total a ser aportado por Ronaldo será R$ 400 milhões e afirma que a Mesa Diretora partiu de “interpretações errôneas” do contrato para chegar a suas conclusões.
Entretanto, a XP não pode se aprofundar publicamente sobre mais esclarecimentos por causa das cláusulas de confidencialidade presentes no contrato.
SAF, essa maldita
A SAF, sigla pela qual vem sendo identificada Sociedade Anônima de Futebol, ainda é uma novidade jurídica no Brasil. E, como toda novidade, gera mais dúvidas do que certeza.
No início do ano, o Seu Dinheiro publicou duas reportagens com o intuito de aprofundar o entendimento do público sobre as SAFs.
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Até aquele momento, somente o Cruzeiro dispunha de um acordo para transformar-se em SAF. Na sequência, os cariocas Botafogo e Vasco da Gama encontraram investidores e seguiram pelo mesmo caminho.
Em todos os casos, algumas fases precisam ser observadas antes da assinatura do contrato definitivo:
- cisão entre o departamento de futebol e o restante do clube;
- liberação de empréstimo-ponte pelo investidor; e
- realização de diligência nas contas do clube.
Somente depois dessas fases é que o negócio poderá ser considerado concluído.
No pouco que a XP externou sobre as alegações da Mesa Diretora do Cruzeiro, a corretora revelou que a equipe de Ronaldo Fenômeno chegou à conclusão, depois de três meses de análise das contas do Cruzeiro, de que será necessário alterar alguns termos do acordo.
A resposta de Ronaldo Fenômeno
Diante da situação, Ronaldo Fenômeno também resolveu se manifestar. Numa carta conjunta com a empresa Tara Sports, o ex-jogador inicia dizendo que a Mesa Diretora “expõe parcialmente dados confidenciais e distorce a realidade dos termos firmados na proposta apresentada ao Cruzeiro”.
Ronaldo afirma que o valor inicial do investimento é de R$ 50 milhões. Os R$ 350 milhões restantes virão de investimento direto ou por meio do incremento de receitas.
“Vale ressaltar que a opção de incremento de receita favorece diretamente a associação, uma vez que a lei das SAF obriga o repasse de 20% das receitas para quitação da dívida bilionária acumulada por anos de má gestão - fato esse que pode gerar mais R$70 milhões em receitas para a quitação da dívida e que parece ser ignorado pelos responsáveis pela Nota”, prossegue Ronaldo.
Ele acrescenta ainda que a possibilidade de transferência das Tocas I e II do clube para a SAF tem como objetivo a “proteção de patrimônio do Cruzeiro diante de uma realidade que se revelou significativamente mais grave", numa referência às combalidas finanças do clube.
Ainda segundo Ronaldo e a Tara Sports, “a SAF se coloca como facilitadora não apenas para encontrar os meios de pagamento dessa dívida, como também para recolocar o futebol do Cruzeiro no seu lugar de protagonista do futebol brasileiro”.