Os dois principais palcos da economia mundial estão com peças bem distintas em cartaz, mas ambas têm roteiros carregados de dramas que convergem um ao outro.
Na maior economia do mundo, o mercado de juros volta a ficar pressionado após alguns meses de quase estabilidade. As últimas indicações do Federal Reserve sobre o rumo da política monetária dos Estados Unidos mostram que uma redução dos estímulos deve acontecer ainda este ano, com uma possível elevação dos juros já em 2022.
Já a China passa por uma forte turbulência que obriga os economistas e analistas a refazerem suas contas e estimativas ao redor do globo. Além dos problemas financeiros da Evergrande, que ameaçam contaminar o restante da economia e já se arrastam por mais de uma semana, a segunda maior economia do mundo passa por problemas de distribuição de energia, o que impacta toda a cadeia produtiva.
Os roteiros se cruzam no impacto gerado no mercado financeiro global - muita cautela. Os temores em Nova York voltam a pressionar os retornos de um dos investimentos mais seguros do mundo, os títulos do Tesouro americano, o que tira dinheiro de ativos mais arriscados, principalmente empresas de tecnologia e países emergentes.
No caso da China, uma redução drástica da demanda e do crescimento gera uma reação em cadeia no mundo. Um exemplo disso é o preço do minério de ferro, que voltou a cair mais de 6% num dia, arrastando junto a Vale e as siderúrgicas brasileiras.
Também temos fatores domésticos estressores, mas para Nicolas Borsoi, economista da Nova Futura Investimentos, eles foram secundários. Em Wall Street, o dia foi de perdas expressivas. O Nasdaq caiu 2,83%, o S&P 500 recuou 2,04%, e o Dow Jones encerrou em queda de 1,63%.
Por aqui, pesaram as preocupações com a saúde fiscal do país. Circulam informações de que o governo pode optar por estender o auxílio emergencial, o que pressionou o câmbio e o mercado de juros. O Ibovespa fechou a sessão em queda de 3,05%, aos 110.123 pontos. Já o dólar à vista subiu 0,85%, a R$ 5,4243.
Para o economista, parte da queda de hoje se explica também pelos múltiplos elevados em que as bolsas internacionais vinham sendo negociadas, já que o mercado precificou quase que uma “perfeição” da retomada econômica.
Roteiro repetido
O clima de cautela internacional se soma aos nossos demônios próprios. Em meio a nova disparada do petróleo, a inflação deve seguir acelerando, mas a ata da última reunião do Copom, divulgada hoje, deixou espaço aberto para a interpretação do mercado.
Há quem diga que existe espaço para uma atuação mais dura do BC, outros afirmam que o plano de voo já está bem desenhado. Para Borsoi, essa leitura dúbia desancora a curva de juros doméstica.
Os rumores de que o governo estuda uma nova extensão do auxílio emergencial pressiona ainda mais o ambiente. Em entrevista, o ministro da Cidadania, João Roma, afirmou que a proposta está na mesa. Para o economista da Nova Futura, estamos correndo o risco de não só estourar o teto, mas também fazer um impulso fiscal para o próximo ano. Confira o fechamento dos principais contratos de DI:
- Janeiro de 2022: de 7,16% para 7,18%
- Janeiro de 2023: de 9,06% para 9,16%
- Janeiro de 2025: de 10,17% para 10,28%
- Janeiro de 2027: de 10,58% para 10,65%
Guerra declarada?
Se no começo do pregão a alta do petróleo compensou em partes a queda do índice doméstico, uma nova rodada de desconfiança em torno da Petrobras e a virada do petróleo no exterior influenciaram para o resultado negativo de hoje.
Essa é uma história de algumas reviravoltas. Com o Brent voltando ao patamar dos US$ 80 por barril, no que parecia ser o sexto dia de alta consecutiva, a Petrobras reajustou os valores do diesel para o consumidor final - notícia que, no geral, é bem recebida pelo mercado, já que mostra o compromisso da companhia com os seus acionistas.
O presidente da Câmara, Arthur Lira, que já havia mostrado desconforto com a atual política há duas semanas, voltou a declarar o seu descontentamento nesta manhã, convocando uma reunião de líderes do Congresso para tratar do assunto.
Vale lembrar que a gasolina e o gás de cozinha não sofreram reajustes desta vez, e o presidente da estatal, Silva e Luna, deixou claro que a política de preços da companhia não irá mudar, na coletiva marcada de última hora nesta segunda-feira (27). Para Lira, "o Brasil não pode tolerar a gasolina a quase R$ 7 e o gás R$120".
Confira o preço de fechamento das ações da estatal:
PETR3 | Petrobras ON | R$ 27,69 | -1,07% |
PETR4 | Petrobras PN | R$ 26,90 | -0,88% |
Sobe e desce do Ibovespa
Em dia de queda generalizada do Ibovespa, poucas empresas fecharam o dia no azul. O destaque vai mais uma vez para as empresas do setor de proteínas, favorecidas pelo câmbio pressionado e ainda repercutindo a expectativa de retomada de exportações para a China.
Fora do top 5, mas ainda assim digno de nota, está o desempenho das operadoras de saúde Hapvida e Intermédica. Além de repercutirem novas investigações da CPI da covid, as duas companhias receberam um sinal amarelo do Cade para a sua fusão. Confira as maiores altas do Ibovespa:
CÓDIGO | NOME | VALOR | VAR |
BEEF3 | Minerva ON | R$ 10,45 | 1,46% |
BRFS3 | BRF ON | R$ 26,53 | 0,95% |
MRFG3 | Marfrig ON | R$ 24,32 | 0,16% |
TAEE11 | Taesa units | R$ 36,71 | 0,08% |
Com o cenário de alta de juros prejudicando as empresas de tecnologia e o noticiário negativo em torno do Inter, as units e ações preferenciais do banco fecharam o dia em forte queda. Na sequência, CSN e Usiminas seguiram repercutindo a revisão de expectativas para o crescimento chinês e a nova queda de 6% do minério de ferro. Confira as maiores quedas:
CÓDIGO | NOME | VALOR | VAR |
BIDI11 | Banco Inter unit | R$ 51,52 | -12,25% |
BIDI4 | Banco Inter PN | R$ 17,25 | -11,90% |
CASH3 | Méliuz ON | R$ 6,01 | -8,80% |
CSNA3 | CSN ON | R$ 27,63 | -7,81% |
USIM5 | Usiminas PNA | R$ 14,74 | -7,59% |
*Colaboraram Rafael Passos, sócio da Ajax Capital; Rodrigo Barreto, analista da Necton Investimentos; e Nicolas Borsoi, economista da Nova Futura Investimentos.