Sergio Rial dá uma aula sobre o mercado
Presidente do Santander Brasil está otimista sobre a saída da crise do coronavírus e com o mercado brasileiro, que vê como muito barato, desde que o investidor tenha cautela e conheça os riscos
Nesta semana que acabou, o presidente do Santander no Brasil, Sergio Rial, deu uma entrevista muito interessante a Felipe Miranda, estrategista-chefe da Empiricus.
Ele está otimista sobre a saída da crise do coronavírus e com o mercado brasileiro, que vê como muito barato, desde que o investidor tenha cautela e conheça os riscos.
Veja abaixo os principais pontos:
1) Está melhor do que o imaginado.
O coronavírus não se transformou em uma crise financeira. Eu tenho uma premissa: nunca ter a arrogância de ter certeza. Tento preparar o banco para qualquer cenário. Mas há alguns sinais de que, no hemisfério norte, a saída está sendo mais acelerada do que imaginávamos. Acho que vamos ter uma retomada mais forte no curto prazo.
2) É preciso olhar as fintechs além das mais famosas.
Fintechs criam uma nova cultura sobre como fazer negócios financeiros. Os chamados bancos tradicionais aprendem muito. Acho que existem oportunidades não necessariamente nos bancos digitais -- creio que eles vão perceber que pagar para adquirir cliente não é sustentável. Mas há outras outras plataformas inovadoras e muito interessantes. Um exemplo: uma empresa que liga produtor com comprador no agronegócio, desintermediando as tradings tradicionais.
3) O home office tem que ser bom para empregado e empregador.
O home office veio para ficar. Vai ser necessário definir KPIs que funcionem remotamente -- estar ocupado é diferente de ser produtivo; a pessoa pode começar às 7h e ir até as 20h, estar esgotado, mas não realizar nada relevante para o cliente.
No Santander, dentro de alguns setores, vamos implementar o home office voluntário. Uma condição é que a pessoa precisa estar ao menos uma vez por semana no escritório, senão perdemos a cultura, queremos que a pessoa permaneça conectada fisicamente.
Além disso, é preciso dialogar sobre um ponto: se o home office ajuda a pessoa a poupar tempo, deixar de gastar combustível, ficar com a vida mais fácil -- inclusive economicamente --, por que não dividir alguma coisa dessa melhora com a empresa? Desde que seja voluntário, por que não com algum ajuste de benefício ou salário? Vamos construir esse diálogo.
4) Um dia, tanto déficit vai ter um preço.
Sobre o coronavírus, há um aspecto importante: acho que tem um custo das políticas fiscais que ainda não foi completamente absorvido. Eu não acredito em déficit fiscal permanente sustentando equilíbrio social. O que sustenta equilíbrio social é crescimento. Eu sempre digo aqui no banco: qualquer empresa que não tem crescimento não pode ter política de RH, porque crescimento é o que gera oportunidade, senão é só dança das cadeiras. Um país sem agenda de crescimento não consegue permitir aos cidadãos progredir, crescer.
No caso do Brasil, a trajetória fiscal preocupa. Temos um vizinho, a Argentina, que é um país extraordinário, mas que vive permanentemente em busca de um equilíbrio social por meio de um déficit fiscal permanente que é financiado pela inflação. E a inflação é o grande motor de crescimento de pobreza.
Não podemos nos iludir. Temos um déficit fiscal importante.
5) Isso implica manter a agenda de reformas no Brasil.
A grande discussão não pode ser aumento de carga tributária. Já temos 35% do PIB [em tributos]. Temos de repensar isenções fiscais. Há um universo enorme de produtos financeiros com isenção fiscal, por exemplo. Não sei se deveríamos ter tantos.
Há também a necessidade de uma reforma administrativa. O Estado precisa custar menos. O coronavírus mostrou a importância do SUS, de um sistema integrado de saúde. Mas o Estado pode ser eficiente e menor. Além disso, não dá para ter o nível de disputa judicial tributária que temos. Isso é inexplicável. Não tem sentido.
Espero que o Congresso tenha a consciência. Estamos endividados. Ser pobre e endividado não é uma boa receita.
6) O Brasil está barato.
Está tudo muito barato no Brasil, não só pela posição do câmbio, mas pela fome de crescimento que o país tem.
Pode ter repique? Pode ter empresas saindo machucadas? Pode. Mas o Brasil tem um mercado de capitais a desenvolver. Precisamos ir de um milhão para de 10 a 20 milhões de investidores em Bolsa. Não vamos criar um capitalismo em cima de bancos: o Brasil é uma sociedade eminentemente de crédito, ainda. Uma hora ficará claro que boas ações de empresas sérias trazem melhor retorno do que deixar o dinheiro na poupança, que é um movimento que já estamos vendo: apesar da crise, o apetite por produtos de mercado de capitais não arrefeceu.
Agora: o investidor tem que ir com cuidado, entender o risco. Precisa entender que as coisas quebram. Se não olhar com atenção, está correndo risco de verdade.
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