Menos de seis meses depois de alcançar a marca histórica de 1 milhão de investidores, a bolsa brasileira deve cruzar ainda nesta semana uma nova barreira e chegar a 1,5 milhão de pessoas físicas que investem diretamente em ações.
Quem mencionou o número foi o presidente da B3, Gilson Finkelsztain, com quem eu conversei, ao lado de outros jornalistas, durante o evento que marcou o IPO (sigla em inglês para oferta pública inicial de ações) da C&A. O dado oficial do mercado deve sair por volta do dia 10 de novembro.
Embora ainda esteja longe da meta de 5 milhões de pessoas físicas estipulada ainda na década passada pelo ex-presidente da bolsa Edemir Pinto, o crescimento recente no número de investidores é bastante animador. Em setembro, a bolsa atingiu 1,441 milhão de investidores, um avanço de 89% em 12 meses.
O rápido aumento do número de pessoas físicas na bolsa é reflexo direto da queda da taxa básica de juros (Selic), atualmente em 5,5% ao ano, e da rentabilidade das aplicações tradicionais de renda fixa.
"A pessoa física está desconfortável com o investimento em CDI", disse Finkelsztain aos jornalistas.
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Para o presidente da B3, a necessidade de buscar alternativas mais rentáveis para o dinheiro no novo cenário de juros baixos será uma constante pelo menos nos próximos dois anos. A entrada na bolsa de nomes conhecidos do grande público, como a C&A, também ajuda a popularizar o investimento em ações.
Finkelsztain não mencionou, mas outro fator que certamente ajudou a despertar o interesse do pequeno investidor pelo mercado foi o bom desempenho da bolsa. Nos últimos 12 meses, o Ibovespa registra alta de 26% e ontem o principal índice da bolsa voltou a fechar em nível recorde.
Cadê as mulheres?
Apesar do crescimento em número, o perfil do investidor pessoa física na bolsa ainda tem muito a avançar. Em setembro deste ano, 78% dos investidores eram homens e apenas 22% mulheres. Esses percentuais pouco mudaram desde 2002, quando começa a série histórica da B3.
Em volume de recursos aplicados em ações, a proporção era praticamente a mesma (76% homens e 24% de mulheres) no fim de 2018 – último dado disponível.
Seja como for, a migração para a bolsa vem ocorrendo tanto entre os investidores que decidiram comprar ações diretamente como aqueles que aplicam via fundos.
De janeiro a setembro, a captação dos fundos de ações alcançou R$ 47,7 bilhões, de acordo com dados da Anbima, associação que representa as instituições que atuam no mercado de capitais. Os fundos multimercados, que também têm uma parcela da carteira em renda variável, captaram R$ 56 bilhões apenas neste ano.
Cadê o gringo?
Quem ainda estava reticente com o mercado brasileiro era o investidor estrangeiro. Mas essa realidade também começa a mudar, segundo o presidente da B3.
"O estrangeiro está começando a entender o que está acontecendo no Brasil, com a retomada da economia puxada pelo setor privado", afirmou.
Finkelsztain atribuiu parte do comportamento do investidor de fora do país às incertezas externas, como a guerra comercial entre Estados Unidos e China. "Tirando a incerteza, o número de ofertas na bolsa vai acelerar", disse.
Vai faltar papel?
A perspectiva da volta do investimento dos gringos, somada ao avanço das pessoas físicas e fundos brasileiros, pode levar a uma inusitada situação de falta de papéis para investir na bolsa, segundo o presidente da B3. Hoje a bolsa negocia ações de pouco menos de 400 empresas, reconhecidamente pouco diante do tamanho da economia brasileira.
Para Finkelsztain, a tendência a partir do ano que vem é que empresas de menor porte testem as águas do mercado de capitais. "O tíquete médio das ofertas de ações ainda é muito alto, mas as operações de companhias de médio porte vão começar a achar demanda", afirmou.
A B3 também vem discutindo com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) formas de manter o máximo possível de ofertas de ações no mercado brasileiro.
Essa mudança é necessária para a bolsa, que deverá perder para o mercado norte-americano o IPO da XP Investimentos, considerado o mais esperado do ano.
A expectativa é que a xerife do mercado de capitais flexibilize a regra ainda neste ano para permitir que empresas como a XP abram o capital lá fora, mas possam listar recibos de ações (BDRs) na bolsa brasileira.