Howard Marks sobre o coronavírus: cadáveres na Paulista, sério?
Quando as coisas estão feias, vale ouvir um dos melhores investidores do mundo – aquele sobre quem Warren Buffett disse que “lê tudo que ele escreve”
Semana ruim, não? Quando as coisas estão feias, vale ouvir Howard Marks, um dos melhores investidores do mundo – aquele sobre quem Warren Buffett disse que “lê tudo que ele escreve”.
Segundo Marks, “as pessoas estão achando que vão ter de saltar sobre cadáveres na Park Avenue [algo como nossa avenida Paulista], como na peste negra; isso é pânico”.
Pânicos, porém, não são igualmente terríveis para todos.
Certamente não foi tão ruim para quem tinha dólares ou ouro (ou, melhor ainda, ouro cotado em dólares, como várias corretoras brasileiras vendem) --o fundo da Vitreo de ouro, por exemplo, já se valorizou 20% ante a cotação do começo do ano.
A questão é esta: como alguém poderia saber de antemão que surgiria um coronavírus ia se espalhar pelo mundo do jeito que se espalhou e, antes de todo mundo, sair por aí comprando proteções?
Ninguém poderia saber. Mas muita gente o fez. Porque estava preocupada com outras coisas. Com a guerra comercial dos Estados Unidos com a China. Com a eleição de um socialista nos Estados Unidos. Um pouco mais atrás, com a possibilidade de a nossa reforma da previdência não passar no Congresso.
Sempre vai haver algo potencialmente ruim no horizonte. Como disse Niki Lauda, o piloto de Fórmula 1, até a felicidade nos traz um medo aterrorizante, que é perdê-la. Ter um filho é ser abençoado com um amor nunca antes sentido – e passar o resto da vida preocupado com a febre do bebê, com o adolescente que sai de casa à noite, às vezes até com o adulto que não se arranja.
Quando os investidores ficaram assustados com o coronavírus e correram para esses ativos considerados seguros, valorizando-os, quem tinha proteções na carteira ganhou dinheiro, mesmo que eles jamais pudessem ter pensado no coronavírus. A cotação dos seus ativos não se importa com o motivo que o levou a comprá-los.
A vida é aleatória – ou, como disse Shakespeare, “a vida é uma história contada por um idiota, cheia de som e de fúria, sem sentido algum”; não era à toa que ele era Shakespeare.
O New York Times escreveu nesta semana que “não há nada que os investidores odeiem mais do que a incerteza”. Mas houve algum momento de certeza plena?
“Um mês atrás, as pessoas achavam que o cenário macroeconômico estava favorável. Seria muito difícil imaginar um evento tão negativo”, disse Howard Marks. Mas não é porque as pessoas não conseguem imaginar que não pode acontecer.
O fato é que sempre vai haver um choque em algum momento, saiba você de onde ele aparecerá ou não. Proteções sempre valem a pena. Até porque você vai estar capitalizado para comprar na baixa, quando surgem as pechinchas.
“Um dia, nós vamos chegar ao fundo”, diz Marks. “Nós não temos a mínima ideia de quando ou onde o fundo vai estar. Mas todos os grandes investimentos começam com o desconforto. Você faz dinheiro grande comprando coisas que ninguém mais quer comprar.”
“Não há dúvidas que o coronavírus é um grande problema. A questão é se a queda nos preços é proporcional à piora dos fundamentos. Provavelmente é tempo de comprar, embora não exista um momento único identificável para isso. Acho que já podemos dizer que o coronavírus não é um retorno da gripe espanhola de 1918. Com o que já sabemos, me parece improvável que ele vá mudar fundamentalmente e permanentemente a vida como conhecemos, fazer o futuro ser irreconhecível ou dizimar empresas.”
“Acho razoável comprar um pouco de ações. Elas podem subir, e você vai ficar satisfeito por ter comprado. Elas podem cair mais, caso em que é bom você preservar algum caixa (e alguma coragem) para comprar mais. A vida é assim para quem aceita que é impossível saber o que o futuro reserva”, diz Marks. O que nos resta é fazer o melhor possível para ganhar dinheiro nesse cenário de incerteza.
As lições, portanto, são estas: a) tenha proteções, porque novos choques vão acontecer um dia, sempre; b) aproveite oportunidades para comprar ações baratas, como esta que se desenha.
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