Lula pede licença para gastar fora do teto e recebe sinal verde para R$ 145 bilhões na CCJ, mas com prazo apertado para apresentar nova regra fiscal
Texto do senador Alexandre Silveira também destrava R$ 23 bilhões para Bolsonaro pagar despesas e liberar emendas, mas deixa rombo de R$ 198 bilhões
O relatório da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, apresentado nesta terça-feira (6) pelo senador Alexandre Silveira (PSD-MG), foi aprovado em votação simbólica na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado.
O texto de Silveira amplia o teto de gastos — a regra que limita o crescimento das despesas do governo à variação da inflação — em R$ 175 bilhões por um período de dois anos. Mas passou por ajustes na CCJ: o valor total foi reduzido em R$ 30 bilhões e está condicionado à apresentação de uma nova regra fiscal até agosto do próximo ano.
A medida original deixa um impacto fiscal de R$ 198 bilhões, e retira do teto até 6,5% de receitas extraordinárias do governo, em um valor de até R$ 23 bilhões — o que deve garantir o pagamento do orçamento secreto, uma demanda levada ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva pelo comandante da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).
Na tentativa de um acordo para aprovar a PEC, Silveira fez um "mix" da proposta do novo governo, ao considerar o valor sugerido para o Bolsa Família, com a proposta apresentada pelo senador Tasso Jereissati (PSDB-CE). A proposta de Jereissati tinha um valor considerado baixo, mas previa apenas a ampliação dentro da regra fiscal, o que agrada o mercado.
Ao elevar o teto em R$ 175 bilhões, o suficiente para financiar todo o Bolsa Família, o texto da PEC libera R$ 105 bilhões no Orçamento de 2023 que já estavam previstos para pagar o programa social.
Com a abertura desse espaço na Lei Orçamentária Anual (LOA), o governo eleito pretende direcionar verbas para programas como o Minha Casa Minha Vida e o Farmácia Popular, além de garantir o aumento real do salário mínimo.
Os principais pontos da PEC da Transição
- Amplia o teto de gastos em R$ 175 bilhões por dois anos, em 2023 e 2024, para garantir o pagamento do Bolsa Família. O valor é suficiente para bancar a parcela de R$ 600 e o adicional de R$ 150 por criança de até seis anos.
- Deixa fora do teto de gastos até 6,5% em receitas extraordinárias do governo num valor de até R$ 23 bilhões por ano. A medida vale a partir de agora, o que pode garantir a liberação do orçamento secreto, fechamento das contas do governo atual e o aumento dos investimentos.
- Determina que o novo governo envie ao Congresso até o fim de 2023 um projeto de lei complementar com a proposta de substituição do teto de gastos por um novo arcabouço fiscal, sem estabelecer qual seria a nova regra.
- Mantém o limite de pagamento de precatórios, dívidas do governo reconhecidas judicialmente, até o fim de 2026, mesmo com o possível fim do teto de gastos.
- Estende a Desvinculação de Recursos da União (DRU) até o fim de 2024 com o objetivo de permitir a compatibilização de fontes de recursos com a expansão do teto.
- Deixa fora do teto de gastos despesas com projetos socioambientais custeadas por doações e despesas com projetos custeados com recursos decorrentes de acordos judiciais ou extrajudiciais firmados em função de desastres ambientais.
- Tira do teto despesas custeadas com recursos oriundos de operações financeiras com organismos multilaterais dos quais o Brasil faça parte, destinados a financiar ou garantir projetos de investimento em infraestrutura, constantes de plano integrado de transportes e considerados prioritários por órgão colegiado do setor.
- Deixa fora da âncora fiscal as despesas das instituições federais de ensino custeadas por receitas próprias, de doações ou de convênios celebrados com demais entes da Federação ou entidades privadas.
- Tira do teto despesas custeadas por recursos oriundos de transferências dos demais entes da Federação para a União destinados à execução direta de obras e serviços de engenharia.
- Inclui a possibilidade de as comissões permanentes do Congresso poderem fazer sugestões de alocação dos recursos do Orçamento que ficarão livres com a ampliação do teto para pagar o Bolsa Família (R$ 105 bilhões). A ideia inicial era que fossem atendidas somente as solicitações da equipe de transição.
Proposta chega à CCJ do Senado
A PEC entrou, na manhã desta terça, em análise na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A medida levou mais de um mês em negociações da equipe de transição do novo governo com o Congresso.
A proposta só deslanchou depois que Lula entrou pessoalmente nas articulações para destravar os acordos políticos cobrados por parlamentares.
Participaram da negociação da PEC no Congresso: os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG), respectivamente, o relator-geral do Orçamento de 2023, Marcelo Castro (MDB-PI), autor da PEC, o presidente da CCJ do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), e parlamentares do PT, além de Silveira.
A ideia de aprovar uma PEC para cumprir as promessas de campanha surgiu no dia 3 de novembro, logo após o segundo turno das eleições, pelo vice-presidente eleito Geraldo Alckmin, no Senado, após uma reunião com Castro.
A falta de discussão com os deputados e senadores, contudo, gerou insatisfação no Congresso, e o PT acabou sendo acusado de errar na articulação política. Nas negociações, entraram o apoio à reeleição de Lira e Pacheco às Presidências da Câmara e do Senado, além de cargos no futuro governo.
Inicialmente, o PT queria tirar o Bolsa Família do teto por tempo indeterminado. Com a resistência do Congresso, o partido de Lula reduziu o prazo para quatro anos. No entanto, acabou prevalecendo a validade de dois anos no relatório de Alexandre Silveira.
*Com informações do Estadão Conteúdo
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